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A cultura digital na participação política do Brasil:

A cultura digital tem inspirado discussões não só quanto aos conceitos do público e do privado dos indivíduos, mas também quanto à participação política dos mesmos.

No fenômeno de popularização da rede digital, muito se tem discutido sobre papel da cultura no incremento da participação política do povo. Em virtude da crise representativa (desconfiança do cidadão com relação às instituições políticas; prova disso é o alto nível de abstenção nas urnas eleitorais e pouca adesão às iniciativas propostas pelos partidos políticos), acreditamos que a esfera política está cada vez mais distante do cidadão comum. Essa realidade pode ser vivenciada, de certa forma, nas últimas eleições municipais de 2012, na cidade de São Paulo, que apresentaram um índice de abstenção às urnas de 18,48% (Quadro I), fato este, pelo descrédito do cidadão comum pela classe política, a proporcionar talvez num futuro próximo, uma crise da democracia representativa, mesmo sendo obrigatório o ato de votar. Já fora de nosso país, onde o voto não é obrigatório, os números de eleitores que não foram votar são mais acentuados.

QUADRO I

Abrangência Qt Aptos Qt Aptos Totalizados Comparecime nto Abstenção Qt Seções Qt Seções Totalizadas SÃO PAULO 8.619.170 8.619.170 7.026.448 1.592.722 23.684 23.684 Total Geral 8.619.170 8.619.170 7.026.448 1.592.722 23.684 23.684

Fonte: TSE – Tribunal Superior Eleitoral

Levando em consideração que nossa pesquisa pretende discutir se as opiniões, os relatos e os discursos dos candidatos que se utilizam do Twitter na plenitude da sua potencialidade favorecem o uso desta ferramenta para o candidato informar o eleitor, (por exemplo, de seu plano de governo), torna-se essencial discutir o papel das redes sociais digitais no incremento da participação política e suas nuances. Cria-se, assim, um espaço virtual de conversação social, frutífero e de vitalidade, para que este tenha interesse em enriquecer a participação do povo no campo político, ou não.

Nos últimos dezessete anos, a Internet vem sendo associada a conceitos como “nova comunidade civil”, “democracia digital”, “democracia eletrônica”, “e-

democracy”, “democracia virtual”, “ciberdemocracia” (MAIA: 2011). Todas essas

nomenclaturas referem-se à ideia de que a Internet seria capaz de resgatar a participação política. A participação política envolve a possibilidade de influenciar de forma efetiva as políticas locais, regionais, nacionais e internacionais. Calcada a na ação intencional para impactar na agenda pública, na participação legal do sistema representativo, a partir do voto, nas campanhas, nas eleições e na estrutura legislativa. A participação política ocorre, também, pela participação nas estruturas, nas atividades e no trabalho partidário, em grupos organizados e em manifestações orientadas a exercer influência na pauta dos atores políticos e institucionais dos governos. A confiança nas instituições políticas por parte dos cidadãos é vista como possibilidades trazidas pelo avanço tecnológico, tais como a comunicação em rede, a organização e o armazenamento de dados online.

Dentre aqueles que visualizam nas novas tecnologias, uma possibilidade de revitalizar as instituições democráticas esquecidas pelos cidadãos, são muitas as

previsões ousadas e generosas no sentido de que a Web pode nivelar a informação e garantir o desenvolvimento equitativo da humanidade por meio dos benefícios da interconexão (RHEINGOLD: 2007).

Outros não visualizam a realidade de uma ação, muito menos a de participação política no mundo digital, não acreditam na ascensão de instituições intermediárias entre os campos político e civil, no crescimento da suposta democracia direta eletrônica e o aperfeiçoamento do espaço em debate. Wilson Gomes afirma que:

“A vida política privada online das pessoas inclui, por conseguinte, mais ação do que participação política. O que provavelmente deve fazer pensar em como favorecer a que os indivíduos passem da ação em geral àquela forma de ação que é a participação em iniciativas digitais” (GOMES, 2011, p. 40).

A Internet será responsável por aumentar o número cidadãos que comparecerão às urnas nas eleições e por diminuir as barreiras físicas e cognitivas, por tornar a informação política mais acessível, promover o debate direto entre os cidadãos e as elites.

De acordo com (GOMES: 2011), ainda pode ser mencionado, no rol das vantagens políticas da Internet, o fato de ela permitir aos cidadãos ou à sociedade civil alcançar, sem a necessidade de intermediários, outros cidadãos e governos. Assim, a Internet pode transformar-se num instrumento para a democracia deliberativa, porque pode assegurar, aos interessados em participar do jogo democrático, dois dos seus requisitos fundamentais: informação política atualizada e oportunidade de interação. Outra vantagem apontada por Gomes é o fato de a Web permitir a disseminação de informação de forma rápida, barata e conveniente para o cidadão que não precisa se deslocar.

Com a globalização, a popularização da Internet e a substituição das comunidades espacialmente localizadas pelas redes virtuais, alterou-se o sentido de um encurtamento das distâncias entre usuários, ou seja, as pessoas ficam mais conectadas, não necessariamente próximas fisicamente, mas um tanto isoladas em seus quartos, escritórios, lares, automóveis, ou até mesmo em transportes coletivos. Portanto, um dos papéis importante da Internet na estrutura das relações sociais digitais é sua contribuição para o novo padrão de sociabilidade baseado no individualismo físico. De fato, as redes sociais complexas sempre existiram, porém, na maioria dos casos, em contato físico, face-a-face, mas, com o desenvolvimento tecnológico nas comunicações, permitiram certo afastamento do contato entre pessoas.

O aproveitamento das novas mídias para incrementar a participação política dos cidadãos não desperta otimismo em todos os estudiosos. A Internet não se transformou num espaço democrático de debate, conforme proclamado na década de 1990. O primeiro temor de outros pesquisadores é de que a própria Internet aumente a distância entre os cidadãos participativos e os não participativos. Esses pesquisadores demonstram que a maior parte dos acessos à rede com propósitos políticos são realizados por cidadãos de poder econômico mais alto, com certo nível de conhecimento e interesse político. Da mesma forma, a atividade política na Internet também é realizada essencialmente pelas pessoas que já costumavam participar politicamente. A população de baixa renda, a taxa de participação é consideravelmente sub-representada, mas está crescendo. O fato de os recursos tecnológicos estarem disponíveis cada vez mais a grupos sociais dos mais diversos não impede a participação política dos mesmos; mesmo assim, não há interesse, por parte da maioria, por essa participação. Acrescente- se, ainda, que o ciberespaço reproduz a política tradicional na medida em que serve apenas como um espaço adicional de expressão para aqueles que já dominam o discurso político e que, mesmo assim, são suscetíveis às formas estratégicas simbólicas das mais variadas.

Outra questão que se coloca é a acessibilidade às tecnologias, uma vez que, para participar da democracia digital, o cidadão precisa ter um computador, acesso à Internet,

bom conhecimento da linguagem virtual e disposição para tal, pois aqueles que conseguirão se seduzem mais facilmente por entretenimento na rede. Para tal, fazem-se necessárias habilidades cognitivas para se conectar aos novos modelos de participação política que só são encontrados nas classes média e alta da sociedade, justamente aquelas que já participam mais comumente do sistema político real. Dessa forma, a Internet acaba por reforçar a realidade já existente (GOMES: 2011).

Rosiley C. M. Maia também defende que a Internet só se transformará em um espaço democrático de debate, se todos os cidadãos tiverem acesso igual às tecnologias e predisposição para tal. Do contrário, as barreiras digitais irão reforçar as assimetrias já existentes, ampliando o espectro dos excluídos (MAIA: 2011).

Segundo a própria Maia, esse problema só será resolvido com políticas públicas agressivas de inclusão digital, não só propiciando o equipamento, mas também educação para o uso do mesmo. Apenas com a população capacitada para utilizar as novas tecnologias, a Internet poderá ser considerada, de fato, uma ferramenta para participação democrática (Ibidem: 2011).

A exclusão digital também é tema de estudos transnacionais, que dividem as desigualdades de acesso à Internet em três tipos: global (entre países), social (dentro dos países) e democrática (mobilização e participação na vida pública) (NORRIS apud ARAUJO: 2001).

Outra questão recorrentemente levantada é que a Internet, embora seja um instrumento democrático, também pode sustentar formas extremas de centralização do poder (MAIA: 2011), uma vez que os produtos e os serviços do mundo virtual estão concentrados nas mãos de um pequeno grupo, que pode usar essa influência para expandir orientações antidemocráticas. Ademais, nem toda informação disponível na Internet é democrática ou promove a democracia, como ilustram os sites dos grupos que defendem a supremacia branca, skinheads, neonazismo etc.

Além de todas as barreiras já apontadas para a utilização da Internet como uma ferramenta para a participação política, existe mais um aspecto cultural que precisa ser superado: o desinteresse do cidadão pelo universo político. Para fortalecer a democracia, são necessárias não apenas estruturas comunicacionais eficientes, ou instituições propícias à participação, mas também devem estar presentes a motivação correta, o interesse e a disponibilidade dos próprios cidadãos para engajar-se em debater (MAIA: 2011).

Segundo João Canavilhas, a Internet e, especialmente, os diversos aplicativos criados pelas redes sociais prometiam ser uma alavanca para movimentos cívicos, facilitando a constituição de redes de pressão ancoradas numa relação virtual sem custos para os participantes. Mas a prática demonstra que as redes sociais estão a ser utilizadas para outras finalidades mais lúdicas (CANAVILHAS apud ARAUJO: 2009).

Wilson Gomes argumenta que, de acordo com o que se verifica da cultura política contemporânea, os indivíduos não estão propensos ao hiperengajamento, a integrar de forma constante e consistente os debates sobre temas políticos.

Pippa Norris expõe que a Internet não conseguirá criar uma cultura de participação política, pois a participação não existe na sociedade como um todo. Outro aspecto apontado é como quebrar a barreira da não participação política por meio da Internet? A fragmentação da Web, mais o crescimento de grupos minoritários, que agregam indivíduos sem interesses políticos, sem pontos de vista ideológicos comuns, torna o potencial das novas tecnologias para uma comunicação global muito fraco, não assegurando que pessoas de diferentes culturas irão conversar e trocar experiências entre si (NORRIS apud ARAUJO: 2001).

Não resta dúvida quanto ao fato de a Internet poderá proporcionar instrumentos e alternativas de participação política civil. Mas, por outro lado, apenas o acesso às

redes digitais não é capaz de assegurar o incremento da atividade política, menos ainda da atividade política argumentativa. “Flaming, conflitos, fragmentação, inconclusão, tudo isso além de qualquer limite racional, aparecem como constituindo a natureza da discussão online em um grande número de pesquisas empíricas sobre comunicação política por meio da Internet” (GOMES, 2011).

A Internet está dispersa entre todos os estratos da sociedade, sendo que o perfil estereotipado do usuário da Web, como sendo homem, com boa condição social, profissional e intelectual também está ultrapassado, sendo que cada vez mais mulheres e idosos aderem à Web (Ibidem: 2011).

Fica aqui o nosso indagar: as pessoas que se aproximam das novas tecnologias estão evoluindo reflexivamente e o uso das redes sociais está emergindo e ganhando força em termos de participação? Os cidadãos estão cobrando as promessas de seus candidatos eleitos como forma de validar e consolidar as instituições democráticas? Os questionamentos e respostas rápidas e curtas na rede dos eleitores e políticos dão a oportunidade para expressar suas reais opiniões e preocupações?

A tecnologia em si não é democrática ou antidemocrática, mas depende de como as instituições políticas vão aproveitar o seu potencial. O valor da participação democrática é constituído, segundo Camilo Aggio, a partir de duas questões-chave em campanhas eleitorais: Interatividade (a possibilidade de construção de ambientes digitais que possibilitem a interação entre eleitores e, eventualmente, entre estes e os candidatos) e Ativismo (recursos que possibilitam novas formas ou maneiras já conhecidas, porém otimizadas, de ativismo dentro das campanhas) (AGGIO: 2011), temas centrais na literatura sobre campanhas on-line que realmente acontece.

A literatura aponta novas dinâmicas de participação nas campanhas eleitorais nos espaços on-line, porém, deve-se levar em conta o papel da cultura política para a realização do potencial comunicativo e participativo dessas campanhas, mas esses

autores citados anteriormente não se posicionaram, tendo em vista a importância do tema para o fortalecimento democrático.