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CAPÍTULO III – CONCEITOS E TEORIAS

3.4 Comunicação em Saúde

Dentro desta perspectiva da Comunicação Organizacional, está inserido o ambiente hospitalar, como sendo aquele mais propício de relações comunicativas, sejam elas verbais ou não verbais.

A Comunicação em Saúde é uma área nova, que ainda é pouco explorada, e até pouco trabalhada pelos profissionais da saúde. No Brasil, vem sendo desenvolvida em programas de pós-graduação, com algumas publicações.

Segundo Sanches (2003) a Comunicação para a Saúde é uma subárea do campo científico da Comunicação que se desenvolveu a partir do início do século XIX, com as ideias de médicos europeus que estabeleceram as relações causais entre doença e condições sócio- econômicas e culturais da população. Essas ideias vão ao encontro da afirmação do médico Rudolf Virchow, que atribuiu a epidemia de febre tifóide de 1947 às condições de pobreza e à falta de acesso às informações para a adoção de hábitos saudáveis a que era relegada a maioria da população.

Nesse mesmo ano, o governo do Canadá assumiu a postura de promoção da saúde por meio da educação e da recreação, enfatizando a prevenção sobre a cura e indicando a Comunicação para a Saúde como caminho estratégico que privilegia a orientação e a informação da população sobre a adoção de hábitos saudáveis como necessidade para a viabilização e gerência da saúde pública. (SANCHES, 2003)

No ano de 1978, a Comunicação para a Saúde ganha maior ênfase quando da publicação do documento conhecido como Declaração de Alma-Ata, fruto de uma reunião

realizada na União Soviética, onde representantes de 134 países, sob o patrocínio da UNICEF e da OMS, concordaram que “o povo tem o direito e o dever de participar individual e coletivamente no planejamento de políticas de saúde.” (SANCHES, 2003, p. 3)

Em 1979, os Estados Unidos adotam a prevenção das enfermidades como principal forma de manutenção da saúde da população, reconhecendo a Comunicação para a Saúde como ferramenta de divulgação indispensável para alcançar os objetivos de programas de ação governamental.

No Brasil, segundo Pessoni (2009), não há concordância sobre a data em que se iniciaram os estudos da Comunicação para Saúde. O que existem, são alguns fatos que contribuíram para que a comunicação fosse vista com mais atenção pelos profissionais da saúde. Segundo Teixeira,

embora a comunicação em saúde tenha se consolidado como campo bem definido de investigações e práticas apenas no contexto desenvolvimentista dos anos 50-60, algumas preocupações “comunicacionais” podem ser identificadas no campo da saúde pelo menos desde a década de 20. De acordo com o autor, [...] são marcos institucionais significativos desses primórdios: a Reforma Carlos Chagas (1920), que, pela primeira vez, propunha associar técnica de propaganda à educação sanitária; no Estado de São Paulo, a Reforma Paula Souza (1925), que adotava a “educação sanitária” como instrumento de ação privilegiado. Para Teixeira, tais propostas denotaram a emergência, naquele momento, de “novas” concepções a respeito do objeto de trabalho da saúde pública [...]. (1996, p. 253 apud PESSONI, 2009, p. 34)

Na década de 1930, o Governo Provisório valoriza “o dueto educação e comunicação como ferramentas de apoio na área da saúde para a mudança de alguns conceitos” (PESSONI, 2009, p. 34-35) que poderiam mudar o processo de melhoria da qualidade de vida do brasileiro. A partir daí, o Estado Novo começou a ver nos meios de comunicação a possibilidade de uma ação contínua e permanente de indução, seja política, seja sanitária, mediante campanhas fortemente centralizadas, a partir das novas percepções higiênicas que começam a associar a conduta individual ao desenvolvimento de doenças (as chamadas ‘doenças da pobreza’), noções que sobreviveram até hoje. (NATANSOHN, 2004)

Em 1982, a SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), realiza uma mesa-redonda sob o tema: “Informação e Desinformação em Medicina”, recomendando a necessidade em transferir o discurso da comunicação primária (entre os cientistas) para a comunicação secundária (com o público). (PESSONI, 2009)

Em 1994, a atual Universidade Metodista de São Paulo, visualiza o campo da Comunicação em Saúde como uma área importante para a oferta de programas de formação em nível de pós-graduação. E em 1996, esta mesma instituição instala a Cátedra UNESCO/Metodista de Comunicação para o Desenvolvimento Regional. (PESSONI, 2009)

Essa interface da comunicação, educação e saúde, é um dos elementos importante para o êxito a ser alcançado em qualquer programa de saúde pública ou privada, com a participação indispensável da comunidade a que se destina e fundamentada nas técnicas educacionais e de comunicação social. (NATANSOHN, 2004).

A importância da comunicação para a saúde se manifesta no impacto que as informações a respeito de hábitos saudáveis, prevenção e cura de doenças têm sobre o quotidiano das pessoas, pois trabalhar na área da saúde é trabalhar com vida, suas doenças e a morte. Então,

quando se pensa na utilização estratégica da comunicação é preciso entender os apelos particulares e coletivos gerados pela informação... Quando o sujeito é lembrado sobre as suas fragilidades e as doenças que o rondam, a comunicação estará servindo também para lembrá-lo das suas dores, da sobrevivência, do medo, da morte. Para alertá-los sobre a proximidade ou distanciamentos da perfeição, da felicidade. (WEBER, 1995, p. 164 apud MAIA E MAIA, 2009, p. 190)

A super especialização das ciências da saúde, em especial da Medicina, tem levado os profissionais a se afastarem do indivíduo e terem como foco a doença.

Chega um cidadão no seu consultório, você mal ouve, pede vários exames; chegam os exames e você trata a partir dos exames. É preciso um leque de especialidades para tratar um mesmo indivíduo. Este é um dos fatores. O outro é um aspecto socioeconômico. O profissional da saúde não é valorizado, muitas vezes os salários são baixos e ele tem que trabalhar em vários lugares. Ele não tem tempo de se ater a um individuo. (PICANÇO, 2009 apud TOKARNIA et al, 2009, p. 98-99)

Para o autor, o médico ou profissional da saúde tem que decodificar a informação que o paciente traz para entendê-la, e então se colocar no lugar dele (paciente), interpretar a informação e recodificar de forma que ele, paciente, possa entender o que o profissional está falando. Não adianta falar complicado e ele (paciente) não entender. Uma coisa é o médico examinar o paciente e perguntar o que ele tem, outra coisa é saber fazer isso sem constrangê- lo. O autor ressalta que um dos motivos para uma má comunicação é que 70% da comunicação é não verbal e, se o médico não fizer direito, ele se trai e o paciente percebe.

Entretanto, o cenário nos hospitais e consultórios é outro, principalmente com as novas exigências tecnológicas e as regras ditadas pelos novos rumos profissionais, que obrigam o mercado a tomar inúmeras ações que modificam totalmente o sentido da atenção médica. Segundo Collina (2006), a conscientização por parte da população de seus direitos como consumidores, ou seja, usuários de serviços, fez com que os hospitais reconhecessem a necessidade de melhorar os seus serviços, investir em tecnologias, aperfeiçoar os seus recursos e buscar profissionais cada vez mais capacitados.

No entanto, a Comunicação Organizacional, não só nos hospitais, ainda é vista por

seus gestores como uma mera ferramenta, muitas vezes esquecida pelas organizações, mas,

não menos importante, se levarmos em conta que desde o atendimento na recepção até uma internação, a comunicação se faz presente.

A Comunicação em Saúde surge neste cenário, não só como uma estratégia para prover indivíduos e coletividade de informações, pois se reconhece que a informação não é suficiente para favorecer mudanças, mas é uma chave, dentro do processo educativo, para compartilhar conhecimentos e práticas que podem contribuir para a conquista de melhores condições de vida.

Uma informação de qualidade, difundida no momento oportuno, com utilização de uma linguagem clara e objetiva, é vista como um poderoso instrumento de promoção da saúde. Em contextos onde há comunicação de qualidade entre pacientes e profissionais da saúde, o paciente se sente mais propício a dar informações úteis e tirar suas dúvidas, reduzindo assim o sofrimento e a ansiedade gerados pela expectativa de melhora.

Um dos fatores que prejudica a realização de uma comunicação de qualidade entre médico e paciente é o uso de jargões técnicos e/ou a adoção de uma linguagem infantilizada, que não permite uma compreensão plena sobre a condição clínica deste paciente. Outro fator que impede uma boa comunicação entre estes dois interlocutores é que, muitas vezes, a consulta configura-se como um momento que se restringe à busca da interpretação de sintomas e prescrição de medicamentos, que nem sempre garante um tratamento eficaz.

Ao chegar ao hospital, o paciente passa por uma espécie de pré-atendimento pelos recepcionistas. Entretanto, muitos destes profissionais estão ainda despreparados e mal informados e não conseguem instruir o paciente, o que contribui para deixá-lo ansioso e irritado devido à demora no atendimento.

as organizações de saúde devem ter consciência do papel social que representam no novo contexto, o que significa contribuir para o desenvolvimento social, professar o respeito ao ser humano de nenhum tipo de distinção ou preconceito, zelar pela liberdade de pensamento e de expressão, tratar seus funcionários e colaboradores com dignidade, observando a legislação trabalhista, promovendo a capacitação profissional e a realização profissional, promover o diálogo com seus públicos, ser transparente e ético em suas ações, agindo no interesse da coletividade, respeitar o meio ambiente, promover a qualidade de seus serviços, respeitar os consumidores e pacientes, envolver-se em projetos de interesse social.

E, para isso, a cultura das organizações de saúde precisa inserir novos paradigmas de relacionamentos, procurando tornar seus funcionários e colaboradores mais produtivos e satisfeitos no desempenho de suas atividades. Nesse contexto, o médico não pode ter preocupações de administrador, deve ater-se somente a dar ao paciente a atenção integral que merece. (NASSAR, 2003). Além disso, Nassar enfatiza a importância da revisão da formação dos profissionais que atuam na área, com a inserção de disciplina de comunicação no currículo acadêmico.

Para Araujo e Cardoso (apud SADALA, s/d, documento eletrônico) a comunicação praticada na área da saúde seria norteada por modelos de comunicação tradicionais, que constituiriam fator limitante na análise e na ação comunicativa no âmbito da saúde.

Para tentar mudar o “quadro” desta comunicação tradicional, estas autoras sugerem estratégias de comunicação que poderiam ser desenvolvidas de acordo com as diretrizes do SUS (Sistema Único de Saúde). Segundo elas, há a possibilidade de uma prática comunicativa que contemple os princípios doutrinários e organizativos da assistência à saúde. A universalidade corresponderia à democratização da comunicação e ao livre acesso da população a meios, canais, e espaços de fala, conduzindo múltiplos discursos, idéias, propostas, saberes etc. A equidade contemplaria as diferenças socioculturais e econômicas, prevenindo danos causados pelas dificuldades de acesso à informação e à assistência à saúde. A descentralização promoveria estímulo à maior participação local nas decisões por meio da criação de canais de comunicação neste nível. A hierarquização implicaria a participação maior das esferas estaduais e municipais no âmbito do SUS, o poder central assumindo o papel de repassador de recursos e de apoio a estados e municípios, na sua prática comunicativa. A participação criaria condições para a sociedade local atuar ativamente, incluindo todos os setores da sociedade no desenvolvimento das políticas públicas de saúde.

Entretanto, Sadala (s/d, documento eletrônico) ressalta que as dificuldades vividas pelas práticas comunicativas (ao tentar implantar os princípios do SUS: universalidade,

equidade, integralidade, descentralização, hierarquização e participação, na proposta das autoras) estão condicionadas e até determinadas pelas mesmas dificuldades que o SUS encontra ao tentar implementar estas diretrizes, que, no conjunto, dependem do contexto das políticas econômicas ao longo dos anos, e que no final implicaria em uma comunicação sem qualidade, para poder respeitar a ética e as políticas de divulgação de informações, que mais uma vez fica restrita aos que detêm o poder dentro do ambiente organizacional.

Dessa forma, faz-se necessário uma comunicação organizacional, no âmbito hospitalar, que englobe todas as formas de comunicação utilizadas pela instituição para relacionar-se e interagir com os seus públicos, visto que os pacientes estão cada vez mais esclarecidos e envolvidos com os procedimentos médico-hospitalares.

É importante que a comunicação seja vista como um todo, não só a comunicação com os media, mas a comunicação interna, as relações institucionais, as relações com os parceiros da comunidade, as relações com os pacientes e todos os públicos envolvidos. Por isso nossa opção metodológica por também estudar e interpretar a comunicação entre atendentes e pacientes, entre médicos e pacientes.

3.5. A TEORIA DA AUTOPOIESE DE HUMBERTO MATURANA E FRANCISCO