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A Mundialização Financeira – do fim dos anos 80 a 2008

2. Os ciclos de Internacionalização do capitalismo e os fatores chave de sucesso

2.4. A Mundialização Financeira – do fim dos anos 80 a 2008

“Globalization was supposed to bring unprecedented benefits to all. Yet, curiously, it has come to vilified both in the developed and developing world”—Joseph E Stiglitz, Making Globalization Work, 2006.

“Quando a internet atingia seu mais alto grau de efervescência em 2000,[...]O vale do Silicio havia se transformado. O entusiasmo de solucionar problemas interessantes criando novas tecnologias já havia esmaecido, e os retornos financeiros imediatos prevaleciam sobre a missão de construir empresas de fato duradouras.”-Estrin (2010, p.29)

Embora este 3o ciclo de internacionalização, nomeado de globalização, sob a égide do neoliberalismo tem tido como um de seus maiores feitos uma liberalização do capital mundial e a financeirização das decisões econômicas, ele não difere dos demais no que tange ao processo descrito nos demais ciclos. A evolução tecnológica em TI e nos meios de transporte e logística, talvez sejam o braço mais visível. Seguida de uma liberalização dos capitais sem precedentes mudou a forma de valorizar os empreendimentos. O curto prazo tomou conta das perspectivas de investimento. Nestas últimas 3 décadas houve um deslocamento qualitativo da coordenação da economia mundial da esfera industrial para a esfera financeira. É necessário partir deste entendimento se desejamos compreender o processo da globalização em seu conjunto. A globalização vista por Chesnais denota uma organização onde se destacam algumas peculiariedades: (1) integração “imperfeita” e “incompleta” dos mercados financeiros fortemente hierarquizados; (2) Carência de controle e supervisão;

e (3) A unidade dos mercados financeiros é assegurada pelos operadores financeiros. Ainda ressalte-se três dimensões da ascensão do setor financeiro: (1) Relativa autonomização da esfera financeira em relação à produção e em relação à capacidade de intervenção das autoridades monetárias; (2) das formas de valorização do capital de natureza especificamente financeira; e (3) são os operadores que definem quais tipos

de transações, quais países e quais agentes econômicos irão participar.

Destes aspectos derivam-se as características principais aparentes em nossa época: (1) os capitais estão mais propensos a se liberarem de seus compromissos rapidamente (foot-loose) gerando maior volatilidade e consequentemente crises em seus países hospedeiros; e (2) os países em vias de desenvolvimento são os mais penalizados por não possuírem mercados financeiros tão integrados e nem empresas capazes de atuar nos mercados de títulos dos mercados centrais de forma significativa Chesnais (1998, p.7-33).

No capítulo sobre O homem de Davos, Priestland (2014, p.204-264), assinala que nestes 30 anos de predomínio do liberalismo econômico milhões de pessoas se tornaram ricas, porém, os riscos aumentaram de uma crise sem precedentes. Priestland (2014) assinala (1) a ruptura de instituições importantes para o aumento potencial do desequilíbrio da economia e (2) a perda da fé nos condutores da economia de então, mais precisamente, nos autodenominados Keynesianos, como os fatores que fortaleceram o movimento atual do capitalismo.

A desregulamentação do setor bancário nos dois principais centros financeiros do mundo (EUA e UK) é um movimento que tem seu início nos anos setenta, valendo destacar a abolição da Lei Glass-Steagal, criada no New Deal. A revogação da lei permitiu aos bancos internacionais usarem a poupança das famílias comuns para fazer investimentos de alto risco nos mercados financeiros internacionais. Ao mesmo tempo destaque-se a função do FMI em pressionar outros países a abrir seus mercados financeiros para os bancos de investimento estrangeiros.

O Keynesianismo tecnocrático, já desacreditado pós anos setenta foi substituído por uma nova linha de pensamento. Os adeptos da Hipótese do Mercado Eficiente - HME. Estes acreditam que os indivíduos agem sábios pró-mercado em difundir como um dogma a HME.

Os sábios pró-mercado fizeram, sem dúvida, uma diferença enorme para o poder do comerciante (capital financeiro principalmente). A influência deles foi considerável – nas colunas de opinião dos jornais, nos governos, nas organizações internacionais e em poderosas instituições privadas, tais como as agências de classificação de crédito, que avaliam as políticas econômicas do governo e podem provocar uma fuga de capitais ao reduzir a nota que lhes atribuem. Também tinham um conjunto de ideias elegantes e com coerência interna, que podiam ser compreendidas por pessoas comuns, pelo menos em um nível básico (PRIESTILAND, 2014 p.210).

A principal objeção, é claro, era que esse novo capitalismo mercantil não podia ser a base para empregos e investimentos de longo prazo.

O capital precisa ficar imobilizado, a fim de financiar a pesquisa e as competências necessárias para as complexas indústrias de alta tecnologia (PRIESTILAND, 2014 p.219).

Se fica claro a dominância da lógica do capital financeiro sobre o industrial neste último ciclo de internacionalização. Isto não significa que esta internacionalização não seguiu o mesmo modelo dos ciclos precedentes. Uma evolução tecnológica profunda em Genética, TI e Telecomunicações associada a uma revolução na logística internacional foram preponderantes para a evolução deste ciclo, além é claro da inovação dos produtos financeiros e da forma de operá-los, os chamados produtos derivativos. Institucionalmente a maioria dos países deram uma guinada a direita. Abriram suas economias através da flexibilização de suas leis permitindo uma maior participação do capital estrangeiro em suas economias. Há uma compressão tempo/espaço na estruturação das sociedades e comunidades planetárias (BAUMAN, 1999)

Denota-se também que a evolução do novo ciclo tem um período mais curto de duração do seu ápice. Se o ápice do primeiro ciclo durou pouco mais 40 anos, o segundo durou pouco mais de 20 anos e este pouco mais de 10 anos. O espraiamento se dá de forma mais intensa e rápida dos países centrais gestores da tecnologia para os países periféricos. Porém mais rapidamente as margens sobre os produtos caem. O valor dos ativos que incham com uma certa rapidez eufórica, perdem também o seu valor

com a mesma rapidez ou até mais rápido, gerando crises constantes. O ano de 2008 representa este fenômeno de crise.

Aparentemente apenas um novo ciclo de evolução científico-tecnológico pode tornar a impulsionar a economia global.

O período mais recente – 1973 a 2014 - foi dividido em quatro etapas para se visualizar a evolução da economia mundial. De 1973 a 1988 tivemos um período de transição política como já descrito acima associado a um esgotamento do ciclo impulsionado pelas tecnologias do pós guerra - golden age. Natural, então, a queda acentuada nas taxas de crescimento do PIB per capita na maioria dos países e regiões em relação a era de ouro. O período de 1989 a 1998 marca a instalação definitiva da ideologia liberal com a globalização. O Mercado transformou-se no principio de organização da economia capitalista, em contraposição ao Estado-nação.” Nakano (2012, p.264-270). No âmbito externo uma redução das barreiras entre países dos fatores de produção – com excessão a mão de obra como assinala Coyle (2003, p.181).

De fato, embora algumas medidas, como investimentos e correntes comerciais ou a extensão da produção estrangeira por companhias multinacionais, mostrem que a globalização da economia mundial já ultrapassou as referências definidas na onda de globalização que ocorreu no fim do século XIX e no começo do XX, o contrário é verdadeiro no caso da imigração. O fluxo de pessoas é o elo perdido na globalização moderna. Pró-globalizadores não vêem problema na ideia de que mercadorias, serviços e capital devem ser livres para ir a qualquer lugar do mundo, mas por alguma razão o mesmo princípio geralmente não se aplica às pessoas.

Bauman sublinha que apenas os acionistas “são o único fator autenticamente livre da determinação espacial” (BAUMAN,1999 p.15).

Destaque, também, deve ser dado a liberalização do fluxo de capitais, mudando a forma de se pensar os investimentos e seus retornos –

encurtamento do tempo de retorno e aumento da volatilidade do capital. O período de 1999 a 2008 pode ser descrito como o da integração das tecnologias da informação: dados, voz e imagens operando de forma conjunta e com uma rapidez nunca antes vista. Avanços na área médica também modificaram não só as expectativas de vida, mas todo o estilo de vida das famílias. Desde a escolha por retardar o nascimento dos filhos até se manter com uma certa qualidade de vida por mais tempo, para quem pode pagar por isso. A pirâmide etária definitivamente esta ficando de pernas pro ar. Estas tecnologias se espraiaram com muita rapidez por todos os países principalmente através de IEDs, e dentre as formas de alcaçarem novos territórios cresceram as fusões e joint ventures.

Após o inicio da crise em 2008 até os dias de hoje, quarta etapa, tem se aprofundado o sentimento de que as economias precisam se reciclar.

Que o modelo mais amplo da economia mundial precisa incorporar de forma mais definitiva e central questões tais como, bens comuns colaborativos, economia verde, crowdfunding e a internet das coisas (RIFKIN, 2015) (MAZZUCATO, 2014).

Como destaca Nakano (2012, p.264-270) “Essa é uma crise centrada nos Estados Unidos e na Europa, portanto, como vimos, é uma crise do próprio centro do sistema global de poder, com todas as suas implicações. O que está em jogo é uma variedade de capitalismo que chegou ao seu limite e a provável ascensão de um novo tipo de capitalismo e globalização.”

Pode-se visualizar nas quatro etapas, descritas acima, e na evolução dos PIBs per capita (tabelas 6 e 7) que mesmo com a evolução tecnológica, destaque para a TI e a biotecnologia, o PIB per capita mundial veio perdendo sua força de crescimento principalmente nos países centrais. O curto período de dez anos – 1999 a 2008 – é uma excessão nos indicadores do PIB per capita a nível mundial. Porém, para os países centrais: Europa, Japão e EUA até mesmo este período foi de declínio. O desenvolvimento dos BRICS e outros países de economia média foram responsáveis por acelerar o PIB per capita durante a década em destaque. Foi através de uma participação maior na economia global desses países, que evoluíram seu desempenho através da apropriação de tecnologias adquiridas pelo desenvolvimento, compra, joint ventures, fusões ou até mesmo pela cópia. O

que há de comum nesses países é uma participação intensa do Estado, ainda que em cada um dos países o Estado tenha uma forma diferente de atuação na Economia. Através de escolhas de empresas campeãs, financiamentos, subsídios, P&D, empresas estatais, participação acionaria em empresas privadas pelo Estado, de forma direta ou indireta, entre outras, a participação do Estado nesse período foi intensa na economia e explica parte do desenvolvimento desses países num momento em que o centro da economia esteve desacelerando. Após anos de uma lógica econômica baseada na ideia de que o mercado pode dar as diretrizes de forma eficiente para a economia, Nakano avalia que desde 2008 “Por razões de sobrevivência do próprio capitalismo, o Estado-nação está retomando a sua função reguladora e controladora dos mercados num processo adaptativo.”

Nakano (2012, p. 264-270).

Tabela 6 :Crescimento (%) do PIB per capita em países selecionados 1973 - 2014.

País 1973-1988 1989-1998 1999-2008 2009-2014

Alemanha 2,28% 1,88% 1,57% 0,89%

   

Tabela 7 : Crescimento (%) do PIB per capita em regiões e blocos econômicos 1973 -2014

Regiões e Países selecionados 1973-1988 1989-1998 1999-2008 2009-2014 East Asia & Pacific (all income levels) 3,14% 2,42% 3,25% 3,24%

East Asia & Pacific (developing only) 5,54% 6,68% 7,79% 7,11%

Euro area 2,26% 2,00% 1,65% -0,43%

Europe & Central Asia (all income levels) 1,96% 1,39% 2,38% -0,09%

Europe & Central Asia (developing only) 1,52% -1,04% 4,63% 1,94%

European Union 2,20% 1,96% 2,01% -0,17%

Heavily indebted poor countries (HIPC) -0,37% -1,09% 1,85% 2,31%

High income 2,31% 1,80% 1,92% 0,38%

High income: nonOECD 0,00% -0,02% 4,40% 1,68%

High income: OECD 2,41% 1,94% 1,74% 0,32%

Latin America & Caribbean (all income

levels) 1,42% 1,31% 1,76% 1,41%

Latin America & Caribbean (developing only) 1,86% 1,06% 1,82% 1,50%

Low & middle income 2,38% 2,13% 4,40% 4,04%

Low income -0,06% -1,32% 1,88% 3,37%

Lower middle income 1,84% 1,21% 4,02% 4,14%

Least developed countries: UN classification -0,05% -0,16% 3,68% 2,56%

Middle East & North Africa (all income levels) 0,73% 2,07% 2,84% 1,16%

Middle East & North Africa (developing only) 0,54% 1,67% 2,70% 0,07%

Middle income 2,46% 2,26% 4,56% 4,19%

North America 2,19% 1,80% 1,59% 0,56%

OECD members 2,25% 1,83% 1,64% 0,25%

South Asia 2,27% 3,03% 4,70% 5,48%

Sub-Saharan Africa (all income levels) -0,48% -0,84% 2,34% 1,21%

Sub-Saharan Africa (developing only) -0,48% -0,88% 2,25% 1,26%

World 1,50% 1,15% 1,85% 0,76%

Fonte: Banco Mundial. Cálculos do Autor.

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