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A atual necessidade da governança corporativa eficiente: a proteção ao

4 PROPOSTA DE APRIMORAMENTO DAS SOCIEDADES POR

4.3 A atual necessidade da governança corporativa eficiente: a proteção ao

Comparando dados de 1998 a 2002, obtidos por um questionário de vinte e quatro pontos de sua lavra, LEAL e CARVALHAL concluíram que a governança corporativa (a usual) vale à pena, embora tenham identificado algumas discrepâncias na realidade das empresas brasileiras 514.

Segundo o estudo, a maioria das companhias não especifica nenhuma sanção contra a administração por má-prática da governança corporativa. Elas fornecem em notas as transações com terceiros, todavia, oferecem pouca informação sobre diretoria e remuneração.

Por volta de trinta porcento utilizam-se de padrões internacionais de contabilidade e 75% contam com uma das empresas líderes de auditoria.

Infelizmente, o presidente do conselho e o diretor-presidente são a mesma pessoa em um terço das companhias. A maioria delas não usa comitês para estudo e realização de atividades específicas, nem são compostas por

514 LEAL, Ricardo; Carvalhal, André. Corporate governance and value in Brazil (and in

diretores externos ou independentes. O mandato recomendado de um ano não é respeitado, nem possuem no conselho fiscal representante dos minoritários.

Cerca de 37% dos conselhos não atendem à recomendação do código de governança corporativa do IBGC quanto ao tamanho dos conselhos.

A maioria não facilita o voto dos acionistas e não garante qualquer direito adicional de voto, nem direitos tag along nos termos legais. Cerca de trinta porcento das empresas oferecem liquidez insuficiente aos acionistas. O que é um dado alarmante, pois o direito de recesso em caso de dissensão poderia ser prejudicado.

Os autores da pesquisa informam que em visualização da série histórica, houve uma evolução geral, contudo insuficiente. Até porquê, corroborando os dados apresentados em capítulo anterior, quanto à concentração, o controle indireto realizado pelos cinco maiores acionistas cresceu de 1998 a 2002, aproximando-se da média de noventa porcento.

Do estudo percebe-se que há preocupação na execução da governança corporativa, mas não a governança corporativa eficiente, que tornaria inconcebível a parcialidade no cumprimento.

Pelos dados apontados, os cinco princípios não são plenamente atendidos. Registre-se especialmente o princípio da eqüidade, em virtude, basicamente da alta concentração de propriedade no Brasil, caracterizando o problema de baixa proteção do acionista minoritário.

Ressalva-se, todavia, que embora consagrada, a expressão “acionista minoritário” não parece adequada. Uma empresa com dez sócios, cada um com 10%, a soma de esforços por acordo de acionistas, por exemplo, pode elevar um pequeno grupo ao controle da organização. Mas, deixam de ser minoritários na acepção mais simples da palavra? Individualmente não, porém, via acordo passam a ter poder sobre os demais, ainda que não atinjam mais de 50%.

Outra situação, um determinado acionista, com meros 5% das ações ordinárias, de perfil habilidoso e eloqüente, pode angariar a simpatia dos demais e virtualmente, assumir o controle da empresa, definindo seus rumos. Pela

conceituação convencional515, o simples fato de ter isoladamente uma participação pequena, determinado acionista poderia ser receptor dos benefícios aos minoritários, embora na prática, seja o grande propulsor de políticas e diretrizes da empresa, controlando-a. Cabe lembrar a descrição dos controles absoluto, majoritário, minoritário e gerencial.516

Assim, o ideal é traçar a separação entre controladores e não- controladores. Os primeiros responsáveis pela força decisora e os últimos, muitas vezes, meros espectadores na melhor hipótese, e na pior, vítimas. Inclusive, reforça-se essa compreensão na leitura atenta do artigo 116 da Lei das sociedades por ações, em que há conceituação de acionista controlador, o que infere, em oposição, a nomenclatura “não-controlador” para todos os demais.

Nesta perspectiva, parte-se e admite-se que o acionista não- controlador é de boa índole, com elementos suficientes de cidadania corporativa, consistente em quatro faces dos acionistas ou grupos: lucrar, obedecer à lei, ser ético e um bom cidadão corporativo nas relações com as partes interessadas. Ele promove um capital de reputação, que envolve a promoção de um ambiente de trabalho saudável e seguro, práticas exemplares de emprego, práticas de proteção ambientais responsáveis, respeitos às leis, especialmente referente a anti- corrupção e transparência, bem como contribuição para o desenvolvimento da economia local 517, ou seja, um bonus paterfamilias518.

Fechada a conceituação, volta-se ao problema: há baixa proteção do acionista não-controlador e mudanças são necessárias para se assegurar a eqüidade. Não se trata de uma ação afirmativa519, pois não é criado programa de

515 Igualmente na idéia de poder diminuído para conceituar minoritário: BULGARELLI,

Waldírio. A proteção às minorias na sociedade anônima. São Paulo: Pioneira, 1977.

516

Cf. BERLE, A.; MEANS, G., 1987. p.71.

517 Cf. HEMPHILL, Thomas. Corporate citizenship: the case for a new corporate governance

model. Business and Society Review, n.109, p.340

518 Cf. CRETELLA JÚNIOR, J. Curso de direito romano. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.106. 519Ação afirmativa é uma expressão que se refere às tentativas de trazer membros de grupos sub-

representados, normalmente grupos que sofrem discriminação, a um grau mais alto de participação em algum programa de benefício. (MENEZES, Paulo Lucena de. A ação afirmativa (Affirmative action) no direito norte-americano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. Nota n.º 3, p. 28

beneficio discriminatório, mas uma alteração substantiva em lei para assegurar igualdade ao titular de ação.

A governança corporativa eficiente aplicada acaba por auxiliar na proteção dos acionistas não-controladores. Estes se revelam preocupados com as possibilidades de expropriação econômica, já que investiram na companhia e sobre o capital aplicado nada sabem. E, por outro lado, aos acionistas controladores interessa apenas gerir o capital, preferindo ignorar os demais. Embora, a governança corporativa eficiente seja favorável ao mercado e a companhia como um todo, pois alavanca oportunidades de melhorias e otimização de recursos, é ainda mais benéfica ao não-controlador, pela construção de sólidos caminhos de gestão e controle das atividades empresariais (ou do desenvolvimento dos recursos investidos na companhia, mediante a compra de ações).

Ciente que na Constituição Federal de 1988 autoriza-se o livre empreendimento e a propriedade privada, reconhece-se que as condições basilares para o desenvolvimento da atividade empresarial. E, depreende-se que autoriza ao brasileiro sua participação, como abertamente demonstrou-se nas emendas permissivas a estrangeiros, diante da incapacidade de investimento nacional. Hoje, passada mais de uma década, há um movimento reconhecido na imprensa de mudança de postura (parcela da população brasileira quer comer bem, ao invés de dormir bem) de investimentos. Com a queda de juros e ampliação dos produtos de previdência privada, o indivíduo deseja construir uma base de poupança distante dos fundos de renda fixa, desenvolvendo apetite por mais retornos em operações de remuneração variável. O que é salutar, pois exemplo maior de remuneração variável é o mercado acionário, proporcionador de ganhos mais expressivos, conforme já demonstrado.

Coletivamente, os investidores colocam seus recursos onde seriam mais necessários, em um mercado fomentador de negócios, reduzindo os custos de financiamento das companhias.520 Estas, afastadas dos juros bancários,

520 Há empiricamente comprovada correlação positiva entre proteção ao investidor e

encontram mais fôlego para administração e empreendimento. Individualmente, cada investidor obtém a chance de resultados nos investimentos superiores aos tradicionais e expandir suas liberdades. Deste modo, como SEN, apropriadamente colocou, o indivíduo expande suas liberdades como fim primordial de atingir o desenvolvimento pessoal, e em conjunto, acrescenta-se, o nacional. E, para tal, precisa das liberdades instrumentais, ou seja, meios para completude do desenvolvimento. O autor sugere: a) as liberdades políticas; b) as facilidades econômicas; c) oportunidades sociais; d) garantia de transparência; e, e) segurança protetora, todas voltadas para o aspecto do Estado521.

Voltando-se a sociedade por ações como um pequeno Estado, institucionalizado522, a liberdade política pode ser encarada como a oportunidade ao acionista de governar, fundado em princípios comuns, fiscalizar e reavaliar a administração, como também criticá-la, sem censuras.

Já no aspecto da facilidade econômica é a oportunidade da utilização de recursos econômicos próprios a sua conveniência, investindo apropriadamente em empresa ou mercado de sua preferência.

Pelas oportunidades sociais entende-se, nesta adaptação, a instrução econômico-financeira adequada para que o acionista expandir sua capacidade de desenvolvimento.

2002.(PAGANO, Marco; VOLPIN, Paolo. Shareholder protection, stock market development and politics. ECGI, 2005.)

521 SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000,

p.52.

522 Teoria institucionalista: de origem francesa, seus dois maiores defensores foram Jean Escarra

e Hauriou. Na opinião deste, a instituição é uma organização social, estável em relação à ordem geral das coisas, cuja permanência é assegurada por um equilíbrio de forças ou por uma separação de poderes, e que constitui, por si mesma, um estado de direito. Diferente de um contrato, em que a conservação da situação se dá pelo adimplemento pelas partes de seus compromissos, criando condição resolutiva seu descumprimento; na instituição, a existência da organização independe das promessas dos seus componentes. Foi a filosofia institucionalista que inspirou a elaboração da Lei das sociedades por ações brasileira. (REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. v.1. São Paulo: Saraiva, 2003. p.369-70). Concorda-se com Santos, muito difícil definir a sociedade por ações como de origem contratualista ou institucionalista. (SANTOS, Aline. Reflexões sobre a governança corporativa no Brasil. Revista de Direito mercantil, industrial, econômico e financeiro. São Paulo, n.130, p.180-206, 2003.)

Pelas garantias de transparência, compreende-se a “liberdade de lidar uns com os outros sob garantias de dessegredo e clareza”523, ou ainda, ter acesso a toda informação relevante para tomada de decisão, qual seja, manter posição acionária, ampliá-la ou reduzi-la.

E, também, há a necessidade da segurança protetora, que se constitui em um ordenamento jurídico ou convencional (acordado) que as regras não mudem (pacta sunt servanda).

Cada pessoa, com respeito às liberdades instrumentais salientadas, participando mais ativamente da economia, seja pelo trabalho ou tornando-se acionista acaba por ter ampliado suas liberdades e aproximado o desenvolvimento524.

O desenvolvimento humano, bem estar de cada pessoa, não é luxo de país rico.525 Ao contrário, o aumento do número de indivíduos na economia, pulveriza o risco das operações e melhora a distribuição de riqueza, pois mais pessoas terão acesso aos dividendos do crescimento econômico, e em círculo virtuoso, maior poder de compra e acesso a bens, estimulando mais produção e mais mercado526.

E, isoladamente, é bem provável que o cidadão torne-se um acionista não-controlador. Imbuído do ânimo de COMPARATO, para qual “[a] tarefa primordial e inadiável do jurista, nessa matéria, consiste, portanto, em procurar corrigir o descompasso entre o sistema jurídico e a realidade social, em função dos valores de justiça econômica527”, que se tenta propor algumas sugestões para aprimoramento, na perspectiva da governança corporativa eficiente nas sociedades por ações.

523 Cf. SEN, A., 2000, p.56.

524 Ao tirar o dinheiro dos fundos de rolagem de dívida pública (renda fixa, principalmente,

carteira compostas por títulos públicos federais), o brasileiro impulsiona as empresas nacionais.

525

Cf. SEN, A., 2000, p.58.

526 Cabe lembrar que em período recessivo, a população perde também, pois a moeda perde

valor, a oferta de bens diminui e o capital não gira, fazendo todos prejudicados.

4.4 SUGESTÕES DE APRIMORAMENTO DAS SOCIEDADES POR AÇÕES: