• Nenhum resultado encontrado

4 ETNOGRAFIA EM UM AMBIENTE ANTROPOSSOCIAL INVESTIGADO:

4.2 A etnopesquisa sociológica e a abordagem educativa

Ingressando a partir desse ponto na etnossociologia50, tem ficado claro a compreensão da etnografia como a materialização do etnógrafo que participa do cotidiano do investigado, seja por um curto ou dilatado período, à medida que observa os acontecimentos, escuta o que se diz, questiona, ou seja, garimpa qualquer informação que possa jogar luzes no foco da pesquisa (HAMMERSLEY & ATKINSON, 1995). Quanto à sociologia, ao tempo que o investigador desenvolve suas pesquisas na paisagem humanística natural, ou os mundos sociais experimentados (DEEGAN, 2001), este mesmo estuda o fato social (HOLLOWAY & WHEELER, 1996)para fins de entendimento em sua essência e implicações, porquanto se há de tê-lo como fluido, dinâmico, em desenvolvimento.

Investigando agora os meandros da sociologia educativa que se dá, por óbvio no interior de ambientes educativos, a etnossociologia institucional (LAPASSADE, 1991) ocuparia o epicentro deste sítio epistemológico. Em primeiro plano, invocar a teoria Interacionista seria uma necessidade real par melhor entendimento, porquanto, para Velho (1999), o Interacionismo já é por definição uma mistura, um cruzamento de influências. Esta percepção (interativa) se dá entre o homem e a cultura (escolar) sendo requerido a inserção deste indivíduo no meio sociocultural, permitindo-se, igualmente, acontecer as mudanças conexas, compreensíveis, neste diapasão, também no ambiente educativo.

A justificativa sociológica, portanto, para este trabalho de campo reside na necessidade do investigador inspetar in loco os entes investigados: onde estão, como e porque estão.

49 A etnopesquisa crítica é oriunda de uma inspiração etnográfica, porém, demarca com esta a sua diferença,

quando se aprofunda na hermenêutica de natureza sociofenomenológica (NASCIMENTO, 2004, p. 44).

50 É proposto pela etnossociologia um modo de análise capaz de demonstrar o que cada um dos relatos contém de

informações pertinentes, com significações suficientes para estabelecer ligações e, assim, encontrar o modelo do objeto social analisado (SIQUEIRA, 2014, p. 70).

167 Decorre, operacionalmente, que o estar como eles consentirá um acompanhamento minucioso na relevância dos fatos sociais investigados que, por certo, subsidiarão a pesquisa etnográfica, cabendo a indagação: “que critérios têm sido usados, em uma dada sociedade, para atribuir diferentes valores e a diferentes conhecimentos? Como relacionar esses critérios e a estratificação deles resultantes às características da estrutura social?” (MOREIRA, 1990, p.75). Naturalmente sobre isso, o alvo etnossociológico repousaria na necessidade de observar a vida dos investigados de forma aproximada, buscando a presença deles nos espaços onde vivem, abraçando suas rotinas em suas investidas sociais, ou como dispõe Goffman (2010):

Quando duas pessoas estão juntas, pelo menos parte de seu mundo será composta do fato que uma linha adaptativa de ação tentada por um deles será ou facilitada perspicazmente pelo outro ou receberá oposição também perspicaz, ou ambos, e que tal linha de ação precisará sempre prosseguir neste mundo inteligentemente prestativo ou obstrutor. Compreensivamente, os indivíduos assumem a atitude de presença de outros, independentemente do objetivo em função do qual aplicam a informação que assim adquirem (GOFFMAN, 2010, p. 32).

Entendendo desta forma, a etnossociologia educativa deve investigar, dentre outros, o simbolismo comum, as linguagens fonêmica e corporal, os retratos da vida prática sociofamiliar expandidos da escola, as estratificações dinâmicas ascendentes e descendentes, os sons e as multiformes declarações sensoriais próprias do coletivismo; para tanto, Brazão (2008) estimula a presente imersão ao ponto de repercutir o que segue no contexto das abordagens qualitativas de pesquisa educacional e social:

Não deixando de fora a subjectividade, opõe-se às abordagens quantitativas e positivistas, e impulsiona fortemente processos de autoformação dos docentes. Permite reexaminar a prática destes e reflectir sobre a resolução de problemas e incidentes críticos, ensaiar estratégias de antecipação, possibilitar a análise mais profunda da construção do “eu” – “self” fazendo-os desempenhar um papel social mais activo (BRAZÃO, 2008, p. 116, grifo do autor).

Continuadamente, o que se defende seria uma etnometodologia qualitativa como foco sociológico ao tempo que se veem os atores sociais como seres dinâmicos investigados em suas biografias, narrativas e histórias de vida (KAUFMANN, 1996, 2000). Para tanto, o autor propõe o resgate de quadros conceituais epistemológicos com base no Interacionismo e a própria

168 etnopesquisa para construção de uma sociologia compreensível. Isto quer dizer que sem nunca se ausentar da cientificidade etnometodológica parametrizada na objetivação dos alvos pesquisados, não se tornaria minimamente plausível relegar do bojo investigativo as manifestações coletivas próprias das construções consensuais demopsicológicas para além dos graus de transversalidade intragrupos e intergrupos (GUATTARI, 2004) sem embargos das retroalimentações sociais simbólicas multivetorializadas pelas infinitas transferência e contratransferênciado homem em seus ambientes socioculturais.

Persistindo na socioanálise etnoeducativa, de forma elementar à problematização dos aspectos investigados, tal condição deve tornar-se viável sobretudo a partir da pesquisa de campo, ou a etnopesquisa escolar. Desta forma, o patrocínio da coexistência entre investigado e investigador deve ser pautado a partir de uma ampla transversalidade psicossociológica ao ponto que esta intervenção se faça entender por uma inseparabilidade metacognitiva entre as partes, todavia sem a sujeição (contaminação) deste em relação àquele. O que se espera sobretudo em relação a este investigador socioetnográfico é que conserve a devida extensão investigativa correspondente, ciente que o "pesquisador também deve efetuar o caminho inverso ao do distanciamento: um passo adiante, um passo atrás. Deve obter o máximo de familiaridade com o campo de estudo" (LOURAU, 2003, p. 264). Ao mesmo tempo, cabe o registro circunspecto que a relação direta do investigador com o investigado:

[...] não anula o distanciamento que a ciência exige. Antes transforma a recolha de informação numa experiência que ‘humaniza’ a própria investigação, ou seja, proporciona ao investigador a possibilidade de ‘ver por dentro’, tomando uma dupla posição de observação: a de investigador e a do próprio actor” (LALANDA, 1998, p. 873, grifo do autor).

Finalmente, estudar as relações sociais do homem no intuito de compreender seus principais processos inter-humanos requer, necessariamente, a leitura e interpretação das correlações (des)harmônicas desses mesmos indivíduos à medida que os fenômenos acontecem em seus habitats naturais seja, como já pontificado, em uma distante ilha da Polinésia a uma

169 sala de aula composta por pré-adolescentes51 de um colégio militar incrustrado numa cidade

com dois milhões de habitantes.

Quanto à etnossociologia, essencialmente, a postura seria a concessão da primazia sobretudo à biografia bem como à narrativa de vida (MAFESSOLI, 1988) dos investigados na captura das informações etnopesquisadas quando se invocam as construções biopsicossociais dos enredos de vida nos microcosmos abissais das infinitas relações humanas. Espera-se com isso que a respectiva produção buscada sociologicamente oferte ao investimento etnográfico uma percepção real na expansão dos moldes investigativos e que possa dar conta da diversidade dos caminhos de uma sociedade mutante sociocognitivamultireferenciada.