• Nenhum resultado encontrado

A gestão democrática na perspectiva dos sujeitos das escolas

CAPÍTULO 5. OS CICLOS DE APRENDIZAGEM NA RMER: O PONTO

6.2 Os sujeitos da escola

6.2.1 A gestão democrática na perspectiva dos sujeitos das escolas

A coordenadora pedagógica da escola B relatou como foi implantado o processo de gestão democrática nas escolas municipais, colocando que o momento não foi fácil, porém muito valoroso e que a partir desse momento a Rede nunca será a mesma, conforme relato:

quando eu cheguei na escola, a questão do diretor era enviado, indicado e foi um momento difícil para muitos a questão da democratização da gestão escolar. O diretor ser escolhido por todos da escola, naquele momento foi um salto muito alto no incremento de políticas de cunho democrático. Para você eleger quem de nós seria o diretor(a) da escola, não foi fácil, mas foi um trabalho muito bonito com os professores, alunos, foi um trabalho crucial, mas foi muito bom, e aí vem a questão da democratização, dos projetos, do conselho, a elaboração do conselho também foi muito difícil, a escolha das pessoas, da campanha de votação para escolher os conselheiros da escola, foi um trabalho muito bom. No começo do Conselho Escolar em 2001, as reuniões eram sistemáticas. Todo mês ou de dois em dois meses se reuniam e discutiam a questão do ciclo, e às vezes quando tinha questão de emergência também, o conselho era convocado para decidir as questões, além das reuniões marcadas. A qualquer momento (manhã, tarde ou noite) era convocado, e as coisas com mais urgência eram definidas […] Até demais. O conselho era muito atuante, chegando até a passar dos limites das suas atribuições. (CP B).

A partir de 2001 iniciou-se a discussão do processo democrático nas escolas com a implantação de novos conselhos e formações, já que a eleição para novos dirigentes nas escolas teria que ser via conselho escolar. A partir de 2002 materializou-se o processo de eleição direta para os dirigentes escolares. Tanto a Escola A, quanto a Escola B, tiveram oportunidade de escolher seus dirigentes.

Já participo do terceiro processo de eleição e sempre também sem concorrentes. Foi chapa única em todos os processos, e continuo aqui na direção. No início foi através de Decreto do Prefeito e depois foi regulamentada pela Lei, por isso que estou no terceiro mandato (DIR A)

Apesar de o processo ter sido instaurado na RMER a coordenadora pedagógica relata a necessidade de uma avaliação permanente desse processo, pois falhas foram cometidas e, se não aprimoradas, tenderão a ser ratificadas práticas autoritárias, conforme explicita:

Com certeza esses momentos de discussão, torna à escola VIVA. A questão da democratização da escola, sempre foi bandeira de luta dos profissionais da educação. Então, é muito emocionante vermos isso ser consolidado na prática e, principalmente, regulamentado em Lei. No entanto, acho que esse processo de eleição direta para os dirigentes de escola não pode ser atropelado, tem que ser revigorado sempre. Mas, agora, não depende só da Secretaria de Educação e, sim, muito mais dos professores que precisam enfrentar o debate das ideias e não cair no risco da acomodação, para não referendar práticas autoritárias em nossas escolas (CP B).

A coordenadora pedagógica enfatiza, ainda, que a democratização das relações perpassa por todos os segmentos que estejam no âmbito da Secretaria de Educação, inclusive na sala de aula, com os nossos estudantes, estes são o alvo de todas as políticas, quando afirma:

É necessário que todos façam parte deste processo, com participação ativa e que esta prática seja reproduzida em sala de aula, com os nossos alunos, desde a democratização do acesso à democratização dos conhecimentos, principalmente, no respeito ao ritmo de aprendizagem. Eu enxergo esse processo com uma dimensão muito maior. A escola não pode andar sozinha. Ela tem que ter parceria, esportes, todos com um objetivo só. a questão do aluno com todo, porque a escola só funciona quando tem aluno. Quando não tem aluno, a escola não tem nem conselho, nem diretor, nem aluno, não é? Então se a estância maior é o aluno, a gente tem que saber separar as coisas também. Todos com o objetivo maior que é o aluno (CP B).

Indo de encontro à preocupação dessa coordenadora com a consolidação do processo democrático, uma professora da mesma escola expressa o seu isolamento nos processos de discussão da escola restringindo-se a sua sala de aula.

A atuação do conselho escolar, eu não posso dar essa resposta. Eu prefiro ficar de fora. A direção sabe mais do que eu nesse sentido. Não sei se há periodicidade de reuniões. Quanto a isso é com a direção, entendeu. Prefiro não me envolver e fazer meu trabalho na minha sala de aula. E, pronto! (P3B).

No relato da professora P3B, o processo democrático da escola B, no que diz respeito a atuação do Conselho Escolar, na realização do Projeto Político Pedagógico (PPP), no

trabalho interativo direção/professores, é inexistente. Constatamos que ela não foi a única, já que na descrição de outra professora o CE não é ativo e refere-se a interação apenas com os professores/as.

Aqui na escola, pelo menos no turno da manhã, eu acho que os professores são muito unidos, a gente troca atividades, trabalha no mesmo projeto, olha eu trouxe esse texto, trouxe isso, aquilo […]. Existe muita interação entre os professores. Agora em relação a direção, temos muita dificuldade. A diretora estar doente, de licença para tratamento de saúde, há mais de ano, bote tempo nisso! O projeto político pedagógico eu nem sei se foi concluído, mas eu acho que foi concluído pela direção e aí eu acho que não teve depois a participação de todos os professores, não. houve um ou dois encontros e parou. O CE não é ativo. Eu acho que é essa dificuldade que temos, porque todo mundo tem sala de aula, todo mundo tem outro horário. Existe a resistência das pessoas em não querer participar, pelo trabalho mesmo que dá, pela responsabilidade que é, e eu acho que ele fica mais assim, mais voltado pra a questão financeira da escola, essa questão realmente do dia-a-dia de trabalho, de dificuldade de relacionamento com o aluno, de algum professor com alguma dificuldade, alguém da comunidade, eu acho que a gente esquece um pouquinho entendeu, a gente mesmo, eu mesmo, por exemplo, eu to falando por mim, nunca perguntei assim quem é do conselho que a gente possa acionar e levar algum problema pra conselho, entendeu (P4B).

A professora P2B menciona a questão do PPP e da falta de apoio que os professores/as sentem em relação ao envolvimento da direção da escola B com as questões pedagógicas. Na fala abaixo, verificamos uma falta de conhecimento pelos professores/as do que venha ser um PPP.

O projeto político pedagógico parece que foi construído com os professores, mas assim, eu estou aqui há 5 anos e nunca participei da construção do PPP, se tiver ele é bem antigo. Acredito que falta um envolvimento da direção com o pedagógico, isso influencia e, muito na estrutura da escola, assim como a estrutura física como a estrutura do corpo docente, da coordenação, tudo isso influencia bastante, tanto pode ser positivamente, quanto negativamente (P2 B).

Uma outra professora da escola B, não entendeu quando nos referíamos ao Projeto Político Pedagógico da escola, quando apenas enfatiza o trabalho com “projetos” em sala de aula, e não com um Projeto coletivo, fruto de uma discussão com toda comunidade escolar. É mais um relato dessa escola, em que mencionam a falta de atuação do conselho escolar.

A escola tem um projeto político pedagógico e sempre que é possível os professores junto com a direção se propõe a trabalhar em cima dos projetos agora nem sempre é possível [...]. Com relação ao conselho escolar, eu não faço parte e, sinceramente,eu não vejo momentos de reunião. Na escola que eu trabalhei eu não fazia parte do conselho, mas eu sempre presenciava momentos de encontro dos segmentos do conselho, na tomada de decisões, pra tudo o conselho estava sempre presente, sempre atuante para tomar qualquer decisão dentro da escola. Aqui na escola eu não vejo e, olhe, que eu trabalho os dois horários aqui, passo o dia inteiro (P1 B).

Diferentemente dos relatos acima explicitados, podemos constatar nas falas que seguem abaixo, a compreensão por parte dos/as professores/as, coordenador pedagógico e direção da Escola A, sobre a importância da atuação do Conselho Escolar nas escolas, não apenas para controle social através da prestação de contas financeira mas, sobretudo no envolvimento com a escola. Conforme descrevemos:

O conselho escolar é relativamente atuante. Estamos sempre nos reunindo. Todas as tomadas de decisões são feitas em conjunto. Isso já vem, mais ou menos, uns 6 anos acontecendo assim. Oficialmente, ela demora assim numa faixa de dois a três meses para se reunir mas, semanalmente, praticamente, estamos nos reunindo. Porque, o conselho como é formado a grande maioria por professores, lideranças da comunidade e pais de alunos, então, informalmente, a gente estar sempre se reunindo. Principalmente esse ano que houve esse problema de mudança de prédio. Estamos sempre dialogando sobre os problemas. Agora, não fica registrados esses encontros (DIR A).

Procuram ver as necessidades e resolver da melhor forma possível até porque a maioria dos membros são pessoas que estão na comunidade e eles sabem que são eles os melhores pra trazer pra gente os problemas e também procurar informações pelo menos o conselho eu sei que há reuniões e eu sei que ele atua (CP A)

Além de trazermos os depoimentos em relação a atuação do conselho escolar, cabe- nos ressaltar como foi construído o Projeto Político Pedagógico da Escola A, abaixo relatados:

Existe o projeto político-pedagógico e eu creio que tenha sido construído com algumas opiniões e sugestões dos professores (CP A).

Na minha história de Rede que totalizam oito (08) anos eu participei uma vez da elaboração de um projeto político pedagógico, de um PPP, uma vez apenas, participei mesmo de reuniões, houve grupos de estudo, foram consideradas as nossas sugestões [...]. Em relação ao nosso PPP, eu não participei e não fui consultada, nem sei quando foi elaborado ( P1 A).

Ninguém trabalha nas condições que a gente trabalha se não tiver realmente satisfeito com alguma coisa, então o que eu percebo aqui de uma forma geral é que os professores eles trabalham muito satisfeitos nas suas salas, é uma escola boa de trabalhar, a direção é boa, é atuante, as pessoas da secretaria são atuantes nos ajudam nos dão suporte, a gente tem oportunidade de pedir transferência, então quem estar aqui, estar por que gosta do trabalho. É um lugar bom de trabalhar, então se é um lugar bom de trabalhar a gente tem que dar a nossa resposta, no sentido de fazer as coisas funcionarem como todo mundo quer e como a gente quer também. Então a gente se junta quando precisa ajudar um ao outro, quando há dificuldade com aluno o outro professor socorre, o pessoal da secretaria socorre. […] Então é isso, a gente se ajuda muito, gosta de trabalhar aqui, é feliz aqui, acho que isso se reflete nessa hora de dar aula, os meninos também são muito carinhosos, a comunidade é muito boa, mas tem muita gente que cobra, que estar em cima, que quer que faça o melhor para os seus filhos e estamos sendo cobrado no bom sentido(P1 A).

a unidade de ensino muito precisa fazer, inclusive esclarecer a comunidade sobre a política educacional da Rede.

Eu ainda acho a comunidade muito pouco esclarecida a respeito de como a escola funciona, para muitos pais, mesmo os pais jovens, para eles o ideal é que a criança chegue em casa com o caderno cheio de tarefa corrigida e que leve outra porção para fazer em casa porque aí ele esta aprendendo porque esta com muita tarefa, ainda acho a comunidade um pouco deficitária em sentido de saber realmente como funciona (P1 A).

Dos relatos dos/as professores/as das duas escolas pesquisadas, em relação ao impacto com a implantação dos ciclos, no total dos dez (10) entrevistados, dos seis (06) que estavam na Rede quando da sua implantação, 04 foram bastante críticos quando relataram a forma em que os ciclos foram implantados e os outros 02 se posicionaram também contrários, mas de forma mais amena. Enfatizaram que foram pegos de surpresa e que a decisão da SE foi totalmente inesperada sem nenhuma discussão anterior.

Os seis entrevistados foram unânimes em mencionar que aconteceu “de cima para baixo” sem escutar a comunidade escolar e sem levar em consideração a realidade de cada escola, o que ocasionou muita angústia por parte dos docentes, dirigentes e pais que ficaram sem compreender o tipo de proposta implantada e as mudanças que estariam acontecendo na forma de avaliar seus filhos.

Uma das entrevistadas, que tem onze (11) anos de magistério e mais de oito (08) anos na RMER, trabalha em horário integral no regime de acumulação. No seu relato enfatiza a forma como os ciclos foram implantados na Rede.

Bem, o ciclo foi implantado em 2001, no segundo semestre, meados de 2001, eu tinha um (01) ano na Rede, então tudo era muito novo, não só pra mim como pra todo o grupo, foram momentos assim de transformação e como toda transformação mexe bastante, mexeu bastante com os professores, alunos, dirigentes, comunidade, porque os pais também não compreendiam, gerou uma fase de muita angústia, muita aflição e que nós, enquanto professores, tentávamos tranquilizar os pais, tentávamos ao máximo esclarecer as dúvidas, mas era angustiante pra a gente também, porque até então nós não tínhamos nada muito claro, estávamos em fase ainda de compreensão […] mas eu confesso que no início assustou um pouco, foi bem tumultuado, mas aceitamos aquele desafio, foi realmente um desafio, foi uma revolução na Rede, foi um grande desafio aquele período de implantação do ciclo pra todo mundo, desde o mais antigo na Rede, a mim recém-chegada. Eu confesso que já vinha um grupo acostumado com a seriação, um outro trabalho, aí vem a ser implantado o ciclo, aquilo assustou demais, mexeu muito com a gente, mas graças a Deus, aos pouquinhos vai se acomodando, as ideias vão sendo organizadas e quando a gente tá disposto a aceitar os desafios, se propõe a aceitar as mudanças, tudo funciona melhor, não é verdade, então graças a Deus deu pra a gente se adequar (P1B).

A professora acima relatou sua visão no momento da implantação dos ciclos e continuou sua fala dando ênfase a resistência por parte dos professores/as, afirmando que foi geral, independente do tempo em que estavam na Rede, contudo pondera que:

A meu ver a resistência foi geral, independente de tempo na Rede houve uma resistência, alguns aceitavam o desafio, viam como uma mudança muito positiva que ia trazer muitos benefícios, mas resistiram um pouco talvez pela angústia, pela dúvida se iria dar certo se conseguiríamos realmente atender a proposta do sistema de ciclos. Outros realmente resistiram completamente, nunca viram de forma positiva essa mudança, não acreditavam que pudesse realmente acontecer, que pudesse mudar pra melhor o ensino na Rede municipal de Recife, eu realmente vi um grupo muito mexido, alguns aceitavam, mas tinham medo da mudança e se preocupavam realmente como seria essa mudança, tinham medo de enfrentar o desafio e outros realmente não acreditaram na proposta, não acreditavam, resistiram bastante, mas aos poucos tudo foi se encaixando e foi se adequando a nova realidade (P1B).

Constatamos que as resistências à nova organização do ensino também ocorreram por parte dos gestores das escolas, que mencionaram que a proposta era apenas um modismo da nova gestão. Apesar da crítica, mencionaram credibilidade na equipe gestora da SE, mas relataram as suas desconfianças e as inquietações relatadas pelos/as professores/as:

[...] estamos acostumados com gestores que mudam tudo, em nome das novas propostas[...]. Eu achei a implantação dos ciclos uma forma mais ou menos bruta, uma imposição, não foi uma conquista, não foi uma coisa trabalhada (DIR A).

Vemos que há diferenças entre as duas escolas e entre os sujeitos da mesma escola com relação à gestão democrática. No capítulo 07 discutiremos essas concepções e suas possíveis conseqüências para a implementação dos ciclos de aprendizagem na RMER.

6.2.2 Bases conceituais que fundamentaram a equipe gestora ao implantar uma nova