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A interação entre grupos: o modelo de Moro e Norman

2 TEORIA ECONÔMICA E DISCRIMINAÇÃO RACIAL

2.4 A interação entre grupos: o modelo de Moro e Norman

Uma das maiores críticas aos modelos de Coate e Loury e de Arrow é a ausência de conflitos de interesse. A diferença nos resultados econômicos dos grupos decorre exclusivamente de um erro de coordenação de mercado, de modo que o segmento populacional no equilíbrio mais favorável não sofre qualquer perda de bem-estar caso o conjunto dos trabalhadores em uma situação inferior possa alcançar um resultado superior. Não há externalidades. A rigor, suas conclusões são indiferentes quanto ao grau de separação existente entre as diferentes clivagens do universo de trabalhadores, sugerindo que as políticas segregacionistas praticadas pelos regimes da África do Sul e dos Estados Unidos, antes de 1965, teriam sido irracionais. Em outras palavras, o fato de os grupos viverem lado a lado, no mesmo espaço territorial, ou em ilhas separadas por milhares de quilômetros não produz qualquer efeito para as conclusões do modelo.

A existência de um conflito latente, alvitrada pelas evidências históricas, é introduzida na literatura por Moro e Norman (2004). Intuitivamente, além do problema da coordenação, a discriminação também pode surgir em decorrência da exploração de um grupo pelo outro, em

que os desfavorecidos assumem o papel de mão de obra barata para uma tarefa que exige baixa qualificação, o que, em condições relativamente genéricas, aumenta a produtividade dos trabalhadores do grupo dominante. Ou seja, a especialização gera discriminação. Nesse sentido, os trabalhadores da parcela dominante da população sempre ganham com a discriminação.

Em linhas gerais, Moro e Norman seguem as ideias colocadas por Coate e Loury, com duas firmas e um contínuo de trabalhadores com massa normalizada para a unidade que devem decidir se investem ou não em qualificação. A tecnologia de produção, denotada por ( , )C S ,

é estritamente quase côncava, exibindo retornos crescentes de escala nas duas tarefas, definidas de modo análogo a Coate e Loury.28 Sé o conjunto de indivíduos alocados na tarefa

simples, sendo ( , )x C Su sua produtividade marginal, ao passo que C representa a quantidade

de trabalhadores qualificados na tarefa complexa,29 com x C Sq( , )denotando sua produtividade marginal.

No equilíbrio de Nash bayesiano do jogo é dada uma lista de decisões de investimento dos trabalhadores, para cada custo c, além de regras de alocação dos funcionários nas tarefas pelas firmas e, também, um quadro de salários, dado pela função w:[0,1]  . No 

equilíbrio, cada indivíduo joga sua melhor resposta, tendo em vista a estratégia dos demais. Seja j,jB W, a respectiva fração dos grupos na população, o total dos fatores é dado por:

    * * , * , ( ) (1 ) ( ) (1 ) ( ) j j q j j u j j B W j j j u j j B W S F s F s C F s               

A regra de alocação ótima da empresa é obtida, resolvendo-se de max A,B( , )S C , obtendo-se

assim os sinais sA e sB em que apenas os trabalhadores com  maior são alocados na tarefa complexa. Nota-se que os valores dos sinais são determinados conjuntamente, pois os valores

28 As condições de Inada também são assumidas. No entanto, a hipótese essencial que gera os efeitos de

externalidade é a quase-concavidade. Caso se assuma apenas que y é côncava nos fatores, os resultados são idênticos a Coate e Loury, havendo discriminação tão somente por uma falha de coordenação.

de xqe xudependem justamente das regras de alocação, dado j. Das condições de primeira

ordem, temos que:

* * * ( ) (1 ) ( ) ( , ) ( ) ( , ) jf sq j j f su j x C Su jf s x C Sq j q           ( ) ( , ) ( , ) , , ( , ) ( ) (1 ) ( ) j q j u j j j q j q j j u j f s x C S j B W x C S f s f s               

De imediato, observamos que a razão dos fatores, C S/ é crescente monotonicamente em j. De fato, se fosse o contrário, ou seja, se a razão dos fatores fosse minorada, teríamos o aumento de xq e o decrescimento dexu, de sorte que ( , )   cairia, assim como  , j aumentando C e reduzindo S, o que implica logo a majoração da razão: uma contradição.

No modelo de Moro e Norman,30 os salários são definidos endogenamente, sendo iguais à produtividade esperada do trabalhador, dado  , em equilíbrio, ou seja:

( , ) ( ) ( , ) ( , ) u j j q j j x C S s w x C S s         

Um resultado fundamental do modelo é o de que, em equilíbrio, o salário na tarefa complexa é uma função crescente da crença da firma sobre a qualidade do grupo. Por exemplo, um aumento de W, como notado acima, eleva a razão entre os fatores, majorando xu e logo o

salário da tarefa simples e, por outro lado, reduz xq e assim o valor pago na tarefa complexa.

No entanto, como sB aumenta, temos que uma fração maior dos trabalhadores do grupo B é

alocada para a tarefa simples, reduzindo logo os estímulos para os indivíduos pertencentes ao grupo B investirem.

No caso dos trabalhadores brancos, o efeito é ambíguo, pois, se as oscilações em xqe xusão idênticas,   w( , )w aumenta com W, podendo inclusive compensar a queda da produtividade na tarefa complexa, levando a um aumento líquido do salário dos brancos. Ademais, na margem, cresce a proporção de trabalhadores do grupo B na tarefa complexa. Do

30 Analogamente a Coate e Loury, Moro e Norma supõem uma estrutura de mercado em que há competição

ponto de vista agregado, os autores mostram que a majoração da especialização da economia tem efeitos positivos, uma vez que, minorando-se alocações erradas de trabalhadores, reduz- se a ineficiência, maximizando-se a produção.

No entanto, a conclusão é a de que as externalidades fazem com que o equilíbrio com desigualdade possa ser superior para o grupo visto com maior chance de ser qualificado, em termos de bem-estar em relação ao equilíbrio homogêneo. Assim, políticas que levem ao equilíbrio simétrico podem ser indesejadas pelo grupo dominante, pois reduzem o seu bem- estar.

Preposição II (Moro e Norman, 2004): De acordo com o modelo de Moro e Norman,

suponha que exista um único equilíbrio simétrico, ou seja, j . Então, em qualquer equilíbrio com discriminação, a utilidade ex-ante (antes de se saber a realização do custo) no grupo com a maior fração de investidores é maior do que no equilíbrio simétrico.