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A imigração japonesa para o estado de São Paulo

1. LÍNGUA, TERRITÓRIO E IMIGRAÇÃO JAPONESA

1.3. A Imigração japonesa para o lócus do estudo

1.3.1. A imigração japonesa para o estado de São Paulo

O contexto histórico da era Meiji e suas transformações levou o governo japonês a planejar, incentivar e executar um plano imigratório de proporção relevante com destino ao Brasil. Esse país foi o que mais recebeu imigrantes japoneses no mundo ao longo de sua história de imigração, chegando a um número de 250 mil japoneses entre 1908 e 1970.

O ano de 1908 é o marco inicial da vinda dos japoneses em massa para as terras brasileiras: donos de fazendas de café, principalmente do oeste paulista subsidiaram as primeiras viagens provenientes do Japão para experimentar a mão de obra japonesa como opção para a falta de trabalhadores em suas propriedades. O plano imigratório era uma tentativa de beneficiar a elite de ambos os países já que

do lado japonês, o governo precisava aliviar a carga demográfica e, com isso, diminuir os protestos populares por melhores condições de vida e trabalho no país. Do lado brasileiro, havia o interesse em exportar café para o Japão, apesar de a bebida ser praticamente desconhecida e muito pouco apreciada entre os japoneses, e de receber mão-de-obra para a lavoura cafeeira (SAKURAI, 2008, p. 245).

39 Os brasileiros logo percebem que o trabalhador japonês era uma ótima opção para as lavouras brasileiras uma vez que a maioria sabia técnicas avançadas relacionadas ao manejo da terra, plantio e colheita, uma vez que a sociedade japonesa havia acabado de transitar entre um sistema social extremamente agrícola para um demasiadamente industrial e comercial.

O governo japonês, para levar a cabo seu plano de diminuição demográfica e de redução da desigualdade social, faz propagandas fervorosas entusiasmando a ida ao Brasil, afirmando para seus cidadãos que no referido país tropical as chances de enriquecer através do trabalho nas fazendas eram numerosas. Porém, muitas famílias, ao chegar no Brasil, se deparam com a dura realidade do trabalho nas fazendas: grandes extensões de terra para cuidar, pagamento injusto com relação à carga horária diária de trabalho e despesas altas adquiridas tanto nos armazéns locais, quanto para vir para as terras brasileiras.

Além dos problemas supracitados, crianças imigrantes de doze anos já eram submetidas ao árduo trabalho nas fazendas, já que a regra para vir ao Brasil exigia que pelo menos três pessoas de cada família estivessem aptas para o trabalho. Com isso, muitas delas não tinham acesso à educação, não sendo letradas nem em japonês, nem em português, dificultando tanto o estabelecimento no país de chegada, quanto o reestabelecimento no país de origem num possível retorno.

Voltando um pouco ao tempo, no dia 18 de junho de 1908 o Kasato Maru, primeiro navio a vir para o Brasil com o objetivo de trazer famílias japonesas para o trabalho em terras brasileiras, atraca no porto de Santos, no estado de São Paulo. Como citado no subcapítulo anterior, alguns japoneses já haviam chegado em nosso país antes de 1908, porém a relevância do número de japoneses que chegam no referido navio (781 imigrantes)16 marca a história da imigração japonesa em nosso país.

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Figura 5.Kasato Maru

Fonte: Google17

A imigração nipônica se deu, sobretudo, pelo plano de captação de mão de obra estabelecido pela Sociedade Promotora de Imigração fundada através da união de diversos fazendeiros paulistas que necessitavam ampliar o número de trabalhadores em suas terras. Essa imprescindibilidade ocorreu devido à extinção da escravatura e, posteriormente, diminuição da imigração de alguns estrangeiros tais como os italianos, alemães e portugueses: a mão de obra japonesa tornou-se uma saída para os problemas enfrentados no trabalho nas fazendas cafeeiras.

Segundo Izumi (2010, p. 31) “ao chegarem em São Paulo, os imigrantes eram recebidos na Hospedaria de Imigrantes antes de serem encaminhados para as fazendas”. Essa hospedaria possuía o papel de facilitar o recrutamento dos imigrantes para o trabalho nas fazendas de café do oeste paulista, bem como auxiliar na formação das colônias de trabalhadores para o serviço agrícola.

Os primeiros imigrantes japoneses que chegaram em São Paulo no Kasato Maru foram alocados para variadas fazendas paulistas tais como São Martinho, Guatapará, Dumont, Canaã, Sobrado e Floresta (IZUMI, op. cit.). Porém, ao contrário do que era esperado, os problemas entre os imigrantes nipônicos e os brasileiros começam rapidamente por razões diversas, entre elas as péssimas condições de moradia, trabalho, alimentação, assim como as barreiras linguísticas e culturais no convívio com os patrões e os outros trabalhadores locais.

O bloqueio cultural foi um dos grandes empecilhos enfrentados pelos japoneses: os produtos alimentícios disponíveis nos armazéns locais possuíam preços exorbitantes,

17 Disponível em:

https://www.google.com/search?q=kasato+maru&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKEwidr5T V6uXlAhWCCrkGHUnjBFgQ_AUIEigB&biw=1366&bih=625#imgrc=mEcnDeopWgAOYM. Acesso em: 12 nov. 2019.

41 bem como eram desconhecidos pelos imigrantes, dificultando o preparo. Além disso, como destacado anteriormente, o bloqueio linguístico causava mais problemas de entendimento, falta de compreensão mútua, criando situações constrangedoras que prejudicavam a vida dos trabalhadores imigrantes.

Nesse contexto, cabe destacar que os próprios japoneses, provenientes de diferentes regiões do Japão, também enfrentam alguns problemas linguísticos entre eles por falarem diferentes variedades da língua japonesa, uma vez que a variedade considerada padrão, a da região de Edo (atual Tóquio), ainda não era muito difundida e ainda não havia ganhado poder político como nos dias atuais. Nesse ínterim, os imigrantes nipônicos precisaram ultrapassar as barreiras linguísticas de suas próprias variedades, passando por processos de acomodação e simplificação linguística para poderem se comunicar de maneira mais simples e prática.

Os japoneses que vieram para o estado de São Paulo, por terem se estabelecido de forma menos dispersa e em maior quantidade, mantiveram em maior escala sua língua e cultura de origem, levando mais tempo para aprender a língua portuguesa. Em muitos casos, devido a essa característica associativa, um número grande de imigrantes de primeira geração nunca chegou a aprender a falar o português com proficiência, pois o convívio quase exclusivamente com japoneses dificultava o processo de aprendizagem

(SAITO e MAEYAMA, 1973).

Além disso, em São Paulo, percebemos claramente como a influência da cultura nipônica, trazida com a imigração, faz parte da paisagem de muitas cidades do referido estado, tanto na arquitetura com os impetuosos portais japoneses, templos budistas e xintoístas, como na paisagem linguística em nomes de restaurantes, lojas, etc. O banco Bradesco do bairro liberdade é um exemplo disso: seu design oriental chama a atenção de muitas pessoas, sobrelevando a influência marcante da imigração japonesa.

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Figura 6.Banco Bradesco do bairro liberdade, São Paulo.

Fonte: Wikipedia18

A imigração japonesa no estado de São Paulo deixou marcas bem claras em muitos dos locais povoados por esses imigrantes. Ademais, o poder associativo desses sujeitos no referido território em número relevante culminou numa maior manutenção da cultura e língua do país de origem, bem como num uso mais saliente da variedade proveniente do CL entre a língua portuguesa e o japonês. Talvez por isso, muitos neologismos surgiram na variedade falada em São Paulo se comparada com a falada pelos

nipobrasileiros no território fluminense.