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2. A Perspectiva Evolutiva do Sistema Educativo

2.3. Terceiro Ciclo – A Reforma

A aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo, segundo Teodoro (2001,p.399) “permitiu fechar o ciclo da normalização da política educativa e abrir uma nova fase, centrada novamente no propósito de realizar a reforma educativa”.

Este terceiro ciclo temporal vai ser dominado pela ascensão e queda do “mito da reforma”.

O Decreto-Lei nº43/89, de 3 de Fevereiro, estabelece o regime de autonomia, reconhecendo a necessidade de “inverter a tradição de uma administração demasiada centralizada” de forma que se transfiram poderes para os níveis regional e local. Entre os factores de mudança inclui-se o reforço da autonomia da escola.

O normativo refere ainda que a autonomia da escola se concretiza:

“Na elaboração de um projecto educativo próprio, construído e executado de forma participada, dentro dos princípios de responsabilização dos vários intervenientes na vida escolar e de adequação a características e recursos da escola e às solicitações e apoios da comunidade em que se insere”.

Este impulso à autonomia dos estabelecimentos, teve reflexos nas práticas diferenciadas de autonomia e proporcionou o desenvolvimento de políticas de territorialização.

O Decreto-Lei nº 43/89 estabelece o regime de autonomia dos estabelecimentos do 2º e 3º ciclos do ensino básico e do ensino secundário, e esqueceu-se de abranger o pré- escolar e o 1º Ciclo na autonomia consagrada (Formosinho, 2005, p.123). Cada escola, de acordo com as suas especificidades e a seu ritmo, pôde, segundo o mesmo autor,

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 31 aprofundar a autonomia, passando a ter a possibilidade de: ensaiar formas de gestão flexível do Currículo; definir algumas políticas de alocação de alunos e professores; gestão dos tempos livres e de ocupação de espaços, organizar e oferecer actividades de complemento curricular, de animação sócio-educativa, de ocupação dos tempos livres ou de desporto escolar, gerir o crédito horário disponível para o exercício de cargos de gestão e de desenvolvimento de projectos pedagógicos, proceder ao recrutamento de pessoal auxiliar de acção educativa em regime de tarefa ou de Contrato a Termo Certo, conseguir auto-financiamento e gerir receitas provindas da prestação de serviços na escola, adquirir bens e serviços e proceder à execução de certo tipo de obras, estabelecer parcerias entre escolas, nomeadamente para, a criação de Centros de Recursos Educativos e Centros de Formação.

Com a publicação do Decreto-Lei nº 43/89, de 3 de Fevereiro, a Administração Central demonstrou que tinha vontade de impulsionar os estabelecimentos a encontrar soluções diferenciadas para problemas e contextos diferentes. Iniciam-se os tempos da maturidade da educação.

O Decreto-Lei nº 172/91, de 10 de Maio, pretende de forma inovadora, alargar o “novo modelo de administração, direcção e gestão de escolas” a todas as escolas dos vários níveis de educação e ensino, nomeadamente ao ensino pré-escolar e 1º ciclo. Os princípios da representatividade, democraticidade e integração comunitária são concretizados neste diploma. Introduz o conceito de área escolar para os estabelecimentos de educação pré-escolar e do 1º ciclo do ensino básico, com dupla acepção pedagógica e administrativa. No conselho de área escolar e de escola, através do processo de eleição, encontram-se representados os intervenientes da comunidade escolar, competindo a este órgão colegial as funções de direcção.

A gestão/administração são garantidas por um órgão unipessoal, o director executivo, designado através de concurso pelo Conselho de área escolar ou de escola. Trata-se de um modelo que favorece a integração da escola no meio.

O desenvolvimento da autonomia nas escolas, como centro das políticas, torna- se manifestamente necessário, pois a sociedade reconhece cada vez mais, que a comunidade educativa deve ser capaz de gerir os seus próprios recursos de forma consistente e participada. O reforço da autonomia das escolas, afigura-se assim como uma forma de combater as assimetrias no acesso e no sucesso educativos, de forma a corrigir desigualdades existentes.

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 32 É à administração que caberá este papel regulador, como ponto sensível e crítico capaz de introduzir mudanças organizacionais no sistema educativo.

Este modelo foi considerado ousado e arrojado. Foi experimentado em 52 escolas e áreas escolares acompanhado de um intenso debate nacional em torno da democratização do ensino, da participação educativa e da autonomia.

Tendo em conta a avaliação da experiência atrás referida, este decreto foi ajustado para poder ser generalizado a todas as escolas. Assim surge o Decreto-Lei nº 115-A/98, que revoga o Decreto-Lei nº 172/91.

A Publicação do Decreto-Lei nº 115-A/98, de 4 de Maio, estabelece, logo no seu preâmbulo, os princípios que enformam o novo quadro da autonomia das escolas e a descentralização de competências, dos quais destacamos três princípios:

“ A autonomia das escolas e a descentralização constituem aspectos fundamentais de uma nova organização da educação, com o objectivo de concretizar na vida da escola a democratização, a igualdade de oportunidades e a qualidade do serviço público de educação”.

“ O reforço da autonomia (…) pressupõe o reconhecimento de que, mediante certas condições, as escolas podem gerir melhor os recursos educativos de forma consistente com o seu projecto educativo “.

“ A autonomia não constitui, pois, um fim em si mesmo, mas uma forma de as escolas desempenharem melhor o serviço público de educação, cabendo à administração educativa uma intervenção de apoio e regulação, com vista a assegurar uma efectiva igualdade de oportunidades e a correcção das desigualdades existentes.”

O regime de autonomia também estabelece o conceito de autonomia no artigo 3, ponto 1: “ é o poder reconhecido à escola pela administração educativa de tomar decisões nos domínios estratégicos, pedagógico, administrativo-financeiro e organizacional, no quadro do seu projecto educativo e em funções das competências e dos meios que lhe estão consignados.”

A autonomia traduz-se assim, numa transferência de competências e de responsabilidade (e, por conseguinte de poder da Administração Educativa – Central e Regional) para a escola (como Comunidade Educativa).

Os poderes transferidos para as escolas implicam que estas têm de assumir novas e acrescidas responsabilidades. Trata-se de uma nova forma organizacional surgida na continuidade do Decreto-lei n.º172/91, o qual não chegou a ter âmbito nacional.

Esta mesma autonomia coloca exigências ao nível da dimensão da escola, da interligação da escola com os serviços centrais, com a autarquia, com o objectivo da inserção do meio na escola.

O Decreto-Lei refere no seu preâmbulo, que:

“ A Escola enquanto centro das políticas educativas, tem de construir a sua autonomia a partir da comunidade em que se insere, dos problemas e potencialidades, contando com uma nova atitude da administração central, regional e local, que possibilita uma melhor resposta aos desafios da mudança.”

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 33 O Regime de Autonomia assenta no pressuposto de que será a comunidade educativa, através da Assembleia, a principal depositária das novas competências a serem transferidas pela Administração. Será do interesse da escola, num quadro de autonomia, que a composição da Assembleia “órgão de participação e representação da comunidade educativa” reflicta, precisamente, uma elevada quantidade e diversidade de vozes da Comunidade educativa para se sentir legitimada para definir as “ linhas orientadoras da actividade da escola “.

No artigo 7º do Regime de Autonomia, Administração e Gestão das escolas, encontram-se definidos os seguintes órgãos de administração e Gestão: A Assembleia, a Direcção Executiva, o Conselho Pedagógico e o Conselho Administrativo.

No desempenho das suas competências, definidas no artigo 10º, realça-se a importância da Assembleia no processo da construção da autonomia da escola, pois é o órgão que aprova o Projecto Educativo, o Regulamento Interno e as propostas de contratos de autonomia, assim como emite o parecer sobre o Plano Anual de Actividades bem como sobre os relatórios periódicos e final relativos à sua execução. Define as linhas orientadoras para a elaboração do Orçamento e aprova o relatório de contas de Gerência.

A Direcção Executiva “ é o órgão de administração e gestão da escola nas áreas pedagógicas, culturais, administrativas e financeiras” (artigo 15º,nº1). De acordo com o nº 2 deste mesmo artigo, a opção por um órgão colegial (Conselho Executivo) ou unipessoal (Director) é da responsabilidade da escola, a definir no seu Regulamento Interno.

O Conselho Executivo é constituído por um Presidente e dois Vice-Presidentes, no caso da escola ter optado por um director, este é apoiado no exercício das suas funções por dois Adjuntos.

O Conselho Pedagógico é “o órgão de coordenação e orientação educativa da escola, nomeadamente nos domínios pedagógico-didáctico, da orientação e acompanhamento dos alunos e da formação inicial e contínua do pessoal docente e não docente”; definido no artigo 24.º do Decreto – Lei nº. 115-A/98.

O Conselho Administrativo é, nos termos do artigo 28º “ o órgão deliberativo em matéria administrativo-financeiro da Escola “. Conforme o estipulado no artigo 29º é constituído pelo Presidente do Conselho Executivo (ou Director) por um dos vice-

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 34 presidentes do Conselho Executivo ou um dos adjuntos do Director e pelo Chefe dos Serviços de Administração Escolar.

A autonomia da escola, no âmbito de uma política descentralizadora da acção educativa, surge através de instrumentos como o Projecto Educativo, o Regulamento Interno, o Projecto Curricular (de escola e de turma) e o Plano Anual de Actividades, como meios de tomar decisões nos domínios estratégicos, pedagógico, administrativo, financeiro e organizacional.

Com o Decreto-Lei n.º 115-A /98, evolui-se para uma autonomia construída pela própria escola e pela comunidade em que se encontra inserida, na criação e aplicação de um Projecto Educativo próprio. O Projecto Educativo, enquanto expressão de identidade e autonomia revela-se um importante documento orientador, destinado a assegurar a coerência e a unidade da acção educativa; constitui uma resposta aos problemas da comunidade e torna a escola num agente de transformação.

O Projecto Educativo de Escola deve ser um documento participativo e democrático. Participação, negociação, consensualidade, contrato são princípios que estão presentes na elaboração deste tipo de projecto. O P.E.E. permite aumentar a transparência da instituição e mobilizar esforços. A autonomia é auto-conhecimento da escola e da comunidade. O P.E.E. é um instrumento de trabalho que sustenta a mudança e define a identidade de uma escola.

A Lei de Bases do Sistema Educativo, no seu artigo 43º visa assegurar o respeito pelas regras de democracia e de participação comunitárias e o Decreto-Lei nº 115 – A/98 prevê no seu artigo 2º, a criação de Conselhos Municipais de Educação, com base na iniciativa dos municípios assegurando a interligação entre a comunidade e o Sistema Educativo.

Os Contratos de Autonomia são referidos no diploma como forma das escolas “desenvolverem e aprofundarem a sua autonomia, em que lhes serão conferidos níveis de competência e de responsabilidade acrescidos, de acordo com a capacidade demonstrada para assegurar o respectivo exercício” (artigo n.º 47º).

Segundo o artigo 48º os contratos de autonomia devem “subordinação da autonomia aos objectivos do serviço público e da educação e à qualidade da aprendizagem das crianças, dos jovens e dos adultos”. O mesmo documento legislativo “permite que sejam encontradas soluções organizativas adequadas às escolas de maior dimensão e às mais pequenas e isoladas” (…), prevendo-se “igualmente o

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 35 desenvolvimento de estratégias de agrupamento de escolas, resultantes das dinâmicas locais e do levantamento rigoroso das necessidades educativas, designadamente através de cartas escolares concelhias”.

No que diz respeito ao processo de constituição dos agrupamentos de escolas, desde logo considerado um dos momentos críticos da implementação do modelo, pois tratava-se de um processo complexo e problemático.

A generalidade dos agrupamentos de escolas foi constituída pelas Direcções Regionais / Centros de Área Educativa e não partiram de processos resultantes das dinâmicas locais. As Direcções Regionais tentaram convencer as escolas e as Câmaras Municipais das vantagens da solução milagrosa para os alunos e escolas, e foram impondo a reorganização da rede previamente definida, seguindo preocupações meramente economicistas (Barroso, 1996).

A Federação Nacional dos Professores (FENPROF) favorável à existência de agrupamentos, afirmava ser uma solução de futuro. No entanto, considerava que deveriam ser ouvidos os professores, já que assim, os agrupamentos funcionariam melhor do que os que eram impostos.

O modo como os agrupamentos se constituíram não foi consensual, gerando-se, por vezes, sentimentos de exclusão por parte de alguns grupos de professores, designadamente do 1º ciclo de escolas integradas em agrupamentos verticais.

Ao nível de política educativa, a Lei de Bases do Sistema Educativo corresponde ao fim de um ciclo e início de outro, em simultâneo. Ela fecha o chamado ciclo de normalização do sistema, iniciado em 1976, e caracterizado por um duplo propósito: a recuperação estatal do poder e controlo do sistema educativo, após o período revolucionário de 1974-76 e a resposta aos desafios colocados pela integração de Portugal na comunidade europeia. A mesma lei abre um novo ciclo, assinalado por uma lógica reformista, no qual os Ministros Roberto Carneiro (1987-1991) e Marçal Grilo (1996-2000), de formas e épocas diferentes, constituíram os maiores protagonistas (Teodoro, 2001).

Normalmente, o primeiro período é dominado por um “messianismo reformista”, cujos impulsionadores acreditavam que iam resolver os problemas da educação e finalmente criariam o “homem novo”. O modelo subjacente à reforma é o normativo- dedutivo, fundamentado numa concepção determinista da mudança, orientada do topo

A Auto – avaliação institucional – um processo de responsabilidade e autonomia 36 para a base do sistema. A política tinha um discurso “modernizador” tendo como objectivo a integração de Portugal na Comunidade Europeia (Barroso, 1991).

Após dez anos de governação do Partido Social Democrático, sucede um governo Socialista que inicia o segundo período do ciclo da reforma e que acontece entre 1996 e 2000. Marçal Grilo era o novo ministro da Educação e tentou demarcar-se do seu antecessor, substituindo a estratégia reformista anterior, por uma política de “geometria variável”. O Pacto Educativo para o Futuro era um documento estratégico para o desenvolvimento educativo em Portugal onde apontava “pacificar a educação”e assegurava “um acordo sobre os grandes rumos da política educativa”. No contexto político em curso (o governo sem maioria absoluta) por um lado e também devido à ambiguidade do conteúdo, o Pacto Educativo para o Futuro não conquistou grande simpatia na opinião pública e o acordo não conseguiu vigorar (idem).

De referir que este ciclo reformista teve um importantíssimo apoio financeiro, no âmbito do Quadro Comunitário de apoio negociado com a Comissão Europeia chamado Programa de Desenvolvimento Educativo para Portugal (PRODEP). O objectivo do referido Programa de apoio era preparar o sistema educativo português para as exigências sociais e económicas decorrentes do processo de integração europeia, generalizando o acesso à educação, modernizando as infra-estruturas e melhorando a qualidade da acção educativa (Barroso, 2003).

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