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CAPÍTULO 3 AS INICIATIVAS EM PORTUGAL EM PROL DO

3.4. Os Programas de desenvolvimento

Podemos argumentar que uma nova lógica organizacional está a alterar o modelo fordista tradicional: desintegração vertical e integração funcional. O primeiro ponto aparece associado às estratégias de downsizing e de outsourcing prosseguidas pelas empresas. Um dos aspectos mais importantes de uma estratégia organizacional conducente à integração funcional parece ser a introdução do trabalho em equipa. A indústria automóvel mundial segue hoje duas grandes tendências. Uma diz respeito à organização da produção e ao movimento das empresas no sentido da desintegração

vertical, através da externalização de fases do processo produtivo, assente em redes de empresas subcontratadas para esse efeito; outra, manifesta-se no plano da organização do trabalho e aponta para a integração funcional no interior das fábricas.

Estas são algumas das questões de organização da cadeia produtiva que devem ser objecto de reflexão permanente pelos gestores de topo. Por esse facto tem surgido uma preocupação entre entidades governamentais, centros de saber e indústria no sentido de minimizar os impactos de falta de preparação das empresas quando confrontadas com ameaças ou oportunidades que põem em causa a sua competitividade.

O WorTiS - Work Systems, Time and Space in the Automobile Industry,- era um projecto de investigação aprovado e financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia. Teve início no princípio do ano 2001 e foi concluído em 2004. Envolveu a Secção de Sociologia Industrial e a Secção de Filosofia e História das Ciências da Faculdade de Ciências e Tecnologia.

O projecto WorTiS pretendia trazer para Portugal a discussão da cenarização e das principais tendências possíveis e envolver os diferentes actores sociais e agentes económicos e políticos para se conhecerem melhor as implicações das opções tomadas relativamente a investimentos e à concepção de produtos, para os quais será necessário encontrar competências e modelos de produção adequados (Moniz, 2004a).

O trabalho focou-se nos construtores implementados em território nacional. A indústria automóvel nacional englobava, até há poucos anos, cinco fábricas montadoras- Volkswagen (Palmela), Opel (Azambuja), Citroën (Mangualde), Toyota (Ovar) e Mitsubishi (Tramagal) -e, a acrescentar a estas, cerca de cento e sessenta fabricantes de componentes.

Os sociólogos conduziram o trabalho de campo no que se refere à integração funcional, levando em conta o grau de inovação dos sistemas de trabalho e as novas formas de organização do trabalho.

O WorTiS determinaria em que medida experimentamos mudanças significativas nos sistemas de trabalho na indústria automóvel portuguesa e se existe realmente uma nova lógica organizacional no sector que tende a inverter o modelo fordista organizacional tradicional. A questão chave que se nos coloca é a de saber, justamente, se estes fenómenos concorrem para a introdução de mudanças substantivas na forma como o

trabalho surge organizado nestas fábricas61. Não tivemos acesso às conclusões deste trabalho.

Com o patrocínio da AFIA foram concluídos ainda outros projectos de desenvolvimento:

O Projecto BenchmarkIndex liderado pelo DTI – Department of Trade Industry, do Reino Unido, que pretendia, através da utilização da ferramenta benchmarking e da gestão de boas práticas, melhorar a competitividade das PME.

• COMPETINOV - Estudo da Arquitectura Prospecto-Estratégica de Competências para a Inovação do Sector Automóvel, com a participação da TecMinho- tendo como grande objectivo a definição das competências chave a desenvolver nos quadros superiores do cluster automóvel.

• STLOG-P - Estratégias Logísticas para a Indústria Automóvel, com o apoio do MIT – projecto que visa contribuir para o desenvolvimento da indústria automóvel nacional ao apresentar recomendações com potencial impacto ao longo de toda a cadeia de valor deste sector e tendo como um dos objectivos a definição de estratégias de logística.

INOCOP - Inovação e Melhoria da Performance no Cluster Automóvel, tendo como parceiros o Centimfe e o INETI entre outros. O projecto pretende reforçar a cultura de cooperação entre as empresas dos diferentes sectores do cluster, promovendo a criação de comunidades trans-sectoriais, um repositório comum de conhecimentos não competitivos e de desenvolvimento de projectos comuns de I&D.

Destacamos também o PAGIA- Programa Avançado de Gestão para a Indústria Automóvel, preparado pela U. Católica Portuguesa para executivos, com o apoio da INTELI e do CEIIA e que é o contributo da Universidade para dar resposta aos vários desafios de gestão das unidades do sector, estratégia, gestão financeira, desenvolvimento de produto, planeamento e gestão de projectos

O Projecto FIVE – Fomento da Inovação e Valorização Empresarial, visou combater a “falha de sistema” associada à dinamização do empreendedorismo inovador e/ou de base tecnológica em Portugal. Aí é feita uma auditoria especificamente ao sector automóvel onde são diagnosticados os factores mais críticos para o desenvolvimento do sector: produtividade, dimensão, engenharia e desenvolvimento de produto, recursos humanos, e desempenho e qualidade (IAPMEI, 2001).

61 WorTis - POCTI/35275/SOC/2000

O Programa INAUTO -Design studios e gestão da tecnologia na indústria automóvel, foi desenvolvido por uma parceria alargada que incluiu 8 universidades nacionais e internacionais, 7 centros de investigação, mais de 60 empresas fornecedoras de componentes e 3 construtores. Este programa permitiu criar uma plataforma de inovação colectiva para posicionar Portugal como espaço para a concepção e produção de veículos de nicho.

3.4.2. Cenários de desenvolvimento

O estabelecimento de cenários para o desenvolvimento da indústria automóvel e em particular o de componentes em Portugal, passa pelo conhecimento das dinâmicas e capacidades organizacionais das empresas e a sua interacção com os modelos de desenvolvimento socio-económicos.

Actualmente, o desenvolvimento e design do produto é totalmente realizado pelos OEM’s ou pelos seus fornecedores de primeira linha, sendo apenas atribuído ao fornecedor nacional a tarefa de produção de acordo com o que foi planeado. Para além do facto das empresas investirem pouco na área de investigação e desenvolvimento, Portugal apresenta mais uma lacuna, desta vez na ausência de centros de investigação totalmente dedicados ao sector automóvel ou mesmo cursos de nível universitário especializados neste sector.

O futuro do sector automóvel nacional representa um grande desafio para a indústria nacional. Uma análise prospectiva indica um aumento da concorrência global, onde é exigido aos fornecedores um maior envolvimento em actividades de concepção e desenvolvimento do produto - área em que os fornecedores nacionais apresentam grandes lacunas. Perante isto, são sugeridos dois possíveis ‘futuros’ para a indústria automóvel nacional: um recessivo e outro de crescimento (Selada e Felizardo, 2002b).

Quadro 16 – Análise prospectiva do sector automóvel nacional (Selada, Felizardo-2002)

Se não forem tomadas medidas urgentes tendentes a inverter o panorama actual da indústria de fornecedores, perspectivam-se situações preocupantes: despedimentos ou

lay-offs com a perda de milhares de postos de trabalho, destruição de equipas técnicas de grande especificidade e altamente especializadas com perda de know-how acumulado, exclusão das empresas do grupo de fornecedores dos construtores, depreciação da imagem de Portugal como país produtor de componentes e alvo de atracção do IDE, quebra no valor das exportações para além de instabilidade social com os inerentes custos sociais.

Os cortes de produção de automóveis estão a obrigar os fornecedores a mudanças drásticas. Esta situação é o culminar de fortes pressões sobre as empresas em geral e em particular as empresas portuguesas, que é caracterizado por uma redução de encomendas, aumento do custo das matérias primas, da energia e dos custos de financiamento62. Acresce a isto a exigência dos construtores de uma revisão anual dos preços, por vezes abusiva, a que não são alheios os custos de entrada de novos projectos com exigências de participação nos custos desses novos investimentos por parte dos fornecedores.

Pelo facto de Portugal não ter um mercado interno significativo, o sector de componentes está muito dependente do comportamento e do desempenho dos seus clientes que se caracterizam por especificidades muito próprias e exigirem altos níveis de competitividade, empreendedorismo e inovação.

Quadro 17 – Principais clientes da indústria de componentes nacional (AFIA, 2007)

Com a atracção de novos investimentos, as potencialidades de desenvolvimento atingem outra dimensão para os fornecedores de 1ª linha, nomeadamente de elevada intensidade tecnológica com competências em design, e na AutoEuropa, através de novas plataformas ou do aumento da produção, para valores próximos da máxima capacidade instalada (Nunes, 2005).

A verificarem-se estes investimentos, estariam criadas condições para uma ascensão dos componentes nacionais na cadeia de valor, ao estimularem o desenvolvimento de materiais e de produtos (ou até de conceitos de mobilidade), numa lógica de cooperação entre entidades com diversas competências e, consequentemente, a oferta de módulos (destacam-se os moldes), de sistemas ou mesmo de um veículo de nicho.

3.4.3. Estratégias de desenvolvimento -A Internacionalização e o envolvimento externo das empresas

A internacionalização portuguesa está intimamente ligada aos componentes e produtos acabados da indústria automóvel. Isto acontece pelo crescimento das economias de escala na produção e pelas vantagens de localização ou antes, a concentração num mesmo lugar de todas as actividades de produção permite atingir uma melhor coordenação. De acordo com alguns especialistas o crescimento das empresas portuguesas depende do nível de internacionalização (Mário Vale, 2002).

A dimensão reduzida do sector de componentes em Portugal não permite às empresas a expansão de parte importante da sua cadeia de valor para o estrangeiro (embora devamos analisar um grupo de empresas com investimentos importantes além fronteiras). Consequentemente as empresas portuguesas fazem uso de limitados recursos e têm poder negocial reduzido quando tentam negociar com os construtores ou com outros fornecedores multinacionais.

Se até recentemente as indústrias de componentes focavam as suas estratégias de internacionalização no acesso aos mercados exteriores pela exportação, actualmente a produção industrial mundial automóvel está a exigir muito mais dos seus fornecedores. Mudanças de localização ou expansão das actividades para mercados no exterior e desenvolvimento de produto tornam-se as bases para a internacionalização das empresas.

Somente com a presença física das empresas será garantido o acesso a posições de primeiro nível das cadeias de abastecimento. Outro importante factor é a participação nos centros de decisão em que os fornecedores tomam parte no desenvolvimento de produto, relevante para estabelecer uma relação de proximidade com os centros de decisão dos OEM’s.

Contudo, podemos dizer que o investimento directo português no estrangeiro, no que diz respeito à indústria de componentes é ainda incipiente. Se Portugal ainda não atingiu um elevado nível tecnológico, tem sido possível no entanto desenvolver as suas próprias capacidades de inovação através de processos de assimilação, adaptação e transformação de tecnologia importada.

A proximidade geográfica com os construtores e com outros grandes fornecedores permite uma participação mais chegada no desenvolvimento de produto. Esta estratégia de internacionalização é considerada uma estratégia dinâmica (Mário Vale, 2002). Segundo Guerra (1990), as vias alternativas do envolvimento externo das empresas são o IDE, a venda de licenças ou a exportação. Por regra, as vantagens competitivas das empresas resultam das características intrínsecas dos países próprios. Essas vantagens podem ser do tipo: economias de escala, “know-how” tecnológico, dimensão, diferenciação de produto, capacidade organizacional, competências específicas.

Ainda segundo o mesmo autor, os critérios de localização das filiais atendem ás características dos países de destino, preferencialmente criadas em países económica, política e culturalmente conciliáveis próximos dos países de origem. À dimensão das empresas não são alheias as orientações dos governos quanto às fusões, participações, clima de investimentos e concentrações em geral.

Conforme o estádio de desenvolvimento em que se encontra um país, assim a sua posição pode ser de importação ou exportação de IDE.

Uma propensão à exportação torna-se dominante quando a vantagem competitiva da empresa e a vantagem comparativa do país estão em sintonia. Uma propensão à

produção no estrangeiro verificar-se-á se a vantagem competitiva da empresa supera a vantagem comparativa do país. Em qualquer dos casos uma empresa desloca-se para um país que lhe ofereça a tecnologia que precisa ou que constitua um mercado com uma procura de produto elevada (Guerra, 1990).

Quando um construtor decide pela produção de novos modelos mundiais, fabricados em diversas zonas do mundo em simultâneo, a internacionalização implica que os fornecedores acompanhem esses clientes para essas novas localizações, com presença simultânea em diversas zonas geográficas. Trata-se pois de um grande desafio e experiência em termos de produção.

O AICEP, como principal responsável pelo apoio à internacionalização das empresas e pela captação de investimento estrangeiro, tem desenvolvido uma estratégia que assenta em três grandes linhas de actuação:

• aposta na captação de IDE de carácter estruturante nesta área no sentido de uma aprendizagem com parceiros e clientes como as OEM’s;

• estímulo à internacionalização com apoio às iniciativas e estratégias empresariais com o objectivo de novas formas de abordagem a novos mercados;

• um plano promocional integrado de bens e equipamentos para os mercados externos, tentando ultrapassar os tradicionais deficits de imagem e qualidade;

Desta forma poderão ser criadas as condições para que Portugal se possa apresentar como possuindo um sector automóvel dinâmico e inovador de características mais do que nacionais.

3.5.

Síntese do capítulo

No presente capítulo demos uma explicação para a necessidade de desenvolvimento dos fornecedores especialmente sob o ponto de vista organizacional e de inovação. Conferimos que contribuições têm concorrido para esse desenvolvimento organizacional particularmente qual tem sido o papel das instituições de I&D.

Também identificámos e caracterizámos o cluster automóvel nacional e analisámos as suas oportunidades, riscos e fraquezas.

Capítulo 4 . Relações entre fornecedores e clientes

4.1.

A indústria automóvel em permanente mudança – a crescente