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SUMÁRIO

2.1 A IDENTIDADE E O PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO

O conceito de identidade enquanto objeto de investigação nas Ciências Sociais é relativamente recente, a primeira vista, no entanto, está em discussão desde a Antiguidade (KAUFMANN, 2004). Kaufmann (2004) acrescenta ainda, que antes de se tornar um conceito, a identidade fora um termo usual, de senso comum, uma categoria administrativa. Era utilizado como forma de identificação do indivíduo, tais como as placas metálicas dos soldados mortos nos campos de batalha, a identificação pelos papéis aos muito ricos, que queriam que suas propriedades e transmissão fossem protegidas, ou aos muito pobres, em que o interesse do Estado era a mobilidade que ela induzia3, a caderneta de trabalho, os registros paroquiais, o bilhete de identidade.

Erik Erikson é reconhecido por ter introduzido este conceito nas ciências humanas em 1950, com sua obra ‘Infância e Sociedade’ (KAUFMANN, 2004; MUCCHIELLI, 2002). De acordo com Kaufmann (2004) por meio da identificação, Erikson retoma de Freud a ideia de processo, abrindo-o ao contexto social. Articulando-se em torno dos termos identidade e crise e tomando o exemplo da adolescência, um importante trabalho de Erikson para o conceito identidade, é o livro ‘Identity: youth and crisis’. Erikson (1976) relaciona identidade com

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Os miseráveis, gente errante, eram tentados para melhor viver a deixar suas comunidades de origem. Os primeiros papéis de identificação estiveram ligados a uma ruptura de ligação com essas comunidades. De acordo com o édito real de 1775 evocado por Tocquiville (1986, p.1067, apud KAUFMANN, 2004, p. 18) “os camponeses que se afastassem da sua paróquia sem estar munido dum atestado assinado pelo pároco e pelo síndico, deveriam ser perseguidos, presos e julgados prebostalmente como vagabundos”.

uma das crises do desenvolvimento. A crise a ser suplantada na adolescência é a busca da identidade versus a confusão de papéis. Se o indivíduo elabora bem esta crise ele avança para a identidade adulta, caso contrário, ele vivencia uma confusão de papéis.

Já George Mead (1963), no seu posicionamento social em relação ao conceito de identidade, introduz a noção de interação para pensar a relação do homem com o mundo em termos de símbolos, ou seja, de significado (LE BRETON, 2004). Le Breton (2004) discorre, ainda, que para o autor o significado não é inerente à natureza das coisas, ele reflete a interpretação do indivíduo e engaja seu comportamento.

Para Mead (1963) indivíduo, sociedade e história não devem ser separados na análise. O indivíduo é um vasto sistema de interações internas em ação sobre um ambiente social e marcado por um contexto histórico preciso. Para Mead (1980) a subjetividade é expressa nas relações sociais por meio da capacidade cognitiva individual. Conforme aponta Le Breton (2004), no clássico texto ‘L’esprit, le soi et la société’ Mead (1963) propõe que há no ato um domínio que não é observável do exterior, mas que no entanto pertence ao ato. Ou seja, o ato externo que observamos constitui uma parte do processo que se iniciou no interior do indivíduo, com suas atitudes (MEAD, 1963).

Para Le Breton (2004) a primeira tarefa de Mead é extrair o pensamento dominante de sua época no que tange a psicologia, o behavorismo, no qual a definição de homem é de uma máquina sem consciência de si, inteiramente regido pelo exterior por uma soma de reflexos.

Segundo Kaufmann (2004), Mead não se utilizava do termo ‘identidade’, mas sim do termo ‘Si’, que seria um processo que resulta da interação entre o ‘Mim’ e o ‘Eu’. O Mim representa a atitude adaptativa que temos perante o mundo organizado incorporado a nossa conduta social. Isso quer dizer, representa a pessoa que tem consciência de pertencimento a um grupo social e age dentro das normas deste grupo. Já o Eu, representa a consciência espontânea da individualidade, funciona como processo de representação imaginativa que temos de nós mesmos, ou seja, representa o sujeito que age e só depois da ação tem consciência do seu ato (ZANATTA, 2011). Mais tarde, seguidores do pensamento de Mead como Erving Goffman e Anselm Strauss passam a utilizar o termo identidade.

Apesar de haver na literatura diversos conceitos e discussões sobre o que seja a identidade, a presente tese analisou-a a partir das contribuições da perspectiva interacionista simbólica. Nessa perspectiva, a identidade é vista como produto da socialização, ou seja, os indivíduos

adotam papéis sociais correspondentes às diferentes instituições em que atuam, sejam eles: a família, o mercado de trabalho, ou qualquer outra esfera da sociedade (ZANATTA, 2008; 2011).

Embora cada autor explore aspectos específicos em seus estudos, Zanatta (2008; 2011) salienta que Strauss (1999), Goffman (1963, 1985), Berger e Luckman (2012) e Dubar (2013), centrais na discussão sobre identidade, partem de uma ideia comum em suas análises. Os autores percebem a identidade como produto dos processos de socialização.

As identidades individuais somente podem ser entendidas concomitantemente a atividade coletiva (ZANATTA, 2011; STRAUSS, 1999). Segundo Strauss (1999, p.27) “a estrutura social e a interação estão intimamente associadas, e também afetam reciprocamente uma a outra”. Para o autor, essa concepção é temporal, sendo a estrutura moldada pelos atores por meio da interação. Strauss (1999) interessa-se principalmente pela interação que ocorre entre as pessoas como membros de grupos.

Strauss (1999) assevera, ainda, que o ponto central para qualquer discussão da identidade é a linguagem e dizer que os homens utilizam a linguagem equivale a dizer que precisam avaliar o passado, o presente e o futuro. Ou seja, o passado e o futuro incidem e influenciam a ação do presente. Dessa forma, a comunicação consiste não apenas na transmissão de ideias da mente de uma pessoa para outra, mas também é significativa de sentidos compartilhados. Considerando a linguagem como um processo essencial no processo de interação, existem, por exemplo, regras sociais compartilhadas nos processos de comunicação para o modo de guiar uma conversa, seja para iniciá-la, terminá-la, interrompê-la, bem como existem convenções para forçar as pessoas a ocupar ou aceitar diversas posições. De acordo com Dewey (1925), as perspectivas que um grupo compartilha são internalizadas por meio da participação social. Diante do exposto e conforme demonstra Zanatta (2011), pode-se fazer uma aproximação da sociologia com a psicologia social a partir do momento em que a interiorização do processo de interação pressupõe uma identificação com a representação simbólica que a vivência em distintos espaços sociais proporciona.

Com a avaliação do passado, presente e futuro, Strauss (1999) traz a noção do self. Segundo o autor, durante uma sequência de ação, o indivíduo pode, por meio de avaliações das ações realizadas no passado imediato, guiar e mudar o curso de suas ações. A autoavaliação conduz a certas decisões tais como proceder bem, fazer melhor, fazer correções, evitar erros, arrepender-se, levando com isso, a uma constante avaliação

entre extremos, como, por exemplo, pode ou não pode, quer ou não quer, deve ou não deve (STRAUSS, 1999). Dessa forma, a interação revela-se num processo em que os atos, por meio da autoavaliação constante, são situacionais, ou seja, o sujeito irá agir de determinada forma ou não, dependendo da situação em que se encontra. Goffman (1963) também compartilha desta perspectiva, ao trazer o conceito de atores que desempenham papéis no processo de interação. Sendo assim, após uma autoavaliação crítica não se pode prever totalmente qual nova identidade será, pois as carreiras humanas tem sempre um caráter inacabado (STRAUSS, 1999).

Strauss (1999) em suas pesquisas reforça a importância da interação para o estudo da identidade. Para o autor, a análise do processo interacional pode ser feita de diversas formas, no entanto, afirma que o primeiro passo é a motivação. A busca de motivos é a busca de uma resposta a uma indagação, no qual o conjunto de interpretações irá gerar uma declaração de motivos, ou seja, toda interpretação de uma situação tem como parte integrante uma interpretação de como a pessoa se comportou e de como está pronta a se comportar. Dessa forma, os sujeitos desempenham papéis de acordo com o que os motiva em cada situação de interação.

Para o autor o ato de identificar objetos permite a pessoa organizar sua ação em relação a esses objetos, sejam eles físicos ou humanos. Ou seja, a partir do momento que um objeto ou situação pareça familiar ao indivíduo, o mesmo terá mais facilidade no curso de suas ações. Strauss (1999) exemplifica com uma situação cotidiana bem definida de um casal. Ao entrar em casa no final do dia, o homem beija sua esposa que vem até a porta cumprimentá-lo, faz algumas observações rotineiras e senta-se para assistir televisão enquanto sua esposa termina o jantar. Ocorrendo o mesmo processo todos os dias, ambos identificam a situação global, reconhecem a divisão do trabalho com a qual ambos concordam e, de um modo geral, sabem o que antecedeu e o que virá.

Os objetos/situações envolvidos nesse processo são reconhecidos e nomeados por convenção (sala, tv, cumprimentos, beijo). Parte-se ainda do pressuposto, que na linha de ação de ambos, as identidades tanto do self quanto do outro são conhecidas. O marido reconhece a si mesmo e a esposa em face um do outro nessa sequência de atos familiares e vice-versa. Supondo-se que determinado dia, ao chegar em casa a esposa não aja como de costume e a situação pareça pouco familiar, o marido se vê num problema de definição, que fará com que tenha que responder a uma série de questionamentos que envolve a

identificação correta dos gestos, dos objetos, dos eventos, das pessoas e da situação. Neste processo, questões centrais para solução satisfatória da situação dizem respeito à identidade pessoal e aos motivos (STRAUSS, 1999). Ou seja, neste momento, segundo o autor, num sentido genérico, o marido sabe quem é a esposa, pois conhece seu nome, seu status (filha, esposa, mãe), seus traços e gestos característicos. No entanto, ele não sabe em qual dos seus possíveis papéis a esposa está atuando naquele instante e por quais motivos. Isto quer dizer, que a familiaridade com objetos ou situações, torna-as naturalizada, comum, pois a sequência lógica de ações e consequências já são previamente conhecidas num geral.

De acordo com o autor, para maioria dos sociólogos, o processo interacional é estruturado, pois é introduzido na interação um peso maior a estrutura social, do que as relações interpessoais, dando-se mais atenção às pessoas como membros de grupos e organizações sociais. Dessa forma, as pessoas são vistas mais como desempenhadoras de papéis do que como indivíduos. Ou seja, duas pessoas em interação nunca são apenas pessoas, mas representantes de grupos.

No entanto, Strauss (1999, p.84) salienta que “é útil pensar que a interação é não só estruturada no sentido de que os participantes representam posições sociais; mas também, ao mesmo tempo, que não é tão estruturada”. O autor desenvolve seu argumento com base em Hughes (1945) este observa que a pessoa a qual representa um determinado status (homem, mulher, civil, militar, pai, mãe, filho, etc.) possui vários atributos, como habilidades, idade, sexo, classe. Hughes (1945) afirma ainda, que pessoas de mesmo status trabalham juntas com mais facilidade e ausência de embaraços, ao modo que na ausência de algumas dessas qualificações ou na presença de algumas outras, a interação possa ser perturbada. Sendo assim, a violação de alguns aspectos do status pode causar o que o autor chama de dilemas de status.

O autor exemplifica com uma interação médica entre homem e mulher, no qual uma mulher médica que trabalha numa clínica onde trabalham outros médicos do sexo masculino altera o clima, ou seja, a presença da mulher pode impedir certas brincadeiras masculinas e evocar ações sexuais. Esse fato é observado no estudo de Takahashi (2002) em que a presença de cadetes femininas, por exemplo, incomodava os cadetes masculinos que faziam parte da turma.

Strauss (1999) conceitua dois tipos de relações possíveis de status: interação de estrutura simples e interação de estrutura múltipla e afirma que independente do tipo, ambas são estruturadas convencionalmente, pois identidades familiares são assumidas e postas

em ação. A interação de estrutura simples ocorre quando apenas um conjunto de muitas relações possíveis de status acontece, ao passo que a interação de estrutura múltipla acontece quando advém de relações variadas, em que atuam por exemplo tanto o sexo quanto a situação profissional. O autor conclui então, que a interação é um processo tanto estruturado, quanto interpessoal, no qual as pessoas não agem apenas e sempre como representantes de status. A partir dessa afirmação, pode-se constatar a influência da estrutura no processo de socialização e, ao mesmo tempo, fazer uma aproximação ao objeto de estudo de Pierre Bourdieu, conforme veremos adiante.

No que tange ao processo de transformações da identidade, Strauss (1999) aborda questões referente à mudança e desenvolvimento pessoais, sejam estas mudanças de autoconcepção ou de comportamento e, para isto, traz o conceito de desenvolvimento e treinamento. O processo de desenvolvimento para o autor apresenta um movimento progressivo com relações discerníveis entre o começo, o meio e o fim. Segundo ele, a psicologia social aborda geralmente duas concepções de desenvolvimento e seu intuito é comparar estas duas a uma terceira.

A primeira concepção de desenvolvimento, o autor utiliza como metáfora uma ‘pista de corrida’, na qual do seu começo ao fim, há diversos corredores, alguns apenas começando, outros já terminando a mesma. Sendo o final da pista o objetivo a ser alcançado, quanto mais perto o corredor está dele, mais avançado se encontra. Ou seja, em relação a determinadas tarefas, algumas pessoas estão mais, outras menos desenvolvidas. Para segunda concepção, o autor faz referência à metáfora do ‘ovo cru’. Tendo diante de si um ovo cru, a pessoa pode escolher comê-lo cozido, mexido, frito, fazer diversos tipos de omelete, porém, independente do tratamento que se dê a esse ovo, não importa o modo como mude de aparência, ele continua em sua essência sendo um ovo. Isto quer dizer que pode parecer que uma pessoa mude consideravelmente durante sua vida, mas admite-se que a pessoa essencial é a mesma. Nessa concepção, o núcleo essencial da personalidade é afirmado cedo na vida e mudanças posteriores da organização inicial da personalidade são variantes, embora complicadas.

Strauss (1999) conclui que normalmente o desenvolvimento é visto ou como o atingimento de um fim, ou como conjunto de variações sobre temas básicos e afirma que nenhuma dessas duas concepções (p.101) “capta o caráter aberto, experimental, exploratório, hipotético, problemático, tortuoso, mutável e apenas parcialmente unificado dos cursos humanos da ação”.

O autor conceitua o desenvolvimento como uma série de transformações relacionadas entre si e afirma que as transformações de identidades podem ser planejadas ou estimuladas por representantes institucionais ou fora da estrutura social mais visível. Assevera, ainda, que as mudanças de identidade estão invariavelmente associadas com posição social em organizações formais.

Quanto ao treinamento, Strauss (1999) afirma que independente da idade, o treinamento é parte integrante do ensino ao inexperiente e é necessário um guia ao aprendiz durante este percurso, não somente no que diz respeito a alguém que lhe ensine as habilidades, mas que o oriente em relação a algumas coisas surpreendentes que estão acontecendo e requerem explicação. Ou seja, “como as sequências de etapas são de certa forma obscuras, e as próprias respostas são coisas incomuns, alguém deve estar preparado para prever, indicar e explicar os sinais” (STRAUSS, 1999, p.117). No decorrer desse processo, cenários são criados para que o aprendiz coloque em prática essas novas habilidades, o que ocorria por exemplo, nas aulas práticas dos alunos soldados. Observa-se assim, que o quadro institucional no qual é realizado o treinamento irá afetar consideravelmente o seu processo e resultado.

Outro aspecto fundamental para a construção da identidade, segundo Strauss (1999), é a afiliação ao grupo, como forma de gerar uma identificação simbólica entre os participantes. A afiliação a um grupo ou estrutura social permanente inevitavelmente implicará a passagem de um status para o outro. No caso da presente pesquisa do status de ‘ser civil’ para o status de ‘ser militar’. Dessa forma, as novas avaliações feitas por esses sujeitos, suscitarão essa nova identidade militar que está se formando. Essas transformações de um status para outro, implica não só mudança de ação ou comportamento, mas também das razões verbalizadas que são associadas a eles (STRAUS, 1999). É necessário um período de transição neste processo de transformação, que é visto na presente pesquisa por meio do Curso de Formação que os alunos soldados passam. No que tange ao processo de transformação, Strauss (1999, p.115) partilha da mesma ideia de Erikson de que “o senso de identidade nunca é obtido e mantido para sempre”, implica em crise(s).

Shibutani (1955) enfatiza que as pessoas participam de diferentes ‘mundos sociais', em consequência, é importante saber no instante de praticar um ato de qual mundo social se está participando. Ao encontro dessas ideias, Strauss (1999) discorre que as identidades implicam não

apenas histórias pessoais, mas também histórias sociais e traz a questão da temporalidade quando afirma

os indivíduos mantém suas filiações aos grupos que, por sua vez, são produtos de um passado. Se quisermos entender as pessoas, seu desenvolvimento e suas relações com outros importantes, devemos estar preparados para considerá-las inseridas num contexto histórico (p.163).

Percebe-se assim, que a identidade pessoal está interligada com a identidade de grupo e situada num contexto histórico e de identificação social. Neste sentido, considerando a temporalidade, a historicidade torna-se essencial para a compreensão do processo de interação e para a análise da identidade, pois os indivíduos estão inseridos num contexto histórico. Portanto, o pressuposto de discussão do autor é de uma estrutura de caráter arraigado formado bem cedo na vida e de que as continuidades da experiência pessoal estão relacionadas sistematicamente com as fornecidas pela estrutura social, mas que no entanto não são asseguradas por ela.

Goffman (1985) partilha o olhar sociológico sobre o processo de interação com Strauss (1999), no entanto, os autores discordam sobre a função que exerce a história na formação das identidades (ZANATTA, 2011). Segundo a autora, Goffman apesar de não negar o passado, desconsidera-o, pois refere-se a um ator situado no presente para compreender a ação em uma interação específica. Para Goffman (1985) a interação é um encontro em que os atores desempenham papéis, ou seja, ele considera que em cada situação de interação os atores estão desempenhando, por exemplo, o papel de pai, mãe, homem, mulher, médico, policial, esposa, filho. Podemos comparar a definição de desempenho de papéis de Goffman, ao que Strauss (1999) define como status e Bourdieu (2004) posições, conforme será abordado posteriormente.

Para Berger e Luckmann (2012) a identidade também decorre dos processos de socialização. Conforme os autores, a realidade é construída socialmente. De acordo com Dubar (2013) eles retomam e prolongam as análises de Mead e introduzem uma distinção entre socialização primária e socialização secundária.

A socialização primária é a primeira socialização do indivíduo na infância, por meio do qual se torna um membro da sociedade adquirindo saberes básicos. Já a socialização secundária é todo processo posterior de incorporação de saberes especializados de novos setores do mundo

objetivo de sua sociedade, de um indivíduo já socializado (BERGER; LUCKMANN, 2012). Dubar (2013) assevera que Berger e Luckmann têm o interesse de construir uma teoria operacional da socialização secundária que não seja somente reprodução dos mecanismos da socialização primária.

De acordo com Berger e Luckmann (2012) pode haver uma ruptura com a socialização secundária em relação à socialização primária (DUBAR, 2013), no que tange por exemplo, a visão de mundo, o que necessitará de muitos choques biográficos para desintegrar a realidade maciça interiorizada durante a primeira infância. Esses choques acompanham um processo de transformação do mundo e reestruturação de identidade, sendo necessário para o êxito, dentre outros, uma distância de papéis, um engajamento pessoal, um processo institucional de iniciação e a existência de uma estrutura de plausibilidade, definida por Dubar (2013) como “laboratório de transformação”. Na presente pesquisa este “laboratório de transformação” pode ser definido como sendo o Curso de Formação de Soldados (CFSD), no qual mudanças irão ocorrer na identidade, em alguns casos mais bruscos que outros. Segundo Dubar (2013, p. 124- 125)

a transformação de identidade, depende da articulação duradoura de um “aparelho de legitimação” e de uma “reinterpretação da biografia passada” em torno de uma estrutura do tipo “antes eu achava.... agora eu sei”. [...] A socialização secundária nunca apaga totalmente a identidade “geral” construída no fim da socialização primária. Entretanto ela pode transformar uma identidade “especializada” em outra, mesmo muito diferente, em condições institucionais bem definidas.

Percebe-se assim, que toda atividade humana é sujeita a habituação e toda ação repetida frequentemente torna-se um modelo que pode ser reproduzido sem esforço pelo sujeito e ser apreendido por este