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A Comunicação Organizacional da Santa Casa de Misericórdia de Maceió

CAPÍTULO III – CONCEITOS E TEORIAS

4.3 A Comunicação Organizacional da Santa Casa de Misericórdia de Maceió

Neste tópico nos deteremos a demonstrar a Comunicação Organizacional da Santa Casa de Misericórdia de Maceió sob o ponto de vista de alguns relatos coletados no momento da realização da entrevista com funcionários do hospital. Principalmente as falas enunciadas pelo gerente de marketing, pois nenhum dado consistente sobre esse processo comunicacional da instituição foi disponibilizado. Além do fato de a instituição ainda não contar com uma política de Comunicação, como relatou o referido gestor.

Vale ressaltar que nosso intuito não é o de fazer uma Análise de Discurso, uma vez que este trabalho não utiliza tal técnica para a análise dos dados coletados na pesquisa de campo. E, principalmente, por este tipo de técnica não conseguir contemplar os conceitos apresentados pelas Teorias da Autopoiese e dos Sistemas Sociais bem como as dimensões processuais da comunicação.

A Santa Casa de Misericórdia de Maceió, apesar de não contar com uma política explícita de Comunicação Organizacional, dispõe de uma estrutura voltada para a comunicação, que desenvolve ações caracterizadas, na sua maior parte, por um perfil instrumental, voltadas para a criação e manutenção de veículos de comunicação, como as revistas, os murais e outros já citados. Essa prática, que ainda predomina na instituição, é a da tradicional comunicação de mão única, na qual as informações partem da diretoria para o nível operacional, em um esquema vertical de comunicação F-M-C-R (fonte, mensagem, canal, receptor). Esse modelo “se resumiria ao ato ou processo de transmissão de mensagens de fontes a receptores pelo intercâmbio de símbolos compartilhados por ambos, em canais transportadores de sinais” (CURVELLO, 2008, p. 10), cujo único objetivo seria o de afetar o receptor, e no qual a retroalimentação aparece apenas como instrumento de medição da eficácia comunicacional.

Observamos ainda que a comunicação, da forma como é tratada pela instituição, possui características mercadológicas, uma vez que muitas das informações são utilizadas

para a simples propagação dos serviços prestados, como os folhetos informativos entregues aos funcionários no setor de ponto.

É sabido que o hospital dispõe de um setor de ouvidoria, que deveria ser o responsável por, mais que ouvir, responder aos seus clientes internos e/ou externos. Entretanto, assim como em muitas instituições particulares, a ouvidoria está diretamente ligada a Gerência Comercial e Marketing da Santa Casa e, portanto, não é possível localizá-la na macroestrutura já apresentada na página 74.

Tal departamento disponibiliza um serviço de atendimento ao cliente, por meio de telefone e dos folhetos disponíveis nos diversos setores do hospital, para que o paciente possa registrar suas reclamações, dúvidas e sugestões. Segundo a supervisora do setor, o serviço ainda está em fase de aperfeiçoamento. Por isso, tem uma equipe funcional reduzida, o que faz com que o serviço prestado, em alguns casos não alcance a qualidade esperada.

Se por um lado a ouvidoria recebe/ouve as diversas informações do público interessado nos serviços prestados pela organização, por outro, não pode abdicar da responsabilidade da resposta, sempre sabendo que as respostas e as soluções encontradas são de responsabilidade institucional. Assim, forma-se um ciclo de comunicação que não pode ser interrompido, pois a função da ouvidoria é a de “fazer girar o fluxo de informações” (IASBECK, 2006, p. 8).

Ao partirmos do pressuposto de que a comunicação é um fenômeno que acontece em um dado momento, este retorno defasado ao cliente, quando lhe é dado, pode não mais interessar, uma vez que a comunicação não tem mais sentido para o cliente, pois já fora enunciada em outro momento, que não mais existe ou que possa ser retomado. Além do fato de que uma reclamação, quando proferida em um ambiente hospitalar, requer soluções imediatas, uma vez que, a depender dos sintomas e do momento, o feedback instantâneo é importante para o êxito do tratamento.

É fato que, a maioria dos casos não depende apenas de uma solução advinda da instituição, já que muitas vezes faz-se necessário uma autorização do plano de saúde para a solicitação desejada. Entretanto, uma comunicação melhor estruturada, com uma equipe mais bem preparada, pode auxiliar o paciente, mesmo naqueles casos em que o retorno não necessita ser imediato, pois ainda assim a informação é desejada pelo paciente, uma vez que a comunicação continua a acontecer em seu processo autopoiético interno.

Existe ainda o trabalho de comunicação interna desenvolvido pela Gerência de Marketing que tenta aproximar Provedor e funcionários por meio do programa bate-papo com o provedor. Nessa atividade, o provedor visita os diversos setores da organização para conversar, identificar e anotar opiniões, e esclarecer boatos que porventura se espalharam pelos corredores da instituição.

Entretanto, práticas como essa ainda são deficientes, pois a comunicação organizacional continua a ser conduzida como um sistema técnico-operacional. Como resultado, o que é visto é a realização setorizada de atividades e funções que pouco tem a ver com a política de Comunicação Integrada que a organização prega.

Essa falta de uma política estruturada para a Comunicação Organizacional foi relatada pelo próprio Gerente de Marketing do hospital, conforme abaixo:

Ainda não temos uma política de comunicação institucional. O que existe são ações isoladas, tanto da Gerência de Marketing como da Assessoria de Comunicação e, nesse conflito, ainda não há uma formalização, uma política. A gente observa que surgem algumas situações que deveriam ser mais bem trabalhadas, como, por exemplo, a comunicação interna com os colaboradores, a comunicação com os profissionais médicos, de enfermagem, o pessoal que atende, que assiste os pacientes, a comunicação com os clientes, no que diz respeito à preparação de procedimentos, de exames. Então, são interlocutores que ainda não são percebidos, certamente por não haver ainda uma definição clara dos papéis da comunicação dentro do hospital.8 (Entrevista concedida em maio/2010)

Apesar dessa falta de uma política voltada para a comunicação na instituição, o Gerente relata que a cultura organizacional, aos poucos, sofre alterações em sua estrutura, devido ao envolvimento, ainda tímido, dos funcionários com a organização. E que a área desenvolve um trabalho contínuo de pesquisa de Clima Organizacional, na tentativa, muitas vezes frustrada, de minimizar os transtornos que por ventura ocorrem devido a falhas no processo comunicacional. Essas falhas acontecem exatamente pelo fato da não percepção por parte dos funcionários de uma política integrada de comunicação e pela permanência incessante dos boatos nos corredores, que terminam por contribuir para distorcer as informações.

Essa ação, feita para diagnosticar as relações de trabalho e atuar sobre a comunicação interna, por estar deslocada da função original do setor, acaba por resumir-se a mais um meio de propaganda institucional, travestida de endomarketing9, pois já traz consigo modelos pré-

      

8

Fala do Gerente de Marketing, editada para uma melhor compreensão do texto. 9

O principal objetivo do Endomarketing é fazer com que todos os colaboradores tenham uma visão compartilhada sobre o negócio da empresa, incluindo as metas, os resultados, os produtos, os serviços e os

formulados que estão preocupados em diagnosticar o que a instituição necessita saber e não contemplam, na maioria das vezes, as necessidades dos funcionários.

Essas pesquisas de clima organizacional só serviriam, neste caso, para a instituição, se as mesmas trouxessem consigo uma verdadeira mudança de paradigmas e rituais, abrindo novos espaços para que os colaboradores pudessem efetivamente participar do processo comunicacional.

Entretanto, tais pesquisas servem apenas para alcançar resultados imediatos, que poderão ser revisados pela organização, mas que não necessariamente serão colocados em prática, uma vez que para isso seria necessário um processo de contínua manutenção e reestruturação da identidade corporativa e de superação dos tradicionais modelos verticais de comunicação.

Dessa forma, formulamos, já neste capítulo, um mapa comunicacional da organização, levando em consideração o formato da macroestrutura, a comunicação formal e os relatos obtidos nas entrevistas realizadas com funcionários da instituição, e reconhecendo que os departamentos “responsáveis” pela comunicação trabalham como áreas específicas, quase isoladas, quando deveriam estar em constante comunicação e integração.

      

mercados nos quais a Organização atua. (BRUM, 1998). “Mais do que simplesmente informar, o endomarketing serve para disciplinar a direção da empresa para determinadas atitudes de aproximação com o funcionário. Nesse contexto, a comunicação é tratada de uma forma bastante simples: como um processo pelo qual ideias (sic) e sentimentos são transmitidos de indivíduo para indivíduo dentro um mesmo ambiente de trabalho.” (BRUM, 1998, p. 71)

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Mapa Comunicacional

(Comunicação formal-vertical)

Santa Casa de Misericórdia de Maceió

Conselho Médico Assessoria Gerência Departamentos

Técnica Assistencial

Medicina Intensiva Diretoria Emergência Médica Cirurgia Oncologia

Assessorias Comissões: Centro de Gerência Diagnose e Terapêutica

- Jurídica; - Prontuários; Estudos de Riscos Pediatria

- Comunicação e RRPP - Óbito; Cardiologia Pacientes - Padronização; Medicina Interna

- Farmácia e Terapêutica; Nefrologia Comunidade - Ética em enfermagem; Saúde da Mulher

Mesa - Ressuscitação; Ortopedia Instituições Administrativa Provedoria - Educação Médica;

- Coreme;

- Ética em pesquisa;

- Ética Médica; Escritório da - CCIH.

Qualidade Gerência de Tecnologia da Informação Gerência de Engenharia e Infraestrutura

Diretoria Gerência de Suprimentos e Logística Administrativa Gerência Financeira

Financeira Gerência de Gestão de Pessoas Gerência Comercial e Marketing Quadro 2 – Fluxo comunicacional criado a partir da macroestrutura da Santa Casa de Misericórdia de Maceió

Observando a macroestrutura da instituição, percebemos a distância que separa a Assessoria de Comunicação e Relações Públicas e o Escritório de Qualidade das Gerências Comercial e Marketing e de Gestão de Pessoas, que são, segundo informações do gerente de marketing, os gestores responsáveis por conduzir processos comunicacionais.

Percebemos, ainda, que alguns setores da instituição, ao seguir um fluxo de comunicação que perpassa por linhas hierárquicas, não conseguem manter uma comunicação direta com a Provedoria e outros departamentos, em nível de diretoria, da instituição. Esses fluxos de comunicação entre nível operacional, neste caso, os departamentos, e as diretorias encontram barreiras comunicacionais, pois, aparentemente, a comunicação que predomina na instituição segue o modelo tradicional, vertical, apesar da horizontalidade com que é apresentado o organograma. Nesse modelo, as informações saem da alta direção, passam pelas gerências e demais lideranças, até chegarem ao nível operacional.

Há ainda o fato de que os outros departamentos, possivelmente não teriam acesso às informações advindas da Mesa Administrativa, que é formada pelos Irmãos, e que, por sua função institucional, encontra-se afastada das demais áreas e mantêm vínculo comunicacional apenas com a provedoria.

Vale ressaltar que este mapa comunicacional está baseado na macroestrutura encontrada no relatório anual de 2008, como um dos documentos a que tivemos acesso. É provável que este organograma já tenha sido substituído por outro mais atual, levando-se em consideração que as organizações são sistemas vivos e como tais, estão em constante mudança e adaptação ao meio em que estão acopladas.

Observando o mapa, podemos inferir que a comunicação, principalmente a caracterizada pela formalidade, sempre seguirá o fluxo hierárquico, apesar de os gerentes poderem manter contato direto com a provedoria, sem a obrigação de primeiro remeter as informações à Diretoria Administrativa e Financeira. Ainda há a possibilidade de encontros comunicacionais entre funcionários e o provedor vir a ocorrer nos corredores, uma vez que nenhum indivíduo está inacessível ao outro. Entretanto, no Hospital, segundo as normas, as informações devem passar primeiramente pelos gerentes, para que a hierarquia seja obedecida.

Analisando pelo ponto de vista da autopoiese, esta informação, que sai do nível administrativo, já sofreu várias modificações em sua estrutura até chegar ao público de interesse, que são os colaboradores. Assim sendo, tais informações já chegam aos colaboradores processadas e selecionadas por meio da compreensão de cada gestor, associada

à troca de informações e ao seu estado emocional no dado momento em que acontecera uma reunião, por exemplo.

Essas informações, influenciadas pela cultura, pelo estado emocional e até mesmo pela superioridade hierárquica de cada gestor, percorrerão o fluxo comunicacional de forma já diferenciada da mensagem inicial, como a brincadeira do telefone sem fio ou como a metáfora do tubo. Será, invariavelmente, um processo cibernético de segunda ordem, de observação da observação. Segundo Maturana e Varela (2001),

...este tipo de comunicação supõe a existência de uma unidade não estruturalmente determinada na qual as interações são instrutivas – como se aquilo que acontece a um sistema, durante uma interação, fosse determinado pelo agente perturbador e não pela dinâmica estrutural desse sistema. (p. 218)

Entretanto, no dia-a-dia é evidente que a comunicação não ocorre desta maneira, determinada pelo agente perturbador, pois cada pessoa diz o que diz ou ouve o que ouve segundo sua própria determinação estrutural. Ou seja, já no momento da troca de informações, na reunião, o receptor, neste caso o gestor de cada departamento, sofre algum tipo de provocação em sua ontogenia, em sua percepção e compreensão sobre o que está recebendo, ao mesmo tempo em que as processa durante o acoplamento estrutural ontogênico.

É neste momento que também surgem às conversas de corredores, já ao final das reuniões, quando alguns participantes comentam os possíveis impactos para a organização das novas informações recebidas.

Estas características complexas da comunicação, o momento, as pessoas envolvidas no processo, os comentários, os gestos dos participantes, a forma com que trocam informações, fazem com que as organizações ainda não consigam perceber a totalidade do processo comunicacional da organização. Um exemplo dessa incompreensão da comunicação pode ser visto nesse relato do Gerente de Marketing, que se reporta a um episódio de vazamento de informação distorcida pelos agentes participantes do processo, e só veio a ser interrompida quando do esclarecimento por parte do provedor.

A instituição tem colocado em prática algumas ações na tentativa de reduzir custos, para que tenhamos um maior resultado no final do período, mas algumas informações vazaram e o que chegou aos ouvidos de muitos colaboradores foi que a Santa Casa não mais pagaria o plano de saúde dos funcionários. O provedor da instituição na festa de São João dos colaboradores pegou o microfone e falou que esta informação não procedia, que continuaria pagando os oitenta por cento do plano de saúde. (Entrevista concedida em maio/2010.)

É claro que as organizações não conseguirão transformar todo tipo de interação em uma comunicação organizacional eficiente e eficaz, pois como vimos no capítulo três dessa dissertação, a comunicação é um processo improvável. E isso se torna mais visível quando os departamentos responsáveis pela gestão da comunicação estão voltados exclusivamente para a produção de mídia interna e externa.

O único departamento de comunicação a que os pacientes/clientes têm acesso é a Ouvidoria, que recepciona as informações, sugestões e reclamações dos clientes e transmite para os setores responsáveis, que deveriam emitir uma resposta para a Ouvidoria, que entraria em contato com o cliente. Mas, esse processo, como já descrevemos, não é assim tão simples, e está sujeito às barreiras intrínsecas à comunicação formal.

Segundo Curvello (2008), mesmo com o reconhecimento do caráter bidirecional da comunicação por parte dos profissionais e da academia, na prática, o que predomina nas organizações ainda é o modelo de transmissão. Dessa forma, o que percebemos é que ainda há uma série de obstáculos e dificuldades que precisam ser superados pela instituição para que a comunicação possa ser percebida como fenômeno, ultrapassando a visão instrumental que ainda impera neste ambiente organizacional.

CAPÍTULO V

AS RELAÇÕES COMUNICACIONAIS NO AMBIENTE HOSPITALAR