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Alteração nos Fatores Socio-culturais

No documento A dor na pessoa com ferida crónica (páginas 90-108)

PARTE II – ENQUADRAMENTO METODOLÓGICO

5. Apresentação e análise dos dados

5.3 O IMPACTO DA DOR NAS DIFERENTES ATIVIDADES DE VIDA DA PESSOA COM FERIDA CRÓNICA

5.3.6 Alteração nos Fatores Socio-culturais

5. Apresentação e análise dos dados

89 E o seu marido? Ah! Ele já é assim mais... Às vezes nem pergunta como é que vai. Vá lá,

perguntou ontem. (…) Mas tenho pena que ele seja assim. Sinto-me por vezes sem apoio. É triste ele não se preocupar”. (E11)

“Às vezes pensava que era mesmo alguma coisa má. Que como me doía tanto, era uma doença grave. (…) Tentava esquecer e... Depois entretanto também houve o casamento do filho. Depois nasceu o neto. Foram coisas boas que me ajudaram a esquecer os pensamentos menos bons”.

(E11)

“Falo com a minha filha mais velha. Ela dá-me muito apoio”. (E1)

“Antes do meu marido morrer, eu já tinha isto nas pernas. Ele coitadinho é que me ajudava: "Deixa lá. Tens que te conformar. Deixa lá. Tem que se dar tempo ao tempo. Mal seja que não te aches melhor”.” (E3)

“Com quem é que desabafa nesta alturas, em que está mais atrapalhada com a dor? Tenho o meu companheiro. Falo muito com ele”. (E2)

“Olhe, às vezes vai lá o meu irmão ver-me. Desabafo com a minha mulher. (…) E esse apoio ajuda-me muito a ultrapassar os momentos de maior sofrimento. O meu irmão, se não me pode ir ver, telefona a saber como estou”. (E7)

Alguns dos entrevistas, quando questionados sobre com quem é que desabafam, muitos relembram familiares que lhes eram próximos e de quem sentem saudades, assumindo os mesmos uma figura de apoio e força, apesar de já terem falecido.

“Com os meus pais que já lá estão. Falo com eles. Peço-lhes ajuda. A vida tem sido muito complicada. As pessoas que a gente mais gosta vão-se”. (E4)

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“Eu quando me sinto apertada, só chamo por uma pessoa, que é a minha avó. Deus a tenha em descanso”. (E1)

No entanto, apesar de a família ser referida como fonte de apoio, nem sempre a relação entre a pessoa com ferida crónica e a família é fácil, por causa das limitações e emoções que a situação causa. “A doença de um membro representará uma ameaça para a manutenção da unidade familiar. A doença exigirá alteração de funções, de forma a ser mantida a unidade familiar se o membro doente não for capaz de desempenhar as atividades habituais incluídas no seu papel. (…) Quando a família tem um membro a sofrer de doença, todos os membros sofrem de ansiedade e stress. Como consequência destas preocupações, os membros da família referem sentimentos de medo, desamparo, vulnerabilidade, insegurança, frustração e depressão” (Luckmann e Sorensen, 1998).

“Sinto falta de sair com a minha família. E ele (marido) fica revoltado comigo. (chorosa) E ele não é muito atencioso comigo”. (E1)

“A sua filha é que a trazia aos tratamentos? Sim. Trazia-me. Mas eu via que isso lhe transtornava a vida. Custava-me. Agora venho na carrinha do Centro de Dia. Já não é preciso ela cá vir por isso. Para não estar a sobrecarregá-la tanto”. (E10)

“Mas acha que a partir do momento em que deixou de trabalhar, a relação com o seu marido

alterou-se? Sim. Deixou de ter respeito. Ele queria que eu andasse lá a trabalhar e ganhasse

dinheiro, mas não posso estar muito tempo em pé. Tenho que me sentar, senão dói-me muito”.

(E9)

“A minha filha também tem muitos problemas, porque ela se enerva muito comigo. (…) Mas ela está é nervosa, porque ela coitada é que apanha tudo. Até lá no café é com ela que fazem comentários”. (E1)

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91 A combinação entre os efeitos da dor persistente associada à ferida e o aparecimento súbito de dor intensa são debilitantes, sendo difícil aos pacientes lidar com a imprevisibilidade da dor, manifestando-se ainda relutantes em falar sobre a dor com amigos e familiares (Mudge et al, 2008).

É ainda importante referir que apesar do apoio dos familiares, as pessoas nem sempre estão dispostas a manifestar a dor que sentem e o sofrimento que esta lhes causa, por receio de se tornarem repetitivos, queixando-se constantemente e, além disso, também pretendem evitar preocupar aqueles que lhes querem bem.

“E quando estava mais aflita com dores, com quem é que desabafava? Sozinha. Chorava. Chorava. Porque isto é assim, as minhas irmãs, esta e a outra, de facto são muito amigas, mas não as quero preocupar”. (E10)

“O meu marido às vezes vê-me triste e diz-me assim: O que é que tu tens? Não tenho nada. Se eu lhe vou estar sempre a dizer: doí-me aqui, doí-me acolá, doí-me no outro, doí-me assim. Como é que é?

Mas com quem é que desabafa sobre a dor? Não tenho ninguém. Tenho-o a ele mas também

não pode ser sempre. Os meus filhos coitadinhos. O meu filho não me pode ver chorar. Fica logo todo aflito. A minha filha está na casa dela, também já pouco... Quer dizer, vimo-nos mais de passagem. (…). Eu por vezes tento esconder ao meu marido o que estou a sentir, para não o preocupar”. (E4)

“E com quem é que desabafa? Só com Deus. Com mais ninguém. Às vezes vou para o café, mas não vou lá falar destas coisas de dores e assim. Vou lá para me distrair”. (E12)

Muitos dos entrevistados, também recorreram à sua fé em Deus para conseguirem suportar a dor na ferida e o impacto que isso tem na sua vida.

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“A saúde espiritual de uma pessoa é o estado de equilíbrio que transcende as coisas materiais e físicas. Revela recetividade para aceitar uma força superior tal como o individuo o define. Para a maioria das pessoas, essa força superior é definida como uma força sobrenatural ou Deus tal como as crenças religiosas o concebem. A relação entre a saúde fisiológica, a saúde psicológico e a saúde espiritual é intricada. Embora esta relação varie conforme os indivíduos, a verdade é que, geralmente, a saúde espiritual pode afetar a saúde física e mental e inversamente, uma crise física ou mental pode dar origem a uma crise espiritual” (Luckmann e Sorensen, 1998).

Assim sendo, como a dor associada à ferida provoca sofrimento não só físico, mas afeta também as AV’s de cada individuo e a sua família, daí a necessidade de recorrerem à sua fé em Deus para lidarem com estas dificuldades.

“Eu cá, às vezes ponho-me assim: "Ó meu Deus. Conforme dá a chaga, dá a mezinha”. Pois, dá-me este conforto, não é? É que há pessoas piegas”. (E5)

“Quer dizer, desabafa sozinha? Com Deus”. (E4)

“Mas a minha perna vai ao sítio. Vai. É preciso é ter fé no Senhor. (…) Eu já sei que tenho dor. Ninguém ma vai tirar senão o nome de Deus. Que é a quem eu peço”. (E12)

“Depois rezo aos santinhos para me darem força e coragem, para eu me animar. Para levar a minha cruz às costas”. (E10)

“Às vezes pensava que era mesmo alguma coisa má. Que como me doía tanto, era uma doença grave. Mas depois: "Tens que esquecer isso que há-de ser o que Deus quiser. Vá. Vá. Vá. Esquece. Esquece”.” (E11)

“Quer dizer, desabafa sozinha? Com Deus (…) Posso dar graças a Deus. Embora às vezes a gente diga assim: "Não tenho ninguém”. Mas é mentira. Porque no fundo a gente tem. E há quem não tenha mesmo ninguém. (…) O bichinho está lá. A dor está lá. A gente às vezes mostra uma cara de riso, mas sabe Deus o que lá está dentro”. (E4)

“Já cá não tenho com quem desabafava mais, que era a minha filha que Deus tem.

(…) E agora desabafa com quem? Com a minha irmã. É uma pessoa excecional. E com a minha filha. A outra que está no Entroncamento. Mas falo muito com esta irmã que eu tenho. É muito boa irmã para comigo. Eu já tenho dito assim. Deus tirou-me uma filha, mas parece que me

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deixou cá outra”. (E8)

Mas tal como foi referido anteriormente, se por um lado a fé em Deus ajuda a ultrapassar momentos de crise, pode também ser posta em causa numa mesma situação. Tal experiência foi relatada por uma das entrevistadas.

“Eu dantes ia muito a Fátima. Retirei-me desses locais todos.

Mas deixou de ir a Fátima porquê? Porque deixei de acreditar. Por tudo o que se tem passado

e por esta ferida, que me faz sofrer. Quando vinha de lá sentia-me em paz”. (E1)

De forma a reduzir o impacto da dor nas Atividades de Vida da pessoa com ferida crónica, contribuindo para a melhoria da sua qualidade de vida, é necessário um controlo eficaz da dor.

Para que seja possível fazer o controlo da dor associada à ferida, é necessário não só recorrer a intervenções farmacológicas, mas também a técnicas não farmacológicas de alívio da dor.

Na medida em que a maioria das pessoas entrevistadas apresentam úlceras de perna de origem venosa, o edema é um problema comum entre eles, o qual deve ser controlado o melhor possível para ajudar a controlar a dor associada à ferida. “Controle o edema para evitar a diminuição do fluxo sanguíneo, que pode conduzir a dor adicional” (Dallam, Barkauskas, Ayello, Baranoski, 2004). Assim sendo, é frequente serem recomendados a repousarem com o membro afetado elevado, o que muitos tentam cumprir.

“Tento fazer as coisas de manhã, mais ou menos. Pronto. O indispensável. (…) E à tarde... Tento estar "sentadinha" no sofá com uma cadeira destas. Ponho uma almofada para estar com a perna mais alta.

Quando está com mais dor, o que é que lhe alivia a dor? Só me puxa para estar deitada com a

perna no ar”. (E11)

“Enrolava um cobertor. Punha-o pela parte debaixo do colchão. Lá estava eu com a perna um

5.4 CONTROLO DA DOR

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bocadinho mais alta”. (E5)

“Esta ferida piorou quando tirei duas grades de cerveja lá do café. E ela (enfermeira) disse-me logo: A Isabel andou a fazer força. Nunca mais peguei em grades de cerveja”. (E1)

“Tenho um tijolo na cama. E depois ponho um travesseiro para estar com a cama para cima. Não me dói tanto. Não me dói tanto assim”. (E2)

“Ponho uma almofada, um travesseiro na cabeça e ponho almofadas mais altas para ter as pernas mais altas que cabeça, para fazer o sangue deslizar para baixo, porque como me disseram aqui, faz bem. E também me ajuda a reduzir a dor”. (E7)

“Estou todo o dia com as pernas mais altas que o corpo. (…) Assim com as pernas levantadas, a dor parece que ia sempre aliviando”. (E10)

“Eu venho fazer o penso. Vou para casa. Acabo de almoçar e não vejo mais nada que não a cama. Não é para dormir. É só para descansar. Enquanto tiver a perna inchada, dói-me sempre”. (E12)

No entanto, apesar de saberem as vantagens de repousar com o membro elevado para aliviar a dor associada à ferida, nem sempre cumprem essa recomendação, alguns por necessitarem de trabalhar, outros por necessitarem de cuidar dos filhos e da casa. Naturalmente, esta dificuldade em cumprir o repouso por estas razões, verificou-se nos entrevistados em idade ativa.

“Se eu pudesse estar sentada de perna direita uns dias... Mas tenho que trabalhar para ganhar, senão não posso comprar os medicamentos e outras coisas. (...) Se eu pudesse colaborar um bocadinho mais em termos de descanso, eu sei que também era melhor. Mas eu sei que é. Eu sei. Só que eu tenho que trabalhar para manter a casa e ajudar os filhos”. (E4)

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“Para a dor a médica diz que eu havia de estar sempre com a perna para cima. Só que eu acho que quem tem filhos para tratar e quem tem uma casa para tratar, não posso fazer isso, né?”

(E2)

“Faço um bocadinho de repouso, mas também não posso sempre. Tenho três homens em casa. Já tive lá cinco, com a miúda”. (E6)

Um dos entrevistados refere que não consegue cumprir o repouso com a perna elevada, pois esse tratamento entra em conflito com o tratamento recomendado para a apneia do sono e para outras patologias cardíacas das quais padece.

“Sabe que eu tenho um aparelho de respiração. Quanto mais alto tiver a cabeça melhor é. Eu uso o travesseiro e duas almofadas. (…) Se eu puser a perna levantada abafo logo daqui (peito). Portanto, antes prefiro a perna a doer do que abafar daqui”. (E12)

Quanto ao controlo da dor recorrendo à toma de medicação, nem todos os entrevistados se encontram dispostos para tomar analgésicos. As pessoas estão frequentemente relutantes em discutir a dor associada à ferida e em tomar uma dose efetiva de medicação analgésica. Muitas das preocupações das pessoas incluem medo de adição sem fundamentação, ou que os bons pacientes não se queixam e ainda que os profissionais de saúde devem saber quando estão com dor (Woo et al, 2008).

“Foram-lhe receitados medicamentos paras as dores? Sim, sim. Mas eu não me dava com eles. Não me sentia bem com eles.

E falou com o médico para mudá-los? Não. Não quis incomodar. As dores mais tarde ou mais

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96 No estudo realizado por Mudge et al (2008) foi referenciado, frequentemente pelos indivíduos do estudo, a preocupação em usar prolongadamente medicação analgésica e ainda receio de polimedicação. Santos et al (2010) salienta ainda, como fatores que afetam o nível de adesão do indivíduo: conhecimento insuficiente, crenças negativas em relação à eficácia da terapêutica, inquietações acerca de possíveis efeitos adversos, medo de dependência de “drogas”, entre outros. Estes aspetos estiveram patentes em diferentes entrevistas realizadas neste estudo.

“Mas como tem dor associada à ferida que não passa com o paracetamol, porque é que não

pede ao seu médico de família para lhe passar outro medicamento mais forte? Não pode ser. É

que eu tenho arritmia cardíaca.

Então tem receio de tomar medicação para a dor, mais forte, por causa de toda a medicação que o senhor toma? Pois. Pois”. (E7)

“Para tomar comprimidos já basta agora. Tomo tanto, não é? Mas, eu penso que se eu me visse muito aflita com dores, tinha que ir pedir uns quaisquer, que eles entendessem que eu podia tomar junto com estes que eu agora ando a tomar. Porque eu quando tive o enfarte, a médica receitou-me uns comprimidos que eu tinha que tomar só seis meses. E então, junto com os outros de manhã ao pequeno-almoço, era um para a tensão e era esse e era outro. Um daqueles, “combatia” com outro. Parecia eu que me estava a passar”. (E5)

“E medicação para as dores? Pouco. Olhe, era o Bem-u-Ron. Só isso.

E fazia efeito? Nenhum. Eram uns atrás dos outros. Eu admira-me esta dor não passar com

isso. Eu fui operada à vesicula e eu tomava-os, e desaparecia-me a dor. A dor é diferente. A dor é diferente”. (E6)

“Eu também estava sempre a evitar tomar comprimidos com medo que me fizessem mal ao estômago. Como fui operada, tinha medo e então preferia sofrer com as dores. E fazia assim. Às vezes nem tomava. Andava ali o resto do dia. E pronto. Aquilo acabava também por abrandar mais. Pronto”. (E10)

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97 Não se poderia deixar de salientar que alguns dos entrevistados referiram razões de ordem económica para não poderem aderir ao regime medicamentoso prescrito para o controlo da dor. “A adesão ao aconselhamento médico pode ser influenciada por fatores económicos e sociais. (…) Embora o estatuto socioeconómico não tenha sido encontrado de forma consistente como preditor independentemente de adesão, nos países em desenvolvimento verifica-se que o indivíduo portador de um baixo estatuo socioeconómico, confronta-se com a problemática de optar por prioridades, que incluem os limitados recursos disponíveis para satisfazer as necessidades do seu núcleo familiar” (Santos et al, 2010).

“Vivo com o ordenado do meu companheiro. Não é muito mas pronto. Não dá para certas coisas. Eu já tomei esse medicamento. Só que cheguei a um ponto em que disse: "Não. Eu não posso tirar de comer à casa para medicamentos”. E foi quando isto começou a ficar pior. Que a minha médica diz que eu vou ter que tomar aquele medicamento sempre. Só que é um medicamento caro. Não é comparticipado”. (E2)

“Às vezes a senhora enfermeira vai assim: " Vá ali ao Dr. a ver se ele lhe receita alguma coisa para as dores”. Tenho lá três receitas para levantar mas não tenho dinheiro. Não posso trabalhar. Nunca mais vou poder trabalhar. A minha vida acabou-se. (…) Vim aqui ao médico de família pedir comprimidos para as dores. Pedi ao meu homem para comprar, porque eu tenho lá a receita, mas ela já não presta. Já passou do prazo. A minha filha diz que já passou do prazo. Ele diz que não tem dinheiro”. (E9)

“A gente vê-se assim. Viver assim com necessidades... Eu tenho alturas em que não levanto os medicamentos porque não posso gastar dinheiro. E vai suceder muita vez”. (E6)

Hollinworth (2005) refere ainda que a analgesia deveria ser administrada antes do tratamento, como forma de reduzir a dor que o utente experiência durante o tratamento. Para além de tomarem analgésicos antes do tratamento, para reduzir a dor durante o mesmo, alguns dos entrevistados tomavam-nos também um pouco antes de dormir, para aliviar a dor e adormecerem

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98 mais facilmente.

“Tomei um comprimido para as dores antes de vir. Porque já estava a senti-la. Estava a almoçar. (…) Depois vou com o efeito para o tratamento. À noite tomo outra vez. Para dar para a noite. É assim que tenho gerido a medicação”. (E4)

“Eu de manhã tomei, é sempre, um para a circulação de sangue e à noite tomo outro. E para as dores é logo de manhã antes de vir.

E esse medicamento para as dores, toma antes de vir ao tratamento porquê? Que é para não

me doer. (…) Para dormir à noite, quer dizer, quando estou para me ir deitar, se eu tenho muita dor tomo o tal comprimido e vai amainando. Depois adormeço”. (E3)

“Tomo sempre um comprimido para as dores antes de dormir. Ou mais forte, ou mais fraco, tomo. Se tiver muita dor tomo o mais forte que é para ver se não me acorda de noite. Depois tenho assim que gerir. Tenho sempre esses medicamentos assim”. (E2)

A dor é um fenómeno multidimensional que para ser corretamente controlado, tem de ser compreendido e para tal é necessário entender quais os fatores que o influenciam.

Alguns dos entrevistados identificaram que a dor se tornava mais acentuada quando a ferida estava infetada, pelo que associavam o facto de sentir mais dor à possibilidade de estarem a desenvolver uma infeção. Esta ideia é corroborada por Alves, Costeira e Vales (2009) ao referirem que a dor pode ser indicador de infeção, tendo vários estudos demonstrado que a infeção pode aumentar a gravidade da dor associada à ferida.

“Aqui há três... Nem tanto. Três meses. Tive uma infeção. E eu noto logo. (…) Porque ela dói- me. Parece que está ali um cão mesmo ali a esfarrapar... Pronto. (…) Quando sentia muita mais

5.5 FATORES QUE INFLUENCIAM A DOR

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dor na ferida pensava logo que poderia ser uma infeção na ferida ou no osso”. (E11)

“Ai, isto é dores horríveis. Quando isto começa a aparecer. No início, quando está com as infeções é da gente morrer com dores”. (E8)

Outros referem ainda o edema como fonte de adicional de dor associada à ferida. Esta ideia é também partilhada por outros participantes num estudo desenvolvido por Phillips et al (citado em Baharestani, 2004), que apresentam úlceras de perna e descrevem a sua mobilidade como adversamente afetada pela sua úlcera e, o edema era considerado como sendo o fator dominante.

“Dantes só me enrolavam a perna até aqui (meio da perna), e a menina não sabe o que eu passava com dores. Inchava e eu parecia que nem tinha sangue cá em baixo”. (E6)

“O inchaço faz com que a ferida me faça doer”. (E7)

Por sua vez existem ainda outros fatores referidos pelos entrevistados que influenciam a dor na ferida, mas que se relacionam com o tratamento da ferida em si. “A dor desempenha um papel importante no tratamento de feridas. Controlá-la é essencial para o sucesso da cicatrização”. (Alves, Costeira e Vales, 2009) Segundo Solowiej, Mason e Upton (2009), num estudo realizado com pacientes cirúrgicos, verificou-se que a dor pós-cirúrgica persistente, é um bom preditor do tempo de cicatrização, isto é, quanto mais tempo persiste a dor, mais tempo demora a cicatrização.

A dor que acompanha a troca do penso anterior pode ser intensa à medida que o novo tecido é “arrancado”, devido a uma seleção inapropriada do penso que foi colocado anteriormente. A pele circundante pode estar friável devido à remoção frequente de pensos que aderiram, ou por pensos que não têm o perfil de absorção necessário. A experiência da dor pode ser exagerada por falta de conhecimento sobre a correta abordagem da ferida e seleção do penso a colocar. (Benbow, 2006)

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“A senhora enfermeira tira-me o penso, parece que aquilo está pegado. Dói-me. Quando ela está a lavar, também me dói. (E9)

“E quando é para retirar as ligaduras? Isso é... Fico logo retraída”. (E1)

Alguns dos entrevistados associam a dor que sentem na remoção do penso, ao facto de serem

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