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A mediação familiar

III. Enquadramento Teórico da Problemática de Estágio

3.6. A mediação familiar

Como referi anteriormente, as minhas intervenções também incidiram no projeto de mediação familiar – “Laços”, que tem como grande objetivo implementar e desenvolver o acesso à mediação familiar como forma de resolução de conflitos familiares e procura ativa de soluções adaptadas a cada família. A mediação familiar insere-se no contexto de uma sociedade que valoriza a comunicação, a corresponsabilidade e a autopromoção. Esta nova intervenção chegou à família no momento em que separações e divórcios aumentam substancialmente. Para isso, “ela visa a uma mudança cultural no que diz respeito ao poder dos indivíduos de tomar eles mesmos suas próprias decisões, em vez de solicitar um terceiro que decida por eles, sendo o juiz o último recurso, quando todas as vias de negociação tiverem sido esgotadas” (Ávila, 2004, p. 4).

Compreende-se que, através da intervenção de um terceiro que não decide, ajuda a decidir, pretende-se evitar o conflito extremo, excluindo a retrógrada ideologia de ganhador-perdedor, abrindo-se oportunidade à cooperação entre as partes envolvidas, promovendo a “reorganização futura da família” (Ávila, 2004, p. 5). Deste modo, as características da mediação tornam-na “idealmente apropriada para disputas familiares” (Haynes & Marodin, 1996, p. 11). Neste sentido, a mediação familiar “não é terapia, advocacia ou aconselhamento” (Ávila, 2004, p. 5).

Daniel Sampaio (citado por Farinha & Lavadinho, 1997, p. 13), define a mediação familiar como “um processo dinâmico pelo qual o casal em divórcio pede voluntariamente ajuda confidencial a uma terceira pessoa neutra e qualificada (o mediador)”. Esta conceção não contempla um conjunto de outros problemas que a família atualmente enfrenta, para além das situações de separação e divórcio. Ou seja, os conflitos familiares vão muito para além das questões de separação ou divórcio e das suas possíveis consequências na relação parental, apesar de estes serem predominantes. Associar os conflitos familiares apenas ao âmbito destes problemas parece-me uma visão retrograda pois, no meu entendimento, são múltiplas as questões que podem mobilizar divergências no seio da família e à qual esta técnica de resolução de conflitos (no domínio especifico da mediação familiar) pode expressar grandes potencialidades, complementando, inclusive, outros meios de resolução de litígios. Por exemplo, no âmbito de dissensões intergeracionais ou disputas de heranças, em que são múltiplos os sentimentos envolvidos, a mediação familiar pode revelar-se uma estratégia adequada, evitando quebrar-se laços e favorecendo o diálogo entre as partes envolvidas. A este propósito, saliento o que

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referem Farinha e Lavadinho (1997, p. 36): “o conflito familiar desenvolve-se e manifesta-se em torno de interesses e expetativas relevantes para o direito mas também através de fortes sentimentos e emoções que o direito não objetiva nem valora diretamente.”. Os autores salientam que este campo específico da mediação tem potencialidades adicionais, uma vez que contribui para eliminar possíveis confrontações despoletadas pelo julgamento, evitar o desrespeito das decisões e sentenças imputadas e para estimular a participação e responsabilidade parental, associando, de igual forma, a mediação a conflitos relacionados com divórcio e separação de pais. Haynes e Marodin (1996) afirmam que “ajuda a assegurar aos filhos que manterão ambos os pais e auxilia os pais a moverem-se com vidas independentes” (p. 195). No entanto, não podemos ignorar que a ideia em causa apresentada por estes autores e intimamente relacionada apenas com este tipo de conflitos data 1996 e 1997. Neste sentido, a conceção apresentada por Gomes (2009), parece-me mais adequada, uma vez que esta afirma que “a mediação familiar consiste num meio extrajudicial de resolução de litígios, através do qual, as partes, auxiliadas por um terceiro, potenciam as hipóteses de conciliar as suas posições no sentido de alcançarem uma solução amigável para os seus diferendos” (pp. 125-126).

Segundo Lévesque (1998, citado por Ávila, 2004), são cinco os principais objetivos da mediação familiar, nomeadamente “reduzir os conflitos”; “facilitar a comunicação”; “identificar e clarificar os pontos específicos em questão”; aperfeiçoar a “utilização do sistema legal” e por fim, “alcançar um acordo escrito das questões discutidas” (pp. 44-45). O alcance destes objetivos depende em muito da postura do mediador, que é “quem organiza a discussão das questões a serem resolvidas” (Haynes & Marodin, 1996, p. 11). Para além disso, o mediador deve “acompanhar os pais na busca de um entendimento satisfatório a ambos, visando aos interesses comuns e de seus filhos”; “favorecer uma atitude de cooperação, inibindo a confrontação frequentemente utilizada pelo sistema tradicional”; “encorajar a manutenção de contacto entre pais e filhos” e “equilibrar o poder entre os cônjuges favorecendo a troca de informações” (Ávila, 2004, pp. 26-27).

As vantagens identificadas para este domínio específico da mediação são similares às da mediação noutros âmbitos, como a voluntariedade, celeridade/rapidez, proximidade, flexibilidade e confidencialidade (Gomes, 2012), para além de ser apresentado como um método económico, consensual, criativo e especificamente, estimular a relação paterno-filial (Farinha & Lavadinho, 1997). Assim, “a mediação [familiar] beneficia os clientes e a sociedade. Produz acordos que são integrados e preserva relacionamentos em andamento dos membros da família (…) Como tal, é uma profissão valiosa no contexto social” (Haynes & Marodin, 1996, p. 195).

Neste sentido, integrando-se o projeto “Laços” no âmbito da mediação familiar, é intenção da sua responsável, a dinamização de um CAFAP, definido como um “serviço de apoio especializado às

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famílias com crianças e jovens, vocacionado para a prevenção e reparação de situações de risco psicossocial mediante o desenvolvimento de competências parentais, pessoais e sociais das famílias” (Ministério da Solidariedade e da Segurança Social, 2013). Estes centros têm particular importância no diagnóstico, prevenção e reparação de situações de risco, promovendo a parentalidade positiva, atuando de acordo com a realidade social e especificidades dessa realidade, para capacitar as famílias, fomentando e reforçando aspetos relacionados com as dinâmicas quotidianas. A criança/jovem assume particular importância, na medida em que estes centros têm intenção de promover os seus direitos e proteger e garantir o seu desenvolvimento integral.

Para dar resposta a estes objetivos e pressupostos, o CAFAP assenta em três modalidades de intervenção, sendo a criação de um PEF, uma delas e a primordial do projeto “Laços”. Carateriza-se por ser um espaço neutro, onde a criança encontra o seu pai, mãe ou familiar de referência quando, por razões várias, estes se encontram privados de o fazer em condições seguras e saudáveis. Para além disso, os PEF garantem o direito (e necessidade) que a criança tem de situar-se na sua história, nas suas origens e portanto, de construir e de manter uma relação pessoal com cada um dos seus progenitores e/ou outros familiares, para se desenvolver de uma forma saudável.

Após a fundamentação das principais áreas de intervenção do meu estágio, apresentarei mais adiante as atividades desenvolvidas em cada uma delas. É por acreditar que a mediação, em todas as suas expressões, “constitui um elemento de referência nas sociedades contemporâneas” (Almeida, 2009, p. 121), que tomei decisão de avançar com estas intenções, tornando-me corresponsável de um projeto que pretende elevar a qualidade dos serviços prestados pela instituição que me acolheu e onde tive a feliz oportunidade de construir a minha identidade profissional enquanto mediadora e de me edificar enquanto sujeito.