• Nenhum resultado encontrado

A indústria automóvel em permanente mudança-a crescente concentração

CAPÍTULO 3 AS INICIATIVAS EM PORTUGAL EM PROL DO

4.1. A indústria automóvel em permanente mudança-a crescente concentração

A concorrência agressiva entre os OEM, que se traduz numa partilha das quotas de mercado que só poderão aumentar à custa uns dos outros, obriga-os a adoptar uma estratégia de presença em quase todos os continentes.

De um ponto de vista geográfico, a indústria automóvel mundial está no meio de uma profunda transição. Desde meados dos anos 80, assistimos a uma deslocação de indústrias nacionais discretas para uma indústria globalmente integrada. Esta integração tem sido acompanhada por pressões políticas sobre os construtores para produzir onde os automóveis se vendem, o que conduziu a uma dispersão da montagem final muito acentuada. Enquanto em 1975 sete países contribuíam com 80% da produção mundial, a mesma percentagem era afecta a onze países em 2005 (Timothy Sturgeon, 2008).

As empresas leaders no sector automóvel têm o poder de condicionar a localização dos fornecedores a nível local, regional e nacional por razões operacionais como a produção lean, colaboração em design e a manutenção das condições para a produção de plataformas de veículos. Mas também há razões políticas que motivam que a produção dos construtores se faça na proximidade dos mercados consumidores finais (p.e. se houver riscos de que os automóveis importados constituam uma cota importante do total de veículos vendidos), o que comporta pressões sobre a localização dos fornecedores. A indústria automóvel apresenta, nos principais países produtores e a nível mundial, uma grande concentração. Constata-se que as duas maiores empresas construtoras produzem mais de 55% do total, havendo países com uma concentração superior a 75%. Os produtores de primeira geração – EUA, R.U., RFA, França, Itália e Suécia – são mais concentrados que os de segunda geração – Japão, Espanha, México, Argentina e Índia. Segundo C. Guerra, as economias de escala são a principal razão explicativa para estes factos.

No primeiro grupo de países, as empresas existentes são já o resultado de um processo de concentração – fusões e aquisições, tomadas de participação, falências, etc. – com as suas últimas manifestações no início da década de 70. No Japão tal não aconteceu por rejeição das próprias empresas aos planos do MITI (Ministry of International Trade and Industry) em reduzir o número de produtores. A competição doméstica é vista como condição à preservação da competitividade internacional (Guerra, 1990).

No segundo grupo de países, a indústria automóvel surge como resultado de realizações directas ou indirectas dos países do primeiro grupo e do Japão através do IDE ou de venda de licenças. A Índia considerar-se-á uma excepção na medida em que detém uma produção e montagem próprias.

Em quase todos os países, a acção dos governos tem influenciado o nível de concentração das respectivas indústrias promovendo ou mesmo dificultando as fusões e aquisições, concedendo incentivos financeiros principalmente na Europa e alguns países da segunda geração. A título de exemplo, o R.U. promoveu a fusão entre a Leyland e a BMC, nos anos 70, com um empréstimo avultado donde surgiu a BLMC, que mais tarde seria nacionalizada para impedir o colapso financeiro.

Para além das fusões e aquisições entre OEM, existe uma grande percentagem de F&A que envolve fornecedores de componentes, não apenas os integradores e fabricantes de sistemas, de grande dimensão (de que são exemplo a TRW (EUA), a Valeo (França), e a

Robert Bosch (Alemanha)), mas também fabricantes de componentes de menor dimensão.

Este movimento de concentração empresarial tem-se verificado em diversas áreas de actividade, da produção ao I&D, até porque a produção do veículo tem vindo a assumir um peso decrescente na cadeia, de forma desigual entre regiões.(Ângela Lobo, 2002). Daí que uma análise da indústria deva ser considerada como um todo, em que o papel dos fornecedores de componentes, que representam mais de 60% do valor do automóvel, e as suas relações com os fabricantes exijam uma coordenação de competências e de transferência de conhecimento em design, produção e montagem (Lung, 2003).

A análise dos índices de concentração, permitem-nos identificar a estrutura oligopolísta do mercado automóvel português, onde a inexistência de barreiras à entrada para o mercado inter-europeu, retirou às empresas que o integrem, poder de mercado. Assim poder-se-á afirmar que qualquer uma das empresas do sector automóvel, deixou a partir de 1988, de ter capacidade por si só, de influenciar e liderar este mercado.

4.2.

As questões de confiança

‘Virtually every commercial transaction has within itself an element of trust, certainly any transaction conducted over a period of time. It can be plausibly argued that much of the economic backwardness in the world can be explained by the lack of mutual confidence.’

(Arrow 1975, p.24)

Estudos anteriores sobre confiança entre parceiros comerciais revelam a possibilidade de contribuir para um aumento das vantagens competitivas63

. É entendida mais como um resultado de aplicação de normas com envolventes sociais, do que propriamente um elemento de instrumentalização.

Tentaremos identificar os factores determinantes do grau de confiança necessário entre fornecedores e OEM’s.

Numa primeira perspectiva, parece que a confiança mútua permite que redes de empresas, independentemente como estão relacionadas, se possam adaptar mais facilmente a circunstâncias não previstas, normais em ambientes de risco e incerteza e fazer com que os fornecedores estejam mais abertos a investir nas especificações pedidas pelo cliente.

63

O nível de confiança depositado nestas redes, permite reduzir os custos de transacção porque a fiabilidade da informação também será mais rigorosa, evitando a confirmação dessa informação e a formação das redes é frequentemente isenta de encargos onerosos, em vez de simplesmente depositar confiança na palavra de dois parceiros individuais (Glazner, 2002).

Tratam-se de expectativas geradas de parte a parte em se pressupõe que nenhuma das partes tentará explorar as vulnerabilidades da outra. Mas porque se trata de comportamentos, existirão razões para que cada entidade possa ter orientações de acção próprias.

Tal como outro tipo de relações em sociedade, a confiança vê-se associada a um tempo prévio de observação e análise mútuas, sem que haja necessariamente uma quantificação de custo/beneficio. Em teoria económica, a confiança é muitas vezes ameaçada por comportamentos oportunistas (a procura do benefício próprio com argúcia), vistos como uma atracção irresistível, e decorrente, p.e., de custos de transacção.

Nas relações de cliente-fornecedor, está implícito o espírito de cooperação na medida em que ambos esperam os respectivos retornos. Mas cooperação não significa confiança, pois aquela pode surgir sem que exista confiança (Rider, 1984). Como se trata de um estado de espírito, não existe uma relação linear entre cooperação e confiança (Mari Sako, 2002). Para este autor, a ausência de oportunismo não é condição suficiente para um grau de confiança total, um fornecedor que detém uma informação tecnológica vital está a actuar oportunistamente de acordo com a definição de confiança sincera, mas não no sentido estritamente contratual, ou seja, subverter o espírito do contracto.

Importa pois conhecer as condições que facilitam e propiciam a criação e manutenção da confiança: um compromisso de longa data, intercâmbio regular de informação, assistência técnica e o bom nome dos clientes. A confiança conduz à colaboração que pode ser uma forma de criar produtos competitivos e sustentar as bases de um processo de sucesso e de uma base de fornecimento salutar. O crescimento da confiança provoca mudanças culturais essenciais para o desenvolvimento das relações OEM e fornecedores.

É notado que, p.e., algumas empresas dos EUA não depositam muita confiança em clientes que peçam uma redução de preço para um produto existente, mas consideram aceitável ganhar um contracto com uma proposta baixa para pedir posteriormente um

aumento de preço (Mari Sako, 2002). Por exemplo, os fornecedores da indústria automóvel americana têm poucas expectativas acerca de um tratamento sério e razoável por parte dos seus clientes no que respeita a fidelização e uma grande maioria acredita que se aparecer um concorrente com qualidade comparável a mais baixo preço, os clientes trocá-los-ão mal se torne tecnicamente possível em vez de tentar igualar ou superar esse novo concorrente (Ram Mudambi, 1998).

Efectivamente quando as relações são baseadas essencialmente em elementos de negociação, o que acaba por ser mais afectada é a qualidade. O fornecedor procura minimizar os seus custos e entregar apenas de acordo com as especificações básicas. O cliente, nestas circunstâncias, pode ter de incorrer em custos adicionais ao ter de efectuar inspecções periódicas ou aleatórias para garantia do material recebido. A qualidade também será afectada se o fornecedor não atender a uma prioridade particular colocada na encomenda (Christopher, 1992).

Quanto mais próxima for a relação entre cliente e fornecedor tanto mais provável que o conhecimento próprio de cada uma das partes resulte em proveito mútuo, podendo assim melhorar o design de produto e produzir componentes com um valor acrescido em engenharia.

Os clientes podem ser levados a ter comportamentos de previsível confiança ou de forma não oportunista se não puderem substituir os seus fornecedores facilmente. É nestas circunstâncias que o aparecimento de fornecedores alternativos acessíveis exige uma atenção cuidada contra o oportunismo e potencia a confiança (Mari Sako, 2002). Com os fornecedores a terem mais responsabilidades, também partilham mais riscos. Quando há deslocamento de fábricas para regiões como a Europa de Leste ou China, os fornecedores são solicitados a deslocarem-se em simultâneo. Em muitos casos, qualquer movimento por parte dos construtores de partilha de riscos com os fornecedores, é entendido apenas como de benefício próprio sem preocupação no que isso afecta o fornecedor. Acreditamos que os construtores que competem globalmente devem ter um grau de confiança e cooperação mais elevado com os seus fornecedores.