• Nenhum resultado encontrado

No que diz respeito à política externa, a Aliança Democrática estabeleceu uma rutura com o que considerava serem as tendências terceiro-mundistas e socializantes de Governos anteriores, e manteve a ênfase na opção europeia e atlântica para reposicionar as relações internacionais de Portugal. Como observou o Expresso, durante o debate do Programa do Governo a “viragem na política externa foi

592 Skidmore, Thomas (1988), “A Lenta Via Brasileira para a Democratização: 1974 – 1985”, em Alfred Stepan

(org.), Democratizando o Brasil, Rio de Janeiro, Paz e Terra, pp. 65-66.

593 Silva, Francisco Carlos Teixeira (2003), “Crise da Ditadura Militar e o Processo de Abertura Militar no

Brasil, 1974 – 1985”, em Jorge Ferreira e Lucília Neves Delgado (org.), O Brasil Republicano. O tempo da

ditadura – regime militar e movimentos sociais em fins do século XX. Rio de Janeiro Civilização Editora, IV,

pp. 271-273.

181 considerada uns os aspectos mais salientes da orientação de fundo do VI Governo Constitucional, a par das propostas no domínio económico e financeiro”595.

Três semanas após o Executivo tomar posse, o então Vice-Primeiro-Ministro (VPM) e MENE, Diogo Freitas do Amaral, participou na reunião do Comité de Ministros da Assembleia do Conselho da Europa (28.01.1980), onde deu a conhecer quais seriam as linhas de força da política externa nacional. Sem descuidar das “relações peculiares a desenvolver com os países de expressão portuguesa”, Freitas do Amaral afirmou que a prioridade do seu mandato era:

a afirmação clara da nossa natureza europeia, ocidental e atlântica, intensificando particularmente os esforços e as diligências com vista à nossa plena integração na CEE e participando ativamente nos trabalhos da Aliança Atlântica, sobretudo numa altura em que o agravamento da crise internacional aconselha um reforço da consciência, da determinação e da coesão de todos os países livres e democráticos do Ocidente.

A conflitualidade política e institucional, bem como o embate ideológico em curso em Portugal, esteve presente no discurso de Freitas do Amaral. Numa crítica direta à política externa dos Executivos anteriores, influenciada por Melo Antunes, e à atuação de Ramalho Eanes, o MENE garantiu que doravante “Portugal não agirá de forma ambígua, parecendo europeu na Europa, terceiro-mundista no Terceiro Mundo, entusiasta da Aliança Atlântica em Washington e adepto do não-alinhamento nas capitais do Leste Leste Europeu”. O VI Governo Constitucional pretendia implementar uma nova orientação, assegurando a “direção unitária da política externa e procurando pôr termo às diplomacias paralelas que geravam inevitáveis reflexos perturbadores”596.

As palavras de Freitas do Amaral foram duramente criticadas em Portugal. O então Conselheiro da Revolução, Ernesto Melo Antunes, acusou o VI Governo de adotar um “tipo de linguagem favorável à intensificação da Guerra Fria, e nada propícia à paz e à détente”, favorecendo o “retorno da política externa portuguesa a casos que já fizeram a sua época há algumas dezenas de anos” e que constituíam um sinal para a comunidade internacional de que estariam em curso “mudanças significativas” na diplomacia portuguesa597. A resposta do MENE evidenciou que além de

opções políticas estava em questão a afirmação dos valores e da ideologia que a AD pretendia representar: “Não desejo um regresso à Guerra Fria, mas a détente não pode ser um processo unilateral em que seja sempre o Ocidente a recuar e o campo soviético a avançar” 598. Neste sentido, “o Governo entende que o momento internacional é de crítica à URSS e não de crítica àqueles que condenam a União Soviética”. Se a adoção de uma “política externa pró-europeia e pró-ocidental”, acrescentou Freitas do Amaral, “é motivo de escândalo para alguns em Portugal, então isso vem demonstrar que

595 Expresso, de 26 de janeiro de 1980, p.7.

596 Discurso do MENE Diogo Freitas do Amaral no Conselho da Europa, a 28 de janeiro de 1980. Ver: FCF,

disponível em: http://www.fcuidarofuturo.pt/, consultado a 18.12.2014.

597 O Comércio do Porto, de 29 de janeiro de 1980, citação em Rezola, Maria Inácia (2012), Melo Antunes. Uma

Biografia Política, Lisboa, Âncora, p. 655.

182

ela estava a ser utilizada até aqui ilegitimamente, por alguns, contra os interesses de Portugal e do mundo ocidental e a favor dos interesses soviéticos”599

O projeto que levara à formação e ascensão da Aliança Democrática contestava a orientação política e ideológica prevalecente em Portugal, bem como a narrativa sobre o 25 de Abril. No Conselho da Europa, o Vice-Primeiro-Ministro afirmou que VI Governo tinha a

convicção profunda de que foi a estatização sistemática e obsessiva, de cariz coletivista, que se abateu sobre Portugal em todos os domínios, depois do golpe de 11 de março de 1975, a maior responsável pela crise económica, pela estagnação cultural e pela insatisfação social que caraterizaram o nosso País nos últimos tempos e marcam ainda penosamente o nosso presente600.

Não passou desapercebido para os sectores próximos a Ramalho Eanes que a inflexão na política interna estava a refletir-se na política externa portuguesa. Durante uma reunião do Conselho da Revolução, a 16 de janeiro de 1980, Melo Antunes chamou a atenção para o facto do “Governo, ou parte do mesmo, ter escolhido o campo da política externa para sistematicamente, praticar uma política de ataques ao Presidente” e ao CR601.

Na avaliação da embaixada do Brasil em Lisboa, a “prioridade das prioridades” da Aliança Democrática era acelerar a adesão de Portugal à CEE e reforçar a participação na NATO, evidenciando uma “posição claramente pró-europeia e pró-ocidental”. Neste sentido, o Executivo definiu ser fundamental assegurar junto dos Estados membros uma ajuda de pré-adesão e o compromisso de que a integração portuguesa poderia ocorrer até janeiro de 1983602. Quanto ao alinhamento geoestratégico, a diplomacia brasileira considerava que ao longo de 1980 a “posição portuguesa no conflito Leste – Oeste tendeu a exacerbar-se” e “o Governo não perdeu as ocasiões que teve para afirmar-se inteiramente pró-ocidente e pró-EUA”. Para fundamentar esta opinião, o embaixador Dário de Castro Alves citava no relatório enviado para o Itamaraty a afirmação feita pelo então MENE e VPM, Diogo Freitas do Amaral, à imprensa: “a posição de Portugal não pode ser de equidistância, a nossa posição é ao lado dos Estados Unidos, país amigo e aliado, contra o

599 O Dia, de 30 de janeiro de 1980. Ver: FCF, disponível em http://www.fcuidarofuturo.pt/, consultado a

28.12.2014

599 Diário de Notícias, de 30 de janeiro de 1980, p.9.

600 Discurso do MENE Diogo Freitas do Amaral no Conselho da Europa, a 28 de janeiro de 1980. Ver: FCF,

disponível em: http://www.fcuidarofuturo.pt/, consultado a 18.12.2014.

601 Acta da reunião n.º 2/ 80 de 16 de janeiro de 1980 do Conselho da Revolução, citação em Maria Inácia

Rezola (2012), Melo Antunes. Uma Biografia Política, Lisboa, Âncora, p. 661.

602 A ajuda de pré-adesão pretendida em 1981 correspondeu a cerca de 20 milhões de contos, sendo quase

metade uma oferta da CEE e o restante crédito em condições favoráveis. Era a primeira vez que as Comunidades aceitavam esta lógica. Ver: Telo, António José (2008), História Contemporânea de Portugal, Lisboa, Presença, II, pp. 212-213.

183 expansionismo soviético”603. Esta opção consubstanciou-se na condenação portuguesa à invasão do Afeganistão por Moscovo – dissociando-se do Executivo anterior –, na suspensão das relações comerciais com o Irão, devido ao assalto e ao conseguinte sequestro à embaixada norte-americana em Teerão, na denúncia unilateral do acordo cultural entre Portugal e a URSS e na expulsão de quatro diplomatas soviéticos colocados em Lisboa sob a acusação de espionagem. No âmbito da NATO, o Governo português defendeu o fortalecimento da Aliança, a relevância das suas ilhas atlânticas para a defesa do Ocidente e voltou a integrar o Grupo de Planeamento Nuclear da Organização. Com a adoção destas posições a AD pretendia eliminar quaisquer dúvidas que subsistissem quanto à inserção internacional de Portugal. O país apresentava-se com um ator empenhado na defesa do bloco capitalista, ao qual indubitavelmente pertenceria, e um fiel aliado dos EUA604.

Não obstante a ênfase atribuída pela AD às mudanças na orientação da diplomacia portuguesa, mantiveram-se, na realidade, as principais linhas de força da política externa, redefinidas a partir de 1976 com a normalização democrática. No que dizia respeito à integração europeia, Alice Cunha salienta a determinação do VI Governo em imprimir um novo impulso às negociações em curso com o propósito de as concluir antes do fim do mandato da Comissão da CEE vigente. Por ocasião da apresentação do programa do Executivo no Parlamento, a AD deixara claro que a adesão às Comunidades constituía o objetivo internacional prioritário do Executivo605. Houve continuidade na

importância atribuída à diversificação dos vínculos internacionais portugueses e à posição de Portugal enquanto plataforma privilegiada no contato entre a Europa e outros continentes, e em particular com os países lusófonos. No entanto, a coligação do centro-direita prescindiria ou recorreria com menor frequência à terminologias e temáticas caras aos Governos anteriores, como a atenção conferida ao debate em torno de uma Nova Ordem Económica Internacional, ao relançamento do diálogo Norte-Sul e de soluções alternativas no campo da cooperação com os países subdesenvolvidos, em particular o Terceiro Mundo606.

O posicionamento pró-ocidente adotado pela AD não implicou a exclusão do relacionamento com os países comunistas. Em primeiro lugar, os novos Estados africanos lusófonos, na sua maioria de orientação socializante, constituíam um vetor prioritário da política externa portuguesa e que não deveria ser comprometido por razões ideológicas. Em segundo lugar, a aproximação ao Leste europeu manteve-se por razões pragmáticas, sendo salientado que Portugal almejava estreitar os contatos com os países que pretendiam maior autonomia em relação ao “imperialismo de Moscovo”. Como

603 Telegrama enviado pela embaixada do Brasil em Lisboa para o MRE sobre a conjuntura política e económica

portuguesa, de 7 de janeiro de 1981, pp. 1 - 17. AHMRE – Telegramas de 1981, Rolo 912. Confidencial.

604 Ibidem.

605 Cunha, Alice Monteiro Pita Brito da (2012), “O Alargamento Ibérico da Comunidade Económica Europeia: A

Experiência Portuguesa”, Tese Doutoramento em História Moderna Contemporânea, Lisboa, FCSH, Universidade Nova de Lisboa, pp. 94 e 113.

184

esclareceu o MENE Diogo Freitas do Amaral, o Governo português condenava “a intervenção ilegítima e perigosa da URSS no Afeganistão”, mas em relação aos países socialistas que “ensaiam passos no sentido de se autonomizarem da tutela soviética” Portugal adotava uma posição de “encorajamento”. Na perspetiva da embaixador Dário de Castro Alves, a política externa do VI Governo, caracterizada pelo “alinhamento cada vez mais nítido com as forças ocidentais e mais precisamente com os Estados Unidos”, deveria ser compreendida no contexto do processo de “radicalização” política interna empreendido pela AD tendo em vista a campanha eleitoral607.

De acordo com a embaixada do Brasil em Lisboa, com a vitória do centro-direita, nas eleições intercalares de dezembro de 1979, teve início um “quadro de bipolarização ideológica e partidária” que marcou a política externa nos anos seguintes. Enquanto o VI Governo enfatizava o relacionamento com os EUA, a diplomacia paralela do Presidente Ramalho Eanes foi mais eclética nos contactos estabelecidos, contrapondo o alinhamento da AD com o bloco ocidental. Ao longo de 1979, o Chefe de Estado português deslocou-se à Guiné-Bissau, à Bulgária, à Roménia, à Hungria e à Jugoslávia. Segundo a diplomacia brasileira, os pronunciamentos feitos por Eanes durante essas viagens sugeriam que poderia haver maior cooperação bilateral entre Portugal e os países do Leste, bem como trilateral evolvendo a África lusófona. Estas visitas presidenciais foram “muito criticadas pelos círculos conservadores portugueses”, sobretudo por Francisco Sá Carneiro e Diogo Freitas do Amaral, que as interpretavam como uma prova de que o Chefe de Estado excedia as suas competências e executava uma agenda política concorrente com a do Executivo.

A apreciação de que Ramalho Eanes assumia crescente protagonismo político era corroborada pela embaixada do Brasil em Lisboa, para a qual o Presidente da República detinha o “comando total da política externa” e desenvolvia uma “estratégia mista na reaproximação com os dirigentes das ex- colónias. Ora utiliza os canais diplomáticos, ora emissários, como Melo Antunes”. Essas “discutíveis incursões de diplomacia paralela” seriam justificadas com o propósito de “tentar superar o bloqueio da máquina burocrática das chancelarias, através do relacionamento pessoal de militares progressistas do 25 de Abril com líderes dos movimentos de libertação” africanos. O comportamento do Chefe de Estado era alvo de “total repúdio da Aliança Democrática”, que o interpretava como parte da campanha para a sua recondução ao cargo608. Uma vez que Ramalho Eanes defrontaria o candidato da

AD, o general António Soares Carneiro, os meses que antecediam à eleição presidencial de dezembro de 1980 estariam sendo utilizados para reforçar a sua posição e comprometer a autoridade do Executivo.

A disputa pelo controlo da política externa também se fazia através de iniciativas simbólicas. Em março de 1980, Francisco Sá Carneiro reuniu-se com todos os chefes de missão dos países

607 Telegrama enviado pela embaixada do Brasil em Lisboa para o MRE sobre a entrevista concedida por Freitas

do Amaral, de 25 de agosto de 1980, pp. 1 - 5. AHMRE 600. (F - 42). Confidencial.

608 Telegrama enviado pela embaixada do Brasil em Lisboa para o MRE sobre a conjuntura política portuguesa,

185 africanos lusófonos residentes em Lisboa, num encontro marcado por grande publicidade. Para o embaixador Dário de Castro Alves, estas diligências demonstravam a “preocupação de chamar ao Executivo a condução das relações entre Portugal e suas ex-colónias”. O próprio Primeiro-Ministro terá manifestado à Missão brasileira em Lisboa que “tais relações se desenvolviam de forma descoordenada, através da Presidência da República, do Conselho da Revolução e, em alguns casos, dos partidos políticos”, tendo dado origem a mal-entendidos entre os Estados e a conflitos institucionais em Portugal. Justamente com o propósito de evitar a repetição destas situações e de conferir maior coerência à política externa, é que estava em curso a reestruturação do MNE e da Direcção-Geral da Cooperação, com caráter prioritário, devido à sua importância na relação entre Portugal e os países africanos lusófonos609.

A 26 junho de 1980, o Presidente norte-americano James Carter fez escala em Lisboa no regresso de um périplo pela Europa. Nos pronunciamentos à imprensa, Carter manifestou “o reconhecimento norte-americano ao apoio concedido por Portugal aos EUA nas crises do Irão e do Afeganistão”. Por esta altura a embaixada do Brasil em Washington informou o Itamaraty que fontes do Departamento de Estado e da Missão portuguesa naquela capital comentavam “com insistência que Portugal tem sido o mais solidário aliado-norte-americano em ambas as crises”. A diplomacia brasileira considerava que “à cooperação mais estreita com os EUA não estão alheios motivos ligados à política interna portuguesa”610. Assim, o voluntarismo com que o VI Governo Constitucional se

posicionou ao lado da Administração Carter era em parte explicado pelo modo como a vitória eleitoral da AD fora interpretada em Washington611. Segundo a embaixada do Brasil, “no Departamento de

Estado o resultado das eleições foi recebido com indisfarçável surpresa”, prevalecendo, num primeiro momento, “uma avaliação algo restrita à vitória das forças de centro-direita”. Isto é, “para a diplomacia norte-americana os grupos que se encontram à direita de Mário Soares em Portugal são considerados comprometidos com a situação anterior à Revolução”. Esta perspetiva terá sido alterada

609 Telegrama enviado pela embaixada do Brasil em Lisboa para o MRE sobre as relações entre Portugal e os

Países Africanos Lusófonos, de 21 de março de 1980, pp. 1 - 2. AHMRE – 900 (F42) NN.

610 Telegrama enviado pela embaixada do Brasil em Washington para o MRE sobre a visita de Carter a Lisboa,

de 28 de junho de 1980, pp. 1 - 2 AHMRE – Telegramas de 1980, Rolo 819. Confidencial.

611 Nas suas memórias, Freitas do Amaral corrobora a interpretação brasileira sobre as implicações da visita de

Carter a Lisboa na política interna portuguesa. O antigo MENE afirma que o convite ao Chefe de Estado norte-americano, em ano de eleições presidenciais em Portugal, bem como o programa da visita, foi “todo pensado para valorizar a posição do General Ramalho Eanes como Presidente da República, ao mesmo tempo que desvalorizava o mais possível o papel do Primeiro-Ministro, Sá Carneiro”. Face a esta constatação, Freitas do Amaral manifestou ao embaixador dos EUA em Lisboa, Richard Bloomfield, que o programa preliminar “parecia norteado por uma intenção propositada de tomar posição a favor da reeleição do General Ramalho Eanes” e exigiu a sua alteração, de modo que as questões protocolares ficassem reservadas aos Presidentes e às políticas no encontro entre Carter e Sá Carneiro. Ver: Amaral, Diogo Freitas do (2008), A

186

ao longo de 1980, quando “aumentou a credibilidade do Governo de Sá Carneiro” junto a Administração Carter. O bom relacionamento com os EUA era fundamental para o êxito da estratégia da Aliança Democrática de posicionar inequivocamente Portugal na esfera política e económica do Ocidente capitalista. Da plena integração neste espaço adviriam os recursos e os apoios necessário para empreender as reformas pretendidas pelo centro-direita, o que deveria concorrer para o afirmar como a única força política capaz de estabilizar e desenvolver Portugal. Ademais, o VI Governo teria maiores probabilidades de êxito nas negociações em curso para a renovação do Acordo das Lajes e em receber apoio às pretensões de ampliar o envolvimento português na NATO se fosse reconhecido pelos EUA como um interlocutor fiável612.

Foram com estas expetativas que o MENE e VPM Diogo Freitas do Amaral se deslocou a Washington em outubro de 1980. Um integrante da comitiva ministerial comentou com um diplomata brasileiro naquela capital que “embora o Departamento de Estado não consiga esconder a sua preferência pelos socialistas em Portugal” era “inegável que os ganhos obtidos pela Aliança Democrática colocam a equipe negociadora portuguesa em uma posição mais favorável”. De acordo com a mesma fonte, “existiria o sentimento, em Lisboa, de que o Governo português já deu várias demonstrações concretas de apoio aos EUA nas últimas crises internacionais e que, agora, competiria aos norte-americanos demonstrar algum tipo de compreensão diante dos problemas portugueses, em especial na área econômica, financeira e energética”. A realização da visita nas últimas semanas da campanha eleitoral para a Presidência norte-americana reduzia, à partida, a probabilidade da adoção de qualquer decisão relevante. O encontro entre o Secretário de Estado Edmund Muskie e o MENE Freitas do Amaral revelou-se inconclusivo, tendo sido necessário aguardar pela entrada em funções da nova Administração norte-americana para dar início a negociações concretas613.

A 9 de janeiro de 1981 tomou posse VII Governo Constitucional e o segundo liderado pela AD. O equilíbrio político interno alterara-se significativamente com o desaparecimento de Francisco Sá Carneiro e de Adelino Amaro da Costa e com a reeleição de Ramalho Eanes, logo à primeira volta. O Primeiro-Ministro Francisco Pinto Balsemão adotou uma ação mais conciliatória, procurando alcançar o entendimento com as demais forças políticas e instituições de modo a viabilizar as reformas pretendidas. No plano externo, o MENE, André Gonçalves Pereira, utilizou uma linguagem mais cautelosa, no momento em que a Guerra Fria entrava numa nova fase marcada pelas crescentes

612 Telegrama enviado pela embaixada do Brasil em Washington para o MRE sobre a repercussão da vitória da

AD nos EUA, de 9 de outubro de 1980, pp. 1- 2. AHMRE – Telegramas de 1980, Rolo 820. Confidencial.

613 Além da renovação do acordo das Lajes e do diferendo quanto aos termos em que decorreriam as

negociações, realizadas em um contexto global – como pretendia Portugal – ou em grupos separados – como propunha os EUA –, Freitas do Amaral pleiteou garantias norte-americanas de abastecimento de petróleo, cujo fornecimento pelo Iraque – cerca de 40% das importações portugueses – vinha sofrendo interrupções. Ver: Telegrama enviado pela embaixada do Brasil em Washington para o MRE sobre a visita do MENE português aos EUA, de 15 de outubro de 1980, pp. 1 - 3. AHMRE – Telegramas de 1980, Rolo 820. Confidencial.

187 dificuldades no diálogo entre Washington e Moscovo, pelo declínio da influência das duas superpotências e pela emergência de outros polos de poder614. Esta inflexão é percetível nas palavras