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A economia da diversificação de Penrose e sua expressão no setor vitivinícola

De acordo com Penrose (1979), uma firma altamente especializada, pouco ou nada diversificada, encontra-se mais vulnerável às mudanças no ambiente capitalista do que aquela que diversifica sua produção. Sendo que, as transformações que acontecem no ambiente capitalista e que redefinem os parâmetros da competição, ocorrem, majoritariamente, quando há a possibilidade de ocorrerem alterações nos gostos dos consumidores ou nas tecnologias de produção da indústria na qual a firma se insere25. Como salvaguarda, as firmas podem, em muitos casos, fazer uso mais lucrativo de seus recursos ao diversificarem sua produção.

Contudo, para que surjam as necessidades de diversificação não é necessário que os mercados em que a firma opera se tornem menos lucrativos a novos investimentos que ela possa vir a realizar. Basta que se tornem relativamente menos atraentes em comparação com a lucratividade possível de ser obtida em outro mercado26. Estímulos para realização de novos investimentos, nos quais se inserem as diversificações, podem acontecer tanto no ambiente externo à firma, quanto interno. E nesse sentido, mudanças ocorridas no ambiente externo e que derivam das ações dos concorrentes, possuem força para alterarem também os patamares em que se estabelece a competição.

Para Penrose (1979, p. 9):

[...] uma firma diversifica suas atividades sempre que, sem abandonar completamente suas antigas linhas de produtos, ela parte para a fabricação de outros, inclusive produtos intermediários, suficientemente diversos daqueles que ela já fabrica, e cuja produção implique em diferenças significativas nos programas de produção e distribuição da firma. A diversificação compreende, desta maneira, incrementos na variedade de produtos finais fabricados, incrementos na integração vertical e incrementos no número de áreas básicas de produção nas quais a firma opera.

25 Com relação às motivações que conduzem as alterações nos gostos dos consumidores de vinhos finos, encontra-se

uma seção mais detalhada no final deste capítulo.

26 Mercados são, na análise de Penrose (1979), classificados de acordo com o tipo de consumidor, ou seja, se são

donas de casa, funcionários públicos, aposentados, etc. Uma área de mercado, por sua vez, refere-se ao grupo de clientes influenciados pelo mesmo programa de vendas, independentemente do número de produtos a eles vendidos.

Em linhas gerais, para algumas das cantinas do Vale dos Vinhedos, o reconhecimento da importância da diversificação surgiu como uma alternativa para transpor a queda da lucratividade no mercado de vinhos finos brasileiro, que se agravou justamente em meados da década de 1990, quando a integração do Brasil ao MERCOSUL passou a expor os vinhos nacionais a concorrência de produtos oriundos de países onde o vinho possui maior importância nos hábitos de consumo da população e, em geral, é produzido em escalas maiores e com menores custos, como é o caso de muitos vinhedos chilenos e argentinos. Na Argentina, por exemplo, o vinho é um elemento cotidiano na mesa de grande parte da população, o que justifica, tanto o alto consumo per capita desta bebida, 55,9 litros ao ano, como o tamanho do parque vitivinícola argentino, muito maior do que o brasileiro27. (Lapolli et al, 1995).

Cabe ressaltar que o clima seco da região dos Andes favorece o não surgimento dos fungos que atacam as videiras28, o que implica na necessidade de poucas aplicações de defensivos. Ao contrário da úmida região da Serra Gaúcha, onde o controle eficiente das doenças da videira implica em uma combinação mais onerosa de métodos de proteção29.

Além disso, na maioria dos vinhedos comerciais ao norte de Santiago, no Chile, e na região de Mendoza, na Argentina, a mecanização é largamente utilizada. Pelo que, a produção de vinhos, nesses locais, parece corresponder ao padrão de consumo e de produção em massa, característico do Fordismo e da Revolução Verde30. Ou seja, a “grande unidade de controle em larga escala” de que falava Schumpeter (1984).

27 O fato de o setor vitivinícola argentino ser maior do que o brasileiro implica, por exemplo, que a produção de

insumos para a indústria vinícola argentina se realize em uma escala também maior, reduzindo-se portanto o custo destes insumos. O caso das garrafas talvez seja o exemplo mais emblemático.

28 Duas, das principais doenças fúngicas, que costumam atacar as videiras são: o míldio e o oídio. Sendo que, quanto

maior a umidade e menor a luminosidade, mais propensa a parreira a adquirir infecções destes fungos. Infecções de míldio podem ser graves quando o período de água livre [chuva, orvalho ou nevoeiro] for superior a três horas. As mais graves infecções desta doença ocorrem quando um inverno úmido é seguido de uma primavera também úmida e de um verão chuvoso. O clima da Serra Gaúcha é muito mais úmido do que o andino, e por isso a necessidade maiores aplicações de defensivos, o que encarece a produção.

29 Com os adequados cuidados para que estes tragam o mínimo possível de reflexos negativos ao meio ambiente sem

perder a viabilidade econômica

30 De acordo com Abramovay (1998), o termo fordismo é adaptado de Gramsci e envolve o princípio de uma

articulação do processo de produção e do modo de consumo, constituindo a produção de massa. Antes do fordismo, produção e consumo eram desarticulados, sendo que os salários eram bastante baixos e as jornadas de trabalho muito longas, o que fazia com que os trabalhadores fossem a força motriz do sistema pelo seu trabalho e não pelo seu consumo. O fordismo implica em um aumento espetacular da produtividade, mas, sobretudo a criação de novas normas de consumo que se tornariam essenciais para a acumulação capitalista. Segundo Ortega (2005) a Revolução Verde está relacionada à introdução de um pacote de inovações que aumentou significativamente a produtividade na

Devido o tamanho – as propriedades da Serra Gaúcha possuem em média 24 ha – e ao relevo fortemente acidentado, a mecanização do setor vitivinícola encontra empecilhos a sua plena implementação na região serrana do Rio Grande do Sul. Com isso, os produtores desta zona vitivinícola costumam arcar com custos mais elevados de produção, especialmente em relação aos que se verificam no Chile e na Argentina. Dessa forma, necessitam escapar a competição por preços com os vizinhos do Mercosul.

Em suma, os custos de produção na Serra Gaúcha são bastante superiores aos que se verificam no Chile e na Argentina, seja pelo clima, pela escala de produção, ou pela topografia do terreno onde se encontra a maioria das propriedades vitivinícolas no Rio Grande do Sul.

A análise da diversificação proposta por Penrose (1979) adota, basicamente, dois tipos de especialização da firma, em que podem se dar àquela ação: Na diversificação da produção e no posicionamento mercadológico.

Nesse sentido, cada tipo de atividade produtiva utiliza uma base tecnológica ou base de produção, sendo que esta compreende as máquinas, os processo, as habilidades e as matérias- primas que são utilizados no processo produtivo pela firma.

A firma estará diversificando quando:

 Expandir o conjunto de produtos que oferece ao seu mercado, utilizando-se da mesma base tecnológica;

 Entrar em novos mercados, com os mesmos produtos e mesma base tecnológica;  Entrar em novos mercados com novos produtos, e mesma base tecnológica;

 Expandir o mercado em que já atua, com novos produtos de base tecnológica diferente;

 Entrar em novos mercados, com novos produtos, e base tecnológica diferente. No caso dos produtores que se associaram a APROVALE, a Indicação de Procedência do Vale dos Vinhedo implicou, num primeiro momento, na modificação da base tecnológica, com o aumento na qualidade da matéria-prima através da reconversão dos vinhedos para variedades viníferas, da utilização de mudas selecionadas, de insumos de qualidade, de sistemas de

agricultura. Nesse novo padrão tecnológico encontram-se sementes geneticamente modificadas, maquinários e insumos químicos, sobretudo fertilizantes e fitossanitários.

condução31 mais eficientes e da restrição de produtividade máxima por hectare. Também ocorreu a modificação no maquinário utilizado, principalmente a partir da utilização de tanques de aço inoxidável e do melhoramento das leveduras utilizadas na elaboração do vinho. Tudo isso acabou por gerar um produto de melhor qualidade. Ou seja, ampliou-se o mercado existente com novos produtos e nova base tecnológica.

Posteriormente, com o crescente reconhecimento do selo de Indicação de Procedência do Vale dos Vinhedos (I.P.V.V.), os produtores dessa região passaram a colocar seus produtos em nichos de mercados mais exigentes, como o europeu. Em outras palavras, entraram em novos mercados, com novos produtos e nova base tecnológica. Não obstante, ainda incrementaram a pauta de produtos oferecidos através do enoturismo. Neste caso, trata-se de um produto oferecido pelo território, e não apenas pelo setor vitivinícola. Embora tenha sido este o responsável pela introdução deste novo produto no mercado turístico brasileiro, como veremos no capítulo 4.

Em relação à fronteira entre um mercado e outro Penrose (1979, p. 10) enfatiza que:

[...] a importância das fronteiras está no fato de que o impulso em direção a uma nova área exige uma concentração de recursos no desenvolvimento de um novo tipo de programa de vendas e capacidade para enfrentar um tipo diferente de pressão competitiva.

Não obstante, como veremos adiante, o enoturismo, ou seja, o turismo do vinho, está, entre outras coisas, fortemente ligado ao desenvolvimento de um novo programa de vendas por parte das vinícolas do Vale dos Vinhedos.

31 Como a videira é uma planta trepadeira ela precisa de suportes para poder crescer. Pois, justamente esses suportes,

são chamados de sistemas de condução. Mais detalhes sobre os sistemas de condução são expostos no próximo capítulo.

2.2 Oportunidades para diversificação e a importância da pesquisa científica a partir de