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A Capela de Santo Antônio

No documento VIÇOSA - MINAS GERAIS 2022 (páginas 86-90)

2.3 Quais bens patrimonializar? Uma análise da escolha dos bens tombados em Piranga. 72

2.3.3 Os processos estaduais de patrimonialização

2.3.3.1 A Capela de Santo Antônio

históricos, como é o caso de alguns bens piranguenses que estão desaparecendo pelo simples abandono dos bens culturais ou devido à indiferença da população ou dos governantes.

A preservação desses bens levaria a manter também preservada a memória e a identidade, ao passo que a destruição implicaria no esquecimento. Nesse sentido, associamos a memória aos seus suportes materiais, os quais devem ser preservados para que ela permaneça. Por outro lado, “[...] muitas vezes, a destruição de objetos e espaços materiais pode ser o elemento gerador de identidades e memórias” (GONÇALVES, 2015, p. 223), como é o caso do sentimento compartilhado entre muitos piranguenses.

1875, torna-se Matriz por lei mineira, mas não teve instituição canônica permanecendo filial da Matriz de Nossa Senhora da Conceição de Piranga (RIBEIRO, 2009, p. 96).

A Igreja de Santo Antônio é um exemplar típico das igrejas construídas no período aurífero do século XVIII. Está localizada em algumas ruas abaixo do Santuário do Bom Jesus de Matozinhos, especificamente no arruamento principal, no centro do distrito. A capela é menor e mais simples, se comparada ao Santuário, e dedicada à devoção a Santo Antônio.

Apresenta características típicas da primeira fase do Barroco e, como é característico da região, há a ausência de torres, sendo o sino é instalado na janela-sineira da fachada principal.

Ao longo dos anos, a igreja foi passando por reformas e modificações. Parte dessas reformas foi necessária após o desabamento de parte do telhado: “A tribuna esquerda, que foi totalmente reconstruída pela Comunidade depois de desabamento, não possui mais o piso e o único púlpito ali instalado não tem escada de acesso” (Ibidem, p. 97). Outra característica marcante acerca do patrimônio religioso piranguense é a atuação dos moradores em mantê-las ainda hoje de pé, pois diversas foram as vezes em que obras foram realizadas em todo o município foram custeadas pelos moradores, que arrecadavam fundos para manter as igrejas.

Devido à sua importância arquitetônica, artística, histórica, cultural e religiosa, a igreja foi tombada pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais, como consta no site do IEPHA-MG:

O tombamento estadual da Igreja de Santo Antônio, do distrito de Santo Antônio de Pirapetinga, município de Piranga, foi homologado pelo Decreto n° 29.399 de 21 de abril de 1989, com inscrição no Livro de Tombo n° I, do tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico; no Livro de Tombo n° II, do tombo de Belas Artes; no Livro de Tombo n° III, do tombo Histórico, das obras de Arte Históricas e dos Documentos Paleográficos ou Bibliográficos e no Livro de Tombo n° IV, do tombo das Artes Aplicadas39.

O fato de ter sido registrado em vários livros do tombo demonstra a importância desse bem patrimonial e do seu valor não apenas para a localidade de Bacalhau, mas também para todo o estado de Minas Gerais. Segundo a arquiteta Delmarí Ribeiro (2009, p. 96): “A Igreja de Santo Antônio é um notável exemplar da arquitetura religiosa de médio porte produzido no período aurífero do século XVIII, em Minas Gerais”. O dossiê de tombamento desse bem foi realizado por meio da equipe do setor de tombamento da superintendência de Pesquisa, Tombamentos e Documentação do IEPHA/MG, sendo baseado em bibliografia geral e

39 Disponível em: http://www.iepha.mg.gov.br/index.php/14-patrimonio-cultural-protegido/bens-tombados/69-igreja-de-santo-ant%C3%B4nio. Acessado em: 08 de abril de 2021.

específica, bem como em pesquisas de campo, as quais realizaram vistorias das edificações e montagem da documentação fotográfica. O dossiê teve como objetivo “fornecer subsídios para a análise dos edifícios religiosos em questão, com vistas ao seu tombamento no âmbito estadual” (DOSSIÊ, fl. 5).

O dossiê enfatiza a importância arquitetônica desta igreja no quadro da arquitetura colonial mineira, pois, segundo os especialistas do IEPHA, trata-se de uma construção muito rica, não apenas no teor religioso, como também por suas características arquitetônicas. Além disso, citam o papel da comunidade local em preservar este bem, uma vez que, segundo o dossiê, deve-se:

[...] aplaudir a comunidade do antigo Bacalhau que, a despeito de grandes dificuldades, conservou seu precioso acervo até os nossos dias. Isso mostra um significado vivo dessas obras, que extrapola os limites da análise puramente formal e reporta a uma dimensão mais humana que expressa uma personalidade cultural própria e delineia o real valor do bem de cultura (DOSSIÊ, fl. 17).

Apesar de ter essa pequena menção à população local, no restante do processo de tombamento deste bem não é possível notarmos uma participação efetiva da comunidade local em prol da realização desse tombamento. Aspectos como este não significam que a proteção dos bens não era do interesse deles, mas que, provavelmente, grande parte da comunidade não entende ao certo como funcionam essas questões e sua finalidade, já que, muitas vezes, o tombamento é visto pela população como um vilão e não como um aliado, pois há ainda muito forte a ideia de que esse processo tira o direito do povo de tomar decisões acerca do bem.

Por mais que durante o processo não tenha aparecido a participação popular, é possível notarmos sua presença em vários outros momentos, principalmente quando se trata da proteção do bem. Após o tombamento, a igreja teve que passar por obras emergenciais (1993-1994) e, diante da falta de verba pública para esse fim, o próprio Conselho de Desenvolvimento Comunitário de Santo Antônio do Pirapetinga, que é composto pela população local, foi quem realizou e financiou as obras. Nessa ação houve uma participação do IEPHA/MG no acompanhamento das obras, por meio dos seus técnicos, mas nenhum apoio de custeio para as obras.

Em 2004, novamente a igreja precisou de novas obras, visto que seu telhado estava sujeito a não suportar o período de chuva que se aproximava. Então, novamente o IEPHA/MG forneceu apoio técnico, mas as obras foram realizadas e custeadas, como da vez anterior, pelo

conselho comunitário local. Dentre os integrantes, destacam-se o mestre de obras, Sr. Adelino Patrocínio Dias, o pedreiro Onézimo Câmara e o engenheiro Adauto Lourenço Mendes, todos profissionais que já haviam atuado na região, inclusive em obras no próprio Santuário do Bom Jesus.

A esse respeito, conforme Delmarí Ribeiro,

Mesmo com recursos econômicos escassos e, sim, disponibilizando a equipe técnica e seus projetos de restauração e fiscalizando as obras, o IEPHA/MG, com a atuação da Presidente Vanessa Brasileiro, procurou, novamente, firmar parcerias com a Comunidade local, com a Prefeitura Municipal de Piranga e, também, com o Ministério Público (através de Termo de Ajustamento de Conduta) para a preservação deste monumento. (...) as obras executadas pela própria Comunidade onde participaram carpinteiros, pedreiros, serventes, o Mestre de Obras, Sr. Adelino Patrocínio Dias, moradores de Bacalhau e acompanhamento técnico do engenheiro de Piranga, Adauto Lourenço Mendes, todos os dois com experiência adquirida anteriormente nas obras do Santuário (RIBEIRO, 2009, p. 155).

Esse trecho deixa claro que, por mais que a escassez dos recursos seja um grande empecilho, e que dificulte muito a conservação dos bens, por meio da colaboração dos setores é possível fazer algo para proteger o patrimônio, pois, quando há colaboração entre os departamentos públicos e entre a comunidade, tudo se torna mais possível de acontecer. A comunidade local nunca deve ser deixada de lado: ela deve ser o personagem atuante de todo processo.

Atualmente, a igreja é utilizada em celebrações do cotidiano da Comunidade, para rezas do terço diário e as missas mensais. Devido ao seu valor simbólico e à sua ligação com a identidade e o sentimento de pertencimento dos moradores da comunidade, a igreja possui alto valor para todos e mantê-la é uma preocupação constante da comunidade de Bacalhau.

Do ponto de vista histórico, tal edificação “destaca-se pela sua qualidade plástica e arquitetônica, (...) que exemplifica a implantação em território mineiro de toda a tradição da arte de construir trazida pelo colonizador português” (Ibidem, p. 98).

Figura 5 - Capela de Santo Antônio em diferentes ângulos e interior

Fonte: http://www.iepha.mg.gov.br/index.php/14-patrimonio-cultural-protegido/benstombados/69-igreja-de-santo-ant%C3%B4nio. Acesso em: 03 de agosto de 2022.

No documento VIÇOSA - MINAS GERAIS 2022 (páginas 86-90)