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CAPÍTULO 5 – ANALISANDO OS ENCONTROS E OS DESENCONTROS

5.1. Dimensão 1: O aluno e o processo de ensino-aprendizagem da

5.2.2 O Trabalho em Grupo

Com relação à importância do trabalho em grupo na formação das professoras, podemos reconhecer que isso ocorreu principalmente durante as reuniões.Como descrevemos anteriormente, temos três reuniões com as professoras participantes que foram registradas em gravação: a do dia 8 de agosto de 2005, a do dia 31 de outubro de 2005 e a do início de ano de 2006. Devido a isso, focamos parte de nossas análises nessas três reuniões.

Já no início da pesquisa, o tema desenvolvido foi escolhido coletivamente pelas professoras participantes e também, de uma forma indireta, pelos alunos. No caso das professoras, estas decidiram logo nas primeiras reuniões, e os alunos confirmaram essa escolha por meio de entrevistas realizadas com os mesmos que infelizmente não foram gravadas devido a problemas técnicos, mas as idéias principais foram anotadas por mim (Profa. Regina). Todas as demais atividades desenvolvidas com os alunos também foram decididas coletivamente pelas professoras. No caso das reuniões realizadas podemos verificar, lendo a transcrição destas e com os exemplos apresentados, que realmente as decisões foram tomadas coletivamente. Eu, enquanto professora coordenadora do projeto, buscava fazer perguntas para que as demais professoras participantes pudessem opinar sempre sobre o que seria mais adequado fazermos. Lembrando que a pesquisa-ação, de acordo com Blández (2000), pode ser colaborativa ou participativa, pois embora eu tenha coordenado as atividades, professoras e alunos foram participantes ativos do projeto.

Na reunião do dia 8 de agosto de 2005, as professoras elaboraram as questões que seriam feitas à diretora pelos alunos com o intuito de investigar o quanto se gastou com a reforma de julho de 2005 e porque ocorrem depredações na escola. As questões foram elaboradas de comum acordo por todas as professoras participantes como podemos verificar no trecho seguinte.

TRECHO DA REUNIÃO COM AS PROFESSORAS, REALIZADA EM 08/08/2005

Profa. Regina: Vamos marcar aqui, o que vocês acham, vamos fazer então entrevista com a

Diretora ou Vice-diretora, com a Coordenadora... Aí depois que eles fizerem as entrevistas, aí vocês teriam que trabalhar na sala com as respostas aí todo mundo ajuda.

Profa. Márcia: Aí teria que elaborar meio padrão às questões.

Profa Regina: Sim. A gente pode elaborar. Vocês acham que a gente devia elaborar com eles

ou nós mesmos vamos fazer as perguntas que eles vão fazer?

Profa. Vera: Eu acho melhor nós. Porque semana passada já teve aquele projeto reflexão já

falou muito e isso e aquilo tem hora que eles começam a falar umas coisas também que ah...

Além disso, também decidiram o que fariam para a FETESC, justamente porque as professoras estavam preocupadas com o pouco tempo que tínhamos para prepará-la. Na verdade, essa feira, embora se constitua um projeto e/ou evento interessante, não é bem um projeto coletivo da escola, mas foi imposto pela diretora e nós professores somos “obrigados” a orientar os alunos no preparo das atividades e, muitas vezes, nós mesmos precisamos executar as atividades ao invés dos alunos, para que a Feira saia como o planejado.

Profa. Vera: Regina depois nós precisamos ver o que é que nós vamos fazer para Fetesc

também.

Profa. Regina: Bom, nós vamos apresentar essas coisas...

Profa. Vera: Só que tem que ver o tempo, que olha quando que vai ser a Fetesc. Profa. Regina: Já está em novembro, né?!

Profa. Vera: Não é em novembro, é em outubro.

Profa. Márcia: Acho que, na verdade, a gente não tem praticamente nada.

Profa. Vera: Nós não temos nada para a Fetesc então nós precisamos ver certinho onde que

nós vamos nos encaixar aí, porque outubro, se não me engano, é nessa semana do 17 ao dia 20...

Profa. Regina: Discutiu no replanejamento? Porque eu estava no congresso e eu não sei. Profa. Márcia: Este projeto assim está demorando muito, porque está chegando a Fetesc e a

gente está muito enrolada...

Profa. Vera: Está demorando muito.

Neste trecho fica clara a insatisfação das professoras com relação à preparação da FETESC e a demora do projeto. Essa reunião (dia 8 de agosto de 2005), embora as decisões continuassem sendo tomadas coletivamente, foi mais polêmica que as demais porque

percebemos que as professoras estavam mais preocupadas com a FETESC do que com o projeto, mesmo sabendo que aproveitaríamos os dados do projeto para apresentarmos nesta feira. Também reclamaram que o projeto estava demorando muito. Isso pode ter ocorrido porque essas professoras não tiveram experiências anteriores de participação em projetos e, deste modo, não sabem que um projeto não pode ser desenvolvido de forma rápida, principalmente se tratando de um trabalho de pesquisa-ação, que precisa ser quase todo planejado em grupo, conforme salienta Franco (2005). Além disso, Demo (2003) enfatiza que o professor não se entende como pesquisador, por acreditar que pesquisa é coisa para pessoas especiais, sendo muito complicada, e assim não se percebe capaz de desenvolvê-la.

A maioria dos professores não foi formada para a pesquisa e, então, não se sente capacitada para tal tarefa, apenas aprendeu a dar aulas copiadas. Por outro lado, realmente o projeto teve um processo mais longo do que o planejado inicialmente, porque, como trabalhamos diretamente no ambiente escolar acontecem muitas coisas que não permitem que este flua como se espera. Não conseguimos iniciar o trabalho diretamente com os alunos no primeiro semestre, o que entendo ter prejudicado o andamento do mesmo. A parte prática acabou ficando concentrada no final do segundo semestre e tivemos que, literalmente, correr para desenvolver as atividades antes do final do ano letivo. Analisamos isso também como sendo um reflexo de uma das características metodológicas da pesquisa-ação apresentada por Blández (2000), a pesquisa-ação é ecológica, ou seja, é desenvolvida no próprio ambiente que os problemas ocorrem, no nosso caso o ambiente escolar, assim está suscetível a enfrentar problemas próprios desse ambiente.

Salientamos também um trecho da entrevista realizada com a professora Vera, em dezembro de 2005, no qual essa professora faz comentários sobre a dificuldade de se fazer um trabalho sozinha, e que ela gostaria de ter desenvolvido algo sobre o ensino religioso, por ter participado de um projeto sobre esse tema na Diretoria de Ensino de Bauru.

TRECHO DA ENTREVISTA COM A PROFESSORA VERA, REALIZADA EM 14/12/2005

Profa. Vera: Esse ano eu participei do ensino religioso. Na realidade o ensino religioso não

tem nada a ver com a católica, espírita era tudo, né?... Então, eu senti que eu queria fazer alguma coisa, mas eu estava sozinha. Sozinha também tem hora que é difícil.

Profa. Regina: Acho que com um grupo é legal.

tenho projeto, mas eu tentei trabalhar com eles, na medida do possível, o que eu aprendia lá eu tentei nas salas que eu dava aula. Eu não tinha uma abertura, por exemplo, no HTPC para falar com todo mundo, oh, vamos fazer isso.

Profa. Regina: O que seria o ideal.

Nesse trecho da entrevista com a professora Vera, reconhecemos que esta teve vontade de fazer um trabalho em grupo. Mas, o propósito da mesma não foi concretizado, tendo em vista que não encontrava espaço para conversar com os demais colegas. Isso é um problema sério que encontramos na maioria das escolas, as questões burocráticas __ como preenchimento de papéis, organização de eventos, questões disciplinares etc. __ ocupam todo o tempo do horário que o próprio nome diz Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC). Assim, os professores não disponibilizam de tempo, tampouco de liberdade, para trocarem idéias e/ou experiências com seus pares. Segundo Freitas e Rocha (2004; 2005), o trabalho coletivo pode ser uma forma dos professores se fortalecerem e procurarem mudar suas práticas. Como na maioria das escolas, trabalhos coletivos são raros, assim os professores têm poucas possibilidades de mudar suas práticas devido a não terem momentos de reflexão coletiva.

Outro aspecto que podemos considerar nesta fala da professora. Vera é a valorização do trabalho em grupo. A mesma coloca que sozinha é difícil, ou seja, ela sentiu a falta de um grupo para que pudesse realmente desenvolver o projeto almejado. Isso pode ter sido influência do projeto que estávamos trabalhando, porque tudo que fazíamos era decidido anteriormente no grupo. Entendemos que essa parceria tornou o trabalho mais produtivo, menos árduo e animador. Imbernón (2002) confirma isso, porque para esse autor os professores caminham melhor para mudanças ao desenvolverem capacidades reflexivas em grupo, bem como aprendem com seus pares e o passam a enfrentar os problemas da escola coletivamente.

Na reunião do dia 31 de outubro de 2005, participaram apenas duas professoras __ Regina e Vera __, o que pode ter colaborado para que esta reunião fosse mais tranqüila do que a reunião de agosto. Tratou-se sobre como seria sistematizado com os alunos os dados da entrevista realizada com a diretora e a maneira como os alunos fariam a divulgação do trabalho, realizado até então, para as demais turmas da escola que não estavam participando do projeto. Foi discutido também a respeito de quantos e quais grupos iriam fazer essa

divulgação. Desta forma, pode-se perceber que as decisões, mesmo com a participação de duas professoras, continuam sendo tomadas coletivamente.

TRECHOS DA REUNIÃO REALIZADA EM 31/10/2005

Profa. Regina: Nós fizemos lembra, eu passei para eles. Eles estão com os dados na mão.

Agora, o quê que a gente pode fazer? Trabalhamos conforme as perguntas, vamos fazendo conta com eles, ou nós vamos montar um esqueminha?

Profa. Vera: Seria melhor trabalhar com eles, assim... montando junto com eles as continhas. Profa. Regina: Lendo as perguntas e fazendo?

Profa. Vera: Lendo as perguntas e fazendo. Porque estressa menos. Profa. Regina: Ah!

Profa. Vera: Eu acho. Porque se deixar por conta deles , eles monta grupo...E eles Profa. Regina: Vai demora mais.

Profa. Vera: Vai demora mais e outra, eles vão dispersar muito, eles vão dando opinião...

Eles vão vendo os custos, os gastos...

No início de 2006, nos reunimos (todas as professoras participantes do projeto) e decidimos o que faríamos no primeiro semestre daquele ano. Resolvemos que os alunos apresentariam os resultados das perguntas respondidas no final do ano anterior para que os demais alunos da escola pudessem refletir também sobre o que poderia ter sido feito com o montante gasto na reforma de 2005 e colaborassem para que as depredações diminuíssem. Nessa reunião, além da questão das decisões também serem tomadas no coletivo, eu (como professora coordenadora do projeto) explico para elas, resumidamente, sobre o trabalho em grupo e um pouco sobre como se dá um trabalho de pesquisa-ação. Outro ponto importante é que uma das professoras que normalmente não gostava que as reuniões fossem gravadas comenta que já está falando sem se preocupar com o gravador.

TRECHOS DA REUNIÃO DO INÍCIO DE 2006 1º TRECHO

Profa. Regina: Vamos fazer isso, não?! O que vocês acham que nós devemos fazer? Porque

qualitativa, porque a gente se interessa pelos resultados, tudo... Mas não é uma pesquisa que é planejada com todas as professoras envolvidas. Então, eu acho que o grupo está caminhando bem, eu acho que nós vamos caminhar no sentido assim, mais projetos que a gente tenha que fazer as nossas dificuldades vão diminuir, porque a equipe aprende a trabalhar junto, vai crescendo...

2º TRECHO

Profa. Regina: Porque, na verdade, nós somos um grupo de pesquisa-ação, o que a gente

faz? A gente estuda, a gente até chegou a estudar um pouco, a gente estuda, planeja e age. Então, nós também somos participantes do projeto, não são somente os alunos, os alunos estão colaborando, mas se a gente precisar fazer alguma coisa nós também podemos fazer. A pesquisa-ação inclusive ajuda a gente na hora da aula, às vezes a gente fala do nosso projeto da Fetesc de repente pode ser que a gente está conseguindo trabalhar assim, tendo idéias juntas, porque o ano passado a gente já teve um período sempre junto, discutindo... Então, começa a conseguir trabalhar melhor em equipe, né... A pesquisa-ação ajuda nisso, também... Eu não chego aqui e falo: vamos fazer isso, eu sempre pergunto o que vocês acham que nós podemos fazer?

Profa. Márcia: Eu sou um exemplo, eu já estou até falando com o “negocinho ligado”. Profa. Cristiane: Pois é, né!

Tanto no primeiro quanto no segundo trecho dessa reunião do início de 2006, vemos nitidamente que o trabalho coletivo foi muito importante para o desenvolvimento do projeto, bem como para que as professoras participantes pudessem crescer enquanto grupo, como eu (professora Regina) relato no primeiro trecho. No segundo trecho faço menção a essa questão também, enfatizando o mérito da pesquisa-ação, e na seqüência, a professora Márcia confirma que o trabalho colaborou até no sentido dela conseguir falar sem se preocupar com o gravador, que antes a incomodava significativamente.

Nesta reunião, além dessa questão do trabalho coletivo, percebemos que as professoras envolvidas no processo analisam algumas possibilidades para tomarem algumas decisões, o que está de acordo tanto com a característica da metodologia da pesquisa-ação ser coletiva e ser flexível, no sentido de não termos um caminho a seguir pronto e acabado, mas passível de mudanças conforme as necessidades (BLÁNDEZ, 2000). Devido à essa reunião, fiquei até empolgada (como professora coordenadora), pois todas as professoras me pareceram mais entusiasmadas. Mas no decorrer do semestre minhas expectativas foram diminuindo, porque

não conseguimos mais nos reunir e acabei realizando as últimas atividades do projeto apenas com meus alunos (primeiros anos do Ensino Médio) que haviam participado do projeto no ano de 2005. Isso, provavelmente, ocorreu também devido às professoras não estarem ainda preparadas para desenvolver uma pesquisa em suas salas de aula, como relatamos anteriormente. Demo (1991) expressa essa questão de uma maneira bem realista enfatizando que:

Um professor de 1º grau teria o maior constrangimento em ver-se colocado como cientista ou pesquisador, porque foi domesticado na universidade a aprender imitativamente e a atuar na escola como mero instrutor. (DEMO, 1991, p. 77).

Nas entrevistas que realizei com as professoras Márcia e Vera (Anexos M e N), inclusive, coloquei que esperava que estas pudessem trabalhar um outro projeto com os alunos, sem, no entanto, terem uma coordenação. Mas, até então, não percebi nenhum resultado nesse sentido.

De qualquer forma, para finalizar esse item, um aspecto positivo que Demo (2003) salienta é que um trabalho em equipe realmente produtivo precisa ser solidário e não competitivo. Refletindo sobre isso, entendemos que o projeto que desenvolvemos baseou-se justamente no trabalho solidário, e, até hoje, percebemos essa influência porque procuramos auxiliar umas as outras sempre que necessário.