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3.2 A (in)existência de limites na Estipulação Negocial para a Instituição da

3.2.2 Da Convenção de Arbitragem: Cláusula Compromissória e

processo arbitral.

3.2.2 Da Convenção de Arbitragem: Cláusula Compromissória e Compromisso Arbitral

Destaca-se que a competência advinda da arbitragem é especial, comparando-se com a competência estabelecida aos órgãos do Poder Judiciário, por tratarem ambas do exercício da jurisdição, a primeira, considerada no âmbito da jurisdição privada, enquanto a última, tradicionalmente, conhecida como jurisdição pública ou estatal.

Nesse sentido, o pacto arbitral retira da competência do Poder Judiciário, a possibilidade de apreciação e julgamento do mérito do conflito, atribuindo ao árbitro, a competência da solução dos conflitos mediante a celebração de convenção de arbitragem válida.492 Para Carmona493, a referida convenção revela duplo aspecto,

492

Conforme art. 19 da Lei de Regência da Arbitragem, in verbis: “Art. 19. Considera-se instituída a arbitragem quando aceita a nomeação pelo árbitro, se for único, ou por todos, se forem vários. § 1º Instituída a arbitragem e entendendo o árbitro ou o tribunal arbitral que há necessidade de explicitar questão disposta na convenção de arbitragem, será elaborado, juntamente com as partes, adendo firmado por todos, que passará a fazer parte integrante da convenção de arbitragem. § 2º A instituição da arbitragem interrompe a prescrição, retroagindo à data do requerimento de sua instauração, ainda que extinta a arbitragem por ausência de jurisdição”.

493

CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à lei nº. 9.397/96. São Paulo: Atlas, 2009. p. 79.

“como acordo de vontades, vincula as partes no que se refere a litígios atuais ou futuros, obrigando-as reciprocamente à submissão ao juízo arbitral; como pacto processual, seus objetivos são os de derrogar a jurisdição estatal, submetendo as partes à jurisdição dos árbitros”.

A forma indispensável para a instituição da arbitragem como meio adequado de resolução dos conflitos é a convenção de arbitragem juridicamente válida, em que as partes exercem a sua escolha pela jurisdição arbitral.494

A convenção da arbitragem apresenta-se com característica híbrida, pois emana dos pressupostos e requisitos tanto do direito material, no que se refere à observância dos princípios gerais contratuais, quanto do direito processual, em relação ao procedimento arbitral e delimitação da competência do árbitro para a solução da controvérsia.

Importa observar que os requisitos de validade da convenção de arbitragem estão previstos nos ordenamentos jurídicos e nos tratados internacionais, normalmente, estão de acordo com os mesmos parâmetros exigidos para qualquer negócio jurídico, ou seja: capacidade das partes, forma prescrita ou não proibida em lei e objeto lícito.

Pelo pacto arbitral, as partes escolhem a matéria, objeto da disputa, às relações jurídicas de natureza contratual ou extracontratual, que versem sobre direitos patrimoniais disponíveis. Nessa premissa, segundo entendimento de Carmona495, essa liberdade de escolha relaciona-se ainda ao “direito – material e processual – aplicável à solução da controvérsia, podendo optar pela decisão por equidade ou ainda fazer decidir o litígio com base nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais do comércio”.

Nesse contexto, a convenção arbitral poderá envolver os conflitos já existentes ou aqueles que possam surgir após a celebração do contrato. Nesse ponto,

494

“Anote-se que a jurisdição arbitral é limitada à tutela de conhecimento e, conforme as circunstâncias, ao reconhecimento de deferimento de tutelas de urgência, sendo excluídos da arbitragem os processos ou atos coercitivos ou de execução e cumprimento de sentença; assim, por exemplo, mesmo contida no contrato cláusula compromissória, se o descumprimento ensejar execução por título extrajudicial, como para pagamento do valor, esta se dará exclusivamente perante o Judiciário”. CAHALI, Francisco José. Curso de arbitragem: mediação, conciliação, resolução CNJ 125/2010. 5. ed. rev., atual. de acordo com a Lei 13.129/2015 (Reforma da Lei de Arbitragem), com a Lei 13.140/2015 (Marco Legal da Mediação) e o Novo CPC. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 153.

495

CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à lei nº. 9.397/96. São Paulo: Atlas, 2009. p. 15.

esta convenção é reconhecida como gênero do qual são espécies a cláusula compromissória e o compromisso arbitral.496

A convenção da arbitragem compreende a cláusula compromissória e o compromisso arbitral e ocorre em dois momentos distintos. A cláusula compromissória ou arbitral trata-se de uma convenção estipulada por escrito, anterior à existência do conflito. Pode tanto estar inserida dentro do contrato como cláusula contratual, assim como, encontrar-se prevista em instrumento anexo distinto, fazendo referência ao contrato principal ao qual se encontre vinculado.497

A cláusula compromissória é autônoma em relação ao contrato principal, no tocante à sua validade e eficácia, que são distintas das normas aplicáveis ao contrato principal. Dessa forma, o reconhecimento de eventuais nulidades do contrato não implicaria na constatação da existência de nulidades na referida cláusula498. Por tal norma499, consagra-se o princípio da Kompetenz-Kompetenz aferindo-se ao árbitro ou ao tribunal arbitral competência para analisar a sua própria competência, ou seja, o exame sobre a existência ou nulidade da convenção arbitral que deve ser feita antes de qualquer decisão judicial. “Indo mais longe, a lei brasileira submete todo o contrato ao prévio exame do tribunal arbitral ao qual reconhece o que a doutrina denominou a ‘prioridade cronológica’ para apreciar a matéria”.500

A cláusula compromissória é a previsão manifestada por escrito em contrato ou em documento próprio a ele reportado, de que serão submetidos à arbitragem eventuais conflitos dele emergentes.501 “Tem caráter preventivo, na medida em que as partes estão na expectativa de contratar e honrar seus compromissos contratuais, porém desde então deixam previsto que eventual conflito decorrente do contrato deverá ser resolvido por arbitragem, não pelo Judiciário”.502

496

A convenção de arbitragem é classificada nos termos do art. 3º da Lei nº. 9.307/1996, a saber: “As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral”.

497

Sobre a cláusula compromissória, sua previsão está expressa no art. 4º, § 1º, da Lei da Arbitragem.

498

Conforme estabelece o art. 8º da Lei nº. 9.307/1996.

499

O princípio da competência-competência encontra-se previsto no parágrafo único do art. 8º da Lei da Arbitragem.

500

WALD, Arnaldo. A anulação das sentenças arbitrais estrangeiras e das respectivas convenções de arbitragem. In: BERTASI, Maria Odete Duque; CORRÊA NETTO, Oscavo Cordeiro. (Coord.). Arbitragem e desenvolvimento. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p.143.

501

Nos termos do artigo 4º, parágrafo 1º da Lei de Arbitragem.

502

CAHALI, Francisco José. Curso de arbitragem: mediação, conciliação, resolução CNJ 125/2010. 5. ed. rev., atual. de acordo com a Lei 13.129/2015 (Reforma da Lei de Arbitragem), com a Lei 13.140/2015 (Marco Legal da Mediação) e o Novo CPC. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p.153.

De igual forma, a arbitragem foi prevista no Código Civil brasileiro de 2002503, mediante a possibilidade de inclusão da cláusula compromissória nos contratos, com vistas à solução das controvérsias pelo juízo arbitral. Deste modo, ressalta a condição do agente na solução de conflitos em âmbito privado, tendo em vista que suas bases estão fundadas no princípio da autonomia privada.

Para que se possa recorrer ainda a este meio de solução de controvérsias quando o conflito de interesses já havia sido instaurado entre as partes, o atual Código Civil504 admite o compromisso sob a forma judicial ou extrajudicial, dando-lhe caráter de contrato para resolver litígio entre pessoas que podem contratar.

Sendo assim, uma vez eleita pelas partes a via paraestatal da arbitragem para a solução do conflito, a cláusula arbitral poderá ser classificada pelo seu conteúdo, como vazia (em branco ou patológica) ou cheia (autossuficiente).

Pela cláusula arbitral vazia, geralmente, as partes ainda não têm uma noção precisa em relação ao surgimento de eventual conflito e, dessa forma, a indicação das regras para uma possível instauração da arbitragem passa a ser genérica, sem estabelecer, contudo, a identificação do árbitro ou os mecanismos utilizados para que se promova a sua escolha.505

Nessas situações, após o surgimento do conflito, a cláusula compromissória considerada apenas como promessa de contratar, cria para as partes a obrigação de declaração de vontade posterior, por meio da celebração do compromisso arbitral que passa a ser designado como o contrato e, somente a partir dele, ensejará a instauração da arbitragem.

Considera-se cláusula arbitral cheia, aquela que possibilita a instauração imediata do juízo arbitral a partir da cláusula compromissória, independentemente, da sua substituição pelo compromisso arbitral. Nessa hipótese, tem-se que a natureza jurídica dessa cláusula é a de um contrato e não mera promessa de contratar. Para configurá-la como cláusula cheia, deve conter os requisitos mínimos para que possa ser instaurado o procedimento arbitral de forma imediata, nas mesmas condições impostas ao compromisso arbitral506 como, por exemplo, a indicação do(s) árbitro(s)

503

Ver art. 853 do Código Civil brasileiro.

504

O Código Civil situa o compromisso em seu art. 851.

505

FOUCHARD, Philippe; GAILLARD, Emmanuel et GOLDMAN, Berthold. Traité de l’arbitrage commercial internacional. Paris: Litec, 1996. p. 286-290.

506

ou a forma de sua escolha com critérios de experiência mínima na matéria objeto da controvérsia e o lugar em que os atos procedimentais serão desenvolvidos.

Aliás, a cláusula arbitral cheia trata-se de uma disposição contratual na qual as partes aproveitam-se da liberdade de contratar para estabelecer outras regras para o desenvolvimento da arbitragem, assim como, a escolha da matéria aplicável como regra de julgamento, admitida a equidade; prazo para apresentação da sentença arbitral; responsabilidade pelo pagamento das despesas com o procedimento arbitral e os honorários dos árbitros, entre outros requisitos facultativos definidos entre os interessados.507

Por meio da cláusula cheia, tem-se a possibilidade de ampliação dessa modalidade às partes não signatárias que, segundo entendimento de Cahali508 abrange: “(i) em grupo de empresas, (ii) contratos principal e acessório, (iii) interveniência no contrato de fiança, (iv) estipulação em favor de terceiro, (v) sub- rogação no contrato de seguro, (vi) novação, (vii) cessão da posição contratual, (viii) desconsideração da personalidade jurídica etc”.

O compromisso arbitral pressupõe que já exista um conflito entre as partes e não a mera possibilidade de sua ocorrência. Uma vez manifestado o litígio e tendo os interessados celebrado o compromisso arbitral, a solução será dada pelo(s) árbitro(s) e não pela jurisdição estatal.

O instituto da arbitragem estabelece que o compromisso arbitral possa ser judicial quando realizado no curso do processo judicial por termo nos autos, ensejando a extinção do processo sem a resolução do mérito509 ou extrajudicial, celebrado por instrumento público ou particular, sendo esta última forma, necessariamente, através de documento escrito e subscrito por duas testemunhas.510 Além dessas formalidades, o compromisso arbitral judicial ou extrajudicial deverá conter determinados requisitos específicos511, como a indicação do nome e

507

CAHALI, Francisco José. Curso de arbitragem: mediação, conciliação, resolução CNJ 125/2010. 5. ed. rev., atual. de acordo com a Lei 13.129/2015 (Reforma da Lei de Arbitragem), com a Lei 13.140/2015 (Marco Legal da Mediação) e o Novo CPC. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 158.

508

CAHALI, Francisco José. Curso de arbitragem: mediação, conciliação, resolução CNJ 125/2010. 5. ed. rev., atual. de acordo com a Lei 13.129/2015 (Reforma da Lei de Arbitragem), com a Lei 13.140/2015 (Marco Legal da Mediação) e o Novo CPC. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 159.

509

Anota o art. 485 do CPC/2015, as causas de extinção do processo sem a resolução do mérito.

510

Conforme art. 9º da Lei da Arbitragem.

511

qualificação das partes, o nome e qualificação do árbitro ou dos árbitros e, dependendo do caso, a identificação da entidade arbitral, a matéria objeto da arbitragem e o lugar em que a sentença arbitral será proferida.

Urge questionar se a forma escrita exigida na convenção de arbitragem (cláusula compromissória e compromisso arbitral) nos termos de sua lei de regência e igualmente previsto na Convenção de Nova Iorque que disciplina o registro escrito em seus arts. II.1 e II.2512, também se aplica as convenções arbitrais eletrônicas. Inicialmente, parte-se do pressuposto da licitude dos contratos eletrônicos que em razão ao princípio da liberdade das formas para os atos e negócios jurídicos devem ser acolhidos em nosso ordenamento.513

No entanto, em que pese haver uma tendência internacional de conferir ao referido dispositivo legal da Convenção de Nova Iorque uma interpretação extensiva e construtiva no sentido de flexibilizar a expressão “por escrito”, ainda não há um entendimento uniforme sobre essa questão.514 A novel legislação brasileira que atualizou o instituto da arbitragem em nada contribuiu para elucidar a matéria, limitando-se a estipulação escrita da convenção arbitral, “sem explicar o conteúdo dessa expressão. A exegese literal, portanto, igualmente suscita dúvida se a expressão deve ser lida de forma ampliativa ou restritiva, para incluir ou não, respectivamente, os documentos eletrônicos".515

Ademais, os documentos eletrônicos assim como os físicos não se restringem às peças escritas, porquanto qualquer informação digitalizada como um vídeo contendo o seu áudio, uma planilha ou fotografia salvos em computadores ou em outros aparelhos eletrônicos podem ser considerados documentos eletrônicos,

512

“Art. II – 1. Cada Estado signatário deverá reconhecer o acordo escrito pelo qual as partes se comprometem a submeter à arbitragem todas as divergências que tenham surgido ou que possam vir a surgir entre si no que diz respeito a um relacionamento jurídico definido, seja ele contratual ou não, com relação a uma matéria passível ou não de solução mediante arbitragem. Art. II - 2. Entender-se-á por ‘acordo escrito’ uma cláusula arbitral inserida em contrato ou acordo de arbitragem, firmado pelas partes ou contido em troca de cartas ou telegramas”.

513

JUNQUEIRA, Gabriel Herscovici. Arbitragem brasileira na era da informática: um estudo das principais questões processuais. In: CARMONA, Carlos Alberto (Coord.). Coleção Atlas de Arbitragem. São Paulo: Atlas, 2015. p. 18.

514

WALD, Arnoldo. Os aspectos formais da convenção de arbitragem (comentário do art. II, (1) e (2), da convenção de Nova Iorque, e sua aplicação no direito brasileiro). In: WALD, Arnoldo; LEMES, Selma Ferreira (Coord.). Arbitragem comercial internacional: a convenção de Nova Iorque e o direito brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 85.

515

JUNQUEIRA, Gabriel Herscovici. Arbitragem brasileira na era da informática: um estudo das principais questões processuais. In: CARMONA, Carlos Alberto (Coord.). Coleção Atlas de Arbitragem. São Paulo: Atlas, 2015. p. 23.

constituindo-se como meio de prova atípica. Nesse contexto, os documentos eletrônicos são reproduções virtuais, sem qualquer vinculação a um apoio físico, por estarem “dissociados de qualquer suporte tangível ou material, sendo uma sequência de bits que podem ser gravados, copiados e remetidos para qualquer recipiente516”.517 Em outros termos, compreende-se que a informação representa a base de formação do documento eletrônico, importando distinguir o “documento eletrônico simples” com o “documento eletrônico certificado”. Este último representa “o documento eletrônico com assinatura digital certificada pela Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), ao passo que aquela faz referência ao documento eletrônico com ou sem assinatura digital, mas sem certificação pelo ICP-Brasil”.518

De fato, a equiparação entre o documento eletrônico e o físico exigido na sua forma escrita, comporta a necessidade de reformas legislativas que atualizem o seu conteúdo, assim como de construções hermenêuticas compatíveis sobre a interpretação da expressão “por escrito”. Assim, por certo, as dúvidas sobre o fato de que os novos documentos por meios tecnológicos devem satisfazer o requisito escrito das cláusulas arbitrais, perpassam desde a análise dos seus aspectos formais, quanto à manifestação da vontade eletrônica.

Por consequência, a exigência formal escrita decorre do texto da lei, todavia, as convenções arbitrais implicam não apenas ao cumprimento dos “requisitos formais da lei para que seja tida como válida e eficaz. É vital assegurar-se que houve uma confiável manifestação da vontade das partes no sentido de celebrar a convenção arbitral”.519

Deste modo, deve-se verificar se ocorreu o consentimento das partes como validade da cláusula arbitral, seja expresso ou tácito, este último manifestado independentemente de qualquer previsão legal. Para tanto, a valorização do princípio

516

Insta registrar que é comum o arquivo dos documentos eletrônicos em diferentes ambientes que podem ser acessados, lidos, modificados, copiados ou deletados no computador, smartphone ou qualquer outro aparelho eletrônico, além dos backups armazenados online e que podem ser recuperados em sua integridade.

517

JUNQUEIRA, Gabriel Herscovici. Arbitragem brasileira na era da informática: um estudo das principais questões processuais. In: CARMONA, Carlos Alberto (Coord.). Coleção Atlas de Arbitragem. São Paulo: Atlas, 2015. p. 158-163.

518

JUNQUEIRA, Gabriel Herscovici. Arbitragem brasileira na era da informática: um estudo das principais questões processuais. In: CARMONA, Carlos Alberto (Coord.). Coleção Atlas de Arbitragem. São Paulo: Atlas, 2015. p. 163.

519

JUNQUEIRA, Gabriel Herscovici. Arbitragem brasileira na era da informática: um estudo das principais questões processuais. In: CARMONA, Carlos Alberto (Coord.). Coleção Atlas de Arbitragem. São Paulo: Atlas, 2015. p. 36.

de autonomia de vontade das partes está sujeito a certas condições: (i) autenticidade: a autonomia da vontade manifesta-se presumível, na medida em que há indícios de autoria da vontade declarada pelas partes; (ii) integridade: presunção de correlação do conteúdo da declaração manifestada com vontade original das partes; (iii) consciência: as partes devem estar cientes da declaração voluntária em firmar a convenção de arbitragem e seus termos, com base na confiabilidade do instituto;520 e (iv) efetiva comunicação: “os meios de comunicação entre as partes devem ser tais que seja presumível que houve a coincidência de vontades e não manifestações unilaterais”.521

O atendimento a esses requisitos demonstram a presunção do desejo das partes na convenção de uma cláusula arbitral, principalmente, na arbitragem informatizada que não deveria estar sujeita a tantas exigências formais, cuja prática tem sido crescente tanto ao comércio internacional como as demais transações eletrônicas deste típico negócio jurídico. A tendência é considerar o consentimento e, nesse caso, presumido das partes como a essência da arbitragem, pois, seria “mais razoável exigir uma presunção de confiabilidade cabendo ao juízo arbitral, se houver impugnação referente à manifestação de vontade, apreciar as provas trazidas para decidir se são suficientes ou não para ilidir a presunção de confiabilidade”.522

De fato, pondera Oliver Cachard523 com base em precedentes dos Estados Unidos que o requisito escrito é comum na aceitação dos documentos eletrônicos, assim como, também são admissíveis às vias eletrônicas nas legislações nacionais.

Por isso, que a Lei Modelo da UNCITRAL de Arbitragem Internacional Comercial sofreu emendas no ano de 2006, especificamente, sobre os documentos eletrônicos em seu art. 7º, passando a conferir nova redação da versão originalmente editada em 1985, com a possibilidade de a cláusula eletrônica ser admitida.

520

Com efeito, esse requisito relaciona-se com o princípio de Interpretação em Boa-fé, devendo a convenção arbitral ser interpretada com base na vontade das partes quanto ao que está escrito, segundo FOUCHARD, Philippe; GAILLARD, Emmanuel; GOLDMAN, Berthold. Fouchard, Gaillard, Goldman on international commercial arbitration. E. Gaillard & J. Savage (eds). Netherlands: Kluwer, 1999. p. 257.

521

JUNQUEIRA, Gabriel Herscovici. Arbitragem brasileira na era da informática: um estudo das principais questões processuais. In: CARMONA, Carlos Alberto (Coord.). Coleção Atlas de Arbitragem. São Paulo: Atlas, 2015. p. 36-37.

522

JUNQUEIRA, Gabriel Herscovici. Arbitragem brasileira na era da informática: um estudo das principais questões processuais. In: CARMONA, Carlos Alberto (Coord.). Coleção Atlas de Arbitragem. São Paulo: Atlas, 2015. p. 37.

523

CACHARD, Olivier. Dispute settlement: international commercial arbitration – 5.9. Electronic Arbitration. UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND DEVELOPMENT, 2003. Disponível em: <http://unctad.org/en/docs/edmmisc232add20_en.pdf>. Acesso em: 5 jan. 2017. p. 23.

Art. 7th: [...]

2 - The arbitration agreement shall be in writing.

3 - An arbitration agreement is in writing if its content is recorded in any form, whether or not the arbitration agreement or contract has been concluded orally, by conduct, or by other means.

4 – The requirement that an arbitration agreement be in writing is met by an electronic communication if the information contained therein is accessible so as to be useable for subsequent reference; ‘electronic communication’ means any communication that the parties make by means of data messages; ‘data message’ means information generated, sent, received or stored by electronic, magnetic, optical or similar means, including, but not limited to, electronic data interchange (EDI), electronic mail, telegram, telex or telecopy.524

Na esteira desse raciocínio, a Lei Modelo serve de padrão modernizador para que as leis nacionais possam ser interpretadas com o mesmo sentido, considerando que a redação atual do referido instrumento, expressamente, acentua que o “documento eletrônico, desde que posteriormente acessível, e independentemente da tecnologia empregada para registrá-lo, é aceitável”.525

Todavia, mesmo diante do fato de que a Lei Modelo da UNCITRAL sobre Comércio Eletrônico seja um instrumento não vinculante, serve de orientação para adaptação das normas existentes, comportando uma interpretação ampliativa com respeito à autonomia da vontade das partes para que a convenção arbitral eletrônica possa ser admitida.526