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A história do art 52º da Convenção sobre a Patente Europeia

CAPÍTULO III A PATENTEABILIDADE DAS INVENÇÕES IMPLEMENTADAS POR

2. A história do art 52º da Convenção sobre a Patente Europeia

J. PILA estudou358 os trabalhos preparatórios que resultaram na CPE, em especial no que diz respeito à origem do art. 52º, e concluiu que a principal preocupação foi assegurar identidade literal entre o texto da Convenção e outros tratados internacionais, particularmente com as Regras 39.1 e 67.1 do Regulamento de Execução do PCT, já aqui referidas. No entanto, conforme já mencionado, aquelas normas, pela própria natureza do PCT, não excluíam os programas de computador da proteção, pois, como vimos, o PCT não concede títulos internacionais de propriedade industrial. Por outro lado, daquelas normas resulta que, apesar de ser reconhecido que algumas autoridades responsáveis pela pesquisa ou exame não estariam na prática preparadas para pesquisar e examinar pedidos de patente que tivessem por objeto programas de computador, estariam, contudo, obrigadas à prática dos respetivos atos, sempre que para tal estivessem equipadas. Assim, perece-nos que destas normas resultaria uma abertura do sistema de cooperação aos programas de computador, desde que se verificassem determinadas condições práticas.

Na verdade, a propósito da CPE discutia-se inicialmente se deveria ser apresentada uma definição de invenção. Uma das propostas, de REIMER, consistia na delimitação do conceito de invenção através da previsão de uma lista de matérias excluídas. Esta lista não incluía os programas de computador, mas «instruções ao cérebro, tais sistemas de contabilidade e regras de jogos», «princípios e teorias científicas», «a criação de formas estéticas», «trazer à luz factos pré-existentes (descobertas)».359 Não sendo aceite num primeiro momento, a lista estendeu-se posteriormente de modo a incluir métodos de terapia e métodos de diagnóstico.360

358 Cfr. Justine Pila, “Article 52(2) of the Convention on the Grant of European Patents: What Did the Framers Intend? A Study of the Travaux Preparatoires,” IIC, 2005, pp. 755 e ss.

359 Cfr. Ibidem, p. 759. 360 Cfr. Ibidem, p. 761.

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Na medida em que havia incerteza quanto ao seu modo de proteção e à evolução que esta teria futuramente nas fontes internacionais, a inclusão dos programas de computador ficou a dever-se à já referida intenção de harmonização com as regras do PCT.361

Já quanto à restrição às exclusões em que consistem os termos «como tal», depois de introduzida, foi apresentada uma proposta da Delegação suíça com preocupações em relação aos métodos matemáticos, no sentido de evitar que qualquer método matemático «como tal» e ainda a sua aplicação na resolução de um problema técnico pudessem ser considerados invenções. No entanto, na Conferência de Munique, a expressão «como tal» foi estendida a todos os elementos excluídos, com a finalidade de evitar que fosse dada uma interpretação demasiado lata às exclusões que não eram limitadas pela expressão «como tal». Pretender-se-ia que a aplicação de «como tal» a todas as exclusões evitasse distorções na interpretação de exclusões não limitadas.362 Se daqui resulta que se desconhece outra razão que tenha levado à inclusão dos programas de computador para além da intenção de uniformização com as normas do PCT, então a análise dos trabalhos preparatórios da Convenção não oferece muitas pistas.

No entanto, cabe ainda verificar se da Conferência Diplomática sobre a Patente Europeia que levou em 29 de novembro de 2000 à aprovação do Ato de revisão da Convenção sobre a Concessão de Patentes Europeias363 pode ser retirada alguma conclusão.

361 Justine Pila, “Article 52(2) of the Convention on the Grant of European Patents: What Did the Framers Intend? A Study of the Travaux Preparatoires,” cit., p. 769.

362 Cfr. Ibidem, p. 769.

363 Acto de Revisão da Convenção sobre a Concessão de Patentes Europeias (Convenção sobre a Patente Europeia), adotado em Munique, a 29 de Novembro de 2000, aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 60-A/2007, em 30 de Novembro de 2007, e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 126-A/2007, de 12 de Dezembro, publicado em DR I-A, n.º 239, Suplemento, de 12 de Dezembro de 2007.

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Vimos no estudo da Diretiva da UE não adotada que no documento Promoting

innovation through patents, The follow up to the Green Paper on the Community patent and patent system in Europe, de 1999, a Comissão definia como plano de

ação a apresentação de uma proposta de diretiva e os Estados contratantes da OEP adotarem passos no sentido de modificar o art. 52º/2, c) da CPE, abolindo a exclusão dos programas de computador. Se aquela Proposta não veio a ser aprovada, os programas de computador também não foram eliminados do referido artigo da CPE.

No entanto, na Basic proposal for the revision of the EPC (MR/2/00)364, pode ler-se, no parágrafo 3, que apesar do Comité de Direito de Patentes e o Conselho Administrativo terem advogado a eliminação dos programas de computador do art. 52º/2 da CPE, tal foi considerado desnecessário na medida em que se considerava que as Câmaras de Recurso Técnicas do IEP interpretavam e aplicavam a CPE «de tal modo que esta exceção de modo algum exclui a proteção adequada para as invenções relacionadas com computadores, i.e. Invenções cujo objeto consiste em ou inclui um programa de computador». O parágrafo faz ainda referência ao caso T 1173/97 IBM de 1999, no qual, diz-se, a CTR teria confirmado que os programas de computador eram patenteáveis desde que produzam um efeito técnico.

Por fim, no parágrafo 4, é acrescentado que a proteção por patente é reservada apenas para criações numa área técnica, o que seria agora claramente expresso na CPE, na medida em que no nº 1 do art. 52º tinha sido introduzida a referência a «todos os domínios da tecnologia», para que ficasse alinhado com a norma do art. 27º/1 do TRIPS/ADPIC. Assim, uma matéria reivindicada tem de ter carácter

técnico ou envolver um ensinamento técnico, ou seja «uma instrução dirigida ao

perito sobre como resolver um particular problema técnico usando particulares

meios técnicos». Encontramos assim uma definição de invenção. É ainda

364 Conselho Administrativo da Organização Europeia de Patentes, Basic proposal for the revision

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complementado que estas considerações aplicavam-se também aos programas de computador, e que seria incumbência do IEP, na prática, determinar o sentido de carácter técnico e «desenvolver o conceito de invenção de um modo apropriado à luz dos desenvolvimentos técnicos».

Se retiramos do desfecho do processo que culminou com a rejeição da Proposta de diretiva da Comissão da UE, a conclusão de que, não havendo entendimento, preferiu manter-se o status quo, daqui podermos retirar a mesma conclusão, mas com segurança adicional. Resulta claramente dos parágrafos anteriores que a intenção de não eliminar os programas de computador do n.º 2 do art. 52º da CPE foi manter a proteção dada às invenções relacionadas com programas de computador intocada, por se considerar que era adequada. Saliente-se, manter a situação que se verificava à altura foi uma preocupação de vários países.365

Concluindo, do elemento histórico da interpretação resulta claramente que o art. 52º/2 deve ser interpretado no sentido de que a sua finalidade é a de promover a divulgação e disseminação de informação científico-tecnológica e a promoção da inovação no que respeita a programas de computador que tenham carácter técnico, ou seja, que possam ser considerados uma invenção.

Adicionalmente, vimos que é feita referência à decisão no caso T 1173/97 IBM de 1999. Como sabemos, no referido caso, a CTR considerou que um programa de computador poderia ser considerado uma invenção desde que produza um efeito

técnico adicional. Assim, não podemos deixar de considerar que resulta deste

elemento histórico que a finalidade da norma é a de proteger programas de computador que produzam o referido efeito técnico adicional.

Deste modo, não dispomos neste momento de justificação para nos afastarmos do entendimento das Câmaras de Recurso Técnicas e da Grande-Câmara de

365 Cfr. Organização Europeia de Patentes, Conference of the Contracting States to revise the 1973

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Recurso que estudámos no CAPÍTULO II. Verificaremos agora que críticas podem ser feitas à referida posição.