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1. O espaço social dos intelectuais no Rio Grande do Sul nas primeiras décadas do

1.2. O “regionalismo” como unidade de referência e objeto de disputas entre

1.2.1. A concorrência entre historiadores e literatos

No plano geral, a relação entre os campos da história e da literatura estava marcada pela competição tácita, entre historiadores e literatos, pela competência de formular uma imagem para o Rio Grande. A inflexão que sofre a trajetória de alguns literatos regionalistas que se desgarram da ficção e adotam os parâmetros historiográficos para descrever o passado e representar a memória e a identidade regional, entretanto, indicam a prevalência dos critérios de validação da interpretação sobre o passado fornecidos pela história em relação à literatura, na esteira do processo de institucionalização da história. Sendo o passado a matéria-prima para o desvelamento da identidade regional e sendo os historiadores aqueles que se apresentavam com os

atributos de competência legítima para retratar a “verdadeira história”, a reconversão da

literatura para a história tornou-se uma inflexão necessária para todos quantos quisessem laborar na construção da identidade regional.

Na década de 1930, escritores que haviam se lançado no universo literário, especialmente na poesia, como Walter Spalding, Jerônimo de Ornellas, Darcy Azambuja, Paranhos Antunes, Olintho Sanmartin, Dante de Laytano e Athos Damasceno Ferreira migram para o campo dos estudos e ensaios históricos, ao longo da década de 1930 e 1940. Segundo a hipótese defendida nesta tese, essa reconversão de poetas e literatos para o campo da história não deve ser tomada como uma inflexão

“natural” nas suas carreiras. Está relacionada com o movimento de especialização e

prestígio da profissão intelectual de historiador. Gabriela Correa da Silva cita um trecho das palavras de Athos Damasceno Ferreira, na sua polêmica com Vargas Neto, em 1932, sobre o regionalismo:

Só há um meio de voltarmos ao passado, sem arriscar-nos a cair num lugar comum, na repetição e na cópia, por falta de fontes de inspiração direta, de remoção espiritual e de clima próprio para a expansão das

ideias-força: é libertando-nos das palavras e mergulhando fundo na nossa história (SILVA, 2012, p. 585).

Segundo Silva (2012), nessa polêmica Athos Damasceno “enfatiza o encerramento da literatura regionalista e escreve sobre a necessidade da recorrência à história, uma vez que a literatura não era mais o reflexo da realidade viva” (p. 586). O corte entre história e literatura estava muito claro aos intelectuais, já no final da década de 1920. Quando Jorge Salis Goulart foi aprovado, em 1927, como membro correspondente do Instituto Histórico, o parecer escrito por João Maia, fundador do Instituto Histórico e das duas academias literárias do Rio Grande do Sul, reconheceu que a produção de Salis no campo da poesia e literatura não lhe franquearia as portas do IHGRGS. Somente a “mudança de quadrante” para a história e sociologia abriu as portas do Instituto ao novo sócio.37

De acordo com esta perspectiva, o investimento de carreira de Moysés Vellinho no campo da produção histórica está relacionado com o reconhecimento implícito de que a história se impôs como a disciplina intelectual com as melhores prerrogativas para

interpretar a realidade e definir a “imagem do Rio Grande”. Mara Rodrigues ao falar

sobre a mudança do quadrante intelectual de Moysés Vellinho, apontou que

“provavelmente ele não se considerava um cantor digno de sua terra, então, podia ser, pelo menos, um historiador” (RODRIGUES, 2006, p. 81). Rodrigues, ainda, cita a razão

apontada pelo próprio Vellinho, feita em entrevista realizada por Temístocles Linhares, explicando porque deixou a crítica: “... deixei simplesmente porque pensei já ter

alcançado o direito nesta altura da minha vida de trabalhar para mim mesmo...” (p. 81). A expressão “alcançar o direito” deixa entrever um sutil juízo de valor entre crítica

literária e história, que vem ao encontro da hipótese de que a disciplina histórica já havia conquistado foros de legitimidade e especialização que a deixavam em posição superior à crítica literária. Ora, a reivindicação de superioridade da História no quadro das ciências humanas, enquanto programa institucional, já estava dada desde o ato de fundação do Instituto Histórico no estado.38 No final da década de 1940, a história estava estabelecida como uma disciplina, senão de maior prestígio, pelo menos com assegurada legitimidade para interpretar a “realidade”. Assim, Vellinho ingressou no

37 Este caso será analisado com maior detalhamento no capítulo 3 desta tese.

38 Para isto basta lembrar a fala do primeiro presidente do Instituto, Florêncio Abreu, quando disse: “... se

sabe que na hierarquia das ciências a história, que é uma ciência concreta, depende de todo o grupo inferior das ciências abstratas” (Revista do IHGRGS, n. 1, 1921, p. 123).

Instituto Histórico do Rio Grande do Sul relativamente tarde, em 1949.39 Ao que parece, a atuação “profissional” como crítico literário não abriu as portas do Instituto Histórico

para Vellinho, o que só foi ocorrer quando este fez a reconversão para os temas históricos, no final da década de 194040, o que pode indicar um contraste entre a atuação

intelectual do crítico literário com a identidade “profissional” dos historiadores, e a

consequente resistência para admitir o ingresso de Vellinho.

A postura que Moysés Vellinho assumiu como historiador reforça a ideia do reconhecimento da história como disciplina mais apropriada a revelar a verdadeira

identidade regional. Seguiu os “cânones” já consagrados da disciplina no estado,

assumindo uma posição conservadora, ao lado de outro conservador no estudo histórico

– Othelo Rosa –, no exato momento em que se esboçava uma revisão historiográfica

que pretendia quebrar a rigidez da historiografia local baseada na hagiografia política e militar.41 Em 1964, publicou pela Globo, o livro Capitania d’El Rey, sua obra mais importante. Um trabalho histórico sobre a origem do Rio Grande e a formação do gaúcho dentro do quadro constitutivo da nacionalidade que repisava, com mais

sofisticação, os mesmos postulados da historiografia “tradicional”: a pertença rio-

grandense ao quadro histórico do Brasil, pela via portuguesa e pela função militar de

“sentinela” da nacionalidade. Se na crítica literária Moysés Vellinho denunciava o “ranço acadêmico” e os “rebates cívicos”, na história assumiu um papel conservador.

Do lado literário, pode-se ver que, no final dos anos 1940, o escritor Érico Veríssimo, a esta altura um romancista já consagrado como escritor não-regionalista, também voltou-se para a temática regionalista, iniciando a trilogia O Tempo e Vento,

39 Uma das possíveis razões para o tardio ingresso de Vellinho no IHGRGS é, talvez, sua polêmica em

torno da obra de Alcides Maia. É interessante notar que Alcides Maia, fundador do IHGRGS, foi o diretor do Museu Júlio de Castilhos, que serviu de sede para o IHGRGS até 1943. Alcides Maia veio a falecer em 1944, no Rio de Janeiro. Moysés Vellinho ingressou no IHGRGS na primeira leva de novos sócios efetivos após a morte de Alcides Maia, cinco anos depois. A abertura dessas novas vagas se deu por uma mudança na interpretação dos estatutos proposta por Othelo Rosa e outros sócios, mediante a qual efetivos não mais residentes em Porto Alegre ficavam transferidos para a categoria de correspondentes, e os fundadores nas mesmas condições abriam vagas para novos membros, contudo, conservando suas características de fundadores (Ata do IHGRGS, 10 de maio de 1949). Disso resultou a abertura de 6 novas vagas, e na sessão seguinte foram apresentados novos candidatos, entre os quais Moysés Vellinho.

40 Mara Rodrigues (2006), em análise ao artigo de Moysés Vellinho “Alcides Maia: a expressão literária e

o sentido sociológico de seu pensamento” (1944), observa que “seu texto crítico tornava-se um ensaio de história do Rio Grande do Sul entremeado por comentários à literatura de Alcides Maya” (p. 84, 85), apontando, já naquela altura, para a reconversão de Vellinho da crítica literária à História.

41 É dito “quase” conservadora, pois Moysés Vellinho introduziu readequações e refinamentos no

discurso historiográfico que prezava pela hagiografia política e militar, através de aportes teóricos emprestados da sociologia de Gilberto Freyre, em especial, a noção de cultura. Pode-se dizer que Vellinho defendia um programa de renovação em termos de lutas intelectuais em torno das questões culturais, bem como do regionalismo, porém, conservando alguns dos postulados tradicionais assentados em novos argumentos teóricos.

preocupado com a forma como a história do Rio Grande era ensinada nos livros escolares. Como esses livros eram escritos por historiadores, o que incomodava o romancista era a forma como eles retratavam a história rio-grandense. Este diagnóstico está a par com a observação compartilhada por outros intelectuais, que, segundo Letícia

Nedel, se tornou generalizada, à época, de que “sobrava tradição política e faltava cultura popular”. Esse investimento de Érico Veríssimo na literatura regionalista, está

inserido, portanto, num novo contexto distinto daquele que caracterizou os anos 1920 e 1930. Mas revela o prolongamento da disputa entre história e literatura, e pode ser visto como uma reação da literatura no momento da revisão do regionalismo, e em que aquela historiografia que havia se tornado hegemônica como disciplina e como memória, começa a dar sinais de esgotamento. Sugere o questionamento do papel do historiador como mais competente e autorizado para interpretar e deslindar o passado, ou, ainda, a

tentativa de “desmitificar” a História regional.42 Mara Rodrigues (2006b) relaciona o projeto de O Tempo e o Vento a “uma intenção crítica quanto à sociedade e à

historiografia do Rio Grande do Sul” (p. 290). Por outro lado, Érico Veríssimo recorreu às “ferramentas” historiográficas para dar coerência, credibilidade e substancialidade

histórica ao romance.43 A despeito de toda a liberdade que a ficção fornece, Érico insere

os seus personagens fictícios num pano de fundo histórico “real”. Embora O Tempo e Vento possa ser visto como “uma intenção crítica à historiografia”, portanto mais um

desdobramento da disputa da literatura com a história pela representação da imagem do Rio Grande (com grande vantagem para a literatura), é também o reconhecimento tácito

das qualidades da história como disciplina detentora dos recursos “veritativos” e como

fonte para a representação da identidade regional.

Para esclarecer um pouco mais sobre a avaliação entre a escrita da história e a literatura nos anos 1930, vale ressaltar a opinião de Souza Docca sobre a incursão do historiador Aurélio Porto pela literatura ficcional. Em 1933, Aurélio Porto publicou pela Livraria do Globo O Tesouro do Arroio do Conde – novela histórica do Rio Grande do

Sul Setecentista. À guisa de prefácio, Souza Docca, a esta altura pontífice da

historiografia local, ao lado de Aurélio Porto, deixou entrever sua visão sobre a relação

42Veríssimo (apud RODRIGUES, 2006b): “Concluí então que a verdade sobre o passado do Rio Grande

devia ser mais bela que sua mitologia. E quanto mais examinava a nossa História, mais convencido ficava da necessidade de desmitifica-la” (p. 293).

43Segundo Maria da Glória Bordini (apud RODRIGUES, 2006b), Érico Veríssimo recorreu à: “consulta a

fontes do folclore e da historiografia sulina procurando especificar eventos e cenários e coordenando vidas e fatos políticos. (...) e há a fixação das cronologias, a fim de garantir a coerência da história...” (p. 291).

entre história e literatura. Dizia o historiador: “A novela histórica é, como sabemos, um

dos gêneros literários em que o escritor, tendo erudição histórica e talento artístico, pode mesclar o real com o possível. Neste caso, porém, a finalidade é estética e não histórica” (p. 11). Assim, Docca faz a distinção entre história e literatura. A literatura teria

finalidade estética, trataria sobre “possível”. A história, por outro lado, trataria sobre o “real”. No caso de Aurélio Porto, aduz Souza Docca: “Na irmanação do historiador com

o artista foi evidenciado o predomínio de um sobre o outro” (p. 11). Como resultado,

Aurélio Porto “fez obra de arte e, ao mesmo tempo, realizou trabalho de sociólogo”. Para Docca, na harmonização entre o “individual-concreto-real” e o “individual-

concreto-possível”, venceu o historiador, porque Aurélio Porto atingiu um de seus

objetivos, que era o de “esboçar um estudo sobre a formação do Rio Grande do Sul”.

No prefácio à novela de Aurélio Porto, Souza Docca segue ressaltando as qualidades

históricas e “reais” da obra. Diz ele: “as paisagens são exatas, palpitantes, vivas...”, “as

personagens, afora a ideal engenitada (sic), são reais”, “as anotações históricas constituem interessantes subsídios e dão mais relevo aos fatos narrados, evidenciando- lhes a autenticidade” (p. 11).

As asserções de Souza Docca indicam a pressuposição do autor de uma hierarquia dos gêneros intelectuais, em que a história aparece como a disciplina que possui as melhores prerrogativas de tratar sobre o passado real. No entanto, o historiador não defende uma interdição à literatura para tratar sobre o passado, desde que o escritor esteja amparado na erudição histórica, ou seja, a história aparece como a fonte que fornece os elementos para lidar com o passado e com o real. A relação entre história e literatura no Rio Grande do Sul foi constante e profícua. Muitos temas históricos foram (e continuam sendo) explorados pela literatura sul-rio-grandense, tais como a Revolução Farroupilha, as Missões, as charqueadas, o castilhismo, o Estado- Novo, e a ditadura militar, o que demonstra a estreita relação entre literatura e história no estado.

No plano institucional, a participação de alguns sócios em várias instituições ao mesmo tempo pode nublar a percepção da concorrência entre disciplinas e “empresas” intelectuais. Por exemplo, Othelo Rosa fazia parte da maioria das entidades culturais do estado, entretanto, em algumas delas sua participação era nominal, em outras, visava a

uma atuação de “patrulha” muito mais do que engajamento ou identificação. Assim,

fazia parte de instituições rivais ou aliadas táticas. Analisando a atuação desses agentes mais de perto, se percebe as clivagens que surgiam num ambiente que ao observador

externo pareceria de unidade. Na reunião de 1º de junho de 1948, o vice-presidente do Instituto, Luiz Carlos de Morais, disse que o jornalista Sérgio de Gouveia, irmão de Paulo de Gouveia, ambos membros da Academia Rio-Grandense de Letras (segunda fase)44, o procurou para solicitar “que o Instituto se associasse às comemorações de Castro Alves”. A esta proposição, entretanto, reagiu Othelo Rosa, “para discordar de uma tal resolução do Instituto”, usando como argumento o fato de “tratar-se de uma comemoração puramente literária, o que escapa das finalidades da nossa instituição”.45 Tanto Luiz Carlos de Morais, presidente em exercício, quanto Othelo Rosa, orador oficial, eram membros da Academia Rio-Grandense de Letras. Naquele mesmo ano, realizou-se o 5º Congresso Eucarístico Nacional, em Porto Alegre, no mês de outubro.

Em virtude desse congresso, o Instituto Histórico resolveu realizar uma “sessão em

homenagem aos membros de instituições históricas do país e do estrangeiro” que se encontravam na cidade (grifos meus). A referida sessão ficou marcada para dia 29 de outubro, às 16 horas, na sede do Instituto. Entretanto, o presidente da Academia Rio- grandense de Letras, cuja sede estava abrigada numa sala alugada no próprio Instituto Histórico, sugeriu uma sessão em conjunto entre as duas entidades, para homenagear

“historiadores e intelectuais”. Opinou o sócio Jorge Godofredo Felizardo, secretário do Instituto, que o prazo era muito “escasso” para organizar uma sessão que representasse a

homenagem das duas entidades. Othelo Rosa se manifestou de acordo com essa opinião,

bem como “os demais membros presentes apoiam a opinião inicial ficando resolvido que a sessão do dia vinte e nove” fosse “apenas do Instituto”.46 Assim, pode-se concluir que a concorrência entre historiadores e literatos se dava de forma mal disfarçada, através de alianças táticas e pequenos boicotes, mas sem grandes rupturas.

Como já foi dito, a partir de meados dos anos 1940, houve um consenso no meio intelectual rio-grandense sobre a necessidade de redefinir o regionalismo, bem como atualizar os debates intelectuais locais colocando-as em sintonia com as discussões mais gerais em voga no restante do país. Por outro lado, não havia consenso a respeito do modelo de regionalismo a seguir. O capítulo terceiro desta tese discutirá sobre os grupos

em disputa pela definição dos “novos” critérios do regionalismo, no contexto do final

do Estado Novo. Por ora, basta dizer que o regionalismo permaneceu como unidade de referência para os intelectuais rio-grandenses, e foi um eixo estruturante (de longa

44 MARTINS, 1978, p. 258-259.

45 Ata do IHGRGS, 1 de junho de 1948, p. 27v. 46 Ata do IHGRGS, 26 de outubro de 1948, p. 63.

duração) das problemáticas legítimas e da sua própria atuação, sendo objeto de disputas e reversões e, também, instrumento destas mesmas disputas.

1.2.2. As relações entre o IHGRGS e outras instituições culturais do estado, de 1920 a 1950: as instâncias dominantes no universo cultural sul-rio-grandense

Entre as transformações morfológicas ocorridas na esfera intelectual gaúcha nas primeiras décadas do século XX, está a conquista de um espaço institucional de atuação para os intelectuais rio-grandenses, através da formação e consolidação de um conjunto de posições estratégicas de prestígio intelectual reconhecido e da formação de uma rede entre instituições culturais, públicas ou não. A importância dessas instituições culturais é que elas funcionaram como móvel e instrumento de lutas e proselitismos nas disputas intelectuais pela definição da cultura legítima (projetos de identidade regional) e dos critérios validativos da cultura e do discurso histórico (através de categorias centrais que podem ser históricas, regionalistas, não-regionalistas, etc.), e, além disso, dos critérios de definição da própria intervenção dos intelectuais nos debates públicos e na gestão burocrática da cultura.

Nos anos 1920, foi se constituindo uma rede de instâncias de produção, distribuição e validação dos bens simbólicos no Rio Grande do Sul, entre as quais podem ser citadas o IHGRGS, o Arquivo Público, o Museu Júlio de Castilhos, a Biblioteca do Estado e a Livraria do Globo. Letícia Nedel resumiu a cooperação destas instituições, em especial, o Arquivo, o Museu e o IHGRGS, no âmbito da pesquisa e produção histórica:

Em 1925 o Arquivo Histórico é separado do Arquivo Público para incorporar-se à seção de História Nacional do MJC, criada no mesmo ano. Vale destacar que em um determinado momento a casa onde viveu Julio de Castilhos, sede do MJC, abrigou ao mesmo tempo o museu, o Arquivo e o IHGRS. Essa agremiação nasceu estreitamente vinculada ao Arquivo Público estadual. Criada em 1920 em sessão inaugural solene no salão nobre da Intendência Municipal, instalou-se provisoriamente na sede própria do Arquivo, compartilhando com ele boa parte de seus mentores. Já o Arquivo Público, no início havia sido regimentalmente definido como órgão passivo no recebimento de documentos oficiais sem valor corrente, mas com a instalação do Instituto Histórico nas suas dependências, passou também a sistematizar informações. Com a transferência da Seção Histórica do Arquivo Público para o Museu Julio de Castilhos, em 1925, a parceria se estendeu às três instituições, possibilitando a diversificação das linhas de atuação do Museu (NEDEL, 2005, p. 64).

Estas três instituições, em particular, nas décadas de 1920 e 1930, foram controladas pelo mesmo grupo de agentes, e formavam uma rede de cooperação (e não

de competição), tanto no âmbito “político” quanto no aspecto da logística de seu

funcionamento e da pesquisa histórica. Por exemplo, os membros do Instituto tinham seu trabalho facilitado à medida que o Arquivo Histórico organizava e publicava os seus documentos. Não por acaso, os dois principais dirigentes da Revista do Arquivo

Histórico – em sua primeira fase –, Florêncio Abreu e Eduardo Duarte, eram também

presidente e secretário do IHGRGS, respectivamente. Outro exemplo da cooperação logística das instituições pode ser visto através do fato de que, antes da criação do

Instituto Histórico, as oito reuniões preparatórias ocorreram na “sala principal” do

Arquivo Público do Rio Grande do Sul, na época presidido por Florêncio Abreu. E depois de fundado o Instituto, quando ainda não possuía sede própria, realizava suas

reuniões nas dependências do Museu Júlio de Castilhos. A relação “mutualista” entre o

IHGRGS e o Museu Júlio de Castilhos perdurou até o ano de 1943, quando foi cedido ao Instituto pelo Estado, o uso de um prédio público na Rua Riachuelo, onde se encontra a atual sede.

No âmbito da distribuição e validação dos bens simbólicos, despontava a Livraria do Globo. No âmbito da institucionalização da História, destacava-se o IHGRGS. Havia diferenças básicas entre as duas instituições como instâncias intelectuais, para além do fato de uma reunir um quadro de letrados que elegeram a história como mote da sua atividade intelectual, e a outra reunir um grupo mais variado