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Capítulo 3 O território Vale dos Vinhedos

3.4 Desenvolvimento endógeno e capital social

De acordo com Vázquez Barquero (1999; 2001), o processo de globalização aumentou a concorrência nos mercados locais, o que fez com que empresas e regiões necessitassem organizar uma resposta que, por assim dizer, minimizasse os efeitos negativos desse aumento da competição sobre a sobrevivência das firmas locais. Entretanto, as empresas não competem sozinhas, de forma isolada, mas o fazem em conjunto com o entorno institucional e produtivo no qual se inserem. Assim:

A melhoria da produtividade e da competitividade das cidades depende da introdução de inovações nas empresas, da flexibilidade e organização do sistema produtivo e da existência de instituições que contribuam para o funcionamento dos mercados. (VÁZQUEZ BRAQUERO, 2001, p. 15).

Além disso, para o referido autor, a questão central a respeito da dinâmica e da mudança estrutural das economias locais está em identificar os processos de acumulação de capital que, por sua vez, são as molas que impulsionam o desenvolvimento econômico. Nesse sentido, a teoria do desenvolvimento endógeno considera que a acumulação de capital e o progresso tecnológico são fatores essenciais para o crescimento econômico.

Dessa forma, justifica Vázquez Barquero (2001), é importante captar quais são os fatores determinantes da acumulação de capital que, segundo ele, assentam sobre quatro elementos fundamentais, a saber: a criação e difusão de inovações no sistema produtivo, a organização flexível da produção, a geração de economias de aglomeração e de diversidade e o fortalecimento das instituições. Com isso se forma o tetraedro, ou melhor, o diamante do desenvolvimento endógeno de Vázquez Barquero.

Portanto, para ele, o desenvolvimento econômico passa fundamentalmente pela geração e difusão das inovações e do conhecimento, pois, é por essas vias que se dá o processo de renovação das estruturas produtivas de modo a gerar os tão desejáveis retornos crescentes. E, assim, a acumulação de capital se traduz por acumulação de tecnologia e de conhecimento.

Todavia, o processo de criação e difusão de conhecimento e inovação está bastante ligado ao entorno, ou seja, às instituições, ao sistema de empresas e as inter-relações entre os atores. Além disso, as inovações possibilitam definir estratégias que se destinam a expandir o alcance das operações das empresas, através da integração vertical ou horizontal, mas também através da diferenciação de produtos ou processos. A introdução e difusão de inovações e conhecimento melhoram o estoque de conhecimento tecnológico de uma indústria, e traz economias externas às empresas, mas internas ao território, nos mesmos termos em que foram colocadas por Becattini (1999), em suas considerações sobre os distritos marshallianos.(VÁZQUEZ BARQUERO, 2001).

Com relação à organização da produção, Vázquez Barquero (2001) afirma que a questão não está em se o sistema produtivo é formado por grandes ou pequenas empresas, mas sim se estas empresas estão organizadas em um entorno que permita a inter-relação entre elas, de maneira que a formação de uma rede empresarial permita o surgimento de retornos crescentes. Segundo ele, isso ocorre sempre que interação entre as empresas proporcione a utilização de economias de escala.

Para Vázquez Barquero (2001), a existência de uma rede de empresas possibilita a geração de uma gama de pontos de encontro que facilitam as trocas de bens e serviços e a difusão de conhecimento e inovação. Dessa forma, a dinâmica econômica atual é caracterizada pela formação de alianças estratégicas entre as empresas, como aquelas que resultam nos sistemas produtivos locais.

E assim sendo, esclarece-se, em boa medida, o porquê das vinícolas do Vale dos Vinhedos estarem em uma posição que, em que pese o acirramento da concorrência, não pode ser considerada de todo ruim. Basta ver a situação daquelas vinícolas que não fazem parte do território, e que, tal qual as associadas da APROVALE, também buscam a constituição de um selo de indicação de procedência. Mas, o ponto que deve ficar destacado aqui assenta sobre a grande facilidade com que as empresas do Vale dos Vinhedos cooperam entre si, principalmente na troca constante de informações. Lembrando que, todos os donos de vinícolas entrevistados afirmaram cooperar entre si, especialmente através da troca de informações.

Além disso, conforme afirma Vázquez Barquero (2001, p. 24):

Os processos produtivos não se dão no vazio, tendo profundas raízes institucionais e culturais (Lewis, 1955; North, 1981; 1994). O desenvolvimento de uma economia é sempre promovido por atores de uma sociedade que tem uma cultura, formas e mecanismos próprios de organização. Cada sociedade encoraja o surgimento de formas específicas de organização e de instituições que lhe são próprias e que haverão de favorecer ou dificultar a atividade econômica, pelo fato de os agentes econômicos tomarem suas decisões nesse entorno organizacional e institucional e por, evidentemente, nem sempre seguirem as prescrições teóricas dos modelos econômicos.

Por isso, afirma o autor supracitado (ibid.), que terão melhores condições de competir, em um mercado cada vez mais globalizado, aquelas regiões que disponham de um sistema institucional que lhes permitam produzir os bens públicos essenciais ao desenvolvimento, como o capital social, e de gerar as importantes relações de cooperação que irão contribuir para a aprendizagem e a inovação.

E, dessa forma, podemos concluir que o capital social é, sem dúvida, um dos elementos que proporciona condições de aumentar a competitividade dos territórios, dado que se trata de um bem público que estimula a cooperação e facilita a ação organizada dos atores. Inclusive no que tange a formação de um estoque contextualizado de conhecimento.

Para Vázquez Barquero (2001, p. 30):

As economias locais e regionais desenvolvem-se e crescem quando se difundem as inovações e o conhecimento entre as empresas e os territórios, de tal modo que aumenta o número e a diferenciação dos produtos, diminuem os custos de produção e se consolidam as economias de escala. As economias locais e regionais desenvolvem-se e crescem quando é mais flexível a organização dos sistemas produtivos e se formem redes e alianças para melhor competir, o que contribui para as economias internas e externas de escala e para um melhor posicionamento competitivo de cidades e territórios. As economias locais e regionais desenvolvem-se e crescem quando as empresas se instalam em cidades inovadoras e dinâmicas, que lhes possibilitem tirar proveito das economias e indivisibilidades existentes no território. As economias locais e regionais se desenvolvem e crescem quando as redes de instituições são complexas e densas, o que permite fazer aflorar a confiança entre os atores e reduzir os custos de transação.

Quando tudo isso acontece, cada um dos elementos do diamante do desenvolvimento endógeno possui a possibilidade de engendrar mecanismos que tornam mais eficientes os sistemas produtivos. Justamente por isso, Vázquez Barquero (2001), afirma que cada um deles é um fator de eficiência no processo de acumulação de capital, por proporcionar, a sua maneira, o aumento da produtividade e o surgimento de rendimentos crescentes.

Além disso, Vázquez Barquero (ibid.) afirma que a presença destes fatores produzem um sistema, que ele batizou por fator de eficiência H. Este sistema permite ampliar o efeito de cada fator determinante do processo de acumulação de capital, o que resulta no chamado efeito H. Dessa forma, o efeito H ocorre quando o sistema está completo, ou seja, quando todos os elementos do tetraedro estão presentes. Contudo, não basta que estes elementos estejam presentes, é necessário que atuem de maneira sinérgica para que o efeito H seja produzido. Daí que, o capital social é um elemento da comunidade que atua de forma positiva sobre a criação de condições para o surgimento do efeito H, pois, como afirma Vázquez Barquero (2001, p. 30):

Os processos de acumulação de capital requerem, em grau maior ou menor, a atuação combinada de todos os fatores que configuram o fator de eficiência H. Na verdade, não é possível que as redes de empresas sejam eficientes, com base na redução dos custos de transação e na obtenção de economias de escala e escopo, se as instituições que condicionam o funcionamento das relações entre as empresas não contribuem para que se desenvolva a confiança entre os atores e não são capazes de garantir os acordos formais entre as empresas.

Por fim, a criação e difusão de inovação, um dos elementos que compõem o tetraedro e, portanto, o fator de eficiência H, e que atua de forma positiva sobre o processo de acumulação de capital, não pode acontecer se o sistema institucional não estimular a interação entre os atores e o aprendizado coletivo através da cooperação. Sendo que, o mesmo pode ser dito quando o ambiente sócioinstitucional não contribuir para o bom funcionamento das organizações dedicadas à pesquisa e à busca de conhecimento. (VÁZQUEZ BARQUERO, 2001).

Diante disso, podemos concluir que o capital social, enquanto bem público que proporciona a cooperação e a construção de ações coordenadas, é um facilitador do que Vázquez Barquero (ibid.) chamou de efeito H e, portanto, um elemento essencial para aumentar a competitividade de empresas e territórios em contextos de aumento da concorrência nos mercados locais, como o da chamada globalização. Por isso, o capital social é um elemento que atua positivamente sobre o processo de desenvolvimento endógeno, principalmente por facilitar a difusão de conhecimento e inovação.