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CAPÍTULO 3 – CAMINHOS PERCORRIDOS

3. Metodologia de Pesquisa

3.1. A Pesquisa-Ação

Trabalhamos com a metodologia da Pesquisa-ação por acreditarmos ser a mais coerente com a proposta educativa que realizamos, justamente por ter sido desenvolvido por professoras e alunos de uma escola, objetivando identificar, quantificar, analisar e, a partir disso, incentivar um processo de reflexão e possível transformação de algumas situações também da própria escola.

Para compreendermos melhor a Pesquisa-Ação (PA), apresentamos primeiramente o que alguns autores estudaram sobre esta, no sentido de investigar seu surgimento, diferentes enfoques, sua relação com as questões educacionais, quais são suas etapas, até chegarmos ao enfoque de PA adotado no presente trabalho. Salientamos que não vamos entrar diretamente na questão sobre a diferença entre a denominação pesquisa-ação e investigação-ação, por não ser o foco desta pesquisa.

Segundo Jordão (2005), Kurt Lewin é quem iniciou os trabalhos com Pesquisa-ação na década de 40, focados em problemas sociais, mas, já enfatizando a questão de solucionar problemas nos ambientes nos quais eles ocorrem. Na década de 1950, Stephen Corey centra seus trabalhos na formação de professores, preocupando-se em gerar conhecimentos e não mais focado na mudança social como Lewin fazia. Jordão (2005) salienta que a Pesquisa-ação praticamente desaparece na década de 1960 e ressurge na década de 1970, mas com diferentes vertentes. Stenhouse (vertente inglesa) é o primeiro autor destacado por Jordão, que usava a Pesquisa-ação como uma forma de melhorar o currículo, incentivando o uso desta entre professores e pesquisadores. Outra vertente (australiana) que enfoca o currículo é representada por Carr e Kemmis. Estes, além de enfatizarem as questões curriculares, propõem a utilização da Pesquisa-ação para o desenvolvimento de políticas educacionais.

A Pesquisa-ação na concepção de Carr e Kemmis (1988) tem como método a espiral auto-reflexiva, constituída por ciclos sucessivos de planejamento, ação, observação e reflexão. Eles defendem uma Pesquisa-ação emancipatória, baseada nos ideais de uma ciência educativa crítica. Desta forma, um trabalho de PA nesta concepção propõe uma investigação auto-reflexiva que os professores desenvolvem com o intuito de melhorar suas práticas e as situações sociais que as envolvem.

Um outro enfoque de Pesquisa-ação destacado por Jordão (2005) é o de Zeichner. Este se baseou nas demais correntes e, principalmente, na concepção de Pesquisa-ação de Carr e Kemmis, porém com algumas divergências, apresentando também no seu modelo de Pesquisa-ação quatro fases: planejar, agir, observar e refletir. Preocupa-se também com a

formação dos professores, bem como com a dos alunos, mas amplia essa questão incorporando as questões sociais. O seguinte trecho retrata um pouco como Zeichner entende a abrangência da Pesquisa-ação em nível educacional:

Ele considera que o principal desafio dos formadores de professores é ajudar os alunos em formação a desenvolver a disposição e as habilidades para enxergar as conexões entre a sala de aula e os contextos sociais e políticos nos quais ela se insere (JORDÃO, 2005, p. 67).

Jordão (2005) também destaca que no Brasil a Pesquisa-ação se fortalece no final da década de 1980 e tem um crescimento relevante na década de 1990. Isso pode ter ocorrido porque os próprios textos oficiais incluíram os termos “professor reflexivo” e “pesquisador”, o que motivou trabalhos tanto sobre reformulação dos cursos de formação inicial e continuada como também no preparo de profissionais que investiguem sua própria prática.

De acordo com Franco (2005), um aspecto importante a ser considerado em uma Pesquisa-ação é que a mesma não pode ser feita às pressas, mas, sim, precisa de um longo tempo para sua realização plena e para que possíveis resistências sejam transformadas. Tem como componente fundamental a imprevisibilidade, no sentido de estar aberta para retomada de princípios, prioridades, desde que decididas no coletivo. Além disso, essa autora também salienta que:

[...] durante uma pesquisa-ação haja tempo e espaço para que cada sujeito vá se apropriando das mudanças que se operam em suas significações de mundo, que implicam essencialmente mudanças em sua perspectiva de sujeito (FRANCO, 2005, p. 500).

Devido as diferentes vertentes que a pesquisa-ação apresenta, torna-se difícil termos uma única definição de Pesquisa-ação, bem como características pré-estabelecidas. Thiolent (1998), em seu livro “Metodologia da Pesquisa-Ação”, destaca alguns pontos centrais sobre a Pesquisa-Ação que podem ser considerados relevantes, como é o caso da definição apresentada na seqüência.

A pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo (THIOLLENT, 1998, p. 14).

Segundo Thiollent (1998), a Pesquisa-ação pode ser realizada dentro de uma organização na qual existe uma hierarquia ou grupos cujos relacionamentos são problemáticos. Entendemos que na escola temos situações desse tipo. Além disso, na

Pesquisa-ação, para Thiollent, os pesquisadores desempenham um papel ativo no equacionamento do problema, no acompanhamento das ações desencadeadas e na avaliação dessas ações.

Outro ponto importante, encontrado em Thiollent (1998), refere-se ao despertar da

consciência dos envolvidos quanto aos problemas que enfrentam e discutir possíveis soluções. Isso é relevante, pois muitas vezes as pessoas acabam se acomodando com a situação em que se encontram e não procuram soluções para enfrentar seus problemas e/ou até acabar com estes. Um trabalho desenvolvido sob a ótica da pesquisa-ação certamente pode fortalecer os participantes e estes passarem a ter “coragem” de se fazer ouvir e agir no sentido de transformarem suas vidas.

Destacamos ainda no livro de Thiollent os objetivos que se pretende alcançar ao desenvolver-se um trabalho de pesquisa-ação: objetivo prático e objetivo de conhecimento. Ele afirma que a ênfase pode ser dada a um dos três aspectos: resolução de problemas,

tomada de consciência ou produção de conhecimento. Entendemos que melhor ainda seria atingir esses três aspectos com o desenvolvimento de um projeto seguindo os princípios metodológicos da Pesquisa-ação.

Por sua vez, De Bastos e Grabauska (2001) salientam que o modelo de pesquisa-ação apresentado por Thiollent precisa ser superado, porque este não tem um caráter emancipatório. Para esses autores, a pesquisa-ação precisa se constituir em concepção de investigação e não como eles entendem que Thiollent a reconhece: um método ou estratégia de pesquisa, com alguns passos pré-estabelecidos para serem seguidos. Esses autores defendem uma pesquisa-ação seguindo os princípios de Paulo Freire, as propostas de PA de Carr e Kemmis, entre outros e apresentam a partir dessas teorias o que chamam de investigação-ação emancipatória:

[...] a concepção de investigação-ação emancipatória aponta o caminho bastante promissor para novos entendimentos da sociedade. Não mais um entendimento “padrão”, imposto; mas sim, diversos entendimentos possíveis, construídos na interação de pessoas ou grupos que se debruçam sobre suas realidades concretas com a intenção de compreendê-las e transformá-las (DE BASTOS e GRABAUSKA, 2001, p. 18).

Barbier (2007) alerta que a Pesquisa-ação não é o melhor caminho para quem quer ser rapidamente bem sucedido no campo acadêmico e salienta que orienta os estudantes pouco arrojados a seguirem caminhos mais clássicos. Entendo que esse autor enfatiza isso, pois quando trabalhamos com Pesquisa-ação enfrentamos pré-conceitos, porque muitos

pesquisadores, embora não conhecendo a pesquisa-ação, acreditam que esta não tem o rigor e a seriedade necessários para se desenvolver uma pesquisa.

Barbier (2007), por outro lado, enfatiza que a Pesquisa-ação tem como finalidade servir de instrumento para mudança social, contrariando a pesquisa clássica na qual o pesquisador deve ser um observador neutro e objetivo. Na Pesquisa-ação, a produção de conhecimento não pode estar desvinculada de mudanças e, para isso, é importante que as pessoas (coletivo) envolvidas com o contexto em questão participem ativamente da pesquisa, por estarem em melhores condições de analisarem e modificarem sua própria realidade.

Diniz-Pereira e Zeichner (2005) enfatizam que, embora existam diferentes enfoques de pesquisa–ação, esta precisa ser desenvolvida tanto com o objetivo de compensação pessoal, ou seja, propiciando uma melhoria na formação profissional dos professores, quanto com o objetivo de reconstrução social, no sentido de lutas mais amplas na sociedade. Eles afirmam que não podemos manter a dicotomia que existe atualmente e já divide a comunidade de pesquisa-ação, mas precisamos sim ser facilitadores de uma pesquisa-ação com este duplo objetivo. Entendem que a pesquisa-ação é importante para que o professor possa refletir sobre sua própria prática e assim estar em constante formação, mas, enfatizam também a importância da pesquisa-ação para conseguirmos mudanças mais amplas, como igualdade educacional e justiça social.

Embora levemos em conta alguns dos aspectos apresentados até aqui sobre PA, para desenvolvermos nossa pesquisa procuramos seguir mais diretamente as etapas fundamentais da pesquisa-ação apresentadas por Blández (2000) em seu livro “La investigación-acción: um

reto para el professorado”. Segundo essa autora, a primeira etapa seria o desenho teórico e metodológico da investigação, que em nosso caso, foi a definição da escola onde se desenvolveria o trabalho, a escolha das professoras participantes e a definição que desenvolveríamos um trabalho relacionando a EA e EM. Entendemos que as leituras e discussões que desenvolvemos nas primeiras reuniões também fazem parte dessa primeira etapa de pesquisa.

A segunda etapa, o desenvolvimento da investigação, na qual se realiza o planejamento (elaboração do projeto que seria desenvolvido com os alunos), a ação, observação, e, a reflexão num processo cíclico, ocorreu durante quase todo o segundo semestre de 2005 e primeiro semestre de 2006.

A terceira etapa, a elaboração do informe final, foi iniciada no final de 2006 com a elaboração de um artigo para ser publicado no jornal da escola (Anexo A). Este artigo foi elaborado por duas alunas participantes do projeto e eu realizei a revisão final, ficando assim

como colaboradora no artigo publicado. A etapa final ainda não está concluída, pois estamos apresentando a pesquisa que desenvolvemos nessa tese, já elaboramos e apresentamos alguns artigos em eventos científicos e outros artigos, provavelmente serão elaborados posteriormente, se constituindo todos em “informes finais” do trabalho.

Blández (2000, p. 51) também descreve que um trabalho de pesquisa-ação pode ser iniciado de diferentes formas e apresenta algumas:

Neste caso, o trabalho começou com uma investigadora que determinou um objeto de investigação e forma um grupo de trabalho que passa a seguir as etapas fundamentais da pesquisa-ação, apresentadas anteriormente. Além disso, Blández destaca dois tipos de investigação-ação: a participativa e a colaborativa. No caso da participativa, o grupo de professores está envolvido no processo desde o início até a produção do informe final; e na

colaborativa, o grupo colabora com a investigadora principal para desenvolver a pesquisa (BLÁNDEZ, 2000, p. 51). Na presente pesquisa, temos características de ambas, embora o trabalho tenha mais características da pesquisa-ação colaborativa, porque, embora a investigadora principal tenha formado o grupo com o interesse de desenvolver um trabalho relacionando à EM e a EA, o grupo decidiu coletivamente o tema específico que iriam desenvolver e o que fariam para isso. Praticamente todas as atividades desenvolvidas foram decididas coletivamente.

Como se inicia uma I-A?



Um grupo de trabalho



Busca um (a) Orientador (a)



Determina o objeto de investigação



Um (a) Investigador (a)



Cria um grupo de trabalho



Determina o objeto de investigação



Uma Instituição



Busca um (a) Investigador (a)



Determina o objeto de investigação



Uma equipe de investigação



Determina o objeto de investigação



Blández (2000) também apresenta as características metodológicas da Pesquisa-Ação:

coletiva, encontro entre teoria e prática, ecológica, flexível, criativa, dinâmica, formativa e crítica. A pesquisa-ação é coletiva porque necessita de um grupo de trabalho para colaborar com o processo, compartilhar suas inquietudes, objetivando melhorar suas práticas docentes.

A questão de relacionar teoria e prática se constitui na principal característica da pesquisa-ação, tendo como pilares fundamentais o planejamento, a ação, a observação e a reflexão num processo cíclico. É caracterizada de ecológica por ser desenvolvida no ambiente no qual o processo ocorre realmente, como na escola, e por ter as pessoas que convivem neste espaço como participantes ativos do processo.

A Pesquisa-ação certamente é flexível, pois se estamos num processo de constante reflexão sobre a prática que guia a ação, não temos um caminho determinado, mas o processo é construído de acordo com o que vai acontecendo. Neste sentido também é criativa e dinâmica, pois o grupo pode redefinir o que fazer da forma que entende ser a mais adequada, usando a criatividade para isso e, certamente assim, não se tem um processo rotineiro. A PA é

formativa, pois os professores ao longo do trabalho vivenciam um processo de formação

profissional, e também é crítica, porque os participantes passam a analisar profundamente o que está sendo feito, bem como o processo educativo de uma forma mais ampla.

Analisando cada uma dessas características, podemos concluir que a pesquisa-ação é um procedimento metodológico relevante para se desenvolver uma pesquisa diretamente relacionada com a educação e que seja desenvolvida em uma escola onde entendemos que os problemas educacionais se concretizam realmente.

Com relação a nossa construção de dados, realizamos entrevistas; aplicamos questionários; desenvolvemos reuniões entre as professoras participantes; os alunos desenvolveram algumas atividades conosco, a partir da entrevista feita com a diretora, e também, apresentaram trabalhos aos demais colegas da escola.

Gravamos quatro entrevistas que foram realizadas em 2005, sendo uma com a diretora da escola, uma com as serventes, uma com a professora Vera e uma com a professora Márcia. Aplicamos um questionário inicial (professoras participantes) e um questionário no

final de 2005 (alunos participantes e alguns não participantes). Realizamos várias reuniões,

entre estas gravamos duas em 2005 e uma em 2006. Sobre as atividades desenvolvidas com os alunos, que chamamos de sistematizações, conseguimos gravar em áudio quase todas; e as

apresentações dos alunos foram praticamente todas filmadas. Além disso, desenvolvemos

também um grupo focal (reunimos praticamente metade dos alunos participantes num mesmo local, ao final do 1º semestre de 2006) para responder algumas questões oralmente e/ou fazer

colocações espontâneas. Isso também foi gravado em áudio. Todas essas atividades desenvolvidas, que estão gravadas e/ou filmadas, foram transcritas e algumas estão anexadas no final da tese. No próximo capítulo, apresentaremos em ordem cronológica e detalharemos um pouco mais sobre todos os procedimentos desenvolvidos e também, relataremos os resultados da pesquisa.