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A GRANDE EXPERIÊNCIA CONTEMPORÂNEA

A BELEZA DA PROPORÇÃO

“Só aceitamos com tanta facilidade o real e sua existência porque pressentimos que a realidade não existe” (Borges)

Quando Álvaro de Campos escreveu o poema: O Binómio de Newton

O binómio de Newton é tão belo como a Vénus de Milo.

O que há é pouca gente para dar por isso. óóóó---óóóóóó óóó--- óóóóóóó óóóóóóóó (O vento lá fora.)

(Fernando Pessoa, Poesias de Álvaro de Campos) Estabelecia ele, visivelmente, uma relação entre a arte118 e a ciência. Na verdade a beleza que existe na arte também

existe na matemática, assim como a “ordem”, que está presente na matemática, também pode ser encontrada na arte. No entanto, poucas são as pessoas capazes de perceber isso. Não há quem não conheça a célebre escultura grega, da época helenística, sem braços, que representa a deusa Afrodite, no entanto, o binômio de Newton não é tão popular assim.

Realmente, se for buscar a imagem do binômio, encontrarei um teorema, “que permite desenvolver, sob a forma de polinômio, qualquer potência de um binômio”, ou seja:

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Por mais que perceba certa identidade entre a arte e a ciência, que perceba que a construção da escultura requer elementos matemáticos para que se erga em ordem e estrutura, como leigo, é difícil enxergar a mesma beleza no binômio de Newton. Acho que é preciso um processo diferenciado de aprendizagem para que se possa dominar essa linguagem e, por algum motivo, que não cabe aqui explicitar, tal aprendizagem não é fácil, o que nos leva sempre ao pensamento errôneo de que arte e matemática estão dissociadas uma da outra.

A Vênus de Milo traduz-se em percepção de beleza e de um corpo perfeito e será aqui a principal metáfora para nossa discussão. No livro A Eva Futura, do escritor francês Villiers de L’Isle Adam, ela será o ícone para a “produção” científica, tecnológica e matemática de um corpo perfeito. Essa perfeição, que produz um equilíbrio estético, só é possível ser encontrada pelos caminhos da matemática. Matemáticos de Cambridge descobriram que a fórmula para um corpo perfeito, que é a fórmula do corpo da Vênus de Milo, é ter a cintura em 70% dos quadris. Essa “descoberta” possivelmente está associada com todo o estudo em torno da Proporção Áurea.

Esta, sem dúvida, para mim é uma das proporções mais fantásticas da matemática, porque é perceptível na natureza, e muito utilizada pelos pintores, escultores e arquitetos, sobretudo os da antiguidade. A Vênus de Milo é um exemplo de Proporção Áurea, o que faz com que tenha beleza estética e será, por esse motivo, que aparecerá no livro de L’Isle Adam, pois estará sempre associada à questão da beleza física e da possibilidade de que seja “matematica e cientificamente reproduzida”.

É difícil entender profundamente, para quem é leigo, o que faz uma proporção áurea ser... enfim...áurea. Mas, reproduzo o que há de mais direto e objetivo que a explique e que possa ter relação com a Hadaly, a “personagem” central de A Eva Futura.

Euclides de Alexandria é o princípio de tudo, ainda no século 365 a.C – 300 a.C. Em 1446, o matemático Pacioli, que influenciou Leonardo da Vinci, escreve um texto no qual remete à Proporção Áurea associando-a ao divino. Leonardo da Vinci a demonstra, então, na sua conhecidíssima

realização – o “homem vitruviano” -, quando demonstra que a proporção humana pode ser perfeita . A sua famosa Mona Lisa, por exemplo, é uma obra estruturada pela Proporção Áurea o que, possivelmente, explica o porquê de a considerarmos uma obra tão bela. Ela é esteticamente perfeita, mesmo que a imagem pintada não reproduza nenhum modelo de beleza atual. O 120 mesmo se dá com a Vênus de Milo.

Fibonacci, matemático italiano do século XII, descobriu uma série numérica “base de uma incrível relação”. Por exemplo a série 0, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34 ..., ou seja, cada número da série é igual à soma dos dois números anteriores – 0 + 1 =1; 1 + 1 = 2; 2 + 1 = 3; 2 + 3 = 5; 3 + 5 = 8 e assim por diante. Essa série, é claro, pode continuar até o infinito. “A razão entre

os dois termos torna-se uma constante”, e o cálculo da proporção que foi feito resulta em 1,618. Essa seria a maneira matemática121 de se

dividir uma linha de maneira proporcional, ou seja, “a razão entre a+b e a coincide com a razão entre a e b” o que tem como resultado, segundo todos esses homens geniais, a forma mais harmônica e esteticamente perfeita de se dividir o segmento de uma reta.

120Disponível em: http://www.bpiropo.com.br/fpc20070226.htm. Acesso em 27 dez. 2007)

121Disponível em : http://pt.wikipedia.org/wiki/Propor%C3%A7%C3%A3o_%C3%A1urea. Acesso em: 26dez. 2007)

É muito impressionante encontrarmos o segmento áureo em obras antigas. Arquiteturas, esculturas e pinturas que sempre admiramos e, embora soubéssemos quais eram suas “origens”, não percebíamos sua estrutura de construção matemática. Sei que a pesquisa de imagens na internet está se estendendo, mas não resisto ao desejo de registrá-las aqui, pois, sobretudo, para aqueles, como eu, cuja formação é literária, a visão de tais imagens é, sem dúvida, esclarecedora. Assim, tomo como exemplo a Catedral de Notre Dame, Paris, França, e percebo que tais segmentos orientaram, com certeza, sua construção. Dessa forma, é possível começar a procurar a Proporção Áurea nas coisas e começar122a entender que, assim como na literatura, é possível haver encantamento na matemática, na física e nas ciências. Com essa série numérica obteve-se o triângulo áureo, o retângulo áureo, que nós encontramos na Mona Lisa de Leonardo da Vinci e, também, está claro, na Vênus de Milo. Se repararmos bem, os números que marcam os quadrados obedecem à série de Fibonacci, e percebemos que a beleza está associada à proporcionalidade, pois vemos, no que é proporcional, harmonia. Todos os autores demonstram que a Progressão Áurea está presente, como já afirmamos, nas artes, na arquitetura, na ciência e, impressionantemente, na natureza. Naquela mesma sobre a qual o homem não é capaz de interferir quando se pensa em “criação”. Um abacaxi é assim formado, as conchas - como o Nautilus, por exemplo, que aparece no segundo capítulo deste trabalho, é um dos melhores exemplos desta proporção, pois se encaixa perfeitamente no retângulo áureo –, as falanges de nossos dedos , as colméias também. Talvez isso explique o porquê de Euclides de Alexandria, tantos anos antes de Cristo, já afirmasse que a Progressão Áurea tinha algo de divino, pois

ela aparece em inúmeros outros exemplos que “envolvem a ordem do crescimento”. 123

E, exatamente por estar relacionada ao crescimento, é que a constante numérica da progressão áurea se tornou tão freqüente e passou a ser conhecida também como o “número de ouro”, ganhando um “status de quase mágico”, e passou a interessar os escritores, artistas, pesquisadores, cientistas. Mas, tudo isso é encontrado por meio das pesquisas e do desenvolvimento da matemática. E, é por isso que se torna, cada vez mais, tão fascinante.

Toda a discussão sobre a Progressão Áurea, além de relacionar a arte com a matemática, apresentando

possibilidades de interseção entre tais linguagens, tem, como objetivo central, o romance A Eva Futura, de Villiers de L’Isle Adam, motivo pelo qual a Vênus de Milo é sempre o eixo central de nossa discussão. No entanto, o objetivo maior, tentando sempre manter a relação com a nossa proposta inicial, é demonstrar como o autor antecipou, tantos anos antes, o desenvolvimento de uma tecnologia que poderia construir ou conceber a construção de corpos-maquínicos perfeitos que pudessem reproduzir os corpos humanos, também com perfeição áurea.