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2 OS GÊNEROS OPINATIVOS E O ARTIGO DE OPINIÃO

2.2 A argumentação como eixo norteador dos gêneros opinativos

Segundo Perelman e Olbrechts- Tyteca (2005), toda argumentação tem como objetivo “provocar ou aumentar a adesão dos espíritos às teses que se apresentam a seu assentimento” (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, 2005, p.50). Os autores definem uma argumentação eficiente como àquela que

consegue aumentar essa intensidade de adesão, de forma que se desencadeie nos ouvinte a ação pretendida (ação positiva ou abstenção) ou, pelo menos, crie neles uma disposição para a ação, que se manifestará no momento).

Para Abreu (2004), a argumentação está vinculada à arte de convencer e persuadir. Segundo o autor, “CONVENCER é saber gerenciar informação, é falar à razão do outro, demonstrando, provocando”, e “PERSUADIR” é saber gerenciar

relação, é falar à emoção do outro” (ABREU, 2004, p. 25). Assim, o autor conclui que argumentar é

em última análise, a arte de, gerenciando informações, convencer o outro de alguma coisa no plano das ideias e de, gerenciando relação, persuadi-lo, no plano das emoções, a fazer alguma coisa que nós desejamos que ele faça. (ABREU, 2004, p. 26)

A argumentação escrita tem norteado o desenvolvimento de importantes pesquisas nas escolas francesas e genebriana (BRONCKART, 1970, 1985; BRONCKART; BRUN; ROULET, 1991; DOLZ, 2004). Já no contexto espanhol, destacam-se os trabalho de Camps (1995, 1997), Camps e Dolz (1995) e Álvarez (2001).

Segundo Bronckart (2004), há uma relação de “interdependência entre a produção da linguagem e o contexto acional e social” (BRONCKART, 2004, p.14). Assim, o autor define a linguagem como “uma característica da atividade humana, cuja função maior é de ordem comunicativa e pragmática” (BRONCKART, 2004, p.34). Essas atividades se organizam em discursos ou em textos, diversificando-se em gêneros.

Nessa perspectiva, os textos passam a ser entendidos como qualquer tipo de produção de linguagem situada (oral e escrita): “um diálogo familiar, uma exposição pedagógica, um pedido de emprego, um artigo de jornal, um romance, etc.” (BRONCKART, 2004, p.71). A língua é, assim, utilizada em diferentes ações sociais para convencer, opinar, aconselhar, declarar, etc.

No enfoque interacionista sociodiscursivo, a argumentação seria, então, um tipo de ação por meio da linguagem utilizada para promover o intercambio de concepções, crenças socialmente construídas e de interação por meio da linguagem, influenciados por condições históricas e sociais de sujeitos reais.

Para Schneuwly e Dolz (2004), no ensino da leitura e da escrita, os gêneros funcionam como meio de articulação entre práticas sociais e objetivos escolares. Nessa perspectiva, os autores defendem que as escolas devem adotar os gêneros textuais como instrumentos didáticos. Nas palavras de Dolz, Gagnon e Decândio (2011, p. 44)

O gênero é um instrumento para agir em situações linguareiras; suas potencialidades de desenvolvimento atualizam-se e são apropriadas na prática. É um instrumento cultural, visto que serve de mediador

nas interações indivíduos- objetos e é um instrumento didático, pois age como meio de articulação entre as práticas sociais e os objetos escolares.

No agrupamento de gêneros proposto por Dolz, Schneuwly e Noverraz (2004), para elaboração de sequências didáticas de ensino da expressão oral e escrita, a argumentação é entendida como o domínio social de comunicação que tem como objetivo a discussão de problemas sociais controversos, a partir de estratégias de sustentação, refutação e negociação de tomadas de posição.

No ensino, a argumentação deve ser trabalhada a fim de levar os “alunos a desenvolver a capacidade de dar seu ponto de vista sobre situações não corriqueiras, formular argumentos, hierarquizá-los”, a partir de sequências didáticas de planificação textual, textualização e consideração das dimensões textuais da escrita (DOLZ; GAGNON; DECÂNDIO, 2011, p. 85).

Na planificação textual, os alunos deverão representar a situação de comunicação: tese, argumentos que sustentam a tese, exemplos, contra- argumentos, posicionamentos, crenças, etc. Na textualização, é preciso estar atento quanto ao uso adequado de organizadores lógicos- argumentativos, expressões que sustentam a argumentação do enunciador e marcas modais para dar a opinião. As dimensões transversais relacionam-se com o conhecimento e uso de elementos formais da língua, no texto escrito (regras ortográficas, pontuação, reunião de frases em parágrafos, domínio da separação de palavras, entre outros (DOLZ; GAGNON; DECÂNDIO, 2011).

Camps (1995) observou, em suas pesquisas, que a maior dificuldade que os alunos apresentam é a de considerar as opiniões contrárias à tese que se defende nos textos argumentativos. Segundo a autora,

no jogo da argumentação e contra- argumentação além de considerar os possíveis destinatários dos textos para adequar os próprios argumentos, faz-se necessário incorporar argumentos contrários à ideia defendida para valorizá-los e tirar sua força argumentativa. 31 (CAMPS, 1995, p. 51, tradução nossa).

A contra- argumentação é um importante elemento da escrita argumentativa que deve ser incorporada nas produções textuais. Camps (1995) define como

31 Texto original em espanhol: “En un juego de argumentación y contraargumentación, que, además de tener en cuenta los posibles destinatarios de los textos para adecuar los propios argumentos, requiere incorporar argumentos contrarios para valorarlos y quitarles fuerza argumentativa”.

estruturas contra-argumentativas a concessão e a refutação. A concessão é entendida como a aceitação de uma proposição que parece contrária à tese defendida. Já a refutação consiste em referir-se aos argumentos contrários para contradizê-los no mesmo texto (CAMPS, 1995, p. 53).

Segundo Barroso (2011), o discurso argumentativo se faz presente em um número variado de gêneros textuais, tais como: o artigo de opinião, o editorial, a carta de reclamação, a propaganda, a carta de solicitação, a resenha crítica, o debate, entre outros. A autora argumenta que “esses gêneros possuem características linguísticas e discursivas comuns, que nos permitem reconhecê-los como sendo da mesma família, ou seja, como gêneros do tipo argumentativo” (BARROSO, 2011, p. 142).

Barroso (2011) define um plano composicional básico de organização composicional para o discurso argumentativo composto de tese e sustentação. Na tese, o aluno expõe suas ideias em relação a algum ponto polêmico. Na sustentação, são utilizados argumentos e justificativas com o objetivo de sustentar a posição assumida pelo autor. Segundo Barroso, o discurso argumentativo

pode, também, apresentar uma organização composicional mais complexa e ampliada, que revela a intenção do sujeito de não só defender uma posição, mas, também, de negociá-la com seu interlocutor. Nesse caso, além de conter os componentes básicos – tese/posição e justificativa –, a argumentação passa a contar com a contraposição, e a justificativa é ampliada por contra-argumentos. Essas duas sequências textuais – contraposição e contra argumentação –, quando presentes na produção do aluno, revelam sua capacidade de: (1) angular a questão polêmica sobre mais de uma perspectiva; e (2) antecipar-se a possíveis posicionamentos de seu interlocutor. (BARROSO, 2011, p. 143)

Nesse sentido, pode-se dizer que a presença da contraposição e contra- argumentação nas produções de textos opinativos indica não só a capacidade de defender posições, mas também sustentá-las e negociá-las com o leitor. Acredito que tais habilidades devem ser trabalhadas no ensino da leitura e da produção escrita, já que, como já foi mencionado anteriormente, pesquisas desenvolvidas na área revelam a ausência ou dificuldade de uso de estratégias contra- argumentativos em textos escritos.

Neste estudo, busquei desenvolver procedimentos didáticos de ensino da escrita argumentativa, a partir de atividades de identificação de argumentos e contra- argumentos em leituras de textos opinativos e uso de estratégias de defesas

de posições e sustentação da argumentação, levando em consideração a visão contrária à que se defende, isto é, a contra-argumentação.

2.3 A retórica e suas contribuições para o ensino da produção escrita como