• Nenhum resultado encontrado

A imigração japonesa para o estado do Rio de Janeiro

1. LÍNGUA, TERRITÓRIO E IMIGRAÇÃO JAPONESA

1.3. A Imigração japonesa para o lócus do estudo

1.3.2. A imigração japonesa para o estado do Rio de Janeiro

A história da imigração japonesa para o Brasil teria seu início em 1888 quando um acrobata japonês chamado Manji Takezawa foi empregado como professor de jiu-jitsu da Guarda Real (MARTINS, 2010, p. 150). Posteriormente, em 1889, Wasaburo Ohtake começa a trabalhar na embaixada do Japão no Brasil e, logo em seguida, presta serviços na representação diplomática do país nipônico na cidade de Petrópolis a partir do ano 1897, mesmo sem haver ainda um acordo imigratório firmado entre os países.

Em 1906, com a visita de Ryu Mizuno, representante da Companhia Imperial de Imigração, o governo do Rio de Janeiro e do Japão começam a pensar sobre as vantagens da imigração japonesa para o estado supracitado como maneira de otimizar a mão de obra

18 Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Bradesco_Liberdade.JPG. Acesso em: 16 jan.

43 agrícola. Contudo, as péssimas condições climáticas e de saúde na baixada fluminense preocupam Mizuno em relação à qualidade de vida dos possíveis imigrantes.

Apesar de todos os problemas de infraestrutura no Rio de Janeiro e das epidemias que assolavam a região fluminense, em 1907 um acordo de imigração entre o governo do Japão e o estado do Rio é estabelecido com o intuito de promover a vinda de japoneses para o território do estado, acreditando que a mão de obra nipônica melhoraria o cultivo do solo, criaria indústrias e aumentaria a produção de alimentos. Como afirma Carlos Neto (2006, p. 25) “nesse acordo ficou decidido que ambas as partes se juntariam para implementar uma colônia de imigração na Fazenda Santo Antônio, situada em São Francisco de Paula, Macaé, a 200 km da cidade do Rio de Janeiro”. Para esse fim, Mizuno escolhe a família de um imigrante chamado Kumabe para empreender a instalação da primeira colônia japonesa no Brasil, bem como dois outros japoneses: os senhores Yassuda e Nishizawa.

As tentativas frustradas de cultivo da terra no clima árduo da região fluminense, bem como as epidemias que assolavam o território naquela época, levam os imigrantes a desistirem de viver naquele local e culminam com o insucesso da instalação da primeira colônia de imigração japonesa no território brasileiro.

Cabe destacar que a imigração japonesa para o estado do Rio de Janeiro, apesar de fracassada em 1907, acontece de forma processual após o ano de 1908 com a chegada do Kasato Maru: primeiro navio japonês a chegar no Brasil com o objetivo específico de trazer mão de obra japonesa para terras brasileiras. A característica do deslocamento dos japoneses para o estado fluminense é diferente da imigração em massa em São Paulo já que as famílias que não queriam mais trabalhar nas exaustivas fazendas cafeeiras paulistas se dirigiam para o Rio de Janeiro em busca de novas oportunidades de trabalho.

Um dos empecilhos para a vida dos japoneses no estado do Rio era a dificuldade com a língua portuguesa: em São Paulo o grande número de imigrantes nipônicos concentrados em localidades específicas facilitava a comunicação entre eles, apesar de muitos fazerem uso de diferentes variedades da língua japonesa por serem provenientes de variadas regiões do Japão. Já no território fluminense, o deslocamento não planejado dos imigrantes e sua dispersão em localidades mais isoladas dificultou a integração e socialização dos japoneses por não dominarem o português.

Apesar da amplitude do estado do Rio não ser vasta em relação a diversos estados do Brasil com grande proporção territorial, os japoneses se espalharam por inúmeras localidades desse estado, levando sua cultura, técnicas agrícolas e abrindo variados

44 comércios como as casas de tecidos, restaurantes de culinária japonesa, casas de botões e casas de comércio de pedras preciosas. Além disso, aos poucos, esses imigrantes foram formando associações e colônias que, apesar de pequenas se comparadas com as de São Paulo, tiveram papel relevante para a formação da identidade nipofluminense e para a propagação do ensino da língua japonesa entre os descendentes nipônicos.

O mapa na página seguinte, elaborado durante nossa pesquisa de mestrado com base na história da imigração japonesa para o estado do Rio de Janeiro, ilustra de maneira clara as regiões onde os imigrantes japoneses passaram, se instalaram e formaram associações, trazendo com eles sua cultura e modificando, de certa maneira, a cultura e a paisagem linguística local:

45

Figura 7.Mapa: Distribuição Geográfica da Imigração Japonesa no estado do Rio de Janeiro

Fonte: Carlos Neto (2016, p. 28)19

19 Mapa elaborado a partir de dados extraídos de Inoue (2014), Inoue (2012a,), Inoue (2012b), Martins et

46 O mapa mostra que somente na região noroeste do estado não houve permanência relevante da imigração japonesa, enquanto em regiões como a Metropolitana e Itaguaí a presença desses imigrantes foi demasiadamente intensa, culminando com a população

nipofluminense mais significativa do referido estado na atualidade (INOUE, 2012, p.

273)20.

Diferentemente do estado de São Paulo, no Rio de Janeiro a primeira escola de língua japonesa foi fundada somente em 1936: já que o perfil dos imigrantes que se instalaram no estado fluminense era diferente dos que se instalaram no estado paulista. Naquele, os japoneses pretendiam abrir seus comércios, prosperar financeiramente e adaptar-se à vida do novo país. Neste, os imigrantes se preocuparam desde o princípio em manter a língua japonesa e passá-la aos seus descendentes já que a intenção inicial era voltar ao Japão assim que a situação financeira permitisse.

Cabe destacar ainda que, apesar dos intentos de muitas colônias de imigrantes em promover e manter o ensino do japonês, a partir de 1930 com a política nacionalista do governo Vargas, as comunidades japonesas sofreram com a perseguição e o boicote ao ensino do japonês. Esse fato teve impacto visível na transmissão da língua para muitos

nipobrasileiros21, assim como no uso da língua japonesa dentro das associações nipônicas

no território brasileiro.

Em suma, a presença nipônica no estado do Rio de Janeiro foi significativa, porém configurou-se de maneira diferente da imigração japonesa para o estado de São Paulo. Ademais, o território fluminense constitui-se numa opção de fuga dos japoneses do árduo serviço nas fazendas paulistas e das péssimas condições de vida proporcionadas pelo trabalho agrícola. Com isso, os japoneses desenvolveram nos variados territórios habitados no Rio atividades diversas que tiveram impacto relevante na economia e cultura local. Apesar de próximos, os referidos estados possuem culturas próprias e modos de vida singulares que, somados ao modo de vida nipônico, conferiram a formação de sujeitos imigrantes híbridos como os nipobrasileiros e seu repertório linguístico. Enquanto em São Paulo os japoneses se dedicavam principalmente ao trabalho agrícola, viviam em localidades onde se associavam em grande número e usavam suas variedades linguísticas como meio comum de comunicação, no Rio de Janeiro os imigrantes

20 Para informações mais detalhadas sobre a formação das colônias japonesas no estado do Rio de Janeiro,

Cf. Carlos Neto (2016, p. 26-32).

21 Explicaremos o uso deste termo de maneira aglutinada ao invés de justaposta, como estabelece a

47 nipônicos se estabeleceram em locais diversos, mais diversos, menos concentrados, precisaram aprender com mais urgência a língua portuguesa e tiveram que assimilar de maneira mais rápida a cultura local como ferramenta de adaptação à necessidade local e à sobrevivência.

Esses acontecimentos estão intrinsecamente relacionados, em muitos casos, ao perfil linguístico dos imigrantes japoneses nos dois estados em questão, já que os tipos de imigração diferem em certa medida. Em São Paulo, configuraram-se colônias em que o uso da língua japonesa é mais intenso, a presença de cursos da referida língua é intensa, principalmente nos bairros onde esses imigrantes se estabeleceram de maneira mais numerosa. No Rio de Janeiro, o perfil de estabelecimento dos japoneses difere de São Paulo, pois muitas famílias se dedicaram a ramos diferentes de negócios, espalhando-se em menor número associativo ao longo do estado. Com isso o uso da língua japonesa ficou mais restrito, contando com um número inferior de falantes. Dessa forma, percebe- se que estes fatores podem ser levados em consideração como modificadores das inovações linguísticas que encontramos na variedade linguística usada por esses imigrantes: pelo que pudemos perceber em nossas observações, enquanto entre os imigrantes japoneses estabelecidos em São Paulo os neologismos na koroniago são mais frequentes, no Rio de Janeiro percebemos que há menos inovações na referida variedade. A análise definitiva dos dados, parte integrante do capítulo 4 deste trabalho, salienta de maneira clara essas premissas.