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CAPÍTULO 5 – ANALISANDO OS ENCONTROS E OS DESENCONTROS

5.1. Dimensão 1: O aluno e o processo de ensino-aprendizagem da

5.1.1 Relação entre a Educação Matemática e a Educação Ambiental

5.1.1.2 Divulgação do projeto: da elaboração a recepção pelos

Nesta parte das análises, é importante destacar trechos retirados da preparação das apresentações realizadas pelas turmas das 7ªs séries, da elaboração dos gráficos desenvolvidos pelas 8ªs séries, e das próprias divulgações dos alunos para outras turmas.

As 7as séries prepararam propostas de apresentação (divulgação do projeto) e para isso foram em grupos para uma sala mais espaçosa, com tempo estimado suficiente para escreverem o que iriam desenvolver e depois nos entregarem. Inicialmente, estes alunos não estavam conseguindo elaborar uma proposição para apresentação. Porém, com alguns esclarecimentos, executaram tal tarefa. Nesse ponto, destaca-se a importância do professor, enquanto um parceiro e facilitador do processo, pois os alunos conseguiram fazer as atividades após algumas explicações e o incentivo dado a eles.

Essa atividade propiciou que esses alunos, utilizando-se de dados matemáticos, pois os mesmos estavam com as informações sobre a reforma em mãos, elaborassem alguma estratégia para apresentá-los aos demais colegas. Deste modo, os dados matemáticos seriam utilizados para facilitar o entendimento dos outros alunos da escola sobre a questão da depredação escolar, que se constitui em um problema ambiental local e precisa ser analisado por estes alunos considerando que, tudo indica, que são alguns destes que depredam a escola.

Com relação às 8ªs séries, foi solicitado aos alunos que, após estarem de posse dos dados sobre a reforma da escola, elaborassem os gráficos; primeiramente no caderno, e posteriormente, transcrevessem o mesmo para uma cartolina. Os gráficos elaborados em cartolinas foram utilizados para a apresentação nas demais salas não participantes. Não foi realizado o registro gravado do trabalho dos alunos em grupos executando essas atividades, mas, por meio de observações diretas, podemos relatar que alguns grupos trabalharam com mais empenho que outros.

Os grupos eram formados por, no máximo, quatro alunos, que se sentaram próximos e assim realizavam as atividades. Quando surgiam dúvidas, solicitavam ajuda da professora e, quando finalizaram a elaboração dos gráficos, apresentaram estes primeiramente para os próprios colegas da sala. Os grupos considerados pelas professoras participantes do projeto como tendo feito uma melhor apresentação prévia do material, foram convidados a posteriormente apresentarem para as outras turmas do período da manhã e da tarde.

Além disso, foi observado por meio do trabalho desenvolvido pelos alunos que estes gostam de trabalhar com gráficos e demonstram se empenhar no desenvolvimento de atividades que os envolvam. Isso foi confirmado também na prova do SARESP, já relatado

anteriormente, que os alunos das oitavas séries fizeram logo após o desenvolvimento do trabalho: havia algumas questões de interpretação de gráficos e estes puderam, ao menos, procurar responder as questões com algum subsídio. Uma aluna, inclusive, comentou que havia sido bom trabalharmos com o assunto, pois, caso contrário, não teria conseguido resolver as questões que envolviam os gráficos. Isso demonstra que um conteúdo se torna relevante e interessante quando os alunos percebem que realmente precisam deste para interpretar diferentes situações, mesmo que sejam provas externas.

Na seqüência, serão apresentados alguns momentos marcantes das divulgações (apresentações) realizadas por dois grupos de alunas das 7ª séries em 2005.

Uma situação que consideramos relevante aparece em um trecho da apresentação de um grupo da 7ª série A, em que as alunas realizaram uma atividade diferenciada para as salas que apresentaram (5ª série C e 5ª série A). Elas prepararam algumas operações matemáticas e colocaram na lousa para os alunos resolverem. Enquanto isso, explicavam que o resultado de cada uma dessas operações equivalia ao montante gasto com o conserto de algum item da reforma da escola. Os alunos que acertavam os cálculos ganhavam balas.

Embora essa premiação, em um primeiro momento, possa parecer um incentivo a competições entre os alunos, avaliamos que motivou os alunos a participarem ativamente da atividade proposta. Além disso, como essa premiação foi uma decisão do grupo de alunas da 7a série A, preferimos não interferir, considerando ainda que ao término da atividade todos os alunos da sala ganhavam balas.



Figura 13 - Grupo de alunas da 7ª série A após apresentação do trabalho











TRECHO DA APRESENTAÇÃO DA 7ª SÉRIE A PARA 5ª SÉRIE C

Bianca: A gente vai fazer uma dinâmica com vocês para saber quanto que a Diretora gastou

para fazer a FETESC.

Profª. Regina: Você tem certeza que é na FETESC? Bianca: Na arrumação da escola.

Profª. Regina: Quando que foi feita a arrumação? Fran: Não, a gente vai perguntar para

Profª. Regina: Ah! Eles é que vão... Então está bom.

Fran: E depois a gente vai pegar as sugestões e reclamações de cada um e vai por aqui

dentro desta caixa.

Bianca: A gente vai passar umas contas e quem acertar vai ganhar uma coisinha. Fran: E é pra levantar a mão, não vale gritar.

Gisele: Quem levantar a mão vai ter que falar o resultado. (Enquanto isso, Amanda coloca a

conta na lousa – 310 multiplicado por 5).

Profª. Regina: Oh, elas colocaram as continhas pra vocês fazerem. Bianca: Essa conta aqui é quanto a Dona Élida gastou com o portão. Fran: Eletrônico.

O trabalho desenvolvido pelo grupo de alunas da 7ª série A foi muito interessante e os alunos das classes que elas apresentaram gostaram muito e se mostraram motivados a encontrar o resultado certo para cada operação matemática proposta. Certamente, essa participação ocorreu porque essas alunas não apresentaram os dados prontos, mas primeiro estimularam os colegas a realizar algumas operações matemáticas e, depois, a relacionar os resultados com os bens consertados e/ou trocados. Assim, os alunos das salas a que elas apresentaram tiveram uma participação efetiva, não sendo meros expectadores de um processo.

No trecho seguinte, descrito a seguir, as alunas estão finalizando a apresentação e solicitam aos alunos que escrevam em pedacinhos de papéis o que levaria os alunos a depredarem a escola. Elas prepararam uma caixa e disponibilizaram para que os alunos fossem colocando as respostas dentro.

TRECHO FINAL DA DIVULGAÇÃO DO PROJETO REALIZADA EM 2005 (ALUNOS DA 7ª SÉRIE A PARA A 5ª SÉRIE C)

Bianca: A gente quer falar com vocês sobre a depredação. Fran: A gente quer ouvir a opinião de cada um...

Bianca: Por que os alunos depredam, destroem a escola? Apresentadoras: Espera aí.

Profª. Regina: Põem num pedacinho de papel. Ah, ela já fez então tem que por na caixinha. A

professora passa pra vocês. Você fez em qual série?

O que aconteceu em relação ao envolvimento e a participação nas atividades desenvolvidas por estas alunas da 7ª série, juntamente com os alunos da 5ª série A e C, compatibiliza-se com a concepção de D’Ambrósio (2001), para o qual a matemática precisa ser: mais interessante, estar relacionada com a vida dos alunos e/ou com o mundo, pensando

numa abrangência maior, entre outras coisas. Os alunos participantes do projeto certamente utilizaram as operações matemáticas para compreender melhor a reforma que foi feita na escola e, além disso, também foram divulgadores do trabalho para os próprios colegas.

Ficamos surpresos com a atuação do grupo de alunas da 7a série A, tanto por este grupo ser formado por meninas de 13 anos quanto por estas terem se envolvido e apresentado um trabalho que avaliamos como sendo bem elaborado.

Ao final dessa atividade, uma das alunas apresentadoras solicita aos alunos que respondam em um papel (entregue para cada aluno da 5ª série A e C), a pergunta “Por que os

alunos depredam, destroem a escola?” Esses papéis, depois de preenchidos pelos alunos da 5ª série A e C, foram colocados em uma caixa, que essas alunas chamaram de “Caixa de Sugestão”.

De uma forma geral, as respostas englobaram duas tendências: uma delas, que é predominante, defende que os alunos que praticam atos de vandalismo, depredação, devem pagar os danos e/ou serem expulsos da escola. A título de exemplos, selecionamos algumas respostas:

RESPOSTAS DOS ALUNOS DA 5ª SÉRIE A E C – CAIXA DE SUGESTÕES

“Eu acho uma falta de respeito com a nossa escola, porque nós devemos fazer o possível para melhorar a nossa escola. A solução é quem quebrou mandar o pai pagar, não a escola.” “A solução é expulsar os alunos que fazem isso.”

“Suspensão para os alunos que fazem isso ou chamar a polícia para resolver isso.”

Podemos perceber, claramente, na seleção de frases acima, na resposta dada pelos alunos à questão, a influência de um modelo educacional que não está privilegiando o diálogo, a conscientização, mas a suspensão, expulsão e punição dos culpados.

A escola, que deveria ser uma das instituições que promove a esperança e trabalha em prol da formação de sujeitos questionadores, parece estar fazendo o papel contrário, como podemos perceber na fala dos alunos acima. Ao invés de sugerirem um processo educativo sugerem punição aos que picham. Com isso, não estamos inferindo que esta postura deve-se apenas às influências do contexto educacional nas concepções dos alunos. Certamente, tal concepção também é valorada no contexto social mais amplo.

Subjacente às sugestões apresentadas acima pelos alunos da 5ª série A, em relação àqueles que depredam a escola, há a ausência do conceito de pertencimento dos mesmos em relação ao ambiente escolar, tal como discute Segura (2001). Tendo em vista que não se sentem componentes do ambiente escolar, certamente não percebem na escola um local propício para interações que possibilitem o crescimento pessoal deles. Assim, não se sentem responsáveis pela solução das problemáticas do meio.

Uma outra tendência que apresenta um número significativo de respostas se refere à necessidade de realizar trabalhos de conscientização dentro da escola. Com este intuito, alguns alunos solicitam o desenvolvimento de palestras.

RESPOSTA DOS ALUNOS 5ª SÉRIE A E C – CAIXA DE SUGESTÕES

“Eu acho muito ruim. Na minha opinião uma boa ação seria pedir para os alunos que se conscientizem do que estão fazendo e senão der certo, fazer com que eles ajudem a consertar o que quebraram.”

“Eu acho muito ridículo e também tem que fazer palestras e mandar limpar cada carteira que rabiscou.”

“Ruim, muitos alunos da escola ficam pixando e quebrando fechaduras etc. A solução é fazer palestra, chamar os pais do aluno que faz isso.”

Identifica-se na fala desses alunos uma concepção que requer a integração dos participantes por meio de um processo educativo. Essa concepção encontra eco nas idéias de Loureiro (2004), para o qual a EA perpassa pela emancipação do sujeito. Propiciar novas atitudes aos estudantes que depredam a escola requer a construção de novos valores e atitudes pelos mesmos, algo que certamente não será conseguido de imediato, tal como opina Tozoni- Reis (2008), ao definir o processo de conscientização em EA.

No quadro seguinte, apresentamos um trecho de uma divulgação no qual o aluno, além de apresentar os dados sobre a reforma, também dá algumas idéias do que poderia ter sido feito com o montante gasto com a mesma.

TRECHO DE UMA DIVULGAÇÃO DO PROJETO REALIZADA EM 2005 (ALUNOS DA 7ª SÉRIE C APRESENTANDO PARA A 6ª SÉRIE A)

Prof. Lucas: O Roger está apresentando gente!

Roger: Então, podia arrumar isso, materiais... Podia arrumar o quê? Pinta a sala. Muitos

gostam dessa cor, mas muitos não gostam. Poderia pintar de novo. Poderia o quê?

Alunos: Arrumar o ventilador.

Roger: Arrumar o ventilador. Poderia fazer um monte de coisa. Poderia arrumar uma festa

para vocês.

Aluno: E a televisão?

Aluno: Poderia pinta a lousa também.

Roger: Vocês preferem o quê? Estragar, gastar mais seis mil reais, ou vocês preferem mais

quatro computadores e mais tudo isso?

Aluno: Mais quatro computadores e tudo isso.

Roger: Então, o que nós vamos fazer agora? Vamos continuar estragando. Então, nós temos

que ter consciência do que fazer. Oh, pra que quebrar aquilo ali?





TRECHO FINAL DA APRESENTAÇÃO

Profª Regina: Só um minutinho. Os outros três querem acrescentar alguma coisa, ficaram

quietinhos, aí? (Tempo). Obrigada, sala. Obrigada, professor Lucas.

A diferença entre esse grupo e os demais é que apenas um aluno (Roger) apresenta o trabalho, como destacado no trecho inicial, embora mais três colegas fizessem parte do grupo. No final dessa apresentação, eu ainda questiono se os outros três não querem falar nada, e estes sinalizam que não; o que confirma que apenas um aluno (Roger) apresentou o trabalho para essa turma. Desta forma, retomamos a questão dos alunos estarem acostumados a receberem as informações prontas e não participarem ativamente das aulas e nem desenvolverem com freqüência atividades em grupo, muito menos serem eles os atores principais, como estávamos propondo nessas divulgações do projeto.

Também comentaremos abaixo um trecho da divulgação do trabalho feito por outras alunas da 7ª série C para a 6ª série B. As alunas, além dos comentários sobre os gastos com a reforma da escola, fazem suposições sobre o que poderia ter sido feito com o dinheiro, caso a escola não necessitasse da reforma.

TRECHO DA APRESENTAÇÃO DE ALUNAS DA 7ª SÉRIE C PARA 6ª SÉRIE B

Priscila: A Dona Élida comprou verniz, envernizou todas as carteiras porque estavam todas

rabiscadas, e também os alunos estavam colocando tudo debaixo da carteira.

Lais: A gente veio conscientizar vocês para não estragarem mais porque o dinheiro que foi

gasto aqui dava pra fazer uma festa super legal pra gente.

Priscila: Professora, qual é o total de gastos?

Profª. Regina: R$ 6.500,00 (seis mil e quinhentos reais)

Priscila: O total de gastos com todas essas arrumações foi seis mil e quinhentos. Com esse

dinheiro poderia ter colocado sabonete no banheiro, papel higiênico... Poderia estar melhorando a escola, não consertando os erros que os próprios alunos fizeram. Poderia estar pintando a escola que está pichada, que os próprios alunos picham a escola...

Neste trecho da divulgação realizada pelas alunas da 7ª série C, elas vão além da apresentação dos custos financeiros despendidos durante a reforma da escola. Explicam que os próprios alunos depredam a escola, justificam porque alguns consertos foram necessários e

que, se isso não ocorresse, outras coisas poderiam ser realizadas ou melhoradas. Aqui, percebemos que os alunos vão além do que foi trabalhado com eles porque apresentam, inclusive, idéias sobre o que poderia ter sido feito com o montante gasto na reforma.

É possível notar também que não houve apenas uma interação individual de alunos com materiais didáticos durante o desenvolvimento do projeto, nem se resumiu à exposição do conteúdo de Matemática pela professora, mas se realizou interação pela participação ativa dos envolvidos no processo educativo em uma prática de elaboração cultural. Isto está de acordo com o que Miguel (1994) também destaca a respeito da matemática, quando descreve que, ao problematizarmos questões com os estudantes, favorecemos que estes pensem de forma independente, criativa e crítica. Deste modo, esses estudantes podem buscar melhorias para suas próprias vidas, porque começam a falar, pensar sobre sua realidade e serem ouvidos.