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4 EM CAMPO COM OS MILITARES: A TRAJETÓRIA DA PESQUISA

4.1 A ENTRADA NO CAMPO

O interesse pelo campo da pesquisa surgiu ainda em 2010 depois de discussões no grupo de orientações. No entanto, o primeiro contato com a instituição foi feito somente em 2011 com o amadurecimento do tema do projeto. Primeiramente, em 04 de abril de 2011, o contato foi feito com o senhor Tenente Coronel Almir Silva, comandante do 22º Batalhão da PMSC. Fui muito bem recebida e o Tenente Coronel Almir se colocou inteiramente à disposição para ajudar no que fosse preciso, disponibilizando o referido Batalhão para realização da pesquisa.

Ficamos conversando por cerca de uma hora sobre o projeto e após apresentar a proposta o Tenente Coronel comentou sobre a possibilidade de se fazer a pesquisa no Centro de Formação da PMSC e questionou sobre meu interesse a respeito. Este era o interesse inicial, mas como não havia ainda um possível contato no Centro de Formação, optou-se por fazer este primeiro contato no referido Batalhão. Após a concordância mútua, o Tenente Coronel procurou viabilizar o contato, que não foi possível, e ficou de dar um retorno ainda no decorrer do dia e ao final da tarde recebi a ligação de que poderia procurar o Centro de Ensino.

O contato foi agendado para o dia 06 de abril com o Tenente Coronel Aldo. O mesmo se mostrou interessado pela pesquisa e solicitou que fosse enviado um projeto em nome do Diretor Geral do Centro de Ensino da PMSC. Um novo contato para entrega do projeto só foi feito em 18 de outubro de 2011, após a banca de qualificação realizada em 14 de junho de 2011.

Em 01 de novembro de 2011 recebi o retorno positivo da instituição para a realização da pesquisa. No dia 07 de novembro de 2011 conheci o Tenente Coronel Ziegler que assinou a declaração de autorização de pesquisa. Enquanto aguardava os encaminhamentos, conversamos durante algum tempo com outros funcionários que não eram militares e marcamos para o dia 09 de novembro de 2011 o início das observações. O Tenente Coronel Ziegler me apresentou para os demais policiais que estavam na sala, que foram totalmente receptivos e se colocaram à disposição para o que eu precisasse, oferecendo, inclusive, um computador de apoio.

aguardava o Tenente Coronel Ziegler que estava em uma reunião, fiquei aguardando na sala e conversando informalmente com os policiais que ali estavam. Após seu retorno da reunião, fui levada até os demais oficiais para falar sobre a pesquisa e ser apresentada formalmente a eles. Os comandantes que ali estavam manifestaram-se favoráveis à pesquisa e me deram acesso livre às dependências do quartel-escola para a realização do estudo. Enquanto aguardava ser apresentada à coordenadora pedagógica para conversar, observava a rotina dos que ali estavam. Este foi o primeiro contato com o campo que ainda revelaria muitas coisas: as continências, a formação no pátio milimetricamente padronizada, os gritos de guerra, tudo era novo e estimulante. Conversei informalmente com a coordenadora pedagógica, e dessa conversa saíram as primeiras informações a respeito do campo.

Após nove dias dessa primeira conversa com a coordenadora pedagógica, retornei ao Centro de Ensino, mas não foi possível encontrá-la. Como ela não estava, fui para a biblioteca. A bibliotecária, receptiva, mostrou-me diversos materiais (livros, documentos, banner com as insígnias militares), o que me fez ficar cerca de quatro horas na biblioteca do quartel escola. Às 18:00 horas há o ritual de formação e todos os alunos se reúnem no pátio, chegam cantando gritos de guerra e vão se alinhando para a retirada da bandeira. ‘É tudo muito metódico e padronizado’ (NOTAS DE CAMPO).

No dia 21 de novembro de 2011 fui ao quartel para conversar com a coordenadora pedagógica sobre o início dos acompanhamentos. Ela disse que teria que me apresentar aos comandantes do CFO (Curso de Formação de Oficiais) e do CFAP (Curso de Formação e Aperfeiçoamento de Praças) para ter abertura para imersão. Primeiramente me apresentou para o comandante do CFO, que me questionou sobre o trabalho e sobre o que precisaria. Após apresentados os objetivos para o comandante, ele me apresentou para os comandantes de pelotão do CFO e ao conversamos a respeito da pesquisa eles demonstraram interesse e falaram sobre o momento que a policia está passando. De acordo com os comandantes “a polícia está num processo de mudança, processos paradoxais e de quebras de paradigmas”. Um dos comandantes exemplificou: “hoje eu tenho 26 anos, sou tenente e comando um pelotão. Tem muita gente antiga que não aceita isso, mas a polícia está mudando”.

Ficamos conversando durante algum tempo e os dois comandantes se colocaram à disposição para o que fosse preciso na pesquisa. Peguei os e-mails e telefones para manter contato. Comunicaram-me que no dia 23 de novembro teria prova no estande de

tiro e que seria interessante eu acompanhar e assim ficou combinado. Além disso, comentaram também, que dia 02 de dezembro de 2011 às 09:00 horas teria a formatura de espadins e combinamos que eu participaria, pois é uma cerimônia muito importante.

Após conversar com os comandantes do CFO, fui recebida pelo comandante do CFAP e sub comandante aos quais explanei sobre a pesquisa. Perguntaram sobre o que era o trabalho, o que eu precisaria, como pretendia fazer, se iria fotografar, filmar, gravar, fazer entrevista, de quantos alunos precisaria. Fui detalhando os procedimentos que seriam adotados e em seguida conversamos sobre alguns aspectos da polícia militar. Um dos comandantes falou além de aspectos gerais da polícia, sobre algumas questões administrativas. Segundo o comandante

hoje temos um desafio muito maior... os alunos são mais maduros, a gente não fala mais para adolescente que acabou de sair do ensino médio... são tudo formados em ensino superior... agora em outubro de 2011 se formou a primeira turma que entrou com ensino superior... teu trabalho vai ser bom porque vai poder levar lá para fora as coisas daqui... a gente precisa mudar a ideia que as pessoas têm da polícia militar... ainda pensam muito no militarismo, na época da ditadura... mas hoje somos voltados para os direitos humanos... mas é complicado... queremos mudar, mas sem perder nossa tradição (TEN. CEL. COUTO11).

Relataram também sobre a importância do controle para a polícia:

aqui é importante nós termos o controle deles a todo momento... por exemplo, as salas de aula são lá no Bardal, não são aqui... então a gente não consegue ficar a todo momento observando... mas agora a gente comprou o terreno aqui do lado, aí isso vai facilitar porque poderemos estar mais presentes e observar mais... temos que observar a todo momento para admoestar, para ir moldando... (TEN. CEL. COUTO).

11

Para manter o sigilo na pesquisa, substituiu-se os nomes verdadeiros por nomes fictícios, mantendo-se no entanto a patente à qual pertencem.

Assim comecei a identificar os primeiros conteúdos relacionados ao habitus e à formação de uma identidade militar.

O comandante ainda discorreu sobre o funcionamento da rotina no quartel escola:

aqui o pessoal do CFSD tem 50 horas/aula semanais, teóricas e práticas durante mais ou menos seis ou nove meses. Nós temos um sistema de controle que é o FON (anotação quando faz algo negativo) e o FOP (anotação quando faz algo positivo). Eles entram em forma todos os dias as 07:30 da manhã e o hasteamento da bandeira é as 07:40. Segunda, quarta e sexta-feira eles cantam os hinos. Atualmente nós temos 11 turmas (pelotões), com mais ou menos 386 alunos soldados e tem também a turma de CFC (curso de formação de cabo) com cerca de 70 alunos cabo. São mais ou menos 35/40 alunos por pelotão. Nós temos como estrutura os sargentos monitores de cada pelotão, os tenentes comandantes do pelotão, o capitão comandante da CIA, o Major e o Tenente Coronel comandante do CFAP. Na entrada deles, na primeira semana, nos primeiro dias são tratadas coisas mais administrativas. São passadas questões administrativas, apresentada as rotinas, apresentado a estrutura, verificado o enxoval que foi solicitado comprar, tirado as medidas para a farda e repassado questões administrativas como conta em banco, etc... (TEN. CEL. COUTO).

Após conversarmos, o comandante foi em todas as salas do comando me apresentar para os comandantes dos pelotões e solicitou para colaborarem com o que fosse preciso, pois eu havia sido autorizada pelo comando geral para fazer uma pesquisa no Centro de Ensino. Os comandantes de pelotões se colocaram à disposição e perguntaram sobre a pesquisa. O comandante que me apresentava avisou que passaria um e- mail a todos os comandantes e monitores dos pelotões avisando sobre a minha pesquisa e presença no dia a dia deles. Depois de passarmos por todas as salas despediu-se e disse que eu poderia contar com ele para as atividades.

Quando os alunos entraram em forma no final do dia, fui procurar o monitor ao qual o comandante havia falado que era da turma

mais nova. No entanto, ao procurá-lo, disseram-me que a última turma a entrar havia sido outra e que o sargento monitor também era outro. Fui até o monitor indicado, apresentei-me e disse que iria acompanhar a turma deles. Perguntei quando poderia começar e o monitor disse que eu poderia começar quando eu quisesse. Expliquei que no dia 23 de novembro iria acompanhar a turma de CFO no estande de tiro, mas que no dia 24 de novembro já começaria com eles. Assim começava a inserção efetiva no campo.