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4.INCLUSÃO E DIVERSIDADE

4.5 A GESTÃO DA AULA

O estudo do fenômeno educativo em suas dimensões mais amplas está circunscrito no campo da Pedagogia Universitária entendida por Leite (2003) como

[...] um campo interdisciplinar que compreende o estudo do docente como intelectual público, do conhecimento social como articulador do científico e do cotidiano, da inovação pedagógica, da avaliação institucional e da classe nos contextos das novas tecnologias (p. 196).

Como parte dos estudos próprios à Pedagogia Universitária situa-se a didática universitária, cujo objeto é o estudo e a intervenção nos processos de ensinar e aprender que ocorrem na aula.

Lucarelli (2007) entende a didática universitária como

Uma didática especializada, cujo objetivo é a análise do que acontece na aula universitária, onde estuda o processo de ensino que um docente ou uma equipe docente organiza em relação às aprendizagens dos estudantes e em função de um conteúdo científico, tecnológico ou artístico altamente especializado e orientado para a formação em uma profissão (p. 77).

A gestão da aula não é algo estático, nem se reduz à aplicação de procedimentos, já que requer a ação-reflexão contínua e vigilante sobre a complexidade das relações que se estabelecem entre as intenções docentes e as expectativas discentes, bem como ao que emerge nessa interação. Trata-se de compreender que a aula é, em si mesma, um processo dinâmico, em que professor, alunos e o próprio objeto de conhecimento implicam-se entre si, (trans)formando-se no percurso de ensinar e de aprender. Compreendida dessa forma, toda a ação docente pressupõe uma atitude investigativa a ser exercida na dinâmica da aula.

Para Veiga (2008, p. 8),

[...] aula é o espaço onde o professor faz o que sabe, expressa o que sente e se posiciona sobre a concepção de sociedade, de homem de educação, de escola, de aluno e seu próprio papel aula é dinamizada peça relação pedagógica de cunho dialógico, porque registra em situação concreta, a

maneira de viver essas relação com vínculo libertador que propicia o exercício da autonomia.

Araújo (2008) trata sobre a disposição da aula; os sujeitos entre a teoria e a técnica e a , polis , focaliza três dimensões cruciais da aula: os sujeitos (professores e alunos), que mantêm uma interlocução intencional, sistemática e organizada, suas relações com a técnica (que se traduz pelo saber fazer, envolve objetivos, finalidades, conteúdos, métodos e técnicas de ensino, tecnologias educativas e avaliação); com a Polis ( que se traduz pelo saber para que, ou seja, a aula guarda uma finalidade intencional, organizada e sistemática, constituindo uma instância cultural carregada de projetos em torno de novas gerações).

Rios (2008) discute sobre o resultado do encontro intersubjetivo entre professores e alunos como pessoas. Para além da dimensão moral, constituinte desse encontro, chama atenção da presença ética, como olhar crítico que sustenta os valores da prática pedagógica.

Castanho (2008, p. 83) coloca que

O trabalho pedagógico se realiza num espaço e tempo político, no qual transita o poder, configuram-se acordos, estabelecem-se hierarquias. Assumem compromissos. Daí a articulação com a moral- e necessidade de sua articulação com a ética. Falar de uma dimensão ética. da docência mais particularmente da aula, é, portanto é pensar na necessidade da presença dos princípios éticos na construção- no seu planejamento, no desenvolvimento do processo, na revisão e no [re]encaminhamento do trabalho.

Nesse sentido, a aula universitária é permeada pela pluralidade. O trabalho educativo de sala de aula constitui numa relação intersubjetiva, na qual está presente a diferença e se procura instalar a igualdade. Para Castanho (2008, p. 83) “do ponto de vista ético, o contrário da igualdade não é a diferença – é igualdade. Na aula, estabelecemos relações. Somos sujeitos de interação”.

Gauthier (1998), aponta que a função pedagógica da gestão da matéria remete ao planejamento, ao ensino e à avaliação de uma aula ou parte de uma aula. Ela engloba o conjunto de operações que o professor utiliza para construir o conhecimento. A gestão da matéria não consiste em um conceito unificado, trata-se de constructos abstratos que criam conjunto de variáveis que influenciam a aprendizagem. O autor, ainda, coloca que a gestão da classe consiste em um conjunto de regras e de disposições necessárias para criar e manter um ambiente

ordenado favorável ao ensino quanto à aprendizagem. A gestão da classe depende do contexto, do tempo, do material, do social, desenvolvimento intelectual dos alunos e influência culturais, institucionais e econômicas e políticas.

Gauthier (1998) apresenta os seguintes passos da organização da gestão da matéria:

Planejamento da gestão da matéria: a) Planejamento dos objetivos de ensino;

b) planejamento dos conteúdos de aprendizagem; c) planejamento das atividades de aprendizagem; d) planejamento das estratégias de ensino; e) planejamento das avaliações; f) planejamento do ambiente educativo.

A gestão da matéria no processo de interação com os alunos- a) atividades de

aprendizagem, planejamento a apresentação de novos conteúdos e estratégias de ensino b) ensino explicito, revisão de conteúdos e recapitulação, conceitos integradores, explicação dos objetivos do trabalho, seqüenciamento e redundância, clareza na apresentação; prática proporcionada aos alunos, retroações, reforço; c) a utilização de perguntas pelos professores: a prática de designar alunos, a clareza das perguntas, o nível cognitivo das perguntas, perguntas estimulantes, questões abertas, questões de acompanhamento, frequência, tempo de espera, a insistência em relação á pergunta, o grau de êxito, reações as respostas; d) a quantidade de instrução: tempo de aprendizagem, tipos de atividades.

Avaliação da fase de gestão da matéria – a) determina o alcance dos

objetivos da disciplina; b) avaliação formativa: retroações ligadas os objetivos da aprendizagem; c) a refletividade dos professores sobre as suas próprias ações relativas ao ensino da matéria: resultados da avaliação para fazer um diagnóstico do ensino ministrado e descobrir novos se os métodos empregados dão os esperados.

Nesse processo da condução do planejamento, até a execução da aula universitária, cabe ao professor produzir o conhecimento de como ser professor Isaia (2003). O importante passa a ser como os conteúdos são entendidos, organizados e integrados em um conjunto significativo de novos conhecimentos, habilidades e estratégias metodológica.

Sob essa perspectiva, Anastasiou (2003) considera o verbo ensinar sob duas dimensões: uma utilização intencional e uma de resultado, ou seja, a intenção de ensinar e a efetivação dessa meta pretendida. A autora identifica também, a diferença entre os termos aprender e apreender. Embora nos dois verbos exista a relação entre os sujeitos do conhecimento, para apreender é preciso agir, exercitar-

se, apropriar-se; já o verbo aprender significa tomar conhecimento, reter na memória mediante estudo, receber a informação.

Anastasiou (2003) coloca que é importante distinguir quais ações estão presentes na meta que estabelecemos ao ensinar. “Se for apenas receber a informação de, bastará passá-lo por meio da exposição oral. [...] No entanto, se a nossa meta se refere à apropriação do conhecimento pelo aluno [...] é preciso se reorganizar, superando o aprender [...]” (p. 14). Foi a partir dessa reflexão que a autora propõe o termo “ensinagem” como um “processo contratual, de parceria deliberada e consciente para o enfrentamento na construção do conhecimento escolar, decorrente de ações efetivadas na sala de aula e fora dela” (ANASTASIOU, 2003, p. 15). Nesse processo, é importante considerar o real envolvimento entre a ação de ensinar e a de apreender, tendo como objetivo a apropriação tanto do conteúdo quanto do processo e as ações pedagógicas se referem a momentos a serem construídos pelos sujeitos em ação acompanhando o pensamento.

Leite (2000) problematiza os conceitos de mudança e reforma ligados à

inovação, visto que a introdução de inovações nos sistemas de ensino tende a dar

uma ideia de melhoria, de progresso, sem, no entanto, provocar transformações, ou seja, mantêm-se as coisas como estão, mas com ares renovados.

A inovação proposta mantém uma forte relação com o conhecimento e implica ruptura com as lógicas de reprodução e regulação. Nesta perspectiva, Leite (2005) afirma que a inovação

[...] se estabelece como um processo descontínuo, de rompimento com os tradicionais paradigmas vigentes na educação, no ensino-aprendizagem- avaliação, ou uma transição entre diferentes concepções paradigmáticas, onde se pode observar uma re- configuração de saberes e, também, de poderes. A inovação nesta condição se constitui, igualmente, em um rompimento com visões hegemônicas da modernidade reguladora. (...) para pensar a inovação é necessário pensar na centralidade do conhecimento e em sua aplicação em esferas de poder com partilha horizontal (p. 121).

Dois aspectos podem ser destacados nas pesquisas sobre a inovação: a ruptura epistemológica e o protagonismo do professor e do aluno. Este último, identificado pela ousadia do professor em romper com a tradição e efetivar práticas transformadoras e com o entendimento do aluno como autor da sua aprendizagem, podendo participar, expressar-se, envolver-se na e com a aula e com a produção do conhecimento.

Leite (1999) esclarece que o protagonismo se refere

[...] à participação/envolvimento dos sujeitos na sala de aula, nos espaços/ambientes micro ou macro institucionais. O protagonismo também envolve a oportunidade de o sujeito dizer a sua palavra; o respeito às diferentes culturas; o aprender com o outro e o ter o que ensinar/aprender; a valorização d outro e dos seus saberes e possibilidades (p. 75).

Do ponto de vista do professor, o protagonismo é fundamental para caracterizar a inovação na perspectiva crítica, porque não se trata de assumir modelos e técnicas de ensino propostas pelos especialistas, as da inventividade, da criatividade proveniente da ruptura conceitual.

A ausência do protagonismo pode produzir a adoção acrítica de técnicas didáticas prescritas em manuais ou sugeridas por especialistas em metodologias e técnicas do ensino, que resultam em alternativas acessórias e provisórias e que pouco ou nada contribuem para a qualificação do ensino, não gerando impacto sobre a aprendizagem dos alunos.

A ruptura epistemológica e o protagonismo, como fatores indispensáveis à inovação, permitem localizar a centralidade da relação entre teoria e prática, tanto nas questões que se referem às condições didático-pedagógicas que favorecem a aprendizagem como construção, quanto na preparação dos alunos para o exercício profissional.

No que se refere às condições didático-pedagógicas, salienta-se que para que o professor possa realizar rupturas conceituais que encaminhem para práticas inovadoras precisa ter conhecimentos suficientes para compreender como ocorre o processo de elaboração do pensamento no aluno; como se processa a informação no sentido de transformá-la em conhecimento; como ocorrem as interações entre sujeito e conhecimento e demais aportes necessários para a tomada de decisões didáticas.

Em relação a um dado campo profissional, a prática preparatória para um determinado ofício precisa ser mediada pelos conceitos que sustentam certas decisões, como, por exemplo, no Curso de Pedagogia é importante ensinar aos alunos diferentes metodologias didáticas, mas é preciso que os alunos reflitam sobre as ênfases dadas, problematizando e situando as diferentes concepções pedagógicas.

Da perspectiva dialética, dentro do campo social, a aplicação de conceitos teóricos, particulares não implica reproduzir taxativamente o anunciado por esses conceitos, mas aceitar a especificidade de cada caso e de cada via do conhecimento, o que supõe reconhecer que as relações entre as esferas teóricas e práticas são parciais, fragmentárias e complementares (p. 83).

Na relação entre teoria e prática estão implicadas as dimensões epistemológicas, didáticas, políticas e sociológicas, considerando que as concepções sobre o conhecimento e sua produção (epistemológico), bem como suas formas de veiculação na aula universitária (didático), precisam levar em conta o tipo de sujeito que se pretende formar (político) e como se espera que desempenhe sua atividade no campo profissional (sociológico). Para tanto, é preciso que o professor tenha uma visão de conjunto do processo formativo, que tenha claro quais aprendizagens serão necessárias em outros componentes curriculares e que conceitos/ações se relacionam com o seu campo de estudos, articulando, de forma interdisciplinar, os conhecimentos que atravessam o currículo, tornando-os significativos porque passíveis de conexões.

A interdisciplinaridade, como uma inovação na aula universitária, precisa ser compreendida para além das articulações pontuais e circunstanciais, vista como uma condição para que o currículo de um dado curso tenha sentido e sustente uma formação acadêmica qualificada.

O espaço universitário, não raro, apresenta condições limitadoras à interdisciplinaridade, principalmente, pela compartimentalização (do saber e da própria instituição), pela supervalorização de alguns campos de conhecimentos em detrimento de outros, pela forma de contratação do trabalho docente, em muitos casos restrita a horas/aulas trabalhadas, não restando tempo para planejamentos, estudos, debates, pesquisas, etc. Isso faz com que o trabalho na universidade seja solitário porque é organizado segundo princípios de segmentação temporal, espacial e programática.

A partir dessas reflexões, acredita-se que a gestão da aula universitária, com novos paradigmas precisa contar com a disposição do professor em protagonizar o próprio trabalho e de espaços, tempos e condições institucionais favoráveis à inovação e, consequentemente, aponta indicadores de qualidade do ensino superior. Não há uma forma melhor e mais eficaz para promover a aprendizagem dos alunos, portanto, não há um modelo didático que irá garanti-la, mas é possível afirmar que a ruptura com a concepção tradicional de educação, baseada na

perspectiva de alguém que ensina e de alguém que passivamente recebe o ensino, favorecerá a mudança, a inovação e qualidade desde que sustentada teoricamente e acompanhada por uma opção epistemológica, podendo provocar grandes transformações no ensino acadêmico, na formação dos alunos e na configuração da docência.

5 O CURSO DE PEDAGOGIA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO FRANCISCANO