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celeridade e troca de papéis para punir na informalidade

2.1 A chegada ao campo e algumas pistas para reflexão

Assisti minha primeira audiência preliminar no dia 27 de outubro de 2006. Ainda não havia ingressado no programa de doutorado, mas desejava fazer algumas observações que me permitissem verificar a viabilidade empírica da pesquisa e que me indicassem caminhos para possíveis reflexões.

Não cheguei no anonimato. Na semana anterior havia visitado a juíza da 1a vara, intermediada por um desembargador – o mesmo mencionado no capítulo anterior –, o qual se ofereceu para me acompanhar ao fórum no qual havia sido juiz- diretor anos atrás e para onde costumava retornar, com frequência, para rever velhos amigos, entre eles a juíza em questão. Aceitei o convite pensando na possibilidade de obter apoio para a pesquisa em um ambiente repleto de interditos, como é conhecido o Judiciário. Já havia visitado em diversas situações outros fóruns e sabia das dinâmicas específicas que envolvem a rotina das varas judiciais. Apesar de seguirem orientações gerais de funcionamento, cada um cria mecanismos de controle de

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circulação de pessoas próprios, segundo a personalidade do juiz e de seus funcionários, compondo arranjos locais sobre o que é ou não permitido, sobretudo no que se refere aos visitantes. Ainda que sejam públicas, tais audiências acontecem dentro de um espaço controlado, porque próximo do gabinete do juiz, território revestido de certa sacralidade, uma vez que lá são proferidas decisões que alteram destinos.1

Aceitei a intermediação do desembargador também porque permitiria aproximar-me de uma i fo a te à apazà deà elho à es la e e à osà p o edi e tosà legais adotados nas velozes audiências preliminares, assim como por permitir ultipli a à osà po tosà deà a essoà aoà te e o à Cefaï, 2006, p.38), viabilizando dessa maneira u aà pe spe tivaà ativa à so eà osà p o edi e tosà deà Je i .à ál à disso,à a intermediação do desembargador propiciaria uma experimentação metodológica interessante, pois mantendo o anonimato nas demais varas criminais eu teria condições de obter formas distintas de inserção no campo pesquisado e refletir sobre as consequências que isso, por ventura, pudesse provocar.

Assisti minha primeira audiência já ciente da visão da juíza sobre as p eli i a es .à Naà o ve saà ueà havía osà tidoà aà se a aà a te io ,à elaà haviaà eà recebido em seu gabinete repleto de pilhas de processos dispostos sobre várias mesas. A respeito das tardes de audiência de Jecrim que haveria na semana seguinte, fez questão de indicar-me uma que considerava mais interessante que as outras, nas quais p edo i ava à igasàde a idoàeà ulhe .

Aproveitei para perguntar-lhe sobre sua trajetória. Ela contou-me que viera de outro município paulista, mas estudara e vivia na capital. Atuava em São Bernardo havia três anos e fizera a opção por lá, em detrimento de uma vara cível que lhe havia sido ofe e idaà e à “ oà Paulo,à justifi a doà daà segui teà fo a:à Estou acostumada com os procedimentos do crime e teria que voltar a estudar uma série de procedimentos cíveis, depoisàdeà aisàdeàdezàa osà aà eaà i i al .àCo àu àa gu e toàse elha te, apontou a necessidade de haver uma vara específica para o Jecrim e, carregando pilhas de processos de uma mesa à outra, queixava-se:à Temos que paralisar o raciocínio em

1 A esse respeito é importante mencionar que a apresentação de algum documento de identidade é sempre exigida antes que o expectador adentre a sala de audiências. Em função do contato estabelecido com a juíza na 1a vara, ao contrário das outras, jamais me foi exigida a apresentação de qualquer documento.

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torno de questões complexas, como essas do PCC, em que tenho que ouvir várias testemunhas, vários réus, para dar conta de problemas menos complexos, com outros p o edi e tos .à Elaà e o he iaà a relevância do Jecrim – est à aà lei,à ósà te osà ueà apli a à–, po àjustifi avaà ueàoà vai-ve àdeàp o edi e tos àto ava-lhe tempo, um recurso bastante escasso diante da visível sobrecarga de trabalho que me exibia sobre suas mesas.

Enquanto conversávamos a respeito dos crimes da região por ela reputados como mais graves – tal como roubo de carga, porte de arma, latrocínio, tráfico de drogas – ela mostrou-me um dos volumosos processos que apresentavam fotografias das armas potentes utilizadas em um crime, dizendo-se inconformada com a impunidade, no seu entender corroborada por outro juízes.

Antes de sair lhe perguntei o significado das diferentes tarjas coloridas que marcam os processos e, mais uma vez, encontro uma resposta que remete à organização doàte poàeàsuaàes assezàdia teàdeàg avesàsituaçõesàaàse e à o t oladas:à Indicam o grau de urgência, isto é, se o réu está preso, se corre em segredo de justiça, alguns têm significados atribuídos pela Corregedoria, out osàeuà es oà io .

Difícil manter-se indiferente a este cenário de excesso, no qual se vê concretamente o volume de tarefas e urgências de um juiz criminal. Difícil também ignorar que para a uelesà ueàvive àe àu à u doà oà ualà oà ueàexisteàest à osàautos à – isto é, no qual o que realmente importa está registrado, documentado por escrito em processos que se desdobram em vários volumes –, os esguios autos de Jecrim, nos quais se toma a termo o mínimo possível, possam mesmo parecer ter a mesma relevância e prioridade.

Retive deste encontro a percepção de que a escassez de tempo e a pequenez dos crimes envolvendo os casos de Jecrim produzem expectativas e investimentos específicos em relação a eles. No desenrolar da pesquisa, elementos atinentes a essa questão foram confirmadas na observação da rotina das atividades de Jecrim, envolvendo os juízes, promotores, defensores públicos e funcionários dos cartórios. É o que demonstro a seguir.

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