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CAPÍTULO 3 – CASO IBSEN PINHEIRO

3.20. A COBERTURA DO CORREIO BRAZILIENSE NO CASO IBSEN

Por ser um jornal com sede em Brasília, Capital Federal do País, a cobertura do Correio Braziliense foi mais ampla quando comparados aos jornais paulistas O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo.

Mas antes de iniciar a análise é preciso abrir um parêntese. A essa altura, no entanto, Correio e os demais meios de comunicação trouxeram a característica da ‗mídia tribunal‘, quase que competindo com as atribuições precípuas do Poder Judiciário, entre eles o Tribunal de Justiça e até o Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília.

Ela é mais uma manifestação da capacidade da mídia de invadir todo o tecido social e de seu poder de tentar submeter atribuições e formatações de outros campos sociais à sua dinâmica de funcionamento. O ritmo de rito judiciário, obrigatoriamente lento para possibilitar um julgamento fundamentado e consistente, com ampla defesa do acusado, é virtualmente atropelado por um dispositivo sociotecnológico regido pela velocidade dos acontecimentos e por seu necessário apego à atualidade. A desigualdade dos ritmos certamente conduz a dificuldades expressivas nas coberturas midiáticas e, mais especialmente, na possibilidade de a mídia invadir e assumir o papel de tribunal, ao pretender julgar acontecimentos e atores sociais 320.

Além disso, diante de toda análise que foi feita nesse trabalho, temos uma importante pista a ser analisada. A grande imprensa avança e disputa o poder de se representar com o campo da política. Como se tivessem ‗mandatos‘ e fossem escolhidos para representar o povo, os meios de comunicação assumem o lugar de ‗porta-vozes‘, que julgam ‗representar‘ setores da população, em especial os excluídos.

Seria muito esperar da própria grande imprensa que a ética - dos meios de comunicação e também dos profissionais - resolva a questão da imprensa-tribunal?

A questão talvez seja muito mais abrangente, passando para uma discussão coletiva e que envolva mais segmentos.

De acordo com Antônio Albino Canelas Rubin, o assunto em questão também se inscreve no campo da ética coletiva ou individual, mas ela não pode deixar de ser formulada como problema político da maior relevância hoje, inclusive para a possibilidade de uma sociedade radicalmente democrática.

320 RUBIN, Antonio Albino Canelas. Dos poderes da media: comunicação, sociabilidade e política in NETO,

(...) como a sociedade vai regulamentar democraticamente essa nova dimensão pública (midiatizada) da sociabilidade contemporânea e quais as normas sociais que a sociedade vai imaginar para governar e ordenar democraticamente essa dimensão, assegurando assim uma atuação responsável da mídia, de seus proprietários, dos patrocinadores, dos profissionais de imprensa e do público? 321

Segundo Rubin, estes e outros exemplos possíveis demonstram, antes de tudo, como a presença e a atuação da mídia aparecem como um problema essencial da sociedade contemporânea. Aliás, a origem e o desenvolvimento dos estudos de Comunicação devem muito às demandas da sociedade para compreender o impacto, o papel, a atuação e os efeitos da mídia na contemporaneidade.

Na opinião de Rubin, apesar de ampla bibliografia publicada, principalmente no exterior, acerca da temática, não se pode afirmar que existe uma convergência de interpretações a respeito do assunto. Ele aponta ainda que de qualquer modo, apesar da multiplicidade de concepções, pode-se afirmar que a presença e a atuação da mídia aparecem como uma das características mais marcantes da contemporaneidade. Ou melhor, da experiência de vida que se nomeia como contemporânea, pois ela se conforma como uma singular conjunção entre convivências - vivências acontecidas em presença e em espaços geográficos - e televivências - vivências de acontecimentos distantes mediadas por signos, em especial que transitam na mídia.

Fechando esse parêntese, veja como foi à cobertura do Correio. A primeira vez que o jornal publicou o caso Ibsen Pinheiro foi na edição do dia 8 de novembro. O título ―Cheques levam Genebaldo e Ibsen a depor‖. A chamada na capa, de uma coluna e três linhas, foi posta, nesse primeiro momento, sem tanto destaque. O resumo da chamada dizia:

Flagrados em uma troca de cheques de alto valor, os deputados Genebaldo Correia e Ibsen Pinheiro serão ―convidados‖ a prestar depoimento na CPI do Orçamento. Cálculos refeitos chegaram a um total de 51 mil322 dólares em cheques recebidos por Ibsen de Genebaldo, que por sua vez recebeu cheques do deputado João Alves. O líder do Governo na Câmara, deputado Roberto Freire (PPS-PE), quer a imediata renúncia de Ibsen ao cargo de relator do regimento da revisão323.

No resumo acima, mais uma vez, em nenhum momento na chamada de capa existe qualquer espaço fornecido aos dois acusados: Ibsen e Genebaldo. Essa característica é comum

321RUBIN, 1994.

322Nota-se aqui que o Jornal Correio Braziliense traz um novo valor em relação aos cheques. Como vimos nas

abordagens dos Jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, os depósitos traziam valores diferentes. O primeiro jornal trouxe valor de US$ 160 mil (edição do dia 11 de novembro de 1993- capa). Já o segundo falou em US$ 30 mil (edição do dia 8 de novembro – capa). O fato mostra as contradições da mídia no episódio. Ou seja, a grande imprensa também é o ‗reino‘ das contradições.

na grande imprensa. Quando se dá espaço para o acusado, esse é praticamente invisível ao ‗olho nu‘ do leitor. É preciso uma ‗lupa‘ para encontrar onde está o espaço destinado para que o acusado se explique. Esse fato é comum dentro na grande imprensa porque, aparentemente, os meios de comunicação trabalham em uníssono. Apesar de cada um ter seu perfil ideológico, quando se fala em grande imprensa, todavia como aparelho privado de hegemonia e que visa lucro, como empresa mercantilista, ela até parece mais um partido político.

Mas outras concordâncias constituíram ainda mais vigorosamente o modus operandi da grande imprensa, pois a ação uníssona superou qualquer contenda comercial que, como vimos, existiram de forma renhida tanto entre o dueto paulista como (sobretudo) entre o carioca. Afinal, com maior ou menor ênfase, os inimigos eram os mesmos, as imagens criadas também as mesmas, o modo de operar idêntico e os objetivos muitos semelhantes, apesar de nuanças 324.

Iniciando pela primeira chamada do Correio Braziliense sobre o episódio nota-se ainda o esforço do jornal em trazer um fato novo diferente, exclusivo, um ‗furo‘ jornalístico.

Como vimos anteriormente, todos os outros meios de comunicação da grande imprensa entraram ―de cabeça‖ na rota do escândalo. A mídia conseguiu potencializar uma suspeita a tal nível, sob tal grau de massificação e maquiagem, que o indício do caso Ibsen Pinheiro virou suplício. A suspeita virou verdade para a imprensa.

Para Francisco Fonseca, ―a grande imprensa possui um poder ‗sem freios nem contrapesos‖ 325.

Para ele, muitas vezes a imprensa é antidemocrática. Mais: a grande imprensa busca intermediar, a todo instante, interesses na esfera pública, implicando assim uma brutal contradição, uma vez que a mídia é privada.

Afinal o auto-elogio que a grande imprensa fez (e faz) de si em relação à sua capacidade investigativa sobre o poder e as autoridades é perfeitamente contemplada pelas instituições públicas, a começar pelo próprio Ministério Público, entidade capaz, legal e tecnicamente, de promover investigações, em concomitância às suspeitas e mesmo preventivamente. 326

Para Fonseca, a grande imprensa não é o que disse ter sido (liberal e democrata). Pelo contrário. Segundo ele, a imprensa ―não fez o que professou (dar voz aos diversos lados e expressar uma suposta ―verdade‖). 327

324 FONSECA, 2005, p. 444. 325 Ibid. p. 451.

326 Ibid., p. 453. 327 FONSECA, loc. cit.

Na cobertura do Correio, não demorou muita para que a denúncia fosse amplamente divulgada em forma de manchete com grande destaque. Na edição do dia 9 de novembro, o título ―Ibsen rebate acusações sobre corrupção‖ trazia o deputado tentando se explicar. Num momento raro, desse episódio, a grande imprensa, por meio do Correio, trouxe uma manchete com enfoque para a tentativa de defesa de Ibsen, coisa que nenhum outro jornal – muito menos a dupla paulista – o fez. Muito pelo contrário. No Jornal O Estado de S. Paulo, por exemplo, os principais títulos/chamadas foram: ―Escândalo pode tirar cargo de Ibsen na revisão‖, ―Cheques reforçam acusação a deputado‖,‖Ibsen renuncia a função na reforma‖, ―Ibsen renuncia e Genebaldo avisa que vai sair‖, CPI acha novos depósitos em contas de Ibsen‖, ―Ibsen movimentou US$ 340 mil em um ano‖, ―Ibsen movimentou US$ 1 milhão desde 1989 em conta do Banrisul‖, ―Punição de corruptores ainda faz a diferença Itália e Brasil‖. Em um só momento, O Estado de S. Paulo tentou abrir espaço para o deputado, em sua chamada de capa, mas não em forma de manchete: ―Ibsen justifica depósito como sobras de eleição‖.

Já o Jornal Folha de S. Paulo seguiu o mesmo caminho. Trouxe os seguintes títulos em suas chamadas: ―Novas acusações abrem crise na CPI‖, ―Acusações contra Ibsen e Roriz abrem crise na CPI‖, ―CPI descobre novas contas de Ibsen‖, ―CPI acha US$ 160 mil em poupanças de Ibsen‖, ―Ibsen tinha mais de US$ 340 mil no Banrisul‖, ―Depósitos de Ibsen superam US$ 1 mi‖ e ―CPI revelou que depósitos a Ibsen superam US$ 1 mi‖.

Na manchete de capa do Correio sob título ―Ibsen rebate acusações sobre corrupção‖, Ibsen Pinheiro encaminhou ofício à CPI do Orçamento condenando o noticiário da imprensa ―com foros de escândalo‖ e deplorando ―o vazamento de uma informação incompleta‖. No trecho da chamada de capa do Correio, traz o seguinte trecho de indignação do deputado:

O deputado reagiu indignado ao que considera ser ―uma conotação perversa que atribuiu contornos escusos a um ato comum‖. Ibsen garante que a operação bancária teria sido compatível ―com a capacidade econômica e a movimentação financeira do requerente. O deputado disse ainda que os depósitos ocorreram quando o Orçamento ainda não sofria a interferência do Legislativo. E garante que não se negará a dar todas as informações que forem necessárias para o esclarecimento dos depósitos328.

Essa mesma indignação, na época do episódio, foi explicada por Ibsen Pinheiro na entrevista que ele concedeu à Revista IstoÉ, quando se descobriu o erro da Revista Veja,

sobre o caso. Na ocasião Ibsen falou sobre a possibilidade de ter havido ou não má fé em todo e episódio, tanto dentro da CPI do Orçamento, quando pela cobertura da imprensa.

Eu não sei se houve má-fé. Não sei se o pior é a má-fé ou a irresponsabilidade, a ligeireza. Às vezes, a má-fé, por ter compromissos com a realidade, tem limites que a irresponsabilidade não tem. Não acho que essas coisas se façam por uma conspiração. Elas se regulam por regras macro. Eu era a vítima ideal. Atingir um ex-presidente da Câmara, um ícone da Casa, significava dar uma dimensão ao episódio que de outra forma não seria alcançada, uma forma de dizer que toda a instituição se comprometeu sem que se precisasse fazer essa afirmação. Sendo eu um deputado de expressão pessoal, mas então sem força política, era a vítima perfeita. Tinha apenas um cargo honorífico, que era a presidência da Comissão de Relações Exteriores. Muito charme, nenhum poder. Pode ter havido algum ódio político. Eu tinha participado meses antes de um processo de grande conflito na Casa, o do impeachment do presidente da República. E também de um processo de cassação de deputado (Jabes Rebelo, cassado por denúncias de envolvimento com o tráfico). Conduzir processos dessa natureza não é exatamente o caminho para ser a miss simpatia de um concurso. Podem ter sido conjugados todos esses fatores. É mais compreensível que imaginar uma conspiração: ‗Vamos atingir esse cara, tirá- lo da carreira política.‘ Não se faz vida política com esse maquiavelismo, a despeito de Maquiavel‖329.

A manchete do Correio, no entanto, em que dava espaço para a defesa de Ibsen, foi apenas uma exceção no meio do emaranhado de denúncias. Nas edições seguintes, como será visto a seguir, todas as denúncias e acusações vindas da CPI foram tornadas como fatos verídicos. A exemplo dos outros meios de comunicação da grande imprensa, como já foi estudado nesse trabalho, o Correio pode ter cometido os mesmos erros dos outros periódicos. Dois deles, foram – como reclamou o próprio deputado Ibsen Pinheiro – a invasão da privacidade (contas até de poupanças do deputado foram levados como prova de atos de corrupção) e ainda o assassinato da reputação de um político em franca ascensão na época.

Assim, a grande imprensa ao invadir a privacidade, ‗fuxica a intimidade alheia‘, isso sem falar na função de aparelho privado de hegemonia de cunho ideológico.

A imprensa é capaz de destruir a reputação de políticos e personalidades importantes, como fez contra o deputado gaúcho. Eugênio Bucci escreveu em seu livro ―Sobre Ética e Imprensa‖ sobre essa característica:

Quando os personagens se situam acima da linha da dignidade humana, e desfrutam de alguma reputação, aí, sim entende-se que a imprensa é capaz de destruí-los. E de fato os destrói. Por distorção deliberada ou inadvertida. Um exemplo de assassinato de reputação aconteceu em 1992, quando se verificou uma campanha contra o ministro da Saúde de Fernando Collor, Alceni Guerra. Mario Sergio Conti, em Notícias do Planalto, conta como a Rede Globo liderou essa campanha.330

329 IstoÉ, 18 de agosto de 2004. 330 BUCCI, 2000, p. 157.

Como não há qualquer tipo de ‗responsabilidade/controle‘, os donos de jornais, em parceria com a edição, são quem decidem o que vai ser publicado sobre um determinado personagem no dia seguinte. O enfoque é dado, geralmente, de acordo com a linha editorial que cada grupo jornalístico possui.

Paul Johnson331,citado por Eugenio Bucci, fala sobre o abuso de poder, da imprensa:

Desde que Macaulay denominou a imprensa de ―o Quarto Poder‖, há consciência do poder político que a mídia dispõe, o que pode ser chamado de ―síndrome de cidadão Kane‖ [...] Os proprietários dos meios de comunicação nem sempre estão conscientes do grau de poder que exercem, e de sua natureza corruptora. Pois o dito de lord Acton de que todo poder tende a corromper aplica-se tanto à mídia quanto à política. O exercício por longo prazo de um grande poder produz uma vulgarização das sensibilidades morais, uma certa abordagem descuidada e temerária de decisões graves 332.

Uma outra edição marcante sobre o caso Ibsen Pinheiro, do Jornal Correio Braziliense, foi a edição do dia 10 de novembro de 1993. ―CPI descobre altos depósitos nas contas de Ibsen e Genebaldo‖.

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Orçamento descobriu, ontem, elevadas movimentações nas contas dos deputados Genebaldo Correia (PMDB-BA) e Ibsen Pinheiro (PMDB-RS). Ex-presidente da Câmara, Ibsen terá que explicar depósitos semanais de dez mil dólares em suas contas bancárias no Banrisul, Bradesco e Banco do Brasil concentrados em 1989 e 1990 quando liberava mais de 300 deputados da bancada peemedebista. Antes, Ibsen foi acusado de receber cheques de Genebaldo no valor de 51 mil dólares333.

É interessante notar, que novos valores surgiram nesta reportagem do Correio. Cada jornal trouxe um valor diferente do valor do cheque. O Correio Braziliense, nesta edição, utilizou o título ―Festival334 de cheques espanta CPI‖ na página interna335 daquele edição.

331Paul Johnson é um pensador influente no pensamento liberal contemporâneo. Historiador, ensaísta e jornalista,

é autor de artigos na revista britânica Spectator que têm servido de referência ao debate sobre ética na imprensa no mundo inteiro. Não pelo que pontificam, mas pelos problemas que apontam. Ele propõe uma grande análise para os erros mais frequentes do jornalismo: listou sete pecados capitais e, como antídotos, dez mandamentos – alguns já tratados nesse trabalho.

332 BUCCI, 2000, p. 161.

333 Correio Braziliense, 10 de novembro de 1993, capa.

334É preciso ressaltar que esse festival, na verdade, teria sido provocado pela imprensa. Os cálculos não eram

muito precisos. Cada jornal divulgou um valor diferente, o que deve ter dado um nó na cabeça do leitor que estava acompanhando o caso pela grande imprensa. Os números, mais uma vez, não foram checados. A imprensa ficou à mercê da fonte oficial, que era a CPI do Orçamento, e não fez cruzamentos com as declarações de Ibsen, o que comprovariam que toda a investigação estaria equivocada. Desta forma, a precipitação, o erro na cobertura da imprensa, causou desgastes e, o mais grave, a reputação de um político que, até então, era ilibada. Na verdade, toda divulgação ocorreu sem o menor medo de errar, sem o menor medo de ser responsabilizado por algum eventual equívoco. Afinal a imprensa sabe que nada iria acontecer, caso estivesse errada.

Dando continuidade ao assunto, no dia seguinte (dia 11 de novembro), o Correio divulgou que a CPI teria descoberto mais depósitos nas contas do deputado. A chamada de capa ―Novos depósitos comprometem Ibsen‖ traz dois aspectos importantes que merecem ser mencionados: a imprensa traz novos valores descobertos nas contas (a essa altura já não se sabe mais quanto seria o valor da corrupção do deputado), a cobertura tendenciosa não só do Correio, mas da grande imprensa na ‗captura‘ de Ibsen influenciou sobremaneira entidades e também a população.

A CPI do Orçamento apurou novos dados sobre o envolvimento do deputado Ibsen Pinheiro no esquema de manipulação de verbas: só na agência do Banco Meridional há um depósito de 153 mil dólares e novos depósitos, quinzenais, foram encontrados na conta do deputado na agência da CEF no Congresso. Hoje, a CPI deverá confirmar a convocação do deputado Genebaldo Correia. Ontem, dirigentes da Confederação das Associações Comerciais entregaram um manifesto ao presidente da CPI, senador Jarbas Passarinho, pedindo punição e reforma. Uma pesquisa da Soma Opinião & Mercado revela que 73 por centro dos brasileiros estão atentos à CPI336. Na página interna daquela edição, o Correio trazia reportagem de três colunas (não era a principal), com o título ―Para Ibsen, depósitos quinzenais‖ afirmando que: ―(...) a ―Subcomissão de Bancos da CPI do Orçamento acredita ter encontrado provas337 definitivas

sobre o envolvimento do deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) no esquema de desvio de verbas. Só na agenda do Banco Meridional há um depósito de 153 mil dólares. (...)‖338.

336 Correio Braziliense, 11 de novembro de 1993, capa.

337 É interessante notar aqui a expressão ―provas‖ utilizada pelo Correio Braziliense. O que mais tarde,

comprovadamente se revelou como equívoco, para a grande imprensa foi ‗uma pá de cal‘. Ou seja, Ibsen era corrupto por causa das provas. Perseu Abramo, em ―Padrões de Manipulação na Grande Imprensa‖ trata esse tipo de exagero, uma espécie de pré-julgamento como a não reflexão da realidade. Em um trecho do livro ele diz o seguinte:

―O principal efeito dessa manipulação é que os órgãos de imprensa não refletem a realidade. A maior parte do material que a imprensa oferece ao público tem algum tipo de relação com a realidade. Mas essa relação é indireta. É uma referência indireta à realidade, mas que distorce a realidade. Tudo se passa como se a imprensa se referisse à realidade apenas para apresentar outra realidade, irreal, que é a contrafação da realidade real. É uma realidade artificial, não-real, irreal, criada e desenvolvida pela imprensa e apresentada no lugar da realidade real. A relação que existe entre a imprensa e a realidade é parecida com a que existe entre um espelho deformado e um objeto que ele aparentemente reflete: a imagem do espelho tem algo a ver com o objeto, mas não só não é o objeto como também não é a sua imagem: é a imagem de outro objeto que não corresponde ao objeto real. Assim, o público — a sociedade — é cotidiana e sistematicamente colocado diante de uma realidade artificialmente criada pela Imprensa e que se contradiz, se contrapõe e frequentemente se superpõe e domina a realidade real que ele vive e conhece. Como o público é fragmentado no leitor ou no telespectador individual, ele só percebe a contradição quando se trata da infinitesimal parcela de realidade da qual ele é protagonista, testemunha ou agente direto, e que, portanto, conhece. A imensa parte da realidade ele a capta por meio da imagem artificial e irreal da realidade criada pela imprensa; essa é, justamente, a parte da realidade que ele não percebe diretamente, mas aprende por conhecimento. Daí que cada leitor tem, para si, uma imagem da realidade, que na sua quase totalidade, não é real. É diferente e até antagonicamente oposta à realidade. A maior parte dos indivíduos, portanto, move-se num mundo que não existe, e que foi artificialmente criado para ele justamente a fim de que ele se mova nesse mundo irreal. A manipulação das informações se transforma, assim, em