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A Escola como Unidade Organizacional Autónoma

Capítulo I A EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR E A NOVA REORGANIZAÇÃO

3. Os Agrupamentos de Escolas em Análise

3.1 A Escola como Unidade Organizacional Autónoma

Abordar o Pré-Escolar actualmente, analisar a sua estrutura e forma de funcionamento, bem como o seu lugar no Sistema de Ensino, requer forçosamente uma abordagem contextualizadora ao novo Modelo de Gestão e Administração Escolar, os Agrupamentos de Escolas, dos quais o Pré- Escolar é parte integrante, como sabemos.

Para que possamos analisar e compreender as dinâmicas que se operam dentro de uma organização escolar tendo em atenção a especificidade que lhe é inerente, consideramos pertinente uma breve incursão sobre as suas características organizacionais, que a definem e distinguem das demais e alertam o leitor para a melhor compreensão da mesma.

Como refere Costa (1996: 9) R SURFHVVR GH ³concretização e PDWHULDOL]DomR GD HGXFDomR´ confinado a um espaço designado de escola confere à educação a sua dimensão organizacional.

Consideramos a escola uma organização complexa cujos estilos de administração se desenvolvem à semelhança dos princípios ideológicos político-constitucionais, cuja interpretação requer a compreensão da mesma na sua complexidade técnica, científica e humana. A propósito, transcrevemos de Nóvoa (1992 a: 16) o seguinte texto :

³$V HVFRODV FRQVWLWXHP XPD WHUULWRULDOLGDGH espacial e cultural, onde se exprime o jogo dos actores educativos internos e externos; por isso a sua análise só tem verdadeiro sentido se conseguir mobilizar todas as dimensões pessoais, simbólicas e políticas da vida escolar, não reduzindo o pensamento e a acção educativa a perspectivas técnicas, da gestão ou de eficácia stricto VHQVX´

As escolas enquanto organizações têm características específicas que as distinguem das demais por serem grandes organizações sociais que englobam centenas de pessoas com finalidades e objectivos, com a particularidade de possuírem um tempo de vida longo que passa de geração em geração, onde os actores desempenham papéis diferenciados e sobre a qual depositam expectativas diferenciadas.

Como refere Canário (1992: 65) FRQVWLWXL ³um sistema de acção FROHFWLYD´, em que existe diferenciação e simultaneamente inter-relação de papéis numa perfeita interdependência entre eles.

Já, Hutmacher (1995:57), define os estabelecimentos de ensino como ³XPDHQWLGDGHVRFLDOGHSURGXomRRULHQWDGDSDUDILQDOLGDGHVHVSHFtILFDV´ que

por se basear num sistema de relações e trabalho colectivo se aproxima por analogia DXPD³empresa (de um tipo particular) ´.

A organização escolar é uma unidade social sujeita a um processo de construção histórica, cuja análise depende também da sua relação com outros sistemas sociais, num determinado tempo e num determinado contexto histórico, político e social. Lembremos as palavras de Arroteia (1998; 41) quando se refere ao sistema educativo, afirmando que:

³Qualquer sistema educativo é uma realidade

complexa, cuja apreciação não se pode desligar do seu contexto histórico e social, nem de um certo número de características geográficas, demográficas, económicas e sócio - culturais, de natureza regional e nacional, que FRQGLFLRQDPRVHXIXQFLRQDPHQWRHUHVXOWDGRV´.

Note-se que o desenvolvimento e complexificação das suas estruturas fruto da aplicação de novas políticas educativas e novos planos de organização e gestão escolar, fazem da escola actualmente um terreno fértil para as investigações educacionais. Como assinala Costa (1996: 7), ³Os estabelecimentos de ensino, de modo específico no que concerne às suas variáveis organizacionais, tornaram-se também, um dos objectos de estudo PDLVSURFXUDGRVSHODLQYHVWLJDomRHGXFDFLRQDO´ .

A interpretação da escola como organização encontrou durante o último século diversas imagens que tendem a estar associadas às diferentes configurações definidas por teóricos das organizações. Sobre este assunto, refere Barroso (2005: 27) queRHVWXGRGDRUJDQL]DomR³HVFROD´QmRVHOLPLWD D XPD ~QLFD WHRULD H[SOLFDWLYD p DQWHV ³Uma multiplicidade de domínios, teorias, metodologias, objectos e níveis de análise que as diferentes GLVFLSOLQDV JHUDP QR SUySULR FDPSR GH LQYHVWLJDomR´. Sendo que a lógica burocrática sempre se apresentou como a teoria mais utilizada na caracterização dos sistemas educativos pelas suas características formais. 16

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A este respeito sugere-se o aprofundamento da leitura do cap. II de Costa, j. (1996) Imagens Organizacionais da Escola, Porto ASA.

Ainda na esteira de Barroso (2005: 33), a escola sempre esteve presente em diversos estudos no âmbito das Ciências da Educação, onde era analisada como um lugar de aplicação e reprodução das medidas macro - políticas. Actualmente os estudos tomam-na como um objecto social, com uma identidade própria que assume uma função mediadora entre o macro- sistema de ensino e as práticas pedagógicas ao nível da sala, que resultam numa produção social, com resultados próprios, de acordo com a especificidade de cada estabelecimento escolar.

Subjacente à formação dos Agrupamentos de Escolas e sob o objectivo de concretizar na vida da escola a democratização, a igualdade de oportunidades e a qualidade do serviço público de educação, encontram-se os princípios de autonomia e descentralização.17

Etimologicamente, autonomia (autos = por si mesmo; nomos = lei, norma), significa auto ± governo, auto determinação, obediência a uma lei cuja origem é interna.

Há três aspectos em que é mais frequente o uso da palavra autonomia; o pessoal, o organizacional e o político e traduz-se na capacidade de um individuo ou uma organização têm de estabelecer por si próprio as UHJUDV GD VXD SUySULD DFomR 1XPD SDODYUD p D VXD FDSDFLGDGH GH ³auto- JRYHUQR´ (BARROSO, 1996:17).

Sendo este um processo que concede aos intervenientes na acção o poder de fazer o bom uso dos recursos disponibilizados, poderá dizer-se que a autonomia pXP³LQVWUXPHQWR´que permite ao indivíduo ou organização um melhor desempenho das suas funções (MARTINS, 1998: 6).

Autonomia pressupõe o poder e a liberdade de decidir, contudo não é VLQyQLPR GH ³OLEHUGDGH VHP OLPLWHV´ (BARBOT e CATAMARRI, 2001: 28), e tão pouco se confunde com independência, por um lado porque somos sempre autónomos em relação a algo ou alguém, daí que a acção de DXWRQRPLD VH HVWDEHOHoD VHPSUH QXP FRQWH[WR GH ³LQWHUGHSHQGrQFLD´ (BARROSO, 1996:17), por outro lado porque prevê um acréscimo de

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responsabilidade consequente de um aumento de competências e atribuições.

Parece-nos pertinente esta breve incursão sobre a questão da autonomia no contexto do actual modelo de gestão, por um lado porque este novo modelo é subsidiário desta ideologia e por outro porque assim compreendemos as dinâmicas internas que um quadro de autonomia acarreta ao nível da organização do currículo, cuja territorialização do mesmo pode FRQVWLWXLU ³um processo de articulação entre ciclos escolares e entre SURILVVLRQDLVGHGLIHUHQWHVQtYHLVGHHQVLQR´ (LEITE, 2005: 29).

De facto, refere Formosinho (2000: 46), ´cada escola passou a ter a SRVVLELOLGDGH GH HQVDLDU WtPLGDV  IRUPDV GH JHVWmR IOH[tYHO GR FXUUtFXOR´. Deposita-se no Agrupamento dos estabelecimentos a construção de escolas HQWHQGLGDV FRPR ³unidades organizacionais com uma dimensão humana razoável e dotada de órgãos próprios de administração e gestão, capazes de

GHFLVmRHDVVXQomRGDDXWRQRPLD´(FORMOSINHO E MACHADO, 1998«)

Uma escola autónoma é uma escola que reconhece a sua identidade num círculo de relações culturais que se estabelece entre ela e o meio que a envolve. É XPD HVFROD TXH FULD R VHX SUySULR ³TXDGUR GH UHIHUrQFLDV´ (FORMOSINHO, 2000: 150), que tem objectivos de acção auto-definidos, que tem uma margem de manobra na selecção e desenvolvimento das DFWLYLGDGHVHSURMHFWRVTXHGHVHQYROYH´que toma decisões, e que consegue UHIOHFWLUFULWLFDPHQWHVREUHRVUHVXOWDGRVTXHREWpPRXYDLREWHQGR´ (PINTO, 1998:   e XPD HVFROD TXH ³parte da sua dimensão local e encontra o HTXLOtEULR HQWUH LGHQWLGDGH H FRPSOHPHQWDULGDGH GH SURMHFWRV´ (MARTINS, 1998: 7).

Tornar uma escola mais autónoma implica alteração de normas, de HVWUXWXUDVHGHDWLWXGHV7HUiTXHVHUXPDHVFRODTXH³valoriza a atitude das SHVVRDV´(FORMOSINHO, 2000: 150) e cujas pessoas sintam em si mesmas uma atitude autónoma no desempenho das suas funções e uma noção clara do seu grau de responsabilidade.

Sobre este assunto, Tripa (1994:59) UHIHUH TXH ³uma mudança de mentalidades, atitudes e comportamentos não pode ser tornada obrigatória

por qualquer autoridade ou decreto; é uma missão que cabe aos Professores e Educadores, desde que estejam conscientes da importância da situação. Neste sentido entende-se o papel essencial da formação na implementação da mudança num processo de alteração de pessoas e de estruturas em direcção a práticas de decisão autónomas.

Uma escola autónoma é uma escola de interacção, que estabelece projectos curriculares e pedagógicos articulados que incentiva a participação, o trabalho conjunto, valoriza a intervenção dos professores e cria novos espaços de acção aos pais e à comunidade. É uma escola de equipas docentes que desenvolve um trabalho em equipa com espaços e tempos de interacção próprios.

O conceito de escola comunidade educativa surge numa lógica ³FRPXQLWiULD H FtYLFD GD DFomR HGXFDWLYD´ (FORMOSINHO, s/d.,: 9), em defesa de uma concepção democrática e participativa da acção escolar pública. A implementação desta nova vertente ideológica da acção educativa afigura-se como prioritária para enfrentar os novos desafios que se colocam à educação Básica. Como refere Sarmento (1993: 40), a escola comunidade educativa estrutura-VH FRP EDVH QXP ³FRQWUDWR VRFLDO´, estabelecido entre a comunidade educativa em que se insere e que se concretiza na elaboração de um projecto educativo, que estabelece uma coesão entre estruturas, meios e objectivos, enriquecendo e consolidando o processo educativo pela intersubjectividade, comunicação e partilha de meios.

Por sua vez, Leite (2005:16), considera que a territorialização pode constituir um processo de articulação entre ciclos escolares e entre profissionais de diferentes níveis de ensino. É através de um projecto de trabalho (projecto educativo)18 que expressam os seus interesses, linhas de conduta, objectivos e ideologias, que dão razão de ser à organização e que promovem a autonomia.O Projecto de EVFROD´pode tornar-se um instrumento

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O termo projecto educativo tem vindo a ser gradualmente utilizado em sequência das alterações introduzidas à Lei de Bases do Sistema Educativo, no sentido de uma política de transferência de competências e gradual assunção de autonomia por parte das escolas. Com o D.L. nº 43/89 de 3 de Fevereiro, (art.2º, 1), faz-se referência pela primeira vez a este documento ao designar a DXWRQRPLDFRPR³a capacidade de elaboração e realização de um

importante para a melhoria do estabelecimento de ensino, facilitando a LQRYDomRHDXPHQWDQGRDVXDTXDOLGDGHHHILFiFLD´(BARROSO, 1992:52).