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A fundamentação da Pedagogia de Género

Capítulo IV A Pedagogia de Género da Escola de Sydney

1. A Escola de Sydney

1.2. A fundamentação da Pedagogia de Género

A Pedagogia de Género é uma abordagem metodológica no ensino da escrita, que parte da leitura e sua compreensão como base de ensino das particularidades e géneros dos textos a escrever. Está radicada numa teoria de descrição gramatical – a Gramática Sistémico-Funcional, também referida como Linguística Sistémico-Funcional – que descreve as variações a que a língua está sujeita consoante os contextos de uso e o papel desempenhado pelos participantes envolvidos na interação.

A LSF é uma teoria de pendor funcional e sistémico que garante descrições de sistemas linguísticos e de usos desses sistemas:

corresponde a uma teoria geral do funcionamento da linguagem humana, concebida a partir de uma abordagem descritiva baseada no uso linguístico. Em concreto, trata-se de uma teoria de descrição gramatical, uma construção teórico-descritiva coerente que fornece descrições plausíveis sobre o como e o porquê de a língua variar em função de e em relação com grupos de falantes e contextos de uso. Mas, para além de ser uma teoria de descrição gramatical, razão pela qual adquire muitas vezes a designação mais restrita de Gramática Sistémico-Funcional (GSF), ela fornece também instrumentos de descrição, uma técnica e uma metalinguagem que são úteis para a análise de textos, pelo que, adicionalmente, pode ser encarada como um modelo de análise textual. Gouveia (2009, p.14)

Em concreto, a LSF é uma teoria que concebe a língua como uma entidade construída socialmente a partir das escolhas dos falantes, ou seja, é uma teoria que coloca a ênfase no uso da língua e recorre a uma metalinguagem que pode ser usada no ensino para o desenvolvimento da literacia dos aprendentes.

A língua surge na vida das pessoas através da troca de significados com outras pessoas e é daí que os falantes a usam para cumprir determinados propósitos sociocomunicativos como pedir informações através de perguntas ou prestar esclarecimentos por meio de afirmações, como para fazer pedidos ou oferecer bens e serviços, ou seja, os falantes adotam papéis diferentes consoante a situação. Desta forma, segundo Halliday, a linguagem realiza três funções:

95 a) a ideacional – manifestada na concretização das nossas experiências, dos nossos conhecimentos do mundo (quotidiano, especializado e académico) correspondendo às evidências linguísticas e textuais que exprimem recursos intertextuais, conhecimentos que um discurso ou tema assume ser de conhecimento do recetor da mensagem.

b) a textual – manifestada na relação do texto com o seu contexto de situação, isto é, na expressão de significados que dizem respeito às escolhas linguísticas quanto ao vocabulário e estruturas dependentes da mensagem que se quer transmitir.

c) a interpessoal – que se manifesta no âmbito das nossas relações com os nossos interlocutores correspondendo à presença e/ou à ausência de recursos linguísticos que demonstrem, entre outros, modo, modalidade, atitude, valor e papel do autor do texto.

É assim que, de acordo com Gouveia (2014), na nossa atividade de produção textual fazemos uso de uma língua sempre em dois contextos: o imediato conhecido como contexto de situação, que envolve o ambiente circundante, os participantes da interação, os gestos, a voz e as tonalidades assumidas, os sons produzidos, o comportamento dos participantes envolvidos na interação; e o mais abrangente conhecido como contexto da cultura, que tem que ver com a ideologia, as convenções sociais, sendo que nele é que se desenvolvem os géneros.

Nesta aceção, a língua não é apenas um sistema de regras a ser descrito e as práticas de escrita estão inscritas num contexto e têm um propósito sociocomunicativo, não são assumidas como tarefas isoladas e descontextualizadas.

A língua é usada de forma diferente em diferentes situações, correspondendo cada situação de uso a uma configuração de Registo composta por três variáveis: a variável Campo (field) que se refere à natureza da ação social; a variável Modo (mode), que diz respeito à organização simbólica do texto, o estatuto em si, a função do texto, incluindo o canal (quer escrito ou falado), o modo retórico, persuasivo, expositivo, didático, por exemplo; e a variável Relações (tenor), que diz respeito à natureza dos participantes, ao seu estatuto e a norma/estrutura.

Juntos, o Modo, o Campo e as Relações são conhecidos como o Registo de um texto e além do Registo está o propósito social de um texto que ajuda a configurar o seu Género. É o propósito sociocomunicativo concreto de qualquer texto que define o tipo de texto que ele é, o seu género.

96 o resultado de toda e qualquer situação de interação, isto é, é ele próprio a forma linguística

de interação social, uma unidade de uso linguístico. De extensão variável, falado ou escrito, individual ou coletivo, composto de apenas uma frase ou de várias (a extensão não é relevante), o texto é o que produzimos quando comunicamos. É ainda uma colecção harmoniosa de significados apropriados ao seu contexto, com um objetivo comunicativo. Gouveia (idem, p. 18)

O texto é, portanto, o resultado de escolhas semânticas que dependem de situações concretas de comunicação.

Um outro aspeto importante é a relação entre os sistemas de linguagem e os textos, sendo o sistema um conjunto de opções que os falantes elegem à medida que escrevem ou falam. Halliday esclarece o funcionamento do sistema, ilustrando a aprendizagem da fala nas crianças através de símbolos não verbais:

The child creates the symbols, using vocal and gestural resources in acting out the role of learner, and by the same token enabling the “others” to act out their roles as teachers… These sets of symbolic acts develop into systems. An act of meaning implies a certain choice: if there is a meaning “I want”, then there can be a meaning “I don´t want”, perhaps also “I want very much”, as alternatives. If there is meaning “I´m content”, this can contrast with other states of being: “I´m cross”, “I`m excited”, and so on. Sets of alternative meanings of this kind form semiotic paradigms called “systems”: Each term in a system excludes, and hence presupposes, the other (s). Halliday (1993, p. 96)

É, portanto, este sistema de escolhas que permite ao falante fazer uma escolha em detrimento de outras escolhas possíveis nesse ato de significar que a língua nos potencia enquanto falantes, quer quando recorremos ao modo oral, quer quando recorremos ao modo escrito.

A esse respeito, Halliday defende:

When children learn language, they are not simply engaging in one kind of learning among many; rather, they are learning the foundation of learning itself. The distinctive characteristic of human learning is that it is a process of making meaning – a semiotec process; and the prototypical form of human semiotic is language. Hence the ontogenesis of language is at the same time the ontogenesis of learning. Halliday (Op. cit., p. 97)

97 Desta forma, pode-se dizer que a língua é usada nas interações sociais para produzir significados, sendo, portanto, necessário dar a entender aos aprendentes como a língua está organizada, para aprenderem a fazer uso dela quer para opinar sobre algo, quer para relatar um evento qualquer com total desembaraço.