• Nenhum resultado encontrado

1. A Organização Educativa

1.2. A escola – uma organização educativa

A investigação portuguesa, a partir dos anos oitenta, adoptou a escola como objecto de estudo das ciências da educação. Nos anos 80/90 a escola foi valorizada como organização o que implicou a elaboração de uma nova teoria curricular o investimento dos estabelecimentos de ensino como lugares dotados de margens de autonomia, como espaços de formação e de auto-formação participada, como centros de investigação e de experimentação, constituindo-se em núcleos de interacção social e de intervenção comunitária (Nóvoa, 1992, p.19).

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 43 Relativamente às organizações Sedano e Perez (1989, p. 41-46) fizeram uma listagem de cinco características fundamentais do conceito de organização:

. Composição da organização: indivíduos e grupos interrelacionados; . Orientação para objectivos e fins;

. Diferenciação de fins;

. Coordenação racional intencionada; . Continuidade através do tempo.

Atendendo às características inventariadas pelos investigadores acima referidos, que definem uma organização, poderemos então definir a escola como uma organização.

Existe um grande grupo de investigadores que elaboraram uma diversidade de teorias, perspectivas, modelos, marcos, paradigmas presentes no âmbito do quadro teórico da organização e administração educacional (Costa, 1998, p.13).

Nomeadamente Ellstrom (cit. por Costa, 1998, p.13) elaborou uma tipologia baseada em quatro modelos – modelo racional, o modelo político, o modelo de sistema social e o modelo anárquico – servindo como critérios de distinção, por um lado, o grau de consenso e de clareza quanto aos objectivos e, por outro, o grau de ambiguidade das tecnologias e dos processos organizacionais.

Bush (Ibidem) para caracterizar as teorias da gestão educacional, toma por referência estruturas, objectivos, e formas de poder, apresentando-nos cinco modelos: modelos formais, modelos democráticos, modelos políticos, modelos subjectivos e modelos de ambiguidade.

Sergiovanni (2004) estabelece a sua tipologia em quatro perspectivas de análise: a perspectiva da eficiência, a perspectiva da pessoa, a perspectiva política e a perspectiva cultural.

Borrel (cit. por Costa, 1998, p.13) apresenta sete modelos de organização escolar: modelos racionais, modelos naturais, modelos estruturais, modelos de recursos humanos, modelos de enfoque de sistemas, modelos políticos e modelos simbólicos.

Também a escola é vista numa perspectiva organizacional, ela é um empreendimento humano cujo sucesso depende dos esforços de coordenação dos seus membros e que possui diversos e importantes processos e características, pois possui processos de influência, processos de observação, de mediação que colectam informações acerca do estado interno da organização, do ambiente em que a organização trabalha. A escola tem processos de tomada de decisão e tem recursos para

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 44 pôr em prática essas decisões como: pessoal da organização, maquinarias, equipamento. (Likert, 1979, p.211).

Costa (1998), um investigador de referência no que respeita à conceptualização da escola como organização, utilizando a terminologia metafórica, faz uma análise organizacional da escola através de seis imagens: a escola como empresa; escola como burocracia; a escola como democracia; a escola como arena politica; a escola como anarquia; a escola como cultura.

No que respeita à escola como empresa, é normalmente associada aos modelos clássicos de organização e administração industrial. Tende a ter uma visão economicista e mecanicista da pessoa humana, promove a reprodução da educação, e encara o aluno como matéria-prima.

Martin-Moreno (apud Costa, 1998,p33) desenvolve onze características inerentes à organização de uma escola tipo Taylorista:

 Uniformidade curricular: os mesmos conteúdos programáticos são obrigatórios para todos os alunos.

 Metodologias dirigidas para o ensino colectivo: métodos de ensino uniformizados, com predomínio para a lição magistral.

 Agrupamentos rígidos de alunos: procura-se a constituição de agrupamentos homogéneos de alunos com base quer na idade cronológica, quer no nível de instrução, de modo a conseguirem turmas iguais.

 Posicionamento insular dos professores: como na produção industrial em cadeia, cada professor molda durante um período de tempo (ano, hora) uma faceta do produto (aluno) e envia-o para outro professor, retomando o processo com outro produto.

 Escassez de recursos materiais: pouca diversificação e utilização de materiais didácticos.

 Uniformidade na organização dos espaços educativos: a mesma localização das salas, o mesmo corredor, a mesma disposição das mesas e dos alunos nas salas.

 Uniformidade de horários: divididos ao minuto, os dias mantêm-se inalteráveis depois de previamente e devidamente planeados para todo ao não lectivo.

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 45  Avaliação descontínua: realização periódica de exames com base nos

conteúdos adquiridos, que decidem da retenção ou da passagem para o ano seguinte.

 Disciplina formal: o professor é um agente de manutenção da disciplina a qual não decorre do desenrolar das actividades de aprendizagem mas assume-se como condição prévia a estas.

 Direcção unipessoal: organização hierárquica e centralizada da escola na figura do director que, velando pelo cumprimento das normas e disposições da administração central, decide sobre todos os aspectos da vida escolar.  Insuficientes relações com a comunidade: escola fechada ao meio não

permitindo a interferência dos membros da comunidade exterior nas questões escolares.

A escola como burocracia – assenta nos modelos burocráticos: criação de circuitos rígidos com hierarquia muito marcante, a comunicação impessoal e vertical descendente, a comunicação formal escrita e a especialização de funções. Lima (1992, p.66) refere também que o modelo burocrático

“Quando aplicado ao estudo das escolas, acentua a importância das normas abstractas e das estruturas formais, os processos de planeamento e de tomada de decisão, a consistência dos objectivos e das tecnologias, a estabilidade, o consenso e o carácter preditivo das acções organizacionais” .

Este tipo de organização assenta no princípio da racionalidade que, segundo Costa (1984, p.44), se espelha na “previsibilidade e na certeza face ao futuro, na consensualidade sobre os objectivos, na correcta adequação dos meios aos fins, nas tecnologias claras, nos processos de decisão e de planeamento estáveis”.

O conceito de escola burocrática tem como objectivo central a eficiência, isto é, o da consecução do melhor rendimento ao menor custo. Outra característica marcante é o estabelecimento de educação e de ensino ser fortemente dependente do Ministério da Educação.

A escola como democracia – fundamenta-se nas teorias colegiais nomeadamente nos estudos começados pela escola das Relações Humanas, tendo uma concepção de estabelecimento de ensino que valoriza as pessoas, fomenta a participação e a concertação para que predomine o consenso e a harmonia. A escola nesta perspectiva é um espaço aberto com maior abertura para o mundo, onde o espírito

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 46 democrático passa a ser apreendido por meio da experiência, abrangendo outros actores além dos alunos e professores e orientando um trabalho educativo com a participação mais activa de todos, promovendo a criação da comunidade educativa com objectivos comuns.

A imagem de escola como democracia propõe-nos, segundo Costa (1998, p.71), “uma concepção dos estabelecimentos de ensino que, valorizando as pessoas, aponta para modos de funcionamento participados e concertados entre todos os intervenientes na vida escolar, de modo a que a harmonia e o consenso prevaleçam”.

A escola como democracia entende como preocupação fundamental da administração a defesa participativa dos processos de tomada de decisão e a obtenção de consensos colegialmente partilhados. Este tipo de conceptualização pressupõe a aceitação de um melhor caminho para a resolução de problemas da educação: o definido pelo consenso democrático.

A escola como arena política – é encarada como espaço organizacional privilegiado para a aplicação dos modelos políticos, sendo incompatível a uma racionalidade linear e a tudo o que é previsível. Segundo Afonso (1993, p.43) as escolas e os sistemas escolares podem ser concebidos como

“ Organizações políticas onde grupos distintos com interesse próprios entram em interacção com o objectivo de satisfazer esses interesses particulares, num contexto caracterizado pela diversidade dos objectivos, pela existência de conflitos abertos ou latentes, e pela luta por mais legitimidade e poder”.

A perspectiva da escola como arena política tem por base quatro conceitos basilares: interesses, conflito, poder, e negociação. Para além destes salientam-se ainda conceitos como ambiguidade, instabilidade de objectivos, de tomada de decisões, de distribuição de recursos, de coligação, de estratégia, de influências, de pressões externas (Costa, 1998, p85).

Nesta perspectiva de escola acontecem e são desenvolvidas dinâmicas de carácter micropolítico que se podem resumir deste modo:

Os membros agem em grande medida, orientados por interesses que podem não coincidir com os objectivos da Organização nem serem idênticas para todos;

A formação de coligações desenvolve-se para melhor alcançar os objectivos, sendo estes muitas vezes ambíguos e instáveis;

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 47 Os grupos de interesses muitas vezes entram em conflito, e esta conflitualidade é perspectivado como algo de positivo, natural e inevitável e mesmo benéfico para o desenvolvimento organizacional;

As formas de poder desenvolvem-se e vão mais além do que a organização determina e as decisões resultam de processos de negociação e de compromisso entre os variados grupos (Costa, 1998, p.81s).

Ball (cit. por Costa, 1998, p.83) considera as escolas “do mesmo modo que praticamente todas as organizações sociais, campos de luta, divididas por conflitos em curso ou potenciais entre os seus membros, fracamente coordenados e ideologicamente diversas”.

A escola como anarquia – enfatiza a incerteza, a ambiguidade a desconexão e a ordem no funcionamento organizacional. Segundo Costa (idem, p.89-90) a escola como anarquia organizada é caracterizada como sendo uma realidade sócio-organizacional complexa, heterogénea, problemática e ambígua. Esta organização educativa é constituída por uma sobreposição de diversos órgãos, estruturas, processos ou indivíduos frouxamente unidos e fragmentados e por vezes não constitui um todo unido. Estas organizações são vulneráveis relativamente ao seu ambiente externo, que sendo turbulento e incerto, aumenta a incerteza e a ambiguidade organizacional. Funcionam com base em intenções e objectivos vagos, tecnologias pouco claras e participação pouco fluida; em processos de tomada de decisões que surgem de forma desordenada, imprevisível e improvisada, do amontoamento de problemas, soluções e estratégias, em processos organizativos (tais como a planificação, a tomada de decisões, a avaliação e a certificação) de natureza simbólica. A escola como anarquia assume formas tais como anarquia organizada, sistema caótico e sistema debilmente articulado, adoptando processos de tomada de decisão só claramente entendidos à luz do modelo de caixote do lixo, o funcionamento da escola como anarquia revela-se particularmente ambíguo, imprevisível e incerto.

A escola como cultura – esta perspectiva cultural garante as características específicas de cada escola que a torna diferente e única (Costa, 1998) tendo como pressupostos de base os seus valores e /ou artefactos – utilizando a terminologia de Schein. Na tipologia da escola como cultura podemos ver as realidades, mais ou menos visíveis, não apenas partilhadas pelos membros da escola mas também como construções sociais que se tornam referências essenciais, particularmente, para a

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 48 definição dos padrões internos de interacção; a construção da identidade colectiva e para a definição da orientação da acção (Rocha, 1999, p.28).

Apesar de se considerar a escola como organização é importante reconhecer o carácter específico da organização. Sergiovanni (2004) menciona que é importante o desenvolvimento teórico específico sobre a gestão das escolas uma vez que elas exprimem algo especial o seu carácter moral, uma vez que este autor refere que as escolas são comunidades morais mais parecidas com as famílias do que com as teorias da motivação, do controlo e da gestão.

Hutmacher (1992), outro investigador que estudou as organizações escolares segundo o quadro conceptual de Mintzberg, diferencia cinco elementos nas organizações: o centro operacional, o topo estratégico, a cadeia hierárquica, a tecno- estrutura e os suportes logísticos.

O centro operacional, é composto por professores e alunos, ocupa o lugar principal, embora o estatuto dos alunos não seja muito definido. Nas escolas os alunos não devem ser considerados clientes, já que não podem ser livres de frequentar a escola, não têm influência no “produto”que lhes é fornecido e são até membros da organização, situação que acumulam com a de beneficiários.

O topo estratégico – contrariamente ao que acontece nas outras organizações é muito reduzido e tem uma perspectiva mais táctica do que estratégica, pois as escolas e nomeadamente as portuguesas são dotadas de fraca autonomia e a decisão política é ainda muito débil.

O suporte logístico é constituído pelos serviços, desde a cantina reprografia, secretaria etc. Este factor está em crescimento.

Nas escolas portuguesas, os outros elementos – a cadeia hierárquica e a tecno- estrutura – não têm um papel tão activo, uma vez que na cadeia hierárquica, a ligação que é assegurada entre o centro operacional e o topo estratégico está algo esbatida pela natureza da gestão / direcção do topo e das lideranças intermédias, e também ao nível tecno-estrutura existem diferenças mais significativas entre as organizações e as escolas. Alves (cit. por Alaiz et. al., 2003, p.26) refere um conjunto de elementos que caracterizam a especificidade da organização educativa das demais organizações em geral:

 “Os dirigentes e os professores têm o mesmo tipo de formação profissional e estatuto;

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 49  Os objectivos da organização são percebidos, valorizados e avaliados

diferentemente pelos diversos actores educativos;

 A estrutura interna aparece debilmente articulada, o que dificulta o exercício hierárquico da autoridade;

 A cultura escolar dominante reforça o sentimento/ prática do individualismo do corpo docente.

Concordamos com Guerra (2000, p.70) quando explica que é fundamental não cometer duas atitudes: uma é considerar a escola como sendo uma organização sem a sua especificidade aplicando a Teoria Geral das Organizações sem qualquer restrições e a outra igualmente perigosa é pensar a escola como se ela não tivesse natureza organizativa, renunciando a toda a contribuição que a Teoria Geral da Organização tem proporcionado.

É também importante dizer que os modelos, na sua maioria, têm como objectivo principal a procura de melhores soluções para que as organizações alcancem a eficácia e, por vezes, é na conjugação de um ou mais modelos, que é descoberto o sistema mais adequado para o desenvolvimento organizacional da escola.

Documentos relacionados