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A economia paranaense nasceu ligada a certa dotação de recursos naturais, como o mate e a madeira, criando-se uma indústria de extração e de primeiros estágios de beneficiamento voltada para mercados do exterior ou do país. Em 1907 essa indústria representava 4,5% do valor da produção da indústria nacional, revelando uma concentração de atividades por especialização natural, muito diferente da já bastante diversificada indústria paulista de bens salários. O preparo da erva-mate representava 48,9% da produção industrial do estado.

A partir de 1913-191411, a concorrência do cultivo argentino penaliza

fortemente as exportações do mate, e o bom desempenho da agricultura paulista desloca fornecedores de alimentos simples, precariamente industrializados, e de matérias-primas. O Paraná viu assim sua situação agravada, tanto entre 1907 e 1919, quando a indústria paulista cresceu e se diversificou, como entre 1919 e 1939, quando se desencadeia o processo de concentração industrial em São Paulo.

A indústria paranaense, dada a má performance de seu principal produto, reduziu sua participação na indústria nacional, de 3,4% em 1919 e para 2,2% em 1939,

10Ver a este respeito Sousa (2003) e Nasser (2000).

revelando entre esses anos uma das taxas de crescimento mais baixas do país (CANO, 1981, p.89). A madeira também enfrenta uma crise, após assumir maior importância no imediato pós-Primeira Guerra. Note-se também que a técnica produtiva de fabrico da erva e da madeira era bastante primitiva, com instalações industriais rudimentares e nível tecnológico reduzido, além de incapaz de enfrentar concorrentes pouco melhor preparados. A infra-estrutura econômica do estado era também bastante deficiente, pouco apoiando as exportações; observe-se que apenas os complexos agroexportadores com algum peso na pauta nacional tinham conseguido nesta época algum desenvo- lvimento desses setores. O Norte do Paraná apenas iniciava sua ocupação com o café e o restante do estado possuía uma agricultura pouco dinâmica e com baixo grau de mercantilização, não gerando mercados para um eventual investimento industrial induzido. No período 1919-1939, todavia, a indústria cresceu discretamente, mais por impulsos vegetativos (LEÃO, 1989, p.32).

Com a ocupação do Norte do estado e o estímulo ligado às atividades de beneficiamento do café, o Paraná apresentou, entre 1930 e 1949, um espetacular crescimento de 10% ao ano, superior ao de São Paulo e ao do Brasil. Entre 1949 e 1959, cresceu à taxa de 10,6% ao ano, pouco menos que São Paulo e mais velozmente que o Brasil. A participação da indústria paranaense sobe para 2,9% em 1949 e para 3,2% em 1959, em pleno período de industrialização acelerada no país, centrada diferencialmente

em São Paulo (LEÃO, 1989, p.33). Há espaço para o crescimento industrial de outras

regiões além de São Paulo porque o mercado interno se constituía e expandia comportando a todos. Localmente, o crescimento industrial também era estimulado pelo processo de ocupação territorial e crescimento populacional.12 O Norte foi alavancado pela

integração das atividades de cultivo e beneficiamento do café ao mercado nacional, além

12“O crescimento populacional da região, como era de esperar-se, atingiu taxas até então

nunca registradas em qualquer outra parte do país. Assim é que, em 1940, estavam concentrados na região apenas 340.449 habitantes, o que correspondia a nada menos que 27,5 por cento do total do estado. Entretanto, na década seguinte, essa mesma população atingia 1.029.025 habitantes e sofria, portanto, nesse curto prazo, um aumento de 202,2 por cento, passando a significar praticamente metade de toda a população do Estado, ou seja, 48,6 por cento” (PADIS, 1981, p.94).

da sua inserção exportadora, no entanto, outras indústrias foram inibidas pela concorrência da pujante indústria paulista.13

Nos anos sessenta, o ritmo de crescimento da indústria paranaense se reduz, como o da brasileira e paulista, com a crise de 1962-1966. A indústria paranaense cresceu 6,9% nesse período, pouco menos que São Paulo e Brasil, mantendo assim

sua posição na indústria nacional, detendo 3% desta em 1970 (IPARDES, 1982, p.41).

Entretanto, apesar dessa boa performance, na década de sessenta a indústria paranaense mantinha-se ligada à produção primária e com um baixo grau de elaboração da matéria-prima, como o beneficiamento do café e da madeira. Esse beneficiamento respondia por 68,9% do produto industrial do estado em 1960 e por 53,5% em 1970, se adicionada a produção em bruto de óleos vegetais. A indústria era um segmento pouco importante mesmo em nível estadual, detendo 16,6% da renda interna ainda em 1970. As empresas apresentavam reduzidas escalas de produção e não marcavam presença no mercado nacional se excetuarmos os principais produtos,

como café e madeira (LEÃO, 1989, p.34). Como veremos, esse quadro será

profundamente alterado nos anos setenta, com o surgimento e consolidação de uma agricultura moderna e tecnificada e de um complexo agroindustrial atendendo ao mercado nacional e também ao internacional.

No seu conjunto, nos anos sessenta o Paraná apresentava uma sociedade na qual a população rural predomina e as cidades surgem em apoio à expansão agrícola, concentrando o comércio e os serviços ligados à agricultura. O grosso da população é formado por pequenos produtores, proprietários ou possuindo a terra como

13Segundo Leão (1989, p.32), “a ocupação do Norte do Estado e o estímulo conseqüente às

atividades de beneficiamento do café explicam a elevada taxa de crescimento industrial do Paraná (10%) entre 1939-49, superior à de São Paulo (9,8%). O Brasil cresce, no período, 7,8% e o Brasil, exceto São Paulo, 6,2%.”

arrendatários, parceiros, etc.14 A indústria, como vimos, é inexpressiva e se volta às

primeiras fases de beneficiamento agrícola.

No plano das regiões do estado, o Norte, ocupado pelo desdobramento da atividade cafeeira paulista, foi colonizado por pequenas propriedades e de modo relativamente ordenado, sem encontrar barreiras herdadas do escravismo colonial. No

Paraná Tradicional15, colonizado por europeus, e no Sudoeste, de ocupação gaúcha,

dominava a pequena produção de auto-subsistência.

Até os anos sessenta predomina, pois, no campo paranaense a pequena produção independente, com a posse da terra relativamente desconcentrada frente a outras regiões do Brasil. O trabalho familiar era amplamente utilizado, e os grandes proprietários resolviam seu problema de mão-de-obra mantendo em sua propriedade grande contingente de parceiros, colonos e arrendatários. Essa pequena produção pouco se relacionava com a indústria, mantendo vínculos com o comércio e não alterando sua base técnica. Vale destacar que nessa década houve um esforço importante, empreendido pelo governo estadual, de construção de estradas e geração de energia elétrica, sendo que esta última, especialmente na segunda metade da década, apresentou razoável expansão da sua capacidade de geração.

Nesse percurso da economia paranaense, que se desenrola entre a era dos arquipélagos regionais agroexportadores e a articulação comercial promovida pela constituição da indústria brasileira em São Paulo, vimos que seus vínculos com o resto

14Segundo o estudo já citado (IPARDES, 1982, p.18): “A ausência de passado colonial e a

colonização realizada via pequenas propriedades farão com que surja no Paraná uma sociedade cuja base é dada por pequenos produtores, com ou sem terras. Assim predomina a pequena propriedade nas zonas de colonização européia, nas áreas de ocupação gaúcha e catarinense, como também no Norte do estado, sendo que nesta última região era também numeroso o contingente de pequenos produtores sem terra, como os colonos e os meeiros”.

15O Paraná Tradicional fazia parte de uma regionalização do estado anterior aos anos setenta,

da nação eram fracos, apesar de que, em vários momentos, cresceu a taxas maiores que a brasileira. Desde a época do mate e da madeira até a expansão cafeeira pelo Norte do Paraná, a economia do estado foi uma peça federativa de pouco peso. A ocupação do estado e a produção cafeeira polarizam a dinâmica da sua economia nos anos cinqüenta e sessenta, possibilitando alguma diversificação, principalmente da produção agrícola; ao mesmo tempo, instigado pelos investimentos do governo JK, nasce um modelo de interpretação de origem cepalina, que procura entender os problemas de desenvolvimento do Paraná em decorrência da condição periférica da

economia de São Paulo.16 Observe-se que, a partir desses modelos de interpretação

que vão surgindo ao longo do desenvolvimento regional da economia brasileira, equivo- cados ou não, é possível começar a entender os modelos de ação dos grupos de poder do estado no cenário nacional e a fortiori as políticas estaduais de desenvolvimento.

Esse é o ponto de partida das grandes transformações dos anos setenta, quando o perfil da sociedade e da economia paranaenses, partindo dessas bases, será profundamente alterado numa dramático processo de “modernização conservadora”.