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A Cidade, História e Indicadores

No documento FALE AGORA OU CALE-SE PARA SEMPRE: (páginas 25-36)

2. O TERRITÓRIO: CONHECENDO A CIDADE

2.1 A Cidade, História e Indicadores

Definir tempo e espaço na pesquisa não é puramente um rígido rito científico, nem somente uma ação que cumpre um formato metodológico no tratamento de um tema. Bacurau é uma produção cinematográfica brasileira que conta a história de uma cidade que não existe no mapa, alternando manifestações alegóricas de futuro e passado, caracterizando um povo com o arquétipo rústico do nordeste brasileiro, buscando problematizar questões relacionadas à política, cultura e violência2. No entanto, como Valéria B. Magalhães e Cristiano Feliciano3 apontam em suas críticas culturais, torna-se problemático reproduzir a estigmatização que a Região Nordeste é uniforme (afinal, Bacurau se passa no Nordeste mas não foi localizado em um de seus 9 estados, logo, a ideia de uma identidade cultural singular “nordestina”) e que os desafios impostos à população são resolvidos através de uma resistência sangrenta (renovando o modelo do cangaço, marcas da marginalização das narrativas sobre a Região).

Essas ordenações de onde e quando se fala implicam verificar como mesmo existindo um todo, ou seja, um caráter estrutural que permite entender a operação do sistema econômico e mesmo, como buscamos trabalhar aqui, as interfaces sociais, culturais e políticas, a faceta individual, própria de um lugar, deve ser extraída e exposta pois é justamente por ela que se é possível entender processos descontínuos e não reproduzir estereótipos coletivos. Com isso, busca-se observar que a Região Nordeste não detém por si só um povo singular; existe uma pluralidade de sujeitos com culturas diversas e que reafirmam seus modos de vida a partir de experiências ímpares.

2 Bacurau, 2019. Diretores: Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles. Produzido por: Emille Lesclaux, Said Bem Said e Michel Merkt.

3 Filme com Especialista Universidade de São Paulo. Disponível em: <

https://www.youtube.com/watch?v=llMyC7KSxm4>. Acesso em: 30 set 2021.

Neste sentido, localizamos a pesquisa no município baiano de Olindina, interior do estado da Bahia, representando o que alguns estudos indicam como problemática ainda a ser estudada em relação à violência de gênero: municípios de pequeno porte que necessitam de atenção, pois grande parte das pesquisas focam em capitais, regiões metropolitanas e grandes municípios. A consideração da regionalização pode imprimir dinâmicas diferentes e atenções voltadas a espaços com ação ou não do Estado (CERQUEIRA et al. 2015; PCSVDF MULHER, 2016; FERRAZ & SCHIAVON, 2019).

A Bahia é composta por 32 microrregiões conforme nomenclatura e divisão do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Olindina encontra-se na Microrregião de Ribeira do Pombal (Microrregião de RP), que ainda abrange outros 13 municípios, dos 417 municípios baianos: Adustina, Antas, Banzaê, Cícero Dantas, Cipó, Fátima, Heliópolis, Itapicuru, Nova Soure, Novo Triunfo, Paripiranga, Ribeira do Amparo e Ribeira do Pombal. A divisão territorial de Olindina e sua posição no estado como na Microrregião, recorte espacial da pesquisa, pode ser visualizada no mapa 1 a seguir.

Mapa 1 – Bahia, Microrregião de RP e Olindina

Fonte: Elaboração própria através dos dados do IBGE.

O estado da Bahia ocupou em 2010 a 22ª posição entre as Unidades Federativas (UFs) brasileiras no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), para o coeficiente de Gini que afere a concentração de renda. Também no mesmo ano ocupou a 9ª posição entre as UFs com maiores

níveis de concentração, enquanto ocupou a 12ª posição entre as UFs com as mais altas taxas de feminicídios no Brasil4. Comparando o município com o estado, em 2010, o IDHM de Olindina era de 0,559; da Bahia, 0,660, ao passo que para o Brasil foi de 0,727; já na Microrregião de RP, Olindina ocupou a posição 9ª na escala decrescente de IDHM5. A população ocupada formalmente na Microrregião de RP ainda em 2010 estava muito abaixo da média estadual:

6,7% e 40,1% respectivamente. Os autodeclarados de religião Cristã católicos em Olindina estão acima da média nacional: 84,7% e 64,6% respectivamente. Os evangélicos são de 7,3%

no município6.

Olindina é descrita como “cidade altaneira, de um povo pacato e gentil; progressista e hospitaleira” segundo a letra de seu hino oficial, escrito por Hiberlúcio Miranda, Maria José Borges Fonseca e José Carlos Batista Borges7. Fazendo um voo possivelmente curto devido aos parcos apontamentos históricos sistematizados, o surgimento, consolidação e emancipação do município foi descrito tanto pelo hino oficial citado, como pelo histórico de surgimento fornecido pelo IBGE (2017b) ao menos em três atos: i) Fazenda Mocambo como princípio; ii) a continuidade enquanto distrito chamado de Nova Olinda; e por fim, iii) a consolidação, em 1958, como município independente. Uma enorme carência, que não é exclusiva da cidade objeto da pesquisa, é conhecer sua história, desvendar os meandros, conflitos, concessões, motivos e formatos que a constituiu como território.

De acordo com o acervo da Biblioteca Pública Municipal de Olindina (BPMO), a história olindinense tem início com o fim da Guerra do Paraguai (1864-1870), ocasião em que o médico chefe dos feridos de guerra, Dr. Pedro de Araújo Ribeiro (nascido em Salvador em meados de 1830), recebeu terras na região como condecoração pela sua atuação na zona dos conflitos, nomeando aquela localidade de Fazenda Mocambo. Sua atuação clínica não se limitou ao período conturbado da guerra paraguaia, mas continuou atuando como médico na Fazenda aplicando seus serviços clínicos em agrupamentos conhecidos como Preguiça, Cedro, Pé de Areia, Caraíba, Roncador e Mangues. Um ilustre visitante em meados de 1882, de passagem pela região da Fazenda Mocambo e orientado por suas peregrinações pelo sertão baiano, promoveu algumas alterações cruciais na dinâmica de crescimento do então povoamento. Tratava-se de Antônio Vicente Maciel, muito conhecido na História e Literatura

4 Elaboração própria através dos dados de mortalidade do Ministério da Saúde - DATASUS/Tabnet e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE/Cidades.

5 Para mais informações, acesse: http://www.atlasbrasil.org.br/. Acesso em: 30 set 2021.

6 Elaboração própria através dos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE-Cidades e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

7 Disponível em: https://bibliotecadeolindina.wixsite.com/bibliotecadeolindina/pagina-em-branco. Acesso em: 29 jun 2021.

Brasileira como Antônio Conselheiro. O seu principal feito no município foi a construção da Capela São João Batista (imagem 1) que registra o que seriam os momentos (não sabendo ao certo se meses ou ano) finais deste templo religioso, tendo em vista que a nova capela se encontrava em fase de construção, como pode ser observado nesta imagem, logo atrás da capela em primeiro plano. O relato diz que Antônio Conselheiro “passou” pela região da Fazenda, o que levaria crer por um descuido involuntário, que sua visita fora simplesmente um turismo de final de semana. No entanto, além de participar da construção, Conselheiro, vendo alguns casebres que se formavam nas imediações, denominou aquele território de Nova Olinda (como diz o hino oficial: “Nova Olinda, continuação”).

Imagem 1 – Capela São João Batista em Olindina – Década de 1960

Fonte: Acervo iconográfico da BPMO.

Fazia parte da promessa do peregrino, a abertura de igrejas ao longo de sua trajetória, inclusive como protesto e alento às populações marginalizadas pelo conturbado período político e social que o país vivia tanto pela Grande Seca, que atingiu a região por volta do fim dos anos 1870, quanto também pela iminência do que viria ser a Primeira República, em 1989, e toda a

tensão em torno da libertação dos povos escravizados. Um grande grupo de adeptos à causa antirrepublicana de Conselheiro ganhava corpo e cortava os caminhos dos sertões baianos criando uma aderência ao que, nos fins do século XIX, culminaria na Guerra de Canudos (1896 – 1987). As edificações levantadas por Antônio Conselheiro foram desde o Rio São Francisco, passando pelas imediações do Rio Vaza-Barris (que margeia a atual Microrregião de RP), até chegar no Rio Itapicuru, rio que também banha o atual município de Olindina (BLINI &

CASTILHO, 2016 APUD CALASANS, 1973).

Pertencente ao extenso e veterano município baiano de Itapicuru, aquele pequeno povoado começou a se desenvolver socioeconomicamente pelo surgimento, em 1912, da feira livre e de uma casa comercial que atualmente é o centro da cidade. Nomes de destaques daquela época como: Calisto José de Santana, José Camil de Santana, Antônio Pereira, Jose Luís, Jose Macário Góes, Francisco Ribeiro de Araújo, Antônio Ribeiro de Araújo, José Moreira, Josefa Pereira, Tomé Ribeiro, Malaquias Pereira, Mestre Viturino, Pedro Borges de Santana, Mariano Jose dos Santos, Major Otico e Américo de Souza Góes; são considerados os primeiros habitantes da então Nova Olinda. Em 1918, a primeira padaria foi instalada, mas foi na observação de que o solo se mostrava potencial no plantio de milho e feijão que as terras começaram a receber pessoas vindas de outras regiões, sendo decisivo para marcar ali o nascedouro do ponto comercial corroborado pelo estabelecimento de duas rodovias: as atuais BR-110 e BR-3498.

Esse dinamismo provocou, em 30 de novembro de 1938 pelo Decreto nº1.189, a elevação do povoado para Distrito de Itapicuru pelo interventor baiano Landulfo Alves (nesta ocasião, o município de Itapicuru detinha três distritos: Nova Olinda, Crisópolis – atualmente município - e Sambaíba, que continua na condição de distrito).

Em 1944, pela ratificação do Decreto Estadual nº141/1943, o distrito passou a ser chamado de Olindina. Atraía novos moradores provenientes sobretudo dos estados de Sergipe, Pernambuco, Alagoas e Paraíba, e que começavam a pressionar para elevação à categoria de município. Em 1957 a Câmara de Vereadores encaminhou à Assembleia Legislativa da Bahia o requerimento de emancipação, o que no ano seguinte, em 14 de agosto pelo Decreto Estadual nº1.033/1958, instituiu o dito pelo hino municipal: “Olindina hoje és município. Salve, salve a

8 Na região, conta-se de maneira popular que em 1932 foi aberta a estrada que posteriormente seria denominada como BR-110, como resposta à seca e à necessidade de transportar alimentos para os municípios e distritos da região. Em meados de 1960 a Rodovia recebeu asfaltamento e fora remodelada: como atravessava o centro do já município, ela foi desviada para a periferia geográfica da cidade como ação de segurança pública aos munícipes.

Diante do crescimento populacional da cidade através da distribuição de terras que originaram os bairros de Nova Olindina, Cidade Nova e Mutirão, em meados de 1980, a cidade hoje está novamente cortada pela BR-110. Em relação a BR-349 não encontramos informações sobre seu processo de abertura.

emancipação”. Em abril de 1959 aconteceu a solenidade de posse da Câmara de Vereadores composta na época pelos seguintes homens: Benigno Dantas de Matos, João Borges Barreto, Antônio Paraiso Dantas, Napoleão Caldas, José Germano da Rocha, Joaquim Barreto Borges, João Fonseca de Sousa e Coreolando Alves Actis; a frente do executivo municipal, Petronilo Freire de Farias9. Na mesma ocasião, a primeira delegacia foi estabelecida no agora município.

Nos mais de 60 anos de existência como município, passaram pela gestão do executivo municipal 16 prefeitos, sendo 15 homens e somente uma mulher (entre os anos 2013 e 2016).

De acordo com os dados do Tribunal Superior Eleitoral tabulados pelo Atlas Brasil10, no Brasil entre 2013 a 2017 houve uma queda de quase 50% na participação percentual de mulheres entre as governadoras nas UF’s: de um percentual já baixo, 7,41% em 2013, para 3,7% em 2017. Na Bahia, no mesmo período, a participação feminina entre prefeitos se manteve em 11,84% corroborando para a diminuta presença da mulher nos espaços políticos de poder11. Desde sua emancipação, Olindina passou por um crescimento econômico baseado na agricultura familiar. Seu crescimento populacional baseou-se nas pessoas que buscavam em suas terras fonte de renda e um novo lar como é contado oficialmente pelo canal de comunicação da Prefeitura Municipal12. A tabela 1 traz um apanhado populacional do município de 2000 a 2020 que, seguindo uma tendência nacional, demonstra a maioria de seus residentes como mulheres, sendo que a população majoritariamente se autodeclarou negra (segundo a categoria do IBGE que soma pretos e pardos).

9 Primeiro prefeito do município, a população local conta que ele chegou no então povoado, Mocambo, em meados de 1932 para atuar na construção da então estrada que posteriormente seria denominada de BR-110. Também é conhecido na localidade por ser avô do esposo da primeira e até então única mulher a ocupar a posição de Prefeita do município, em 2013, Bianca de Jesus Menezes.

10 Para mais informações, acesse: http://www.atlasbrasil.org.br/consulta/planilha. Acesso em: 06 out 2021.

11 O estado da Bahia ainda não registrou em sua história uma governadora mulher.

12 Disponível em: https://www.olindina.ba.gov.br/municipio. Acesso em: 30 set 2021.

Tabela 1 – Estatísticas Populacionais

Fonte: Elaboração própria através dos dados do SEI/Bahia e IBGE e TCU.

Olindina ocupou a 5ª posição na Microrregião de RP com maior quantitativo populacional pelo Censo IBGE 2010; ainda comparando com os demais 13 municípios que compõe a Microrregião, detinha a 7ª maior população rural e o que a coloca em destaque no grupo, a 3ª maior população urbana (ficando atrás somente de Ribeira do Pombal e Cícero Dantas)13. Em grande medida a atividade econômica que baseia a cidade é a agricultura e de maneira muito tímida, a pecuária. A maior parte das lavouras dos municípios são consideradas temporárias, isto é, marcada pelo plantio anual, uma tendência encontrada nos demais 12 municípios que compõem a Microrregião de RP (exceto para o município de Itapicuru que se destaca por obter um dos maiores territórios municipais da região e por ter um plantio permanente, isto é, plantio de longo prazo). De acordo com a Pesquisa Produção Agrícola do IBGE, em 2016 (último ano de divulgação dos dados), milho, mandioca e laranja foram as maiores produções agrícolas de Olindina, seguidas em menor escala para feijão, castanha de caju, banana e amendoim. Diferente de vizinhos como Ribeira do Amparo, Ribeira do Pombal, Heliópolis, Cipó, Cícero Dantas, Fátima, Paripiranga e Nova Soure, Olindina não conseguiu

13 Para mais informações, acesse: http://www.atlasbrasil.org.br/. Acesso em: 04 set 2021.

diversificar a produção de frutas (um dos principais componentes de garantia da segurança alimentar da população)14.

Na pecuária, conforme aponta a Pesquisa de Pecuária Municipal do IBGE, o município detém uma participação de cerca de 8% na Microrregião de RP, de criação de animais de grande porte (bovinos, bubalinos e equinos). Essa participação ainda é menor na Microrregião quando se considera animais de médio e pequeno porte, 5,6% e 4,6% respectivamente15. Por outro lado, a produção oriunda da criação animal em Olindina é baixa ante os municípios vizinhos; dos itens levantados, somente leite, ovos de galinha e mel de abelha apresentaram percentuais de participação microrregional: 2,9%, 1,2% e 1,8% respectivamente16.

O crescimento da cidade pode ser comparado nas imagens 2, 3 e 4, composta por três momentos temporais distintos: na primeira tem-se o registro de Olindina em meados dos 1960.

De acordo com informações da BPMO, estima-se que nesta data o poder público municipal solicitou fotos aéreas da cidade. Ao centro, encontra-se a nova Igreja Matriz, inaugurada em 1969, e construída pelo primeiro vigário do município, Pe. José Justino de Almeida; no seu entorno encontra-se uma concentração de casas em poucos quarteirões, nos quais se concentraria a expansão da cidade, o que pode ser comparada na sequência das imagens. A imagem 3, por sua vez, mostra uma área urbana ampliada pelo aumento das construções. Os quarteirões se multiplicaram e, além do crescimento na zona central da foto (centro da zona urbana do município), é possível também indicar o povoamento da área além da rodovia BR-110 – importante ligação entre Alagoinhas e Paulo Afonso (parte superior da imagem). A imagem 4 apresenta a situação atual do município e propõe olhar seu crescimento por um ângulo aproximadamente parecido – não um ângulo exato, mas aproximado. Nela é possível encontrar no centro, à direita, a Igreja Matriz, agora com um entorno mais expressivo em residências e estabelecimentos comerciais, aventando um crescimento territorial maior na parte superior da imagem (os bairros Mutirão, Cidade Nova, Nova Olindina e Urbis). Nas três imagens em questão, o centro do município foi destacado no tracejado vermelho tendo por referência a Igreja Matriz.

14 Para mais informações, acesse: < https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/agricultura-e-pecuaria/9117-producao-agricola-municipal-culturas-temporarias-e-permanentes.html>. Acesso em: 28 nov 2021.

15 Válido considerar que essas categorias são as que possivelmente sejam de maior facilidade na criação por serem característicos de menor valor de aquisição e maior manejo na criação como ovinos, suínos, caprinos e galináceos.

16 Para mais informações, acesse: < https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/agricultura-e-pecuaria/9107-producao-da-pecuaria-municipal.html?=&t=o-que-e>. Acesso em: 28 nov 2021.

Imagem 2 – Olindina - Década de 1960

Fonte: Acervo iconográfico da Biblioteca Pública de Olindina.

Imagem 3 – Olindina - Década de 2000

Fonte: Acervo iconográfico da Biblioteca Pública de Olindina.

Imagem 4 – Olindina - Década de 2020

Fonte: Acervo iconográfico da Biblioteca Pública de Olindina.

Pra lá da estrada estão os bairros de Nova Olindina, Cidade Nova e Mutirão que juntos formam a expressão popular no município quando se é tratado o crescimento habitacional e populacional de Olindina. A inexistência de registros oficiais inviabiliza ir a fundo na dinâmica urbana municipal, uma vez que parte dos documentos produzidos nas décadas de 1950 a 1980 são escassos por parte do Poder Público Municipal. A população local conta que em meados da década de 1980, prefeitos começaram a distribuir lotes para a construção de moradias na região citada. Ainda hoje, o município esbarra em uma necessidade de reorganizar o espaço urbano pois justamente esses locais que aqui chamamos de bairros, como reprodução do que o povo local considera, oficialmente são loteamentos rurais devido à falta de documentação legal.

Como uma política de assistência social para populações carentes, os lotes foram doados, as construções habitacionais responsabilizadas pelos elegíveis das terras e o Poder Público atuou na abertura de alguns serviços públicos posteriormente, já na década de 199017. Nesse sentido, uma importante caracterização desses bairros é a escassez de serviços públicos, a construção de habitações em condições mais simples, a vulnerabilidade socioeconômica em que vive boa parte dos moradores e a estigmatização social que se fortaleceu nos últimos anos a partir da responsabilização dos crimes e violência urbana aos moradores desses locais18.

2.2 Políticas Públicas e Violência de Gênero

Muito mais do que tentar esgotar as possibilidades em se debater os conceitos em torno das duas temáticas aqui propostas, isto é, política pública e violência de gênero, buscamos minimante historicizar até que ponto ambos conceitos manifestos na sociedade brasileira foram incorporados na esfera regional de Olindina.

Seja já na introdução deste trabalho, dito que a violência de gênero é a expressão de uma relação assimétrica de poder em que se manifesta a repulsa pelo sujeito decorrente do gênero, adotamos o entendimento de política pública como o “fazer” do Estado que passa primeiro pelo estágio da identificação do problema, na sequência pela articulação junto à sociedade e pôr fim à efetivação de um modelo de ação, baseado na sugestão de Souza (2006, p. 26) ao indicar que

“constitui-se no estágio em que os governos democráticos traduzem seus propósitos e

17 Ginásio Esportivo, uma Creche e um Posto de Saúde da Família tiveram suas obras iniciadas através das Leis Municipais nº 392/1999 nº 394/1999, nº 395/1999 respectivamente. A abertura e alargamento de algumas vias nos bairros de Nova Olindina e Cidade Nova aconteceram a partir da Lei Municipal nº 378/1997. Ainda hoje, um dos grandes impasses relatados pela população local é a carência de esgotamento sanitário.

18 Devido à topografia desses bairros apresentar uma elevação, quem reside no centro do município costumeiramente se retrata a essas localidades como: “o pessoal lá de cima”, como uma espécie de estratificação social.

No documento FALE AGORA OU CALE-SE PARA SEMPRE: (páginas 25-36)