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A participação dos sujeitos no processo de elaboração do PME

4 CONCEPÇÕES DA GESTÃO ESCOLAR E PROCESSOS PARTICIPATIVOS

5 O PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO NA GESTÃO E ORGANIZAÇÃO DE ESCOLAS PÚBLICAS DE RECIFE E DE OLINDA

5.1 A participação dos sujeitos no processo de elaboração do PME

De acordo com Pedro Demo (1996), a participação é um princípio para ser conquistado e não uma doação ou dádiva, como historicamente vem ocorrendo no país em face da nossa cultura cívica. Isso reflete na cultura da não participação nas formulações das políticas públicas. No entanto, desde a Constituição de 1988 houve conquistas em relação à abertura da arena pública das decisões, incluindo, nesse contexto, as decisões em relação às políticas educacionais e às conquistas sociais.

Nesse sentido, se faz necessário analisar a participação dos sujeitos no processo de elaboração do Plano Municipal de Educação para compreendermos como ocorreu a formulação desse instrumento de planejamento nos municípios de Recife e de Olinda.

O PME de Recife foi construído por meio da participação democrática de técnicos da SEMED que ficaram responsáveis para discutir e planejar a sua elaboração, bem como organizar a COMUDE. A equipe técnica foi definida pelo Poder Executivo do município. De acordo com o documento final do PME (2015, p. 13-14):

As reuniões, debates, proposições, planejamento e elaboração do Plano Municipal de Educação tiveram embasamento técnico no diagnóstico dos dados do município de Recife, produzido com o objetivo de nortear a construção do Plano Municipal de Educação (PME), de buscar e subsidiar a elevação global do nível de escolaridade da população municipal, de criar estratégias para a melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis e reduzir as desigualdades sociais e de aprendizagem no acesso e no sucesso escolar, em alinhamento com o Plano Nacional de Educação.

Segundo dados do documento final do PME, a COMUDE foi realizada pela SEMED em parceria com o Conselho Municipal da Educação (CME) e contou com a participação de aproximadamente 600 pessoas, as quais discutiram e aprovaram o documento base do Plano Municipal de Educação. De acordo com o documento referência do PME, foram realizadas 32 reuniões de planejamento e uma audiência pública, contando com a participação da sociedade civil organizada, a qual também contribuiu com o processo de elaboração enviando as propostas. Desse modo, “cada segmento da sociedade realizou plenárias para eleger os delegados aptos a participarem da conferência. Nas plenárias anteriores à Comude, os grupos

também elaboraram suas proposições para as metas do PME” (PME de Recife, 2015, p. 15- 16).

Apesar da elaboração do PME de Recife ter se caracterizado de forma democrática e participativa, envolvendo as lideranças da SEMED, do Fórum Municipal de Educação (FME), profissionais da educação pública e privada e dos diversos movimentos e entidades sociais, a sua aprovação ocorreu através de muitos conflitos, embates, discussões, entraves e discordâncias. Isto porque professores e estudantes foram impedidos de acompanhar a votação do PME na Câmara dos Vereadores. O líder do PT e de outros partidos de esquerda solicitaram a leitura individual das propostas, mas o presidente da Comissão de Educação, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), não atendeu ao pedido fazendo a votação em bloco das emendas (PME de Recife, 2015).

A partir dos resultados da pesquisa, chegamos a conclusão de que uns gestores participaram ativamente do processo elaboração do PME, outros não participaram, como sinalizam as entrevistas:

Participei efetivamente, fui até a COMUDE, participei inclusive da mesa de defesa, foi bem sério mesmo e não concordo com o texto final porque a secretaria, inclusive, não soube conduzir e no final o que foi aprovado, necessariamente, não condiz com o que foi discutido lá, ainda teve alteração (RosaG1).

O discurso da gestora nos faz perceber que houve uma participação dos sujeitos na COMUDE, o que é relevante para a formulação da política educacional do município. A 10ª Conferência Municipal de Educação aconteceu entre os dias 27 a 29 de maio e 4 de junho de 2015, tendo como título “Recife: Planejando a Próxima Década” caracterizando-se como “estratégia política, que conforme seu processo de formulação e de decisão, pode representar características tanto de mobilização quanto de desmobilização dos atores envolvidos” (JÚNIOR, et. al., 2016, p, 7).

A COMUDE e as outras conferências de educação que aconteceram na época de elaboração do plano ganharam destaques nos debates da política educacional no Brasil. As conferências de educação são canais de participação que possibilitam um envolvimento significativo dos sujeitos nas tomadas de decisões das políticas educacionais, evidenciando a consolidação e o aprofundamento da democracia (CHAGAS, 2010). Desse modo, as conferências de educação podem se constituir como espaço de discussão e redefinição da educação nacional, estadual e municipal possibilitando um planejamento voltado para cada realidade. No âmbito municipal, as conferências de educação serviram de base para a construção do plano local, configurando-se como o norteamento para a formulação da política educacional, estabelecendo prioridades para a educação do município.

Porém, o texto aprovado, como aponta a gestora, não corresponde ao que foi discutido inicialmente com os diversos segmentos da educação e a sociedade civil. Isso porque o prefeito enviou ao Presidente da Câmara de Vereadores do Recife o ofício nº 28 GP/SEGOV de 15 de junho de 2015 solicitando, em caráter de urgência, a aprovação do PME afirmando que foi elaborado segundo os princípios da democracia, da participação e do diálogo, o que não é verdade, pois como enfatiza Júnior (et. al. 2016, p. 7) “o FME não foi consultado acerca do PME submetido a votação no dia 22 de junho e publicizado no Diário Oficial do Município no dia seguinte”.

Dia 22/6 na Câmara Municipal do Recife, os/as vereadores/as votaram no Plano Municipal de Educação (PME) da Cidade para os próximos 10 anos. A Prefeitura do Recife não quis aprovar o plano desenvolvido pelos/as professores/as na Conferência Municipal de Educação (Comude), que durou em torno de 8 dias de trabalho junto à outros setores ligados à educação. Encaminharam para votação um plano desenvolvido pelo prefeito Geraldo Julio, que não contempla os setores ligados à educação. Antes do início da votação a sociedade foi impedida de entrar no plenário, depois de uma grande pressão invadiram o plenário e garantiram a presença. Após isso, os vereadores se retiraram do plenário e foram para outra sala votar sem a presença da população (JORNAL DO RECIFE, 2015).

Nessa dimensão, percebemos que apesar do documento final do PME não atender a todas as demandas que o grupo apresentou, os depoimentos sinalizaram que houve uma participação ativa dos sujeitos no processo de elaboração, ou seja, eles se engajaram para discutir as ações e as propostas para o PME. No entanto, mediante os depoimentos ficou evidente que o conteúdo aprovado nas plenárias de discussão não foi levado em consideração na aprovação do documento final. Desse modo, se o próprio Poder Executivo desviou as intenções do PME, tanto o plano como sua efetivação na escola ficaram comprometidos.

Outra questão a pontuar é o depoimento apresentado por AmandaC1, quando sinalizou em seu discurso que: “eu me lembro que nós sentamos, teve até num dia de sábado que nós ganhamos um valor extra que eles ofereceram. Eles trouxeram os textos pra gente discutir em grupos”. O depoimento da coordenadora de Recife nos permite compreender que alguns gestores foram remunerados para desenvolverem estudos e discussões sobre o PME, o que descaracteriza o processo democrático e a boa vontade em participar das tomadas de decisões da educação.

Outro aspecto a ser destacado nesse contexto é a forma como foi desenvolvida a discussão do grupo, a partir do documento referência para a elaboração do PME de Recife. Dessa forma, nos questionamos: Será que os apontamentos foram incluídos no documento final? Como foram as discussões dos grupos? Como os grupos sinalizaram os resultados das reflexões? Nesse aspecto, percebemos, diante dessa situação, que pode ter se vivenciado uma falsa democracia e participação como denomina Lück (2013).

O processo de elaboração do PME de Olinda se situa em um contexto diferente da realidade de Recife. Cabe destacar que o PME de Olinda foi construído em um governo que tinha o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e o PT a frente da gestão. Atualmente essa realidade se distancia, uma vez que a nova gestão tem em seu projeto os princípios do Partido Socialista Brasileiro (PSB) e do PSDB, os quais trazem em seus programas traços neoliberais, justificando, possivelmente, a não concretização das políticas planejadas no PME.

Em relação à participação dos gestores na elaboração do PME de Olinda, eles destacaram:

Escolheram os delegados e eu também participei do processo de discussão. Eu achei o plano de Olinda bem importante porque cada ponto se pautava numa fala, depois tirava, botava outra, então foi construído, não foi uma opinião minha nem sua, foi a opinião de um grupo [...] (ÁgataG3).

A gente teve a escolha dos delegados e aqui na escola selecionaram duas pessoas e lá eu atuei muito na discussão do ensino fundamental dos anos iniciais e nessas discussões a gente pontuou tanto a questão do trabalho do profissional da educação, da qualidade do trabalho do profissional, das condições de trabalho, principalmente. E uma coisa que foi fundamental que eu participei muito mais que foi a discussão da valorização do magistério que foi crucial [...] (VicenteC4).

Os depoimentos indicaram que o processo de participação de elaboração do PME de Olinda foi importante para a concretização do PME. Os profissionais participantes sinalizaram que esse momento se deu de forma democrática, ouvindo todos os integrantes e discutindo as ideias e as propostas para o plano. A partir da análise do conteúdo é possível perceber que temas relevantes para a melhoria da educação foram discutidos com os envolvidos na elaboração do documento, como a valorização dos profissionais da educação, a qualidade do trabalho, entre outros.

Esse momento de discussão, de ouvir as propostas e as sugestões de cada participante, de construir o texto e de elaborar o plano da educação é um momento de aprendizagem e conhecimento, pois os sujeitos vivenciam os ideais de um planejamento em uma perspectiva democrática, no qual orienta para o entrosamento dos sujeitos nas instituições (KARL MANHEIM, 1982).

A análise das percepções dos entrevistados sobre o processo de elaboração dos planos mostra diferenças entre o que ocorreu em Olinda e Recife. Na segunda cidade, as indicações parecem evidenciar um processo de maior participação o que também pode ser reforçado com os dados que aparecem na introdução do seu PME: “[...] com vigência decenal (2015 – 2025) foi elaborado o Plano Municipal de Educação de Recife, demonstrando, as diretrizes para execução de uma grande mudança na educação do município, para os próximos dez anos,

sobretudo pela forma democrática e participativa inerente ao processo de elaboração” (PME de Recife, 2015, p. 20).

O tipo de participação apresentada pelos gestores escolares pode ser concebido na perspectiva do planejamento participativo, como conceitua Demo (1996). O autor destaca que um dos componentes do planejamento participativo é a formulação de estratégias para solucionar os problemas da comunidade. Essa ação possibilita o envolvimento dos diversos segmentos na constituição da política educacional proporcionando a consciência crítica dos cidadãos e promovendo uma organicidade da educação, aspectos necessários do planejamento participativo (DEMO, 1996).

Outra gestora de Olinda destacou que:

Existia uma reunião mensal, mas eu acho que precisa ainda as escolas tomarem conhecimento sobre isso, porque a gente só escuta falar muito em plano municipal de educação ou conselho municipal de educação numa reunião de abertura no início do ano que apresenta lá o presidente do conselho municipal pra dá uma fala ou nas conferências É quando a gente escuta falar em plano municipal de educação e não deveria ser assim porque dentro do plano municipal de educação tem toda uma estrutura, tem os conselhos (deve ter) conselho de merenda, tem toda uma fundamentação. Eu acho, na minha concepção deveria ser bem mais trabalhado e ampliado pras escolas que a divulgação não é ampla, não (EdnaV3).

Os conteúdos apresentados sinalizam que o PME das duas cidades pouco estão servindo de guia para o dia a dia da política educacional municipal. O PME parece não ser o condutor norteador para a elaboração das políticas educacionais, bem como está se constituindo, apenas, como uma burocracia necessária para os municípios pesquisados.

Por meio das tensões e dos conflitos existentes no processo de construção das políticas educacionais, percebe-se que a implementação dos objetivos planejados torna-se um desafio, uma vez que os diferentes interesses estão direcionando a condução das políticas locais e nacionais, desconsiderando a perspectiva democrática que foram construídos os PME de Recife e de Olinda.

5.2 Ações da Secretaria Municipal de Educação (SEMED) na discussão e implementação