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A abertura econômica constituiu-se como uma das principais características da contra-reforma do Estado brasileiro realizada pelo governo FHC (1995/2002). Nesse período, grandes empresas multinacionais expandiram a sua presença no país, remetendo

uma parcela significativa de seus lucros para o exterior 353.

Além da desnacionalização no plano econômico, a política de abertura ao capital

estrangeiro 354 ocasionou, além de uma maior dependência em relação aos fluxos

financeiros internacionais, um crescimento elevado do endividamento interno e,

sobretudo, externo 355.

O início do programa de abertura econômica ocorreu, contudo, ainda no começo da década de noventa, com o governo Collor. Este foi marcado pela tentativa de implantação de uma política econômica alinhada diretamente com as recomendações do chamado consenso de Washington, sendo o primeiro governo responsável pela

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As remessas de lucro para o exterior saltaram de U$S 9,0 bilhões entre 1981/1990 para U$S 27,3 bilhões no período 1991/1999. Em 1994, as remessas totais de lucro das empresas estrangeiras no Brasil para as suas matrizes no exterior totalizavam U$S 2,5 bilhões. Dois anos depois, estes valores alcançariam U$S 3,8 bilhões e, em 1997, atingiriam U$S 6,5 bilhões. GONÇALVES, Reinaldo. Globalização e Desnacionalização. São Paulo: Paz e Terra, 1999, p. 75; ARÊAS, João Braga. Batalhas de O Globo (1989- 2002): o neoliberalismo em questão. 359 f. Tese (Doutorado em História Social). Programa de Pós- Graduação em História Social, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2012, p. 181.

354 Segundo Luiz Filgueiras, ―as distintas frações do capital devem ser identificadas e caracterizadas a partir dos distintos lugares e funções que diferentes conjuntos de capitais particulares ocupam e cumprem no processo de acumulação, em diferentes momentos da produção e reprodução do capital social – o que dá, objetivamente, a cada um desses conjuntos, internamente, uma forte unidade de interesses. Externamente, esses distintos lugares e funções de cada um dos conjuntos de capitais os colocam, potencialmente, em conflito entre si, apesar da condição geral de serem todos capitais e, por isso, possuírem o mesmo interesse na exploração do trabalho e a mesma lógica de caráter mais geral. Na prática existem, pelo menos, quatro modos – não necessariamente excludentes - de se identificar, caracterizar e distinguir as diversas frações do capital, quais sejam: 1) A distinção clássica a partir da oposição entre produção e circulação, que identifica, de um lado, diferentes formas de capital produtivo (agrário e industrial) e, de outro, distintas formas que podem ser assumidas pelo capital dinheiro (bancário e comercial); 2) A distinção pela origem ou procedência do capital: nacional, estrangeiro ou associado; 3) A distinção pelo tamanho do capital: grande, médio e pequeno; 4) E, por fim, a distinção pelo lugar de realização dos lucros: o mercado interno, o mercado externo ou ambos os mercados‖. In: FILGUEIRAS, Luiz. O Neoliberalismo no Brasil: estrutura, dinâmica e ajuste do Modelo Econômico. In: BASUALDO, Eduardo M e ARCEO, Enrique. (org.) Neoliberalismo y Sectores Dominantes: tendências globales y experiências nacionales. Buenos Aires: CLACSO, 2006, p. 180.

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Segundo Maria da Conceição Tavares, ―na década de 90, as autoridades monetárias deixaram entrar, sem controle, montantes crescentes de capital estrangeiro de todos os tipos. A liberalização comercial e financeira produziu um aumento brutal dos passivos externos do país, que dobraram nos últimos cinco anos, alcançando cerca de U$S 450 bilhões‖. TAVARES, Maria da Conceição. ―Desnacionalização e vulnerabilidade externa‖. In: Folha de S. Paulo. Lições Contemporâneas, 03/12/2000.

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―desregulamentação dos mercados financeiros e pela abertura comercial irrestrita‖ 356

. A partir de então, observa-se uma mudança nos rumos da acumulação de capital no Brasil, que seria ampliada e aprofunda com o governo FHC.

Entre as principais medidas de caráter neoliberal adotadas pelo governo Collor estavam as privatizações de empresas estatais e a liberalização econômica, tanto em

relação aos fluxos de mercadorias quanto de capitais 357.

A partir de Collor assistiu-se, portanto, a uma ―ruptura econômico-política que marcou definitivamente a trajetória do desenvolvimentismo no Brasil na década de 1990‖. Pela primeira vez na história brasileira, para além de uma política de econômica de estabilização monetária, surgiu ―uma proposta de um projeto de longo prazo, que articulava o combate à inflação com a implementação de reformas estruturais na economia, no Estado e na relação do país com o resto do mundo, com características

nitidamente neoliberais‖ 358

.

Embora o governo Collor tenha sido o responsável pelo início do processo de abertura econômica no começo da década de 1990, é somente no governo FHC que podemos constatar um nítido, amplo e profundo processo de desnacionalização da economia brasileira. Tal processo veio acompanhado da perda de posição relativa, tanto

das empresas estatais quanto das empresas privadas nacionais 359.

O capital estrangeiro desempenhou um triplo papel na estratégia econômica do governo FHC. Primeiramente, no contexto do extraordinário desequilíbrio do balanço de pagamentos e da vulnerabilidade externa do país, os investimentos estrangeiros

356 TAVARES, Maria da Conceição e FIORI, José Luís. Desajuste global e modernização conservadora. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993, p. 77.

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De acordo com José Márcio Rego, ―a abertura da economia brasileira intensificou-se a partir de 1990. O esgotamento do modelo de substituição de importações e a crescente desregulamentação dos mercados internacionais contribuíram para uma reestruturação da economia brasileira, influenciada pela redução das tarifas de importação e eliminação de várias barreiras não tarifárias. A tarifa nominal média de importação, que era de cerca de 40%, em 1990, foi reduzida gradualmente até atingir seu nível mais baixo em 1995, 13%‖. REGO, José Márcio e MARQUES, Rosa Maria. Economia Brasileira. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 184.

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FILGUEIRAS, Luiz. História do Plano... Op. cit., p. 84.

359 Segundo Reinaldo Gonçalves, ―A desnacionalização da economia brasileira significa que uma parcela crescente da produção e da renda interna é controlada por não residentes. Na medida em que esses não residentes têm fontes significativas de poder, o Estado nacional perde grau de manobra na definição de suas estratégias e implementação de suas políticas. (...) O ponto central é que o capital estrangeiro tem fontes internas e, principalmente, fontes externas de poder que o capital privado nacional não tem. (...) Em outras palavras, reduz-se a capacidade nacional de resistências a fatores desestabilizadores e choques externos. Assim, a desnacionalização econômica aumenta a vulnerabilidade externa do país por meio do que poderia se chamar de a economia política internacional do capital estrangeiro‖. GONÇALVES, Reinaldo. Globalização e... Op. cit., p. 17 e 134.

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