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1 APRESENTAÇÃO DAS SOCIEDADES POR AÇÕES

2.3 Modelos de governança corporativa: constatação da formação da

2.3.1 Reino Unido

FRANKS et al180 analisando a diluição da participação das famílias

nas empresas do Reino Unidos , constatou que no Reino Unido não há propriedade concentrada, nem estruturas piramidais181. A propriedade familiar é de significância limitada e existe um mercado ativo em controle corporativo.

BECHT e MAYER informaram que os blocos médios familiares nas empresas são de 26% na Áustria, 27% na Alemanha e 20% na Itália. No Reino Unido, apenas 5%. Essa é a diferença frente a Europa Continental, o que talvez justifique o modelo diferenciado de governança corporativa.

Historicamente, as famílias foram detentoras das empresas, principalmente nas áreas de modesto investimento, como pequenos negócios de

178 Sobre rent-seeking e propriedade e controle corporativo: BEBCHUK, Lucian. A rent-

protection theory of corporate ownership and control. NBER Working paper, n. 7203, julho, 1999.

179 Os países foram escolhidos pela diversidade cultural e dados históricos que contemplem as

últimas quinze décadas.

180 FRANKS, Julian et al. Spending less time with the family: the decline of family ownership in

the UK. National Bureau of Economic Research. In: History of corporate ownership: the rise and fall of great business families. 2004.

181 Estrutura societária em que determinada empresa é detentora de parcela de controle de outra

serviços e comércio. Nas de grande investimento como química, equipamentos elétricos e metais sofreram em concorrência com alemãs e norte-americanas.

No início do século XX, famílias poderosas dominavam o setor corporativo britânico. Não necessariamente pelo controle de propriedade, mas por assegurarem importantes posições no conselho de administração (board of directors), como a de presidente, em desproporção a sua posição acionária. O declínio da propriedade familiar não veio pela venda das participações, mas pela diluição na emissão de ações para crescimento financeiro não interno, mas de aquisição de outras empresas182. Durante o século XX, três grandes ondas de fusões ocorreram (1900, 1920 e 1930) consolidando grupos corporativos que ainda perduram. Ocorreram em um período de mercado de ações não regulado com pouca proteção a minoritários. Já nas décadas de 1940 e 1950, a proteção a minoritários se fortaleceu. A transparência foi melhorada os mecanismos anti- absolutismo dos diretores foram introduzidos. Igualmente, cresceu a propriedade de investidores institucionais. Em 1960, o fundos institucionais já eram os maiores acionistas em mais de um terço das companhias. Seguiu-se a emersão de um mercado de controle corporativo, onde as aquisições hostis (hostile takeovers) encareceram o custo de aquisição total, em virtude, igualmente, do conceito de pagamento de prêmio pelas ações. As empresas passaram a se proteger, inclusive, extinguindo as ações dual class183, bem como o sistema de pirâmides. O Takeover Panel foi estabelecido em 1968. O regulatório determinou bid, sinônimo de valor mínimo para oferta obrigatório aos demais acionistas, com preço igual ao dos controladores. Preveniram-se as ofertas discriminatórias de preços e a construção de blocos acionários grandes.

Na década de 1970 revelou-se o sistema britânico de propriedade e controle corporativo: investidores institucionais substanciais, mercado de aquisição hostil e proteção extensiva aos minoritários. Juntos afetaram os

182 Acreditando que o mercado acionário inglês cresceu sem adequada proteção aos acionistas:

FRANKS, Julian; MAYER, Colin. The origination and evolution of ownership and control. ECGI Finance Working Paper, n. 9, 2003.

183 Dual class: duas espécies, por exemplo ordinárias e preferenciais, distinguidas pelo direito ou

mercados ativos de controle corporativo. Naturalmente, o poderio das famílias nos conselhos de administração sucumbiu, já que a dinâmica comercial era rápida demais.

Segundo dados compilados da própria London Stock Exchange (LSE) a propriedade familiar declinou rapidamente na primeira metade do século XX e as instituições emergiram para assumir tal espaço. Faz-se perceptível o verificar que na board de 1900 a 1940, a participação de não familiares subiu de 46% para 64% das cadeiras. Da posição de presidente, a participação de um membro da família caiu de 80% para 50%. E a participação de famílias detendo mais de 25% das ações caiu de 65% para 20%. Já na segunda metade do século os assentos ocupados por familiares caíram para apenas 16%184.

A evolução da propriedade no Reino Unido pode ser bem observada nos dois estudos simplificados: GKN Siderúrgica e Schweppes185.

A GKN foi criada em 1759. John Guest era gerente em 1767 e seu neto se tornou único dono em 1851. Empregava 7.300 pessoas e era a maior empresa siderúrgica mundial. Foi incorporada em 1900 com emissão de ações. Em 1902 comprou outra empresa com nova emissão de ações, negociadas em bolsa de Londres e Birminghan. Em 1910, os diretores detinham 26,4% das ações ordinárias. Em 1923 comprou outras empresas. Nesta década, o número de acionistas saltou de 1.000 para 20.000. Em 1946 estava listada na bolsa de valores de Londres e os diretores detinham parcela insignificante, e o maior acionista: Royal Bank of Scotland detinha 2,37% das ações ordinárias. Na segunda metade do século, investidores institucionais alteraram a posição de maior acionista, nunca superando a marca de 5,25% do total.

A empresa fundada pelo alemão Jean Jacob Schweppe em 1783, tinha como característica principal a eficiente exploração de água mineral. Em 1790, realizou parceria para expansão e construiu uma fábrica em Londres. Em 1800, mudou seu nome e da fábrica para Schweppes e continuou a crescer. Em 1831 se tornou fornecedora oficial da Casa Real. Em 1834 foi comprada por outro grupo

184 Cf. FRANKS, J., 2004. 185 Idem.

familiar e ampliou sua linha de produtos com refrigerantes como limonada. No ano seguinte recebeu a garantia real pela Rainha Vitória. Tornou-se popular na Índia pela bebida com quinino que prevenia a malária. Em 1877 abriu fábrica na Austrália, e 1884 no Brooklyn, Nova Iorque. Em 1886 converteu-se em sociedade limited. A propriedade era totalmente dos diretores. Em 1897, com public flotation, passaram a controlar apenas 27,2% das ações ordinárias. Passaram a contar com 2.400 acionistas, entre ordinarialistas e preferencialistas. Em 1919, o controle saiu da mão das famílias principais. Expandiu-se e praticamente duplicou o número de acionistas ordinários. Ainda na década de 1950, houve sete grandes fusões fomentadas por emissão de ações, inclusive com a controladora dos Chocolates Cadbury.

Os dois exemplos demonstram que as empresas cresceram por meio da emissão de ações. Ações compradas pela população em geral. Mas, o inverso também ocorreu... Na segunda metade do século, mais precisamente 1953, Charles Clore ofereceu o bid186 pela J. Sears & Co., que controlava uma cadeia de lojas. Ao invés de seguir a tradicional negociação com a gerência alvo, Clore enviou carta direta aos acionistas. Em contra-ataque, os diretores da Companhia responderam a todos os acionistas que triplicariam os dividendos pagos. Logicamente, os acionistas identificaram a medida com desesperada e irresponsável e se dirigiram a Clore. Rapidamente, este tomou o controle, via takeover. Outras situações semelhantes ocorreram. As empresas em geral ficaram preocupadas, e como estratégia de defesa passaram a ampliar as estruturas piramidais e ações dual class, com restrição a alguns direitos. A LSE interveio e desaprovou ambas as práticas. O resultado foi que da década 1970 para 1980, o número de empresas listadas com ações dual class caiu de 11,1% para 7,1%, fenômeno que ainda subsiste.

Recentemente, houve uma revisão no código da LSE aumentando o tamanho dos conselhos; ampliando o papel do presidente para incluir liderança no conselho a fim de garantir efetiva comunicação com acionistas e diretores

186 Para COMPARATO o take-over bid é a desforra do acionista (COMPARATO, Fábio K.

não-executivos e assegurar relacionamento construtivo entre diretores executivos e não-executivos; exigindo mais comprometimento em tempo dos diretores não- executivos e redimensionou o risco potencial sobre reputação e responsabilidade civil desses diretores187.