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A Capela de Nossa Senhora do Rosário

No documento VIÇOSA - MINAS GERAIS 2022 (páginas 93-97)

2.3 Quais bens patrimonializar? Uma análise da escolha dos bens tombados em Piranga. 72

2.3.3 Os processos estaduais de patrimonialização

2.3.3.3 A Capela de Nossa Senhora do Rosário

Figura 6 - Capela de Nossa Senhora do Rosário (ruínas)

* À esquerda, quando recebeu tombamento e à direita uma fotografia mais recente.

Fonte:http://www.iepha.mg.gov.br/index.php/14-patrimonio-cultural-protegido/bens-tombados/119 ru%C3%ADnas-da-capela-de-nossa-senhora-do-ros%C3%A1rio.

da construção. Sabe-se que a irmandade era responsável por manter e organizar os eventos, e que um capelão era eleito para realizar as missas pelos vivos e mortos e para acompanhar os sepultamentos. A irmandade tinha, ainda, a obrigação de assistir os velórios, acompanhar os corpos e sepultar os falecidos na capela, rezando seis missas por cada falecido. Os documentos comprovam que a irmandade não recebia nenhuma contribuição da igreja da matriz, então, as despesas da capela eram custeadas pelos membros da Irmandade. Esse ato era bem comum na região, principalmente quando se tratava das irmandades dos pretos.

O interessante acerca desta capela e dessa Irmandade é que, desde a sua fundação, os

“pretos forros e cativos moradores no Arraial e freguesia de Nossa Sra da Conceição de Guarapiranga”41 foram os responsáveis por eleger brancos bem abonados para ocupar os cargos administrativos da Irmandade e “por cuja conta correrá a receita, e despesa, Livros e todos os mais bens”. Isso mostra uma certa independência dessa Irmandade em relação a como cuidariam das obrigações referentes ao funcionamento da Irmandade e da referida capela. Segundo a documentação, a Irmandade contava com 700 irmãos na segunda metade do século XVIII, os quais tinham gasto cinco mil cruzados na capela, sem receber nenhuma contribuição da Igreja Matriz.

Miranda (1984) afirma que, em 1789, foi fundido um sino, o qual seria instalado em uma janela sineira, e que, por volta de 1800, foi executada uma reforma interna. Os altares colaterais teriam sido executados com a colaboração do Mestre Ataíde, responsável pela pintura dos anjos do retábulo de Nossa Senhora do Carmo (MIRANDA, 1984). A partir daí, com o passar dos anos a igreja foi passando por reformas e modificações, as quais datam de 1883, com uma reforma interna, no período de 1947 a 1964, e mudanças nos pisos e nos bancos em 1964, obras na Praça do Rosário e no muro da capela. Já em 1968 houve a cessão de parte do terreno da igreja para a prefeitura, para que fosse construída uma fábrica de bloquetes.

Um fato que ainda hoje é muito relembrado pelos fiéis é uma infestação de insetos que aconteceu por volta dos anos de 1985 a 1988. Esta infestação comprometeu a estrutura do telhado da igreja, e, por isso, foi necessária uma reforma para a substituição dos forros e para exterminar os insetos. Contudo, sem o acompanhamento técnico adequado, essas obras acabaram provocando a queda do telhado e danificando os retábulos.

41 Compromisso da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos do Arraial e freguesia de Nossa Senhora de Guarapiranga (Manuscrito). Arquivo da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição. Piranga, 1765.

Após esse acontecimento, no ano de 1989 a Capela foi tombada e o IEPHA/MG passou a fiscalizar a restauração, a qual estava interrompida por falta de dinheiro. Como consta no site do Instituto,

O tombamento estadual da Capela de Nossa Senhora do Rosário do município de Piranga foi aprovado pelo Decreto n.° 29.399 de 21 de abril de 1989, inscrito Livro de Tombo n.° II, do tombo de Belas Artes e no Livro de Tombo n.° III, do tombo Histórico, das obras de Arte Históricas e dos Documentos Paleográficos ou Bibliográficos (IEPHA/MG, 2014, p. 41).

Desde o seu tombamento até o ano de 1992, a capela passou por uma grande reforma, inclusive na área externa. Em 1997 houve a restauração nas pinturas e, até 2007, foram realizados os serviços de manutenção pela própria comunidade. Nesse quadro, fica evidente novamente a atuação da população para manter o seu patrimônio religioso. A capela é considerada um importante exemplar arquitetônico religioso de Minas Gerais, não apenas por seu simbolismo, mas por suas obras de arte, como relata Delmarí Ribeiro,

Alguns estudiosos apontam a fatura dos retábulos colaterais à Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. Segundo documentação datada de 1800, Manoel da Costa Ataíde executou a pintura dos três anjos e a cartela no baldaquino do retábulo de Nossa Senhora do Carmo (lado do Evangelho), assim como o seu douramento. (...) Recebe um conjunto de imaginária de grande importância atribuída ao Mestre Piranga, acervo, na sua maior parte, remanescente do século XVIII e pertencentes à demolida Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição (RIBEIRO, 2009, p. 73-74).

A história da capela e a sua relação com a Irmandade dos Pretos reforçam a importância da proteção desse bem não apenas como representante da identidade e da memória dos integrantes da Irmandade, mas também como um bem que integra parte da história local e da religiosidade do Município. Ao longo dos anos, a construção foi passando por algumas mudanças devido a obras executadas no intuito de atender às necessidades dos fiéis.

Após o tombamento, fica definido que: “Nesses termos ficam salvaguardadas de maiores descaracterizações todos os elementos artísticos, arquitetônicos e urbanos inseridos nessa área da malha urbana” (DOSSIÊ, fl. 39). Desse modo, o IEPHA/MG passa a fiscalizar o processo de restauração que já estava acontecendo, mas, devido à falta de recursos, ele fica interrompido durante algum tempo. Ao todo, a capela passou por obras no ano de 1992 e no período de 1997 a 2007, as quais foram financiadas e executadas majoritariamente pela própria comunidade. Segundo as informações contidas neste Guia de bens tombados do

IEPHA/MG, após o tombamento estadual, o Instituto passou a fazer vistorias periódicas, além de levantamentos arquitetônicos e diagnósticos e em 2008 contratou e fiscalizou projetos de restauração da capela. As obras de restauração foram iniciadas em 2010 e inauguradas em 2011, e essa foi a última reforma até então realizada nesse edifício.

A trajetória desse bem patrimonial e sua relação com a história e a cultura local expressa a importância desse bem e justifica o seu tombamento como patrimônio material do estado de Minas Gerais. Segundo o Guia de bens tombados do IEPHA/MG:

[...] a Capela de Nossa Senhora do Rosário é um exemplar típico da arquitetura religiosa difundida desde o setecentos no Vale do Piranga. Sua arquitetura singela marcada pela trama estrutural aparente é de grande importância para a identidade piranguense e a preservação da memória de Minas Gerais (IEPHA/MG, 2014, p. 32).

Fica evidente que a justifica desse tombamento não está pautada apenas no valor do bem para a comunidade local, mas também como um representante importante da história e memória de Minas Gerais. Segundo o dossiê, “A capela de Nossa Senhora do Rosário de Piranga constitui um dos importantes exemplares da arquitetura religiosa do Vale do Rio Piranga, reproduzindo a peculiar tipologia regional” (DOSSIÊ, fl. 43).

Atualmente, a capela é utilizada para algumas celebrações tradicionais, para encontro dos homens que realizam semanalmente a reza do “terço dos homens” e alguns casamentos, mas poucos. Na maior parte do tempo, ela se encontra fechada. Os seus fiéis são muito devotos e apresentam preocupação com a preservação do monumento, principalmente das imagens atribuídas ao Mestre Piranga42. Nos últimos anos, a capela passou por novas reformas e, atualmente, encontra-se em bom estado de conservação.

42 Até o presente momento não há evidências científicas que comprovem, de fato, a identidade do Mestre Piranga. Esse nome foi atribuído a peças encontradas no Vale do Rio Piranga, ao sul de Ouro Preto e no passado foram atribuídas a um único artista, devido a características peculiares existentes nas obras. Atualmente pesquisadores estão chegando à conclusão que “Mestre Piranga” refere-se a uma oficina e não a uma única pessoa. “oficina muito atuante na segunda metade do século XVIII nas freguesias de Guarapiranga e Rio Pomba, Adriano Ramos defende a tese de que Luiz Pinheiro, conjuntamente com José de Meireles Pinto e Antônio de Meireles Pinto, seriam os principais integrantes da oficina” (RAMOS, 2018, p. 1).

Figura 7 - Igreja de Nossa Senhora do Rosário vista por fora e por dentro

Fonte: http://www.iepha.mg.gov.br/index.php/programas-e-acoes/patrimonio-cultural-protegido/bens-tombados/details/1/43/bens-tombados-capela-de-nossa-senhora-do-ros%C3%A1rio. Acesso: 17 de agosto de 2022.

No documento VIÇOSA - MINAS GERAIS 2022 (páginas 93-97)