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Como fatores intervenientes das relações entre a jurisdição estatal e outras instâncias não-estatais, emerge o fenômeno da globalização. Esta ocorre quando a unidade do Estado e da sociedade nacional é desmanchada diante do aparecimento de “[...] novas relações de poder e de concorrência, novos conflitos e incompatibilidades entre atores e unidades do Estado nacional por um lado e, pelo outro, atores, identidades, espaços sociais e processos sociais transnacionais”.252

A globalização é definida por Anthony Giddens253 como um fenômeno em que as relações sociais se intensificam em escala mundial, possibilitando que acontecimentos locais são influenciados e modelados por outros eventos que ocorrem a milhares de distância, conectando as localidades longínquas.

[...] globalização são conjuntos de relações sociais. À medida que estes conjuntos se transformam, assim se transforma a globalização. Existem, portanto, globalizações, e deveríamos usar este termo apenas no plural. Por outro lado, se as globalizações são feixes de relações sociais, estas envolvem inevitavelmente conflitos e, portanto, vencedores e vencidos. Frequentemente, o discurso da globalização é a história dos vencedores contada por estes. Na verdade, a vitória é, aparentemente, tão absoluta que os derrotados acabam por desaparecer completamente do cenário.254

Sob esse ponto de vista, as questões fundamentais dessa transformação são muitas, tanto que se constata um ecletismo teórico na abordagem sobre a globalização ao longo do tempo. Dentre as inúmeras concepções, destacam-se a econômica, política, social, ambiental e cultural, cuja significação e características dependem do momento histórico vivenciado.255 Em face de tais peculiaridades, pretende-se analisar a globalização sob o enfoque socioeconômico, sem qualquer ambição de sistematização sobre o tema.

A globalização social é o cenário em que a economia global levou os países em desenvolvimento, em especial, o Terceiro Mundo, a um processo de exclusão

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BECK, Ulrich. O que é globalização?. Equívocos do globalismo/respostas à globalização. Tradução de André Carone. São Paulo: Paz e Terra, 1999. p. 49.

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GIDDENS, Anthony. As consequências da modernidade. São Paulo: Unesp, 1991. p. 69.

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SANTOS, Boaventura de Sousa. A gramática do tempo: para uma nova cultura política. São Paulo: Cortez, 2006. v. IV. p. 194-195.

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social diante do incremento tecnológico, caracterizado pelas perdas das garantias sociais dos cidadãos, precarização das condições de trabalho, desemprego, baixos níveis salariais, configurando assim, um empobrecimento de natureza estrutural. Liszt Vieira256 destaca que, na atualidade, o “[...] padrão mundial de acumulação e desenvolvimento, assentado no domínio das informações, do saber e das novas tecnologias – e não apenas do capital e do poder de coerção -, reduz a oferta de empregos produtivos e reforça as tendências de exclusão social”. Todavia, ressalta o autor que, não há qualquer conexão entre a derrocada econômica desses países com a nova ordem global, cuja capacidade produtiva é enorme.

Com o efeito da globalização, percebe-se maior interdependência nas relações sociais, comunicações e conexões geradas pelo desenvolvimento da tecnologia moderna, causando maiores incertezas e inseguranças na sociedade, que decorrem da nova instantaneidade do tempo. Esses fenômenos “tentam captar e articular é a experiência combinada da falta de garantias (de posição, títulos e sobrevivência), da incerteza (em relação à sua continuação e estabilidade futura) e de

insegurança (do corpo, do eu e de suas extensões: posses, vizinhança,

comunidade)”.257

Do ponto de vista sociológico, Boaventura de Sousa Santos258 enumera cinco desafios que emergem de perplexidades produtivas, mas que conferem ao tempo presente uma nova característica e reflexão, diante da imprevisibilidade e celeridade de algumas transformações globais no contexto sócio temporal.

Assim, das perplexidades que já ocupam ou ainda devem ocupar como desafios para os próximos anos, tem-se: a) problemas de natureza econômica, cuja pauta encontra-se nas agendas políticas de diversos países, tais como, crise financeira do Estado-Providência, deficit orçamental, inflação, taxas de juros, o desemprego, dívida externa e política econômica em geral, tanto a nacional como a internacional. “Contudo, e em aparente contradição com isto, a teoria e a análise sociológica dos últimos dez anos têm vindo a desvalorizar o económico, em detrimento do político, do cultural e do simbólico, têm vindo a desvalorizar os modos

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LISZT, Vieira. Cidadania e globalização. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 1998. p. 90.

257

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Tradução de Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. p. 184.

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SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1997. p. 20-22.

de produção em detrimento dos modos de vida”.259; b) intensificação das práticas transnacionais, decorrentes desde a “internacionalização da economia à translocalização maciça de pessoas como migrantes ou turistas, das redes planetárias de informação e de comunicação à transnacionalização da lógica do consumismo destas transformações”.260 Tais questões são consequências de um Estado nacional marginalizado, com sua autonomia e capacidade de regulação social enfraquecidos, diante da crescente globalização da economia; c) regresso do indivíduo, pois devido “o esgotamento do estruturalismo trouxe consigo a revalorização das práticas e dos processos e, nuns e noutros, a revalorização dos indivíduos que os protagonizam”.261 Todavia, em contradição, o indivíduo nunca teve sua vida privada tão explícita publicamente como nos tempos hodiernos; d) a democracia, como paradigma sócio- político da modernidade. Os processos de democratização foram abarcados por muitas instituições, dos quais se destaca o Banco Mundial que tem como política, defender que o crédito concedido seja aquele em que vige a democracia no país creditado, com base no “princípio da ‘condição política’ (political conditionality), ao mesmo tempo que a Agência Internacional para o Desenvolvimento, dos EUA, promove em larga escala ‘iniciativas para a democracia’ (democracy initiatives), com o mesmo objetivo de vincular o desenvolvimento à democracia”.262 Por sua vez, reporta- se na história europeia, o conflito entre a democracia e o liberalismo econômico, existente desde meados do século XIX. No prisma internacional, o fato da democracia ser promovida conjuntamente com o neoliberalismo na atualidade, manifesta-se contraditório; e) desterritorialização das relações sociais, em face das interações globais e intensa interdependência transnacional, que rompem as fronteiras do nacionalismo, costumes, ideologia e o idioma. O mesmo grau de contradição ocorre quando “assiste-se a um desabrochar de novas identidades regionais e locais

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SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1997. p. 20.

260

SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1997. p. 20.

261

SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1997. p. 20.

262

SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1997. p. 21.

alicerçadas numa revalorização do Direito às raízes (em contraposição com o Direito à escolha)”.263

Nesse contexto, é importante esclarecer que a globalização em sua dimensão econômica implicou a desterritorialização da política, engendrando consequências no âmbito jurídico e social. Dentro dessa perspectiva, a globalização econômica264 opera por meio do neoliberalismo, preconizando com base no receituário estabelecido pelo chamado “‘Consenso de Washington”, o término da inflação, maior liberdade de mercado e a diminuição da participação do Estado na sociedade.265

O denominado consenso de Washington configura-se como um contrato social, no prisma internacional, envolvendo os países centrais capitalistas. Este se apresenta para as demais sociedades nacionais, “como um conjunto de condições inexoráveis de aceitação acrítica sob pena de implacável exclusão. São essas condições inelutáveis globais que depois sustentam os contratos individuais de direito civil”.266

A origem do neoliberalismo ocorreu na Europa e América do Norte, no segundo período pós-guerra, época em que imperava o capitalismo como um modelo de organização social. Foi uma manifestação teórica e política contrária ao “Estado intervencionista e de bem-estar”, cujo marco doutrinário é o texto escrito em 1944, “O Caminho da Servidão”, por Friedrich Hayek. “Trata-se de um ataque apaixonado contra qualquer limitação dos mecanismos de mercado por parte do Estado,

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SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1997. p. 22.

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“Globalização da economia significa que as fronteiras entre os países perdem importância, quando se trata de decisões sobre investimentos, produção, oferta, procura e financiamentos. As conseqüências são uma rede cada vez mais densa de entrelaçamentos das economias nacionais, uma crescente internacionalização da produção, no sentido de que os diferentes componentes de um produto final possam ser manufaturados em diferentes países, e a criação de mercados mundiais integrados para inúmeros bens, serviços e produtos financeiros. A globalização também abarca os mercados de trabalho. Aumentaram as migrações de mão-de-obra entre países... Nenhum país pode retirar-se da rede de integração econômica internacional sem no mínimo, temporariamente, ocasionar perdas na assistência social para si e para os outros países”. HESSE, Helmut. Globalização. In: ENDERLE, Georges et allii. (Org.) Dicionário de ética econômica. Tradução de Brenno Dischinger et allii. São Leopoldo: Editora Universidade Vale dos Sinos, 1997. p. 305.

265

LIMA, Abili Lázaro Castro de. Globalização econômica, política e direito: análise das mazelas causadas no plano político-jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002. p. 26.

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SANTOS, Boaventura de Sousa. Reinventar a democracia. In: OLIVEIRA, Francisco de e PAOLI, Maria Célia (Org.). Os sentidos da democracia: políticas do dissenso e hegemonia global. Brasília: NEDIC, Vozes, FAPESP, 1999. p. 95.

denunciadas como uma ameaça letal à liberdade, não somente econômica, mas também política”.267

Em defesa da concorrência e da ausência de regulação do mercado, Hayek pronuncia um princípio orientador “[...] de que uma política de liberdade para o

indivíduo é a única política que de fato conduz ao progresso – permanece tão verdadeiro hoje como o foi no século XIX”.268

As ideias neoliberais passaram a ter progresso no ano de 1973, ante a crise do modelo econômico que atingiu todo o mundo capitalista avançado, culminando com uma profunda e longa recessão, de um lado, pela diminuição das taxas de crescimento e, por outro, pela elevação das taxas de inflação. O ideário do neoliberalismo eclodiu com mais força em 1979, na Inglaterra, com a eleição do governo Thatcher e, no ano seguinte, em 1980, nos Estados Unidos, quando Ronald Reagan chegou ao poder, colocando em prática o programa neoliberal.269

Importante ressaltar que, várias medidas das políticas atinentes ao neoliberalismo foram feitas há uma década antes dos governos Thatcher, “[...] sob a inspiração das teorizações de Milton Friedman270, já vinham sendo implementadas, tais como: desregulação, desemprego massivo, repressão sindical, redistribuição de renda em favor dos ricos, privatização dos bens públicos”.271

Assim, para contrapor-se ao Estado de bem-estar, a nova corrente de pensamento neoliberal implementou uma série de ajustes estruturais como premissa político-econômica, no combate a inflação com vistas ao equilíbrio orçamentário, fundamentada nos princípios elementares do liberalismo clássico, enaltecendo o individualismo, a contenção da intervenção estatal e a liberdade de mercado. “O

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ANDERSON, Perry. Balanço do neoliberalismo. In: SADER, Emir; GENTILLI PABLO, et al. (Org.). Pós-neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. 8. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2008. p. 9.

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HAYEK, Friedrich August Von. O caminho da servidão. Tradução e revisão de Anna Maria Capovilla, José Italo Stelle e Liane de Morais Ribeiro. 5. ed. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1990. p. 214.

269

ANDERSON, Perry. Balanço do neoliberalismo. In: SADER, Emir; GENTILLI PABLO, et al. (Org.). Pós-neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. 8. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2008. p. 10-11.

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Para compreensão das estruturas filosóficas e econômicas do modelo neoliberal, importante analisar as obras de: HAYEK, Friedrich August Von. Direito, legislação e liberdade: uma nova formulação dos princípios liberais de justiça e economia política. São Paulo: Visão, 1985. 3 v.; HAYEK, Friedrich August Von. O caminho da servidão. Tradução e revisão de Anna Maria Capovilla, José Italo Stelle e Liane de Morais Ribeiro. 5. ed. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1990. (Representante da Escola Austríaca). FRIEDMAN, Milton. Capitalismo e liberdade. Tradução de Luciana Carli. 2. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1985. (Representante da Escola de Chicago).

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LIMA, Abili Lázaro Castro de. Globalização econômica, política e direito: análise das mazelas causadas no plano político-jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002. p. 163.

esquema neoliberal opera uma brutal fetichização do mercado e dos preços relativos como mecanismo de alocação dos recursos econômicos”.272

Nesse passo, as políticas neoliberais pregavam que a meta prioritária de qualquer governo deveria ser a estabilidade monetária, adotando-se medidas para contenção de gastos do Estado de bem-estar, com reformas fiscais, diminuição da proteção social do trabalho, privatizações, estímulo da desigualdade como meio para o desenvolvimento econômico.

No entanto, trata-se de um movimento ideológico em escala mundial, com reflexo na América Latina, sobretudo, no Brasil, como fruto da “crise fiscal do Estado”. Cada país adotou uma versão do neoliberalismo, de acordo com as heranças trazidas anteriormente. “Ao longo dos anos 80, a economia brasileira viveu processos de acomodamento, com a imposição da hegemonia do capital financeiro, que finalmente desembocou no neoliberalismo, iniciado no final da década, ainda no governo Sarney”.273

Nesse sistema pós-liberal, propôs-se no âmbito jurídico um Estado mínimo, que não intervenha no funcionamento do mercado.

Ao seu turno, as políticas neoliberais, que concedem a miniaturização do Estado a partir de um conjunto de medidas que visam reduzir o papel do Estado (esfera pública) em prol do mercado, preconizam a redução e/ou supressão das tutelas estatais no âmbito social, passando a constituir-se a esfera estatal numa seara que serve de guardiã do livre mercado. Tal panorama deflagrou um processo no qual assistimos a gradual erosão da soberania, a obsolência das fronteiras nacionais, o retraimento da esfera pública em favor do mercado, a perda dos direitos políticos dos cidadãos como resultado do esvaziamento da sua participação política, peculiaridades que são indicativas da crise e/ou declínio do Estado-nação.274

Na Europa, essa conformação significou em tentar dilapidar o Estado Social, enquanto que “[...] na América Latina coloca de forma radical a questão do dilema democrático, na medida em que a modernização neoliberal não enfrenta os óbices

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FEIJÓO, José Carlos Valenzuela. O estado neoliberal e o caso mexicano. In: LAURELL. Asa Cristina (Org.), et al. Estado e políticas sociais no neoliberalismo. Tradução de Rodrigo León Contrera. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2002. p. 24.

273

SADER, Emir. A hegemonia neoliberal na América Latina. In: SADER, Emir; GENTILLI PABLO, et al. (Org.). Pós-neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. 8. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2008. p. 36.

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LIMA, Abili Lázaro Castro de. Globalização econômica, política e direito: análise das mazelas causadas no plano político-jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002. p. 23.

que são as conquistas jurídicas da cidadania logrados nas lutas históricas dos trabalhadores”. 275

Para Perry Anderson, o neoliberalismo fracassou no plano econômico, por não ter conseguido “nenhuma revitalização básica do capitalismo avançado. Socialmente, ao contrário, o neoliberalismo conseguiu muitos dos seus objetivos, criando sociedades marcadamente mais desiguais, embora não tão desestatizadas como queria”.276

O neoliberalismo espera que o fenômeno da globalização e suas consequências como “sociedade aberta” ou a “grande sociedade”, garantam a equidade entre os indivíduos, com tratamento igualitário frente às mesmas regras. Entretanto, questiona-se qual é o destino da igualdade entre sujeitos de direitos na sociedade diferenciada que se anuncia na atualidade.

Todavia, o ritmo frenético da sociedade atual com inúmeras possibilidades de acesso à informação pelos meios cibernéticos, ao lado da concorrência e competitividade, tem evidenciado relações sociais descompassadas. O Estado se apresenta com dificuldades de controlar aos avanços tecnológicos e de informação.

Na contemporaneidade, o pensamento capitalista neoliberal manifesta-se sob o cerne fundamental da eficiência, representando importante conexão entre a Economia, Política e o Direito. Razão pela qual, o movimento da Análise Econômica do Direito assentou suas bases construídas pela evolução e consolidação do capitalismo277. Ao longo do tempo, o capitalismo sofreu transformações especialmente, da própria função do Poder Público, com implicações na relação entre o Estado e o mercado. “Além disso, a globalização econômica e as políticas neoliberais que a operacionalizam fazem com que as decisões de governo deixem de

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ARRUDA JÚNIOR, Edmundo Lima de. Direito e século XXI: conflito e ordem na onda neoliberal pós- moderna. Rio de Janeiro: Luam, 1997. p. 79-80.

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ANDERSON, Perry. Balanço do neoliberalismo. In: SADER, Emir; GENTILLI PABLO, et al. (Org.). Pós-neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. 8. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2008. p. 23.

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Em que pese à importância do resgate histórico sobre o pensamento capitalista e liberal, optou-se por sua abordagem na concepção neoliberal, em razão da limitação dos estudos da Análise Econômica do Direito e sua implicação para a Arbitragem, conteúdo desenvolvido com aprofundamento no último capítulo. Dentre vários autores que retratam esse processo histórico de surgimento do capitalismo, destacam-se: NUSDEO, Fábio. Curso de Economia: introdução ao direito econômico. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001; LAURELL. Asa Cristina (org.) et al. Estado e políticas sociais no neoliberalismo. Tradução de Rodrigo León Contrera. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2002; KLEIN, Naomi. A doutrina do choque: a ascensão do capitalismo de desastre. Tradução de Vania Cury. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008 e NUNES, António José Avelãs. Do capitalismo e do socialismo. Florianópolis: Boiteux, 2008.

serem políticas para tornarem-se econômicas, baseadas numa relação custo/benefício”.278

A partir das feições neoliberais assumidas pelo Estado no mundo globalizado, o poder decisório estatal submete-se às regras do mercado e diretrizes das organizações.

[...] esse Estado assume uma dimensão organizacional reduzida, enxuta ou compacta e passa a ser pautado e condicionado pelo mercado e por seus atores dominantes – conglomerados empresariais transnacionais, instituições financeiras internacionais, organismos supranacionais, entidades de classe, câmaras de comércio, associações de consumidores, corporações profissionais, institutos públicos, semipúblicos e privados, sindicatos etc. [...] No âmbito do Estado neoliberal, em outras palavras, é a economia que efetivamente, calibra, baliza e pauta tanto a agenda quanto as decisões políticas e jurídicas.279

A eficiência econômica do indivíduo se volta como um dos pontos chaves do pensamento capitalista neoliberal globalizado. Por outro lado, há uma ruptura das tradicionais fontes do direito, ocasionadas pelo surgimento “[...] de um direito ‘de textura aberta’ com o deslocamento dessas fontes para os poderes privados econômicos, com uma participação maior dos atores privados, e a tomada em consideração de ‘valores’ oriundos dos sistemas econômico ou técnico-científico”.280

Diante da complexidade crescente entre a regulação pelo Direito do Estado com outras formas de regulação jurídica, entendida esta como “regulação social que passa pelo canal do direito281”, o Estado ainda tenta manter o controle do processo como forma de dizer o direito que, por muito tempo, foi considerado atributo exclusivo da soberania estatal282. No entanto, em decorrência do surgimento das questões

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LIMA, Abili Lázaro Castro de. Globalização econômica, política e direito: análise das mazelas causadas no plano político-jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002. p. 352.

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FARIA, José Eduardo. O direito na economia globalizada. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 177-179.

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ARNAUD, André-Jean. Da regulação pelo direito na era da globalização. In: MELLO, Celso de Albuquerque (Coord.). Anuário Direito e Globalização, 1: a soberania. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 24.

281

ARNAUD, André-Jean. Da regulação pelo direito na era da globalização. In: MELLO, Celso de Albuquerque (Coord.). Anuário Direito e Globalização, 1: a soberania. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 25.

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Para Celso de Albuquerque Mello, “Estado e Soberania foram noções que caminharam irmanadas desde o século XVI até o final do século XX, uma não existia sem a outra. [...] A noção de soberania foi sempre vista como uma <<qualidade>> do poder. Assim, Estado soberano era aquele que não dependia de outro Estado. Em uma outra linguagem, poder-se-ia dizer uma mesma coisa, é o Estado independente politicamente. [...] No século XX a soberania passa a ser vista como um feixe de

fáticas que tratam das relações jurídicas no difícil contexto socioeconômico atual, muitas vezes, esse controle escapa da regulação do Estado.

A soberania é caracterizada por um aspecto interno e externo. No primeiro caso, esta se manifesta em qualquer um dos poderes do Estado, seja no Legislativo,