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Capítulo 1 A ENFERMAGEM ESCOLARIZADA E A SUA

1.1 A profissionalização da enfermagem no Brasil

Como apresentado, a historiografia da enfermagem brasileira registra a Escola de Enfermagem Alfredo Pinto, fundada em 1890, como a primeira escola de profissionalização da enfermagem do Brasil. No entanto, para efeito de formação de enfermeiras de acordo com o sistema nightingale, a Escola de Enfermagem Anna Nery angariou para si o status de escola oficial-padrão, para fins de reconhecimento das demais escolas de enfermagem no País.

O movimento de profissionalização da enfermagem conhecido como o sistema nightingale iniciou-se na Inglaterra, em 1860, e determinou, de acordo com a historiografia da

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A expressão é usada no sentido que lhe foi atribuída por Rocha (2003, p.14) em seu estudo sobre o Instituto de Hygiene de São Paulo. Segundo a autora, esse Instituto teve papel fundamental na formulação de uma política sanitária que, “calcada nos ideais de prevenção das doenças e manutenção da saúde, elegeu, como objetivo prioritário, a formação da consciência sanitária e constitui a educação sanitária como uma das suas mais importantes pautas, acreditando ser possível, por meio dela, incutir na população e, sobretudo, nas crianças, hábitos saudáveis”.

enfermagem brasileira, o início de uma nova etapa na enfermagem no País – a chamada enfermagem “moderna”27 –, passando a representar o marco do movimento de secularização da enfermagem no Brasil. Idealizada por Florence Nightingale, a secularização da enfermagem28 na Inglaterra vitoriana no século XIX não se atém, como diz Miranda (1994, p. 13), somente à pessoa de Florence, “mas decorre de suas idéias e das suas propostas de trabalho, bem como das obras que ela realizou ao longo de seus 91 anos de vida”. Dentre os escritos de Florence Nightingale, destaca-se o livro Notes on Nursing (Notas sobre Enfermagem) editado em 1859, com primeira e única edição traduzida no Brasil em 1989. De

acordo com a autora, esse livro não pretendia ser um manual, muito menos um conjunto de preceitos sobre as bases técnicas de enfermagem, mas, simplesmente, oferecer às mulheres que tinham a seu cargo a saúde de outras pessoas alguns fundamentos de enfermagem. É que “todas as mulheres, ou pelo menos quase todas, na Inglaterra, assumem, em algum período de sua vida, a responsabilidade pessoal pela saúde de alguém, criança ou inválido – o que significa que todas exercem a enfermagem” (NIGHTINGALE, 1989, p. 11). Parece que ao escrever esse livro e marcar o início da sistematização dos conhecimentos da enfermagem, Florence Nightingale não pensava na profissionalização da mulher como enfermeira, mas na sua escolarização. Entretanto, com a criação da primeira escola de enfermagem e da formação das primeiras enfermeiras, acaba sendo instituída, mundialmente, a profissão da mulher- enfermeira.

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A adjetivação “moderna” para enfermagem cristalizou-se na historiografia brasileira (o que não se tem observado em outros paises) para designar a enfermagem escolarizada de acordo com o sistema nightingale ou com o mesmo significado de enfermagem profissional.

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O movimento pioneiro de secularização da enfermagem surgiu em Lausanne, Suíça, em 1859, um ano antes da fundação da Escola Nightingale. O Conde e a Condessa de Gasparin, inspirados pelo trabalho de Florence na Criméia, fundaram “L’Ecole Normale des Gardes-Malades”, mais conhecida como “La Source”, em oposição ao sistema religioso existente. Os seus fundadores queriam provar que enfermeiras laicas, bem preparadas, seriam capazes de prestar serviços de enfermagem tão eficientes quanto os das religiosas ou diaconisas (ALCÂNTARA, 1966). Entretanto, essa Escola, não teve a repercussão mundial como o sistema nightingale.

No Brasil, a Escola de Enfermagem Anna Nery, criada, articulada e vinculada ao movimento de Reforma Sanitária29 que ocorreu no País na década de 1920, deu início ao processo de formação de enfermeiras sob a inspiração do sistema nightingale de ensino. Assim, esta escola foi autorizada pelos poderes governamentais a difundir um novo saber da enfermagem que deveria caracterizar a nova enfermeira, distinguindo-a dos “antigos enfermeiros”, que se responsabilizavam pelos cuidados aos doentes nas Santas Casas de Misericórdia, nos hospitais governamentais e nos serviços de saúde pública que se reorganizavam no País.

A institucionalização da enfermagem como campo de saber na área da saúde no País surge, portanto, no seio de reformas político-sociais, dentre elas, o movimento higienista- sanitário. O higienismo foi um movimento de caráter internacional, liderado por médicos higienistas e sanitaristas, que teve como eixo de suas preocupações a saúde física e mental dos seres humanos. A educação, como um de seus pressupostos, buscou formas de racionalização da vida das pessoas – intervindo, modificando e controlando seus costumes, hábitos e suas crenças. O objetivo principal dos missionários do progresso – médicos, engenheiros, educadores – era impor um discurso normativo-disciplinar que conseguisse que “homens e mulheres desempenhassem tanto seus papéis como produtores quanto como reprodutores e guardiães de proles sãs e de uma raça ‘sadia’ e, na medida do possível, ‘pura’” (HERSCHMANN, 1996, p. 17). Esse discurso higienista, ao operar com a articulação entre educação e saúde, contribuiu para a inserção da mulher na educação e em profissões como o magistério e a enfermagem. Em nome da ordem e do progresso, medidas saneadoras de todos os males físicos e sociais tinham que ser implementadas.

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Essa Reforma sanitária, coordenada pelo médico sanitarista Carlos Chagas, que lhe deu o nome, foi amplamente financiada pela Fundação Rockefeller, assinalando a intensificação das relações socioeconômicas e culturais entre os Estados Unidos e o Brasil.

Heloisa Helena Pimenta Rocha (2003), em estudo que busca compreender a produção do modelo de intervenção governamental gestado pelo Instituto de Hygiene na cidade de São Paulo, no período de 1918 a 1925, afirma:

Auto-representando-se como porta-vozes da razão, do progresso e da modernidade, esses homens da ciência reclamam para si a responsabilidade pelos destinos da cidade e de seus habitantes, procurando impor-lhes um conjunto de preceitos que deveria guiar as suas vidas. Investindo sobre o espaço urbano, buscam organizar cientificamente a cidade, produzindo um espaço classificado, geometrizado, onde tudo pudesse ser ordenado, controlado (ROCHA, 2003, p. 32).

Nesse contexto produzido como “fundação do novo”, “construção de novos tempos” a partir de uma batalha renhida do “novo” contra o “velho”, em que se pretendia uma ruptura radical com o passado e com tudo que fosse identificado como obsoleto e arcaico, a educação da mulher e, particularmente, da mulher-enfermeira, – a enfermeira de saúde pública – torna-se um elemento estratégico na veiculação e na implementação de mensagem higienista.

Proveniente de uma concepção norte-americana, a enfermeira de saúde pública tornou-se a figura central na reforma sanitária mundial. De acordo com Ethel Parsons, chefe da missão norte-americana30 que institucionalizou a profissão no Brasil, a enfermeira, ao mesmo tempo em que trata verdadeiramente dos doentes e dá-lhes conforto com as suas próprias mãos, “transmite-lhes os benefícios adquiridos em sua experiência hospitalar, ensinando, por exemplos, preceitos e palavras, as lições indispensáveis da higiene e de prevenção contra as moléstias, o que significa a perpetuação de uma raça sadia” (PARSONS, 1997, p. 11).

O processo de penetração das idéias norte-americanas em todos os setores e, particularmente, na economia brasileira durante a Primeira Guerra Mundial teve a sua legitimação no final da guerra, com o estabelecimento das áreas de poder das grandes

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Sobre a atuação da missão das enfermeiras norte-americanas no Brasil, que culminou com a criação da Escola de Enfermagem Anna Nery, conferir SAUTHIER; BARREIRA (1999).

potências do mundo, em que os Estados Unidos “conquistam” seus “direitos” de expansão sobre as Américas. A “doutrina Monroe” solidificava a idéia dos pioneiros norte-americanos de que o seu país tinha papel especial na “cristianização” do mundo, entendendo-se “cristianização” também como modelo político e econômico de nação (MESQUITA, 1994).

A expansão econômica dos Estados Unidos no Brasil veio acompanhada pela importação de um modelo de administração pública em que se incluía a administração sanitária, adotada pelos sanitaristas brasileiros que passaram a fazer uma insistente pregação da “nova ciência sanitária”, acreditando que, ao “imitar os norte-americanos”, o Brasil atingiria o grau elevado de civilização daquele país (SAUTHIER; BARREIRA, 1999). Na verdade, a ciência “moderna” funciona como uma bússola para a própria sociedade, indicando os caminhos para o “progresso”, fortalecendo, portanto, a crença de que sem ela a sociedade dificilmente se beneficiaria das conquistas sociais, econômicas e culturais. E aqueles que falavam pela ciência revestiam-se de um poder típico, distinto da autoridade política tradicional. Assim, a ciência, ao conferir este poder a seus porta-vozes, credenciava suas práticas identificando-os como “cientistas profissionais” (BOMENY, 1993).

De acordo com Gilberto Hochman (1993), o período Pós-Primeira Guerra foi, no exterior e no Brasil, marcado por intensa atuação de movimentos de caráter nacionalista. Esses movimentos pretendiam descobrir, afirmar e reclamar os princípios da nacionalidade e realizá-los por intermédio do Estado Nacional. No Brasil, vários caminhos foram utilizados para a recuperação e/ou fundação da nacionalidade: educação, saúde, valores nacionais, etc. A Liga Pró-Saneamento do Brasil foi um desses movimentos, fundado em 1918, no auge da epidemia da “gripe espanhola”, que foi considerada a última pandemia do século XX. A morte do presidente eleito Rodrigues Alves, no início de 1919, vitimado pela gripe, demonstrou, de forma trágica, uma das faces do estado sanitário do País. Passa-se, então, a requerer e a exigir do governo a implementação de medidas saneadoras e de mudanças

urgentes na área da saúde pública. A Liga pretendia alertar as elites políticas, intelectuais e econômicas para a precariedade das condições sanitárias e obter apoio para uma ação de saneamento no interior do País. O “saneamento dos sertões”, como ficou consagrado, foi um dos diversos caminhos encontrados para recuperar e civilizar o País.

Desde 1916, com a publicação do relatório da expedição médico-científica realizada por Belisário Penna e Arthur Neiva e a enorme repercussão da frase “O Brasil é um imenso hospital”, dita por Miguel Pereira, a saúde e o saneamento tornaram-se temas nacionais (HOCHMAN, 1993).

Nesse contexto, Carlos Chagas assumiu a direção do Instituto de Manguinhos em 1917, após a morte de Oswaldo Cruz. No ano seguinte, ele foi chamado pelo governo brasileiro para coordenar a campanha contra a epidemia de gripe espanhola e também encarregado, pelo Presidente Epitácio Pessoa, de elaborar um programa de saúde pública. A atuação de Carlos Chagas ao movimento dos médicos sanitaristas, criadores e participantes da Liga Pró-Saneamento do Brasil, em prol da saúde pública como de responsabilidade governamental, resultou na criação do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), em 2 de janeiro de 1920.

A criação do DNSP institucionalizou, de forma definitiva, as práticas sanitárias, tornando possível a ascendência política do círculo intelectual médico-sanitário e permitindo a entrada de uma nova geração de jovens sanitaristas nos projetos governamentais voltados para o setor da saúde. Esses médicos passaram a influenciar nas decisões relativas à questão sanitária, sob a liderança do diretor do departamento, Carlos Chagas, e com o apoio logístico

e financeiro da Fundação Rockefeller31.

Os médicos sanitaristas do DNSP, principalmente os da Inspetoria de Profilaxia de Tuberculose, o inspetor Dr. Plácido Barbosa e seu assistente, Dr. J. P. Fontenelle, percebiam que para o êxito do trabalho deles seria necessário estabelecer um elo entre os dispensários e os lares dos doentes. Esse elo almejado e indispensável em toda organização sanitária seria a enfermeira de saúde pública, de acordo com o instituído nos Estados Unidos da América. Essa enfermeira faria “a ligação entre os ambulatórios e os lares dos pacientes, estimulando-os a executar os tratamentos médicos e inculcando-lhes noções sanitárias” (FORJAZ, 1959, p. 318). Assim, em 1921, em visita aos Estados Unidos, Carlos Chagas pediu auxílio ao International Health Board no sentido de estabelecer um serviço de enfermeiras de saúde pública para preencher essa lacuna no País. Atendendo a esse pedido, Ethel Parsons veio ao Brasil para fazer um estudo da situação dos serviços de saúde e das ações de enfermagem neles empreendidas e recomendar um programa de ação (PARSONS, 1997).

Dentre os diversos serviços voltados para a atenção à saúde e para a formação de pessoal da área, criados e subordinados diretamente ao DNSP e financiados pela Fundação Rockefeller, destacam-se aqueles em que a Missão Parsons organizou e coordenou: um serviço unificado de enfermeiras de saúde pública, que começou a fazer as visitas domiciliares para o controle sanitário da população do Rio de Janeiro e o atendimento nos

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A Fundação Rockefeller encontra-se no cerne do processo que gerou e constituiu o campo de atuação do que foi caracterizado como filantropia científica, compreendida como destinação de recursos privados para a produção de conhecimentos científicos. Em estudos aprofundados sobre o papel da Fundação Rockfeller na difusão de um modelo científico de excelência e sobre o seu caráter filantrópico, Marinho (2001, p. 33-34) destaca que, “atuando privativamente em setores de interesse público, a Fundação Rockefeller agiu no sentido de selecionar pesquisadores, apoiar grupos de pesquisa e fornecer recursos para compra de equipamentos e instalação de infra-estrutura destinada à pesquisa científica. Tais recursos traduziram-se em bolsas de estudo, subsídios para a aquisição de bibliografia especializada, montagem de laboratórios, financiamento de viagens de estudo e de professores visitantes, direcionando, desse modo, uma pauta de interesses para o setor”. É importante destacar, também, que “embora amparado por um discurso filantrópico, as ações empreendidas pela Fundação estavam marcadas pelo viés da eficiência. Desse modo, a filantropia pautava-se não por um suposto caráter desinteressado, caritativo, mas por uma lógica de resultados, plenamente assumida em suas concepções [...]” (MARINHO, 2001, p. 154, grifos da autora).

dispensários de controle e profilaxia da tuberculose; um hospital geral, mediante a reorganização do Hospital Geral de Assistência – o Hospital São Francisco de Assis – e uma escola de enfermagem vinculada a esse hospital – a atual EEAN32.

Apesar de ter recomendado a criação de uma escola de enfermagem, Ethel Parsons duvidava do êxito da nova instituição. Isso porque era reduzido o número de médicos e de outras pessoas que conheciam o trabalho da enfermeira diplomada nos Estados Unidos e em alguns países da Europa.

Inicialmente, como em diversos países do “mundo civilizado”, a Escola Anna Nery teve dificuldade em recrutar as candidatas ao curso. Parsons achava que não era exagero afirmar que os brasileiros consideravam a enfermagem da mesma maneira que os ingleses a consideravam antes de Florence Nightingale e temia que as moças de classe social mais elevada não aceitassem a nova profissão. Entretanto, a despeito do “preconceito nacional e tradicional” e da necessidade exigida pelo serviço, as moças brasileiras atenderam ao convite feito para o ingresso na escola. Para Parsons, as alunas que entraram para a escola não como meio de vida, mas por motivos e ideais de se prepararem para “um grande serviço patriótico e humanitário” têm demonstrado espírito de devoção e idealismo, que é uma verdadeira inspiração, assim como excelente habilidade executiva e energia no trabalho prático (PARSONS, 1997). Ethel Parsons afirmara, também, que muitos brasileiros tinham dúvidas quanto ao sucesso da Missão, “por ser um projeto de uma Escola de Enfermeiras, aventura nunca experimentada na América Latina, com exceção de Cuba”. Para ela existia uma grande interrogação: “Interessar-se-iam suficientemente as senhoras brasileiras, das melhores camadas sociais, pela nova profissão, para consentirem em deixar as suas casas e seguirem o interessante, conquanto difícil, preparo exigido?” (PARSONS, 1997, p. 13).

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Denominações dessa Escola: Escola de Enfermeiras do Departamento Nacional de Saúde Pública (1922); Escola de Enfermeiras D. Anna Nery (1926); Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade do Brasil (1937); Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro (1965).

As preocupações de Ethel Parsons mostram que o projeto da Missão era compreendido como “uma aventura” no sentido de visar à formalização de uma profissão voltada para as senhoras das melhores camadas sociais, que até então se encontravam no recôndito do lar. Para ela, “não havia como negar que o preparo [para a profissão] teria de ser penoso e exigente, pois que tratando-se de vida e de morte, o cumprimento rigoroso de uma disciplina, militar em sua conscienciosa exatidão, é necessário” (PARSONS, 1997, p. 13).

De acordo com Edith Fraenkel33 (1997, p. 10), em Relatório do Serviço de Enfermeiras do Departamento Nacional de Saúde Pública abrangendo o período de 1922 a 1930, não foi fácil conseguir candidatas ao curso de enfermagem. Assim, Fraenkel diz que houve um trabalho ativo de propaganda para recrutar alunas para a instalação da escola, sendo estabelecida desde o início, como requisitos indispensáveis à matrícula, uma sólida educação e idoneidade moral.

Certamente, nessa época, na sociedade brasileira em geral e no campo da saúde em particular, o trabalho da “nova” enfermeira – a enfermeira diplomada – era desconhecido. O que chama a atenção na historiografia da enfermagem brasileira é o fato do seu estranhamento ante esse desconhecimento. Ou seja, os estudos históricos que analisam a institucionalização da enfermagem como profissão no Brasil pelo viés de elementos que se colocam como obstáculos à difusão do sistema nightingale registram o desconhecimento da população sobre a nova profissão como um dos próprios obstáculos.

No entanto, como mencionado anteriormente, dentre os segmentos sociais brasileiros que já tomavam ciência da possibilidade de contar com a nova profissional e que

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Edith Fraenkel, enfermeira brasileira, formada nos Estados Unidos. Atuou como Instrutora e Coordenadora de Ensino na Escola de Enfermagem Anna Nery e substituiu Ethel Parsons, em 1931, na superintendência dos Serviços de Enfermagem do DNSP, onde permaneceu até a integração desse Departamento ao Ministério de Educação e Saúde. De acordo com Carvalho (1976, p.12), Edith de Magalhães Fraenkel “tendo revelado muito cedo sua capacidade e pendores para liderança, ao lado de grande potencial para o trabalho, foi escolhida para se preparar a fim de, futuramente, ocupar o cargo de Superintendente Geral”. Aceitando sugestão de Ethel Parsons e com auxílio da Fundação Rockefeller, seguiu para os Estados Unidos para fazer o curso de Enfermagem na Escola de Enfermagem do Hospital Geral de Filadélfia, onde permaneceu de março de 1922 a maio de 1925; de maio a novembro visitou escolas e serviços de Enfermagem do Canadá e nesse mesmo mês voltou ao Brasil. Foi, portanto, a primeira brasileira a fazer o curso de Enfermagem de três anos completos.

começavam a se interessar pela formação da mulher-enfermeira de saúde pública, destaca-se aquele representado pelos médicos. O discurso do médico sanitarista Manoel Ferreira em homenagem póstuma a Ethel Parsons, durante sessão conjunta da Sociedade Brasileira de Higiene e da Associação Brasileira de Enfermeiras Diplomadas, relembra essas questões.

Num tom saudosista, o discurso de Dr. Manoel Ferreira procura estabelecer determinadas memórias das “novas atividades” comandadas por “novos batalhadores” no campo da saúde pública, ao enumerar algumas das questões sanitárias do País na década de 1920, bem como ao discorrer sobre o “espaço sanitário” instituído pela chefe da Missão de Enfermeiras Norte-Americanas para a atuação da nova profissional, que foi introduzida na sociedade brasileira como parte de um amplo projeto de intensificação da entrada do capital norte-americano no País, representado pela “Benemérita Fundação Rockefeller”:

Resultando das devastações de pandemia de gripe de 1918, surgia com Carlos Chagas o Departamento Nacional de Saúde Pública, no qual se plasmavam novas concepções, se estruturavam novas atividades e se conclamavam novos batalhadores para a retomada do caminho que se havia perdido depois da era de Oswaldo Cruz. O desaparecimento deste grande líder trouxera além de outros infortúnios, um rápido afundamento do trabalho de Saúde Pública. Das memoráveis campanhas de febre amarela e da peste bubônica; de presença na Amazônia e das perspectivas em marcha na Capital da República, passávamos à burocratização das Delegacias de Saúde, aos ‘Habite-se’ às ‘Multas’ e às desinfecções terminais como resíduos últimos do que havia sido uma era de vitórias e de horizontes largos. Os poucos teimosos que se recusavam a soçobrar no barco furado eram, de um lado o velho e inesquecível Plácido Barbosa, sozinho, incompreendido e desprezado e de outro, uma plêiade jovem e combativa que junto de Belizário Pena se atirava em cheio ao campo de Saneamento Rural.

Plácido Barbosa, Inspetor de Serviços de Tuberculose ao ser criado o