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A natureza das pesquisas contemporâneas em Linguística Aplicada

CAPÍTULO 3: METODOLOGIA DE PESQUISA

1. A natureza das pesquisas contemporâneas em Linguística Aplicada

transdisciplinar, em uma perspectiva contemporânea para as pesquisas em ciências da linguagem, frente não só às novas demandas sociais, mas também ao novo quadro sócio-histórico-cultural e científico influenciado e delineado ao longo dos últimos anos pelo processo de globalização.

Desse modo, alguns pesquisadores (CELANI, 1998; EVENSEN, 1998; FABRÍCIO, 2006; KLEIMAN, 1998; KUMARAVADIVELU, 2006; MOITA-LOPES, 1996; 2006; ROJO, 1999; 2006b; 2006b; 2007, e 2008d; dentre outros) que procuram atuar no campo aplicado apontam para essa nova perspectiva, além de buscarem, em suas reflexões, a ruptura com os paradigmas hegemônicos do fazer científico, procedimento já incorporado pelas diversas áreas das ciências sociais e humanas (CELANI, 1998 e 2006; MOITA-LOPES, 1996 e 2006; KLEIMAN, 1998; dentre outros).

Esse movimento de reflexão parece conduzir esses pesquisadores a buscarem um sentido aplicado e uma relevância social para as suas investigações e teorizações. Assim, consideram não só os seus interesses

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primários de pesquisa e de construção teórica, como também procuram entender, explicar ou tentar solucionar problemas sociais, criando ou aprimorando as soluções já existentes (EVENSEN, 1998). Para Rojo (2007), devem-se investigar problemas de uso da linguagem socialmente relevantes, para a elaboração de conhecimento útil aos participantes em seus próprios contextos de uso.

A autora reitera ainda a visão de que

sustentar que a LA mais recente – em especial, em sua vertente sociocultural ou sócio-histórica – tem buscado e praticado uma „leveza de pensamento‟ que a torna capaz (...) de tentar enfrentar a precariedade da existência em sociedade ou a „privação sofrida‟ por sujeitos, comunidades, instituições (ROJO, 2006b, p. 254).

A autora considera essa “leveza de pensamento” como um percurso transdisciplinar, perspectiva teórico-metodológica defendida neste texto para a LA na contemporaneidade.

Essa nova postura de fazer ciência aplicada é percebida, por exemplo, nas orientações atuais para o Ensino Médio (OCEM/2006)44 e mesmo nos programas

para esse segmento da Educação Básica (PNLEM/2006/2009 e Ensino Médio Inovador/2009/2010), todos eles sinalizando para possíveis respostas da comunidade científica de pesquisa no campo aplicado às demandas sociais da educação, incorporando reflexões sobre os letramentos plurais e as novas demandas de leitura, a partir da concepção dos gêneros discursivos e das esferas de produção/circulação desses gêneros (em meio digital, dentre outros).

Moita-Lopes (2006, p. 23) afirma que os novos tempos de “grande ebulição sócio-cultural-político-histórica e epistemológica” influenciam as

44 Exemplificando: “O caminho escolhido para essa discussão dá ênfase aos estudos levados a efeito no âmbito da Linguística e da Linguística Aplicada, a fim de discutir as contribuições que tais domínios científicos acarretaram, nos últimos anos, para as práticas de ensino e de aprendizagem da Língua Portuguesa como língua materna” (BRASIL, 2006a, p.18); ou “Trata- se, aqui, de discutir, em linhas gerais, a relação entre os avanços de disciplinas científicas que se incumbem do estudo da língua e da linguagem e seus efeitos para as disciplinas envolvidas pelo ensino médio” (BRASIL, 2006a, p.19).

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instâncias da vida pública e privada do homem contemporâneo, obrigando-o ao questionamento dos ideais de modernidade dos sujeitos sociais e dos modos de produção de conhecimento que os envolvem. Isso, na perspectiva do autor, leva a considerar a necessidade de um diálogo da LA com teorias que levem em conta esses novos modos de produzir conhecimento em ciências sociais, tentando compreender esses novos tempos e buscando “teorizações que dialoguem com o mundo contemporâneo, com práticas sociais que as pessoas vivem” (MOITA-LOPES, 2006a, p. 23).

Em uma postura coincidente com a do autor acima citado, Fabrício (2006) acena para um sujeito social híbrido em função da vida social, cultural, política e econômica na contemporaneidade. Esse mundo contemporâneo, para a autora, apresenta-se num fluxo de continuidades e rupturas, exigindo, consequentemente, o reconhecimento de sua complexidade e desse seu movimento constante, que interferem na forma de produção de conhecimento, principalmente em relação às práticas sociais e discursivas de uso de linguagem, campo de atuação aplicado. Ela considera, ainda, que os estudos contemporâneos em LA devam não só voltar-se para essa linguagem como prática social, investigada em seu contexto de uso, como também apresentar uma característica inter/transdisciplinar.

A autora reitera a importância de se conceber as pesquisas sobre linguagem imbricadas às investigações que envolvam sociedade e cultura, pois em sua opinião,

as práticas discursivas não são neutras, e envolvem escolhas (intencionais ou não) ideológicas e políticas, atravessadas por relações de poder, que provocam diferentes efeitos no mundo social (FABRÍCIO, 2006, p. 48).

Torna-se, portanto, necessário, segundo a autora, procurar crítica e reflexivamente orientar o olhar das investigações aplicadas para as perspectivas de “como a linguagem opera no mundo social e no exame das questões que afetem diretamente a sociedade contemporânea” (FABRÍCIO, 2006, p. 49).

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Estabelecendo uma relação entre o nosso percurso de pesquisa e os pressupostos anteriormente discutidos, percebemos a relevância de considerarmos o nosso objeto de investigação – a leitura no livro didático – a partir dessa ótica contemporânea de criticidade e reflexão, investigando-o inter/transdisciplinarmente em função de sua complexidade e, também, da heterogeneidade do contexto em que esse objeto está inserido – o Ensino Médio. Além disso, nessa perspectiva, consideramos nosso estudo uma possibilidade de exame de uma questão de uso social de linguagem que está diretamente relacionada aos letramentos na sociedade contemporânea, permeada de discursos e posicionamento ideológicos e políticos não isentos ou neutros, que podem criar reflexos nas escolhas de textos/gêneros/esferas e nas práticas de leitura contempladas pelos livros didáticos, objetos de nossas análises.