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A DOR E O TIPO DE FERIDAS

No documento A dor na pessoa com ferida crónica (páginas 36-39)

2. A pessoa com dor

2.3 A DOR E O TIPO DE FERIDAS

2. A pessoa com dor

35 psicológico dominante dos doentes com dor crónica é a depressão, corolário da perda de esperança na cura”.

A dor está muitas vezes associada a feridas, tornando a experiência de viver com uma ferida muito mais penoso. “A dor desempenha um papel importante no tratamento de feridas, controlá-la é essencial para o sucesso da cicatrização. (…) A diminuição ou eliminação da dor contribui para o sucesso do processo de cicatrização e consequentemente para a melhoria da qualidade de vida” (Alves, Costeira e Vales, 2009).

Segundo um estudo desenvolvido por Woo et al (2008), no qual se procedeu à análise de vários artigos, guidelines e estudos sobre dor associada à ferida crónica, por um grupo de diferentes profissionais experientes na área, a dor na ferida é influenciada por muitos fatores: dano tecidular (pressão, fricção e cisalhamento), irritação química, compromisso vascular (hipertensão venosa ou insuficiência arterial), agentes infeciosos ou inflamação anormal persistente.

Krasner (1995, citado em Dallam, Barkauskas, Ayello e Baranoski, 2004) conceptualizou a dor em feridas crónicas como uma experiência, desenvolvendo um modelo em que a dor é dividida em três subconceitos: não cíclica, cíclica e dor crónica. Segundo o mesmo autor:

“A dor não cíclica ou dor incidente é definida como um episódio único de dor que pode ocorrer, por exemplo, após o desbridamento de uma ferida. A dor cíclica ou dor episódica repete-se como resultado de tratamentos repetidos, como mudanças de pensos ou posicionamento ou reposicionamento. A dor crónica ou dor contínua é persistente e ocorre sem manipulação da ferida”.

O tipo de dor que uma pessoa com ferida experimenta, depende do tipo de ferida. De acordo com Woo et al (2008), deve-se assumir que todas as feridas crónicas são dolorosas, a não ser que a pessoa indique o contrário.

Em 1989, o Nacional Pressure Ulcer Advisory Panel, na sua primeira conferência, afirmou que “as úlceras de pressão são feridas graves e que causam dor considerável, sofrimento, incapacidade e até mesmo morte”. No entanto, a etiologia da dor na pessoa com úlcera de pressão não é conhecida, sendo atribuída, por alguns autores, à libertação de químicos nocivos pelo tecido danificado, erosão dos planos tecidulares com destruição dos terminais nervosos, regeneração dos terminais dos nervos nociceptivos, infeção, mudanças de penso e desbridamento. A dor nas úlceras de pressão não depende apenas do estádio da úlcera de pressão, mas igualmente se está a ser realizada a mudança de penso quando se faz a avaliação (Dallam, Barkauskas, Ayello e Baranoski, 2004).

2. A pessoa com dor

36 Por sua vez, a dor associada à doença arterial periférica por ser claudicação intermitente, a qual pode ocorrer à noite, quando as pernas da pessoa estão elevadas, ou em outros períodos de repouso.

“A dor de claudicação intermitente resulta do exercício ou atividade e tem sido descrita como um cãibra, queimadura ou dorido. O fluxo sanguíneo em exercício é inadequado para corresponder às necessidades dos tecidos; a escassa circulação resultante causa dor intermitente. A dor noturna pode ter os mesmos sintomas, mas usualmente precede a ocorrência da dor em repouso. A dor em repouso ocorre – mesmo sem atividade – quando o fluxo sanguíneo é inadequado para corresponder às necessidades dos tecidos das extremidades. É descrita como uma sensação de queimadura ou entorpecimento agravado pela elevação da perna” (Dallam, Barkauskas, Ayello e Baranoski, 2004).

A dor associada à úlcera de origem venosa é ampla pois a pessoa pode referir dor moderada, dor entorpecida, aguda ou uma dor muscular profunda. Devido ao edema dos membros inferiores, a dor é mais intensa ao fim do dia. As úlceras de origem venosa são subsequentes a uma redução ou mesmo oclusão do retorno venoso ao coração, podendo produzir dor aguda e prolongada. A elevação das pernas, o uso de meias de suporte, evitando longos períodos de tempo sentado, são essenciais para o tratamento e controlo de dor neste tipo de ferida (Dallam, Barkauskas, Ayello e Baranoski, 2004).

No que concerne às úlceras de origem neuropática, a quantidade de dor presente depende da gravidade da neuropatia. A qualidade da dor pode ser dorida, queimadura, aguda e pode incluir sensibilidade cutânea e prurido. No caso de a pessoa apresentar dor excessiva num membro neuropático, onde não tinha dor anteriormente, deverá ser considerada a hipótese de existir infeção (Dallam, Barkauskas, Ayello e Baranoski, 2004).

Componentes da dor

Na perspetiva de Metzger, Muller, Schwetta e Walter (2002), independentemente da origem e tipo de dor, para que possamos compreender a experiência da mesma, é importante compreender que esta tem várias componentes: a componente sensório- discriminativa, a componente afetiva e emocional, a componente cognitiva e a componente comportamental. A componente sensório-discriminativa consiste em aspetos quantitativos e qualitativos da sensação dolorosa, permitindo identificar as possíveis causa da sensação dolorosa. Esta componente é frequentemente evidenciada pelos doentes na dor aguda. Por sua vez, a componente afetiva e emocional corresponde aos aspetos penosos e desagradáveis da dor, isto é, ao modo como a pessoa se sente. Esta componente depende do

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37 carácter e personalidade do doente. É mais frequentemente evidenciada nas situações de dor crónica, ou no caso de descompensação psicopatológica. Relativamente à componente cognitiva, esta envolve os processos mentais provocados pela dor, isto é, os significados que o doente lhe atribui de forma consciente ou não, o que é, naturalmente, influenciado não só por fatores sócio-culturais, mas também pela história pessoal e familiar do utente. Por último, a componente comportamental engloba as manifestações de dor conscientes ou não. A manifestação da dor implica que os outros tomem conhecimento da dor, pedindo, explicitamente ou não, que nos compreendam e aliviem, procurando recuperar o controlo da situação. Tendo em conta o que foi referido sobre as componentes cognitiva e afetivo- emocionais, é compreensível que, apesar de um mesmo mecanismo e de uma mesma causa de dor, os doentes não se queixem todos da mesma maneira.

Para se poder fazer uma abordagem e um controlo eficaz da dor, é necessário conhecer as suas diferentes dimensões, pelo que é essencial fazer uma correta avaliação da mesma, sem cair no erro de comparar a dor de uma pessoa com a dor de outra, ou de julgar a dor da pessoa de acordo com o nosso quadro de referências.

Segundo Metzger, Muller, Schwetta e Walter (2002), a avaliação da dor torna-se essencial não só porque, tal como foi referido anteriormente, não há uma relação proporcional entre a importância da lesão e a dor referida pelo doente, mas também porque não existem marcadores para a dor, o que contribui para a sua subjetividade. De acordo com os mesmos autores, a qualidade da avaliação da dor, depende da riqueza das informações obtidas junto do doente. De acordo com Dallam, Barkauskas, Ayello e Baranoski (2004), existem diferentes dimensões que devem ser avaliadas quando pretendemos fazer uma avaliação correta da dor: fatores paliativos/causadores, qualidade da dor (tipo), região e irradiação da dor, gravidade da dor (intensidade) e aspetos temporais da dor.

Na perspetiva de Metzger, Muller, Schwetta e Walter (2002), a recolha de dados baseia-se na história da dor vivida pelo doente, devendo englobar os seguintes aspetos: história de vida do doente; circunstâncias em que a dor aparece; história da dor; localização da dor; qualidade da dor; frequência da dor; intensidade da dor e repercussão sobre as atividades diárias e sobre a qualidade de vida.

No documento A dor na pessoa com ferida crónica (páginas 36-39)