• Nenhum resultado encontrado

Para se adentrar na temática da gestão democrática, há necessidade de se fazer sua relação com a educação, que tal como a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a assistência aos desamparados, é um direito social assegurado a todos os brasileiros pela Constituição Federal de 1988 (Art. 6º). O direito à educação se viabiliza por meio da escola, o ambiente onde as crianças, jovens e adultos se reúnem em torno do cotidiano escolar, consolidando o desafio de ensinar e aprender (VIEIRA, 2009). Atrelada ao ato de educar está a gestão escolar, de abrangência dos estabelecimentos de ensino, que subsidia todas as ações desenvolvidas pelo coletivo da escola em consonância com a gestão educacional, de forma ampla e democrática junto aos alunos, ao corpo docente, aos funcionários e comunidade local.

Cabe destacar que as definições da gestão educacional advindas da Constituição e da LDB a situam como espaços de ações dos governos federais, estaduais e municipais, ou seja, dizem respeito aos seus diferentes níveis organizacionais, bem como aos seus integrantes, desde os detentores de altos cargos aos mais simples servidores. Nesse sentido, vale ressaltar que a gestão educacional e a gestão escolar “articulam-se mutuamente, onde a primeira existe em razão da segunda, ou seja, a razão de existir da gestão educacional é a escola e o trabalho que nela se realiza” (VIEIRA, 2009, p. 26).

Logo, o dever do Estado para com a educação está regulamentado em lei (CF/88, Art. 208 e LDB/96, Art. 4º), pois a concebe como um direito público de todos e dever do Estado e da família, a ser promovida e incentivada em parceria e colaboração da sociedade, em que Estados/sociedade compartilham responsabilidades tanto em relação a direitos quanto a deveres.

Nessa perspectiva, assume caráter obrigatório a garantia de oferta de ensino fundamental e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria e pela progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio, importando a irregularidade de sua oferta como responsabilidade da autoridade competente. A LDB/96 introduziu mudanças na Educação Básica brasileira; na atual diretriz, sua concepção é acrescida pela ampliação do número de anos que a compõem, incluindo a Educação Infantil, o Ensino Fundamental de nove anos e o Ensino Médio (VIEIRA, 2009).

No que tange à responsabilidade da família no âmbito da educação, ela se concretiza em deveres, cabendo aos pais matricular seus filhos menores, “a partir dos seis anos de idade, no ensino fundamental”, conforme preconiza o Art. 6º da LDB/96 (apud VIEIRA, 2009, p.

37). Portanto, a legislação vigente define a educação escolar como aquela que mantém um vínculo entre a escola, o mundo do trabalho e a prática social (VIEIRA, 2009).

A escola, lócus de gestão do conhecimento e de construção da aprendizagem, encontra amparo na Constituição Federal atual para o exercício democrático da gestão escolar a partir da efetivação do princípio de gestão democrática do ensino público, estabelecido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei n. 9.394/96 – que possibilita às pessoas, independentemente de sua situação social e cultural, intervir na construção de políticas e na gestão das instituições educacionais públicas. Nesse contexto, o discurso da gestão democrática e participativa vem à tona (VIEIRA, 2009).

Instituída legalmente pela Constituição Federal de 1988 e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n° 9.394/96, a gestão democrática pode ser entendida como

(...) um processo de aprendizado e de luta política que não se circunscreve aos limites da prática educativa mas vislumbra, nas especificidades dessa prática social e de sua relativa autonomia, a possibilidade de criação de canais de efetiva participação e de aprendizado do “jogo” democrático e, consequentemente, do repensar das estruturas de poder autoritário que permeiam as relações sociais e, no seio dessas, as práticas educativas” (DOURADO, 2000, p. 79).

Vieira (2009) enfatiza que, ao estabelecer a gestão democrática do ensino, o texto constitucional institui (CF/88, Art. 206, Inciso VI), ao mesmo tempo, o direito e o dever de participação de todos os que atuam no sistema e nas escolas públicas, ou seja, sinaliza-o como um dos sete princípios necessários para se ministrar o ensino no país.

Portanto, a gestão democrática do ensino público contém o princípio da participação da sociedade, apontando uma concepção de educação com fundamento no exercício efetivo da cidadania mediante a conquista progressiva da autonomia. Uma gestão democrática de fato tem como sustentação a participação efetiva de todos os segmentos da comunidade escolar em sua rotina diária, especialmente nos momentos de tomar decisões. E, por extensão, devem ser desenvolvidos no cotidiano escolar nas escolas públicas os princípios de igualdade, liberdade, pluralismo, gratuidade, além da valorização dos profissionais de educação (VIEIRA, 2009).

Dessa forma, verifica-se que o processo democrático requer a participação ativa de seus atores, que é consolidada por uma construção permanente e sistemática, que deve acontecer desde “a elaboração dos projetos, definição de metas, decisões, execução, avaliação

e se necessário a retomada de ações e o repensar do processo pedagógico. (DOURADO, 2000).

A gestão democrática é, portanto, sinônimo de participação da comunidade, de autonomia e de descentralização administrativa e propõe, como principais instrumentos, a criação de conselhos escolares e de grêmios estudantis, a elaboração do projeto político pedagógico em âmbito interno, e a escolha direta de diretores com vista ao fortalecimento da liberdade, flexibilidade e democracia (DOURADO; DUARTE; MACHADO, 2001).

Padilha (1998) e Dourado (2000) referendam a eleição de diretores de escola, seguida da constituição de conselhos escolares como formas mais democráticas de gestão. A partir desse procedimento, efetiva-se a gestão democrática na escola, institucionalizando a descentralização de atividades e poder. Desse modo, espera-se que a escola assuma suas decisões e reaja pontualmente a questões de ordem pedagógica, de relações com a comunidade, de projetos educacionais, de formação continuada dos professores e de aproveitamento fidedigno à realidade da escola, com a gestão séria dos recursos materiais e financeiros oriundos da esfera governamental, em seus vários níveis.

A “gestão democrática do ensino público na forma da lei” é um valor público definido em lei, cujos limites são assim estabelecidos. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios apontados por Vieira (2009, p.45):

I) participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola;

II) participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.

Na perspectiva de crescimento da gestão democrática nas escolas, tanto a Constituição Federal de 1988 quanto a LDB contribuíram para que a década de 90 fosse o marco para a substituição do termo administração pelo termo gestão na educação brasileira. Atualmente a expressão gestor está sendo mais empregada no âmbito das instituições educativas, pois o termo abrange as diversas demandas a que as instituições estão hoje submetidas, uma vez que devem ser mais globalizantes e dinâmicas, envolvendo “a dimensão política e social, a ação para transformações, globalizações, participação, práxis, cidadania, dentre outros” (LUCK, 2009, p. 35).

Na perspectiva democrática, o conceito de gestão está associado ao fortalecimento da democratização do processo pedagógico, à participação responsável de todos nas decisões necessárias e na sua efetivação mediante um compromisso coletivo com resultados educacionais cada vez mais efetivos e significativos (LUCK, 2009).

Com essa nova configuração de entendimento da função de gestor, a comunidade escolar ganha força e começa a se envolver nas resoluções que anteriormente eram apenas do gestor escolar e/ou do Estado, com o objetivo de consolidar a autonomia, a participação, a descentralização do poder decisório bem como o desenvolvimento de projetos educativos em corresponsabilidade, visando à melhoria da qualidade de ensino. Torna-se, portanto, evidente a necessidade de discussões e de participações nas ações voltadas para o sucesso escolar dos respectivos segmentos, transpondo a idealização e buscando uma maneira competente de não só aprovar os alunos e mostrar dados estatísticos de melhoria, mas também de estabelecer a formação do homem enquanto cidadão consciente e apto (LUCK, 2003).

Quando ocorre esse processo de transformação e construção democrática na escola, pode-se dizer que a gestão escolar bem-sucedida é um componente fundamental do sucesso escolar, no qual o compromisso com a aprendizagem orienta todo o trabalho desenvolvido. (VIEIRA, 2009).

Na ótica democrática, os autores anteriormente citados comungam de pensamentos afins voltados para o fortalecimento da gestão escolar por meio da participação, em que se almeja o envolvimento de todos os segmentos nos rumos da escola pelo princípio da participação de forma ampla e responsável junto aos aspectos pedagógicos, administrativos, financeiros, com vistas à construção de processos dinâmicos que envolvem a gestão de pessoas e a retomada de ações/projetos, no sentido de se efetivar uma escola de sucesso para todos os alunos.

Na última década, partiu-se da premissa de que a escolha de dirigentes por maioria de votos da comunidade escolar garantiria a democratização das relações internas da escola, superando as mazelas decorrentes da sistemática de indicação, além de assegurar o compromisso da instituição no cumprimento de sua missão, qual seja oferecer oportunidades educacionais concretas a todos os cidadãos. A partir daí a democratização da sociedade brasileira ocupou o sistema de ensino público em vários estados, com a adoção de práticas colegiadas, eleições e descentralização dos recursos financeiros. Essas inovações foram sendo introduzidas em vários estados brasileiros, de forma pontual, desde 1981. (DOURADO, 2000).

A ideia de ser um cargo de confiança e, como tal, passível de indicação política por parte do sistema de governo local, perpetua-se, não redimensionando as responsabilidades e também não oferecendo possibilidade para exercer uma direção coletiva. Nesse contexto, o diretor continuava como o único a responder pelos sucessos ou fracassos obtidos no ensino, evidenciando-se um paradoxo: de um lado, o direito de escolher um diretor e, de outro, a falta de condições e interesses para que a escola atendesse à participação dos segmentos envolvidos na tomada de decisões que atingissem os objetivos e resultados da escola e de sua administração. No decorrer dos tempos, a indicação política foi a maneira que menos comprovou ser a mais adequada e que, embora tenha sobressaído, não fora pela obtenção de resultados significativos, mas pela forma de dominação e poder, prevalecendo as mesmas insatisfações ante esse procedimento (PARO, 1996 ).

É oportuno enfatizar que a falta de credibilidade no contexto da administração escolar no transcorrer dos anos 1980 e de processos dinâmicos de decisão coletiva permaneceram evidentes no âmbito da escola. A ausência de procedimentos que possibilitassem a participação ativa de seus segmentos representativos tornou a eleição para diretor ato insuficiente e incapaz para modificar a centralização de poder na escola e o rompimento com uma cultura de procedimentos impessoais (COUTO, 1998).

Paro (1986, p. 85) enfatiza que “a participação de todos na determinação dos rumos da escola não se realiza da noite para o dia”, sendo, portanto, uma construção em longo prazo no que se refere a um processo de mudança que precisa iniciar com medidas que, na prática, rompam com as condições presentes no contexto de trabalho, em que o diretor precisa também estar preparado para gerenciar os conflitos que por certo devem advir.

Na perspectiva democrática, pode-se dizer que a troca de gestores em virtude dos acordos políticos e relações de poder, antes exercidos, deixa de existir com a nova estrutura de gestão. A questão da competência passa a ser caracterizada e avaliada com padrões entre os educadores e os resultados obtidos em determinado período. Pode-se observar que o poder, antes aferido unilateralmente, passa a ser o mais forte anseio da comunidade participante.

A evolução do novo paradígma de administração para gestão, em que a gestão democrática se fortalece, vem transcorrendo historicamente no contexto dos sistemas de ensino público brasileiro. Nesse sentido, a gestão passa a ter status de uma expressão que ganhou corpo no contexto educacional, caracterizando-se pelo reconhecimento da importância da participação consciente e esclarecida dos diversos segmentos nas decisões sobre a orientação e planejamento de seu trabalho. Agregado ao conceito de gestão democrática está o

fortalecimento da democratização do processo pedagógico, mediante o compromisso de uma gestão educacional democrática e participativa, associada ao compartilhamento de responsabilidades no processo de tomada de decisão entre os diversos níveis e segmentos de autoridade do sistema educacional, envolvendo quem vai realizar esta prática e seus usuários (DOURADO, 2000).

O conceito de gestão democrática, ora enfatizado, permite a coletividade e a democratização de ações que priorizam a corresponsabilidade no fazer pedagógico dos destinos da instituição de ensino e sua autonomia na construção, execução e avaliação do projeto político-pedagógico pelos atores envolvidos no processo escolar de cada escola. Como observa Vieira (2009, p. 25), “gestão se faz em interação com o outro, pois o trabalho de qualquer gestor(a) implica sempre conversar e dialogar muito”, com vistas ao fortalecimento da gestão democrática.

Segundo Dourado et al. (2001, p. 18), “uma gestão democrática e participativa do ensino público busca, pelo diálogo e pela mobilização das pessoas, a criação de um projeto pedagógico , com base na participação e nos princípios de convivência democrática”.

Documentos relacionados