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A internacionalização de fora para dentro

2. Os ciclos de Internacionalização do capitalismo e os fatores chave de sucesso

4.1. A internacionalização de fora para dentro

O processo de internacionalização que ocorre de fora para dentro, de forma geral, torna o País receptor dos fluxos de capital refém das estratégias desenvolvidas pelas grandes corporações. Tornando a sua economia muito volátil e vulnerável às mudanças de projetos das grandes empresas multinacionais. Cabe ressaltar o desestímulo ao investimento em inovação tecnológica oriundo deste tipo de internacionalização, dado que as empresas aportam no país hospedeiro com uma tecnologia embarcada em seus produtos superior àquela que poderia ser desenvolvida no curto prazo pelos centros de pesquisa locais. Cabe destacar ainda que as tecnologias importadas que estão incorporadas nos produtos de forma geral causam dois tipos de problemas. O efeito caixa preta, onde muitas das tecnologias não serão aproveitadas para se realizar spill overs e a inadequação de parte das tecnologias internalizadas, pois são constituídas para desempenharem um eficiente papel em seus países originários e não são obrigatoriamente as mais adequadas para os países hospedeiros. Unger (2012 pg71).

Cabe ao Estado receptor de tais investimentos desenvolver uma política que permita abrir as possíveis caixas pretas e, com isto, absorver as tecnologias embarcadas e dissemina-las e, ao mesmo tempo, negociar e orientar para o desenvolvimento de produtos e serviços mais adequados aos interesses e às condições locais.

Quanto mais assimétrica é a relação tecnológica entre o país hospedeiro e o processo produtivo da empresa entrante mais se torna viável, desde que haja uma intervenção do Estado durante todo o processo, que se possibilite o avanço tecnológico por um processo mimético. Como ressalta Nakano (2012) “Como a nossa indústria e os serviços, sobretudo, estão longe da fronteira tecnológica, há um espaço imenso para aumentar a produtividade do trabalho com simples processo de catch-up. Trata-se apenas de copiar e trazer bens de capital de última geração para que a produtividade do trabalho dê grandes saltos.” Nakano (2012 pg 264-270) Não se trata de fato de inovação tecnológica, mas os países podem se desenvolver desta forma como um primeiro passo.

Este tema, além desta introdução, está dividido em quatro partes: A primeira analiza de forma crítica a literatura teórica concernente a internacionalização de fora para dentro, contrapondo a literatura criada no mainstream com uma nova literatura menos ortodoxa e evidências empírico-históricas. Na segunda seção resumiu-se as evidências deste tipo de internacionalização sobre a economia, os setores e as empresas. Com Destaque a questão da criação e difusão da tecnologia e da distribuição de riqueza. Na terceira seção discuti-se o ambiente político público mais adequado para receber os Investimentos Externos Diretos -IEDs, do ponto de vista da empresa entrante e do país. Finalmente, na quarta parte, avalia-se quais as exigências e salvaguardas que deveriam avalia-ser feitas pelo Estado na entrada de IEDs, principalmente naqueles que têm grande probabilidade de formação de cartéis ou monopolios e nos casos dos serviços públicos, garantindo um nível de qualidade e segurança dos serviços minimamente adequados.

4.1.1. A literatura da internacionalização de fora para dentro

Os investidores do mundo todo, durante as últimas décadas, de maneira mais intensa vêm procurando investimentos com alta rentabilidade e baixo risco independentemente de localização geográfica e do setor a ser investido.

Entender o que acarreta a atratividade de países e setores da economia se torna fundamental tanto para investidores e gestores das empresas, quanto para o governo e para os acadêmicos de economia e gestão.

Sejam investidores especuladores, aqueles que apenas procuram em prazos curto e médio terem um retorno em títulos mobiliários acima do normal, ou investidores estrangeiros diretos, aqueles que procuram expandir sua base de atuação em novos mercados ou na busca de fontes de recursos naturais ou mão de obra qualificada e barata. Todos estão com seus radares ligados atentos a possíveis novos investimentos com ganhos extraordinários, ou seja, ganhos acima da média para classe de risco do investimento.

Para os governos, principalmente para os de países com baixa poupança, tornar alguns de seus setores atrativos ao capital estrangeiro torna-se fundamental para obter fluxos de recursos suficientes para sustentar um crescimento constante da economia e trazer com ele uma potencial série de benefícios. Aqui cabe uma discussão sobre a necessidade de recursos estrangeiros e quais os verdadeiros benefícios da internacionalização de fora para dentro, conforme será discutido durante está análise crítica da literatura. Além disso, uma política de industrialização do país precisa ser desenhada encima da atratividade que cada setor da economia pode gerar e dos benefícios oriundos do desenvolvimento de cada um desses setores a longo prazo.

Os economistas e gestores obviamente se interessam por desenvolver modelos que captem as variáveis chaves de desenvolvimento econômico nesta nova era do capitalismo globalizado e de um sistema cada vez mais liberalizante do ponto de vista do capital e do comércio, e cada vez mais regulamentador e restritivo do ponto de vista da livre movimentação de mão de obra e do uso de tecnologias - vide controle de patentes.

Aparentemente, os economistas e formuladores de politicas de desenvolvimento, têm dado menos atenção à compra de empresas locais por empresas estrangeiras. O que tem tornado o país em alguns setores totalmente dependente de empresas estrangeiras: suas políticas de expansão e investimento e suas cadeias produtivas internacionais. Dado o baixo nível de investimento e desenvolvimento de tecnologia, a venda de empresas nacionais corrobora ainda mais para a perda de tecnologia sob controle nacional. Levando a reduzir a possibilidade de uma maior participação nas cadeias produtivas internacionais com maior índice tecnológico e obviamente com maior valor agregado.

Do ponto de vista do investimento estrangeiro a separação entre capital especulativo, normalmente com foco no curto prazo, e IDEs, por definição investimentos de longo prazo, torna-se importante. Pois, para o desenvolvimento do país apenas este último pode ser considerado como novo recurso colocado na produção de bens e serviços, mesmo assim com ressalvas, dado que nas compras de empresas locais, muitas vezes o investimento na ampliação ou modernização do parque já existente é parte

modesta do total de recursos internalizados na compra e no período pós-aquisição.

O capital especulativo tem uma importância menor para o desenvolvimento, cabendo apenas gerar maior liquidez e cobrir, quando o caso, a necessidade de moeda forte internacional que alguns países têm no curto prazo. Ao mesmo tempo que cumpre o papel de fornecedor de moeda forte ao país, gera muita volatilidade por conta das suas entradas e saídas constantes do país e normalmente cobra um alto custo financeiro por sua hospedagem.

Gerando mais custos econômico-sociais do que benefícios.

Conforme o trabalho de Eid Jr. e Gonçalves Jr. (2011p.23):

Há, todavia, efeitos adversos inerentes à maior participação dos estrangeiros na atividade bursátil de um país; uma maior sensibilidade da volatilidade às movimentações desses recursos é corriqueiramente observada, fenômeno este que pode assumir contornos inquietantes em se tratando de países emergentes.

Os recursos externos especulativos, investidos em bolsa ou não, de forma geral não servem para patrocinar novos investimentos, portanto o desenvolvimento. Eles ficam, enquanto estiverem internalizados no país, migrando entre aplicações em bolsa, títulos do governo de renda fixa e o próprio dólar. Associados ao capital financeiro nacional, de forma direta e indireta, pressionam para que as taxas de juros e os spreads sejam altos dificultando a captação de recursos a valores adequados pelo capital produtivo-empreendedor. Se olharmos o volume de recursos existentes vamos perceber a consistência no volume, que só é alterado em épocas de crise. Portanto, o que ocorre é apenas uma escolha de onde aplica-lo. Não é a toa que de forma geral no curto prazo há uma correlação negativa entre a valorização do dólar e a valorização da bolsa de valores.

Para entendermos as diferenças de abordagens dos tipos de investidores externos podemos descreve-los quanto ao interesse:

investimentos de curto prazo de caráter especulativo ou investimentos de longo prazo de caráter colonizador expansionista/empreendedor/agregador;

de outro lado, podemos analisa-los conforme a origem dos recursos:

empresas ou grandes fundos de investimento; e ainda cabe uma outra

abordagem, quanto a forma de entrada nos novos mercados, que de certa forma esta ligada ao objetivo estratégico das empresas.

4.1.1.1. Quanto ao tipo de interesse:

Como já dito anteriormente, existem os especuladores, que se preocupam em achar oportunidades de ganhos extraordinários, através da compra e venda de títulos mobiliários. Normalmente estes investidores, sejam indivíduos ou grandes fundos, eles não se importam com a finalidade dos recursos captados. Apenas se preocupam com a rentabilidade de curto prazo de seus recursos. Nos últimos anos a dificuldade de controlar o capital financeiro mesmo pelo Estado, que se tornou conivente pela necessidade de moedas conversíveis, alterou a relação entre o Capital e o Estado.

Como diz Coutinho (2014, p.10-11):

[...]a autonomia sem limites do capital financeiro passou a acentuar o caráter dominante dos investimentos financeiros sobre as decisões e omissões dos executivos públicos e privados, e revela a primazia do mercado secundário de títulos na busca incessante por mais valorização.

Destaque-se a dissociação entre o capital produtivo e o financeiro nessa busca desenfreada por ganhos extraordinários que tem levado a uma situação em que os rendimentos captados na esfera financeira através de instrumentos derivativos que permitem uma valorização de ativos em parte fictícios. O crédito fácil levando a um estoque muito acima da produção e da capacidade de honrar compromissos em caso de crise.

Esse fenômeno, criador das bolhas especulativas, é o maior desestabilizador de economias frágeis, e pouco contribui para o ordenamento econômico do país, portanto, para o desenvolvimento.

O capital aplicador de recursos a longo prazo, embora a princípio possa parecer potencialmente mais saudável para o país hospedeiro, na prática nem sempre torna esta premissa verdadeira. Os objetivos estratégicos da empresa podem não estar alinhados ao projeto de desenvolvimento do país.

Portanto, embora em alguns casos tais investimentos possam aumentar as capacitações locais, o efeito pode ser negativo quando os objetivos estiverem inversamente relacionados aos objetivos dos países em que se instalam (COUTINHO,2014 p.11).

Apenas como exemplo, pode-se imaginar uma grande mineradora que tenha potencial para verticalizar sua produção podendo assim agregar valor às suas exportações, algo interessante para o país que melhoraria e aumentaria a sua pauta de exportação, geraria empregos melhores e tecnologias superiores, porém, em sua estratégia a Empresa não se interessa por investir na verticalização, pelo menos não naquele país hospedeiro. Sendo uma empresa grande além de não se alinhar ao projeto em curso no país poderá inviabilizar que outras empresas o façam, por tomar conta do mercado, pela montagem de um quase monopólio e pelo lobby exercido.

Portanto, seja através de fusões ou de crescimento orgânico, as empresas investem em outros países para atender a objetivos específicos que não obrigatoriamente estão alinhados a expectativa que o Estado tem para o desenvolvimento do setor e para a economia como um todo.

Existem, também os investidores estrangeiros, que têm um espírito empreendedor Schumpteriano, e desembarcam em outros países em busca de desbravar novos mercados e oportunidades. Embora estes pareçam ser a exceção na economia contemporânea, principalmente para países em desenvolvimento.

Quanto a origem dos recursos:

As duas principais grandes fontes de recursos têm características bem diferenciadas. As grandes empresas cruzam as suas fronteiras em busca de mercado e/ou fontes de recursos baratos – humanos e matérias primas e/ou tecnologias locais. Portanto, elas aplicam seus recursos financeiros de forma focada para atingir os seus objetivos estratégicos.

A escolha do local depende da existência de condições específicas, tais como, mão de obra qualificada com nível educacional elevado ou engenheiros e pesquisadores, que possam ser empregados a custos significativamente inferiores aos dos países onde se localizam as suas matrizes. O retorno normalmente é maximizado através de investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento em inovações adaptativas, que não apenas permitem competir e dominar o mercado local, como também geram conhecimentos que podem ser úteis à estrutura global do grupo.

Fenômeno mais recente, empresas de pequeno porte, principalmente europeias, que não fazem parte do núcleo duro da zona do euro, França e Alemanha, se sentiram impelidas em crescerem para fora da Europa, redescobrindo as Américas, principalmente do Sul. Os setores bancário, de telefonia e de laticíneos são exemplos evidentes deste fenômeno.

De outro lado, existem os grandes investidores institucionais, fundos, que às vezes se especializam em alguns setores. De qualquer forma se tornam investidores em setores em rápida expansão buscando obter uma certa hegemonia nos mercados emergentes em que atuam. Vide exemplo, do setor educacional abaixo.

4.1.1.2. Quanto a forma de entrada:

As empresas buscam se instalar em outros países pela aquisição de empresas locais, disponíveis para a venda. Neste caso, de forma geral, além de adquirirem uma fatia de mercado e uma marca já consolidada, pode-se eventualmente adquirir tecnologia local. Definimos tecnologia nesse caso em sentido amplo, não apenas aquela inserida no produto ou no seu modo de produzir, mas também na forma de comercialização, administração e inserção no mercado doméstico.

Como exemplo podemos pensar no setor educacional brasileiro. Este setor, no caso brasileiro foi invadido por grandes sistemas de ensino financiados por fundos de investimento especializados. Aproveitando a necessidade latente do mercado educacional, principalmente universitário, que deixou de ser algo estritamente acessível às elites e passou a ser objeto de consumo de uma classe média que foi expandida nas últimas décadas. A forma de atuação destes grupos é exemplar para entendermos a evolução deste tipo de investidores. Estamos falando de investidores com vultosas somas de dinheiro, portanto, que vislumbram um grande mercado de massas. Seu target é se expandir rapidamente e manter um Market share substancial. Neste sentido, correndo o risco de se ter resumido demais o processo, pode-se apontar as seguintes fases: Num primeiro momento, identificação e compra de um grupo local que tem expertise neste mercado.

Isto significa adquirir uma escola que tenha tecnologia de ensino adequada

com o mercado de massas a qual o fundo pretende atingir. No caso universitário brasileiro, por exemplo, significa buscar uma faculdade que tenha tecnologia de ensino para lidar com uma camada da sociedade que tem uma série de fatores limitantes para o estudo: recursos financeiros escassos , tempo restrito para o estudo, repertório sócio-cultural pequeno, suporte familiar a desejar, deficiência escolar anterior, trabalho concomitante com o estudo, entre outros fatores. Normalmente por questões financeiras e de tamanho de mercado esta instituição alvo, no momento da aquisição, embora pudesse ser grande para os padrões brasileiros, esta longe do tamanho previsto pelos fundos de investimento. Portanto, esta faculdade servirá de plataforma para desbravar o mercado. Este segundo momento, o da expansão e consolidação, é realizado de forma rápida. Aqui vale ressaltar a grande expertise destes fundos, o faro por potenciais mercados e sua expansão. Os fundos surfaram na onda do crescimento de uma classe média ávida pelo primeiro diploma universitário familiar e por um programa de governo que optou por expandir o ensino universitário através da rede privada embora financiado através de bolsas públicas. A grande expansão é realizada com a compra de várias faculdades isoladas que passam a fazer parte de um mesmo sistema de ensino e funcionar sobre uma mesma bandeira. Quando o mercado passa a ser dominado por um grupo pequeno de sistemas de ensino é possível se ver a retirada do mercado, de alguns dos fundos já satisfeitos com os resultados obtidos e não dispostos a disputar espaço adicional com outro fundo de investimento. No caso brasileiro estas mega fusões e aquisições entre os grandes sistemas* já vem ocorrendo. A terceira fase, que na prática é concomitante com a segunda, é a de formatar processos administrativos, consolidar a marca e atingir todo o território economicamente viável. Isto levará aos ganhos de escala e escopo pretendidos. Não havendo mais riscos são enxugados parte dos processos acadêmicos procurando atender aos níveis básicos exigidos pelas agências reguladoras e pela sociedade para a sua permanência no mercado e maximizar os retornos exigidos pelos cotistas.

* veja que este processo não é exclusivo do sistema educacional, o setor de telefonia e bancário, de certa forma, aconteceu algo similar.

De outro lado, quando não é possível a entrada pela aquisição de empresas locais, as empresas procuram leiloar a sua vinda entre os países da região em busca de benefícios concedidos por estes. Benefícios fiscais são os mais comuns, porém não os únicos, podendo se estender por vantagens em financiamentos, localização, infraestrutura, entre outros benefícios.

4.1.2. O papel do Estado

Outra função do Estado é a de equilibrar os fluxos de moeda forte entre o país e o exterior. A internacionalização de fora para dentro traz no curto prazo divisas para o país pela compra, mas a longo prazo prazo gera uma sangria constante de divisas através da distribuição de dividendos das subsidiárias para as matrizes. Principalmente em setores de serviços isto se torna ainda mais pernicioso. Pois, as subsidiárias criam fluxos internos em moeda local e remetem os lucros para suas matrizes em moeda forte. Vide o caso do Brasil através da Balança de pagamentos no anexo 2. As remessas de lucros na forma de dividendos, os pagamentos de juros de empréstimos intra empresas e pela transferência de lucros através de precificação de insumos e produtos acabados super ou sub faturados.

Nos países, subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, fica ainda mais realçado o papel importante do Estado por estas questões.

A forma de inserção da economia - internacionalização - de um país afeta os seus graus de dependência de sua economia por participar de uma rede cada vez mais intrincada e complexa e de autonomia do governo, pela perda de graus de liberdade de escolha de seus instrumentos de gestão e planejamento do seu destino econômico e social, ou seja, afeta a sua soberania.

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