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A Problemática das Plantas Exóticas Invasoras em Portugal Continental.

PARTE I. INTRODUÇÃO E ENQUADRAMENTO INTRODUCTION AND RESEARCH CONTEXT

Capítulo 1. Ecossistemas Ripícolas e Bacia Hidrográfica do Tejo em Portugal – Síntese e Contextualização.

1.2. Ecossistemas Ripícolas Estado da Arte em Portugal.

1.2.3. A Problemática das Plantas Exóticas Invasoras em Portugal Continental.

Esta é uma problemática recente (dentro da atual perspetiva), mas em grande desenvolvimento em todo mundo20. E.g. na Europa estima-se que existam 12 000 espécies exóticas (animais e plantas) no ambiente, sendo que 10-15% se reproduziram e se dispersaram, causando danos ambientais, económicos e sociais (EC, 2013). Os custos estimados na UE para as combater rondam pelo menos os 12 biliões de euros por ano e os custos continuam a aumentar (EC, 2013). Em Portugal os trabalhos realizados não são muitos, embora tenham acompanhado a evolução a nível internacional, pois só recentemente se está a dar a devida atenção a este problema. (Hulme et al., 2009) refere que na UE só nos finais da década 1990 é o que o problema ganhou visibilidade. Em termos de escolas nacionais que mais se dedicam às invasões biológicas temos duas que se destacam pela organização e estudos realizados. A escola de Coimbra, que nos últimos anos se tornou visível através do(s) projeto(s) “Invader”21, reúne especialistas do CEF-UC22 e da ESAC23. Este grupo de trabalho é um dos que mais tem divulgado esta problemática a nível científico, técnico e público em geral. E.g. organização de fichas de identificação e controlo das plantas invasoras (Marchante et al., 2005), campos de trabalho, conferências e outras publicações técnicas, como o guia de exóticas de (Marchante et al., 2008), e a recente base de dados (INVASORAS, 2013). Apesar dos estudos desenvolvidos por esta escola não se dedicarem em particular aos ecossistemas ribeirinhos, como ainda há muito em aberto, consideramos que todos os trabalhos desenvolvidos sobre o problema das invasões têm um contributo muito importante, nomeadamente na catalogação dos táxones, mas não só (e.g. Almeida, 1999; Liberal & Esteves, 1999; Almeida & Freitas, 2000, 2001, 2006, 2012; Campelo, 2001; Marchante, 2001; Marchante et al., 2006). O número mais recente aponta para a presença de 667 táxones exóticos em Portugal Continental, o que representa 18% da flora total (sub)espontânea que ronda os 3725 táxones (Almeida & Freitas, 2012).

A escola de Lisboa é constituída por investigadores ligados ao ISA. O já referido grupo de trabalho “Water Lobby” do DEF, que com o projeto “Exóticas”, estuda atualmente esta problemática especificamente nos sistemas fluviais; e do CBAA24, no grupo de trabalho “Vegetation Science”, onde os investigadores da área da “Weed Science” estudam esta problemática ligada às culturas agrícolas e aos impactos destas espécies nos ecossistemas autóctones. Esta escola foi pioneira a nível nacional na avaliação das melhores estratégias para o controlo de infestantes aquáticas (Moreira et al., 1989; Aguiar & Ferreira, 2012). Os trabalhos pioneiros iniciaram-se no final da década de 1970 por (Guerreiro et al., 1977; Fernandes et al., 1978) relacionados com o controlo químico de várias

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Numa pesquisa rápida, em qualquer motor de busca, na Internet com a palavra ‘invasions’ logo nos surgem uma grande lista de sítios de entidades que investigam este problema em todo o mundo.

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http://www1.ci.uc.pt/invasoras 22

Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra. 23

Escola Superior Agrária de Coimbra, Instituto Politécnico de Lisboa. 24

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infestantes e com o estudo da biologia de determinadas espécies (Moreira, 1978b) [ver revisão de (Moreira et al., 1989)]. Uma obra de referência, que aborda a distribuição das espécies infestantes em Portugal, é a de (Franco & Rocha Afonso, 1980). Do mesmo modo os trabalhos seguintes de (Moreira et al., 1983; Figueiredo et al., 1984) não são menos importantes. No entanto, de um modo geral, até meados dos anos 1990, os trabalhos feitos em Portugal sobre a proliferação de espécies infestantes25 tinham normalmente como preocupação a produção agrícola. Deste modo, a distinção entre espécies exóticas e autóctones nem sempre foi uma necessidade (e.g. Monteiro et al., 1988). Com a evolução destes trabalhos, esta necessidade começa a fazer sentido – os autores, apesar de estudarem “infestantes” (alóctones e autóctones) elucidam que determinadas espécies – as mais problemáticas – são exóticas/alóctones, apesar do objetivo ser ainda a produção agrícola (Moreira et al., 1989, 1999a; Ferreira & Moreira, 1990a; Ferreira, 1991; Catarino & Ferreira, 1994). (Ferreira, 1996a) chamava à atenção para isto mesmo num trabalho de revisão. Em meados dos anos 1990, o termo “infestante aquático” era consensual e a própria EWRS26 o reconhecia. Contudo este conceito «realça apenas as características negativas das plantas, não considera as diferenças de comportamento que possam existir no espaço e no tempo e não inclui as espécies alóctones (ditas exóticas ou alienígenas ou infestantes ambientais) que pelo seu comportamento tentam desalojar as autóctones sem prejuízo direto para o Homem» (Ferreira, 1996a). Esta terá sido das primeiras chamadas de atenção para os trabalhos que até então se realizavam em Portugal (e na Europa), pouco direcionados para a conservação da natureza. Na nossa investigação, pretendemos estudar as espécies exóticas que ameaçam a conservação das autóctones e, como os estudos o demonstram, acabam por ter custos diretos para a sociedade. Esta é a preocupação atual da comunidade científica (Aguiar et al., 1997).

Na última década s.l. os estudos conduzidos parecem seguir a nova perspetiva: a proliferação das espécies exóticas invasoras no ecossistema ribeirinho. Deixou de estar em causa não só a produção agrícola, mas também a manutenção da biodiversidade e a conservação dos habitats autóctones. (Aguiar et al., 1997) discute estas diferentes perspetivas de ver o problema – perspetiva herbológica ou antrópica vs. perspetiva ecológica ou conservacionista. Aparentemente, o primeiro trabalho em Portugal que marca esta diferença de perspetiva é o de (Ferreira & Moreira, 1995), marcado desde logo pela substituição do conceito ‘weed’ (infestante) por ‘invasive’ (invasora). Até aos nossos dias outros trabalhos sobre exóticas invasoras foram surgindo (Aguiar et al., 1997; Moreira et al., 1997) e embora a perspetiva herbológica se mantenha, surge muitas vezes inter- relacionada com uma preocupação conservacionista (e.g. Aguiar, 1996; Aguiar et al., 1996; Ferreira et al., 1998a; Vasconcelos et al., 1999; Catarino et al., 2001; Bernez et al., 2002; Moreira et al., 2002b). Mais recentemente a perspetiva conservacionista tem evoluído e ganho cada vez maior importância no nosso país, como comprovam os estudos recentes de (Aguiar et al., 2001, 2005, 2006a, 2006b, 2007; Bernez et al., 2005, 2006). Como referem (Aguiar & Ferreira, 2012), numa revisão muito recente sobre esta problemática nos ecossistemas ripícolas em Portugal, a evolução mais recente nos estudos das invasões biológicas é a exploração das funcionalidades dos SIG e DR, e.g. dos canaviais de Arundo donax (Pinto & Correia, 2012).

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Este conceito não é consensual, mas seguindo as orientações de (Richardson et al., 2000), ‘infestante’ (weed) não é necessariamente uma planta exótica, pois há espécies autóctones que são infestantes, que reagem rapidamente a fenómeno de perturbação do ecossistema. Por outro lado, é um conceito ligado às práticas agrícolas. Na presente tese, como se analisará no subcap. 1.3, o conceito “invasora” será o utilizado, de forma a indicar as plantas exóticas problemáticas. Para reforçar esta ideia por vezes redigimos a expressão “exótica invasora”.

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Pelo que esta problemática representa a nível mundial – «a segunda maior ameaça à biodiversidade» (Marchante & Marchante, 2007) – o seu estudo nas galerias ribeirinhas é um contributo muito importante. Até porque, como sublinha (Aguiar et al., 1997), a vegetação ripícola é das que sofrerá mais pressões a nível de invasoras. Foram encontrados 139 táxones exóticos entre a flora aquática e ribeirinha de Portugal Continental! (Duarte et al., 2004) e ainda que apenas dezena e meia tenham comportamento invasor em sistemas fluviais portugueses (Aguiar & Ferreira, 2012) bastaria uma (e.g. Arundo donax) para considerar esta uma ameaça real que afeta não só os recursos ecológicos mas também económicos. Vários fatores fomentam este processo: as margens são um habitat propício à colonização, o microclima, o solo rico em água e nutrientes e ainda a facilidade de dispersão das sementes através do movimento das águas. O seu estudo é relevante para a nossa investigação não só a nível da flora exótica e invasora, mas também de formações de exóticas que invadem e substituem a vegetação nativa ripícola. Como aponta o D-L 112/2002 (MAOT, 2002), que aprova o Plano Nacional da Água (PNA), no ponto 2.4. “Conservação da Natureza”, a presença de espécies exóticas condiciona a diversidade dos ecossistemas e depauperam áreas de elevado valor conservacionista, sendo, por isso necessário ações de gestão e controlo continuadas, algo que tem sido completamente negligenciado.

Na nossa opinião, um dos (vários) aspetos que tem contribuído para a dispersão de esforços no combate a este problema ambiental é a confusão ao nível conceptual que ocorre entre espécies invasoras (só as exóticas) e espécies infestantes (exóticas e autóctones). Importa pois centrar os esforços naquelas que colocam em causa a biodiversidade autóctone – as exóticas e sobretudos as invasoras ou com potencial invasor. Desta forma, a crítica não só se aplica aos estudos da Ecologia Dulçaquícola de perspetiva eminentemente herbológica, mas também à Fitossociologia, que ao catalogar espécies exóticas em algumas comunidades, não só como espécies companheiras, mas também configurando na própria designação das associações, provoca a confusão de conceitos. E.g. a descrição da associação Arundini donacis-Convolvuletum sepium Tüxen & Oberdorfer ex O. Bolòs 1962, comunidade dominada pela cana (Arundo donax), uma espécie exótica invasora27 (Marchante et al., 2008), para as margens das ribeiras mediterrânicas (Pinto-Gomes et al., 2008)! Como se pretende demonstrar na Fig. 1 a relação entre a Ecologia (das Invasões) e a Geobotânica parece-nos uma relação num sentido só, onde as ciências geobotânicas (na realidade portuguesa e parte da ibérica) parecem resistir em contribuir com o conhecimento que detêm (que é imenso) para um problema global como as invasões biológicas. Consideramos que em Portugal, nomeadamente, muito pode ser feito nesse sentido – uma aproximação entre a Geobotânica (nomeadamente a Fitossociologia s.l.) e a Ecologia das Invasões é desejável e é possível, apesar dos conflitos epistemológicos que possam existir. O trabalho de (Costa et al., 2009b) é apenas uma das muitas possibilidades de contribuição entre estas ciências ecológicas.

Por outro lado em termos legais o D-L 565/99 (Ministério do Ambiente, 1999a), apesar de fazer de Portugal um dos países pioneiros a nível europeu a regular a introdução de espécies exóticas, além de se reger sobretudo pela proibição da detenção, uso, troca, venda,... destas espécies peca por estar organizado de forma algo confusa. E.g. não é fácil discernir quais as espécies invasoras e as que comportam risco ecológico. No entanto é importante destacar algumas das questões que aí são destacadas e que servem de enquadramento a toda esta problemática, que vai muito para além de uma questão ecológica [Quadro 2].

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A introdução de espécies não indígenas na

Natureza pode originar situações de predação

ou competição com espécies nativas, a transmissão de agentes patogénicos ou de parasitas e afetar seriamente a diversidade biológica, as atividades económicas ou a saúde pública, com prejuízos irreversíveis e de difícil contabilização.

Acresce que, quando necessário, o controlo ou a

erradicação de uma espécie introduzida, que se

tornou invasora, são especialmente complexos e onerosos.

No entanto, a introdução de algumas espécies

não indígenas e a sua exploração revelaram-se

como fatores importantes para o

desenvolvimento da economia nacional, nomeadamente para o aumento da variedade e disponibilidade dos recursos alimentares, como são exemplos históricos a batata e o milho. Conscientes destes factos, pretendeu-se condicionar a introdução na Natureza de espécies não indígenas, com exceção das destinadas à exploração agrícola.

Mas, porque existe o equívoco generalizado de que a um maior número de espécies na Natureza corresponde, no imediato e a longo prazo, uma maior diversidade biológica, pretendeu-se ainda acentuar a dimensão pedagógica necessária à aplicação de princípios de conservação da integridade genética do património biológico autóctone e de prevenção das libertações intencionais ou acidentais de

espécimes de espécies não indígenas

potencialmente causadores de alterações negativas nos sistemas ecológicos.

Nesse sentido, interdita-se genericamente a

introdução intencional de espécies não indígenas na Natureza, visando-se assim

promover também o recurso a espécies autóctones aptas para os mesmos fins. Quanto às introduções acidentais, definem-se medidas relativas à exploração de espécies não indígenas em local confinado, sujeitando-se os estabelecimentos ou as entidades que as detenham a licenciamento e ao cumprimento de normas mínimas de segurança como forma de prevenção.

Esta regulamentação vem atender às obrigações

internacionalmente assumidas por Portugal, ao

aprovar, para ratificação, através do Decreto-Lei n.º95/81, de 23 de Julho, a Convenção de Berna, pelo Decreto n.º 103/80, de 11 de Outubro, a Convenção de Bona, e pelo Decreto n.º 21/93, de 21 de Junho, a Convenção da Biodiversidade, que preconizam a adoção de medidas que condicionem as introduções intencionais e evitem as introduções acidentais, bem como o

controlo ou a erradicação das espécies já introduzidas. Também a Lei de Bases do

Ambiente, Lei n.º 11/87, de 7 de Abril, no seu artigo 15.º, n.º 6, preconiza a elaboração de legislação adequada à introdução de exemplares exóticos da flora e, no seu artigo 16.º, n.º 3, a adoção de medidas de controlo efetivo, severamente restritivas, no âmbito da introdução de qualquer espécie animal selvagem, aquática ou terrestre.

Quadro 2. Extrato da Parte Introdutória (aqui em tópicos) do D-L565/99 que Regulamenta a Introdução de Espécies Exóticas em Portugal. Extract from the Introductory Part of the Portuguese Legislation which Regulates the Introduction of Alien Species

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1.2.4. Tipologias, Índices e Estado e Restauro Ecológico de Cursos de Água e/ou Galerias