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A publicidade dos precedentes do Supremo Tribunal de Justiça

3. OS PRECEDENTES JUDICIAIS NO DIREITO DO IMPÉRIO

3.4 A publicidade dos precedentes do Supremo Tribunal de Justiça

Como se referiu acima, a cultura jurídica constitucional (ao menos durante a maior parte do Império) rechaçava a ideia de um tribunal intérprete autêntico da lei, e em seu lugar concebeu um tribunal responsável por aplicar a lei aos casos concretos – razão pela qual, na opinião de José Reinaldo de Lima Lopes, não foram criadas condições favoráveis à instituição da regra do precedente obrigatório no Direito brasileiro311. Associados ao papel do recurso de revista como um instrumento de cassação nos moldes franceses, estes fatores resultaram em um cenário em que não havia estímulo para a organização de repertórios oficiais de precedentes.

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BATISTA, Francisco de Paula. Compendio de Theoria e Pratica do Processo Civil Comparado com o Commercial e de Hermeneutica Juridica para Uso das Faculdades de Direito do Brazil, cit., p. 448.

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Sobre os costumes como fontes no Direito português e na visão dos juristas do Império, cf. ALVES, José Carlos Moreira. “O Direito Consuetudinário”. Notícia do Direito Brasileiro. Brasília, Vol. 2, p. 15-37, 1996. 309

BATISTA, Francisco de Paula. Compendio de Theoria e Pratica do Processo Civil Comparado com o Commercial e de Hermeneutica Juridica para Uso das Faculdades de Direito do Brazil, cit., p. 444-445. 310

ALMEIDA, Cândido Mendes de. Codigo Philippino ou Ordenações e Leis do Reino de Portugal Recopiladas por Mandado D’el Rey D. Philippe I, cit., T. 3, p. 663, nota 1.

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Embora os julgamentos não fossem secretos, a fundamentação das decisões fosse exigida312 e se admitissem os votos divergentes em decisões colegiadas, não se criaram coletâneas oficiais e nem revistas jurídicas e dedicadas a publicar decisões judiciais, embora alguns periódicos o fizessem, entre outros conteúdos divulgados313; por outro lado, é importante lembrar que o art. 14 da Lei de 18 de Setembro de 1828 determinava o registro das cassações concedidas e denegadas em Livro, e sua publicação pela Imprensa oficial.

Por outro lado, diversas obras jurídicas publicadas no decorrer do século XIX mencionaram precedentes do Supremo Tribunal de Justiça ou das Relações na exposição das questões jurídicas discutidas em diversos gêneros literários, na forma de Códigos comentados314, manuais práticos para o uso de profissionais do Direito315 ou livros de prática processual, que adaptavam ao foro brasileiro textos produzidos no exterior (especialmente em Portugal316), bem como exposições sobre a ordem do processo civil ou criminal317.

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A regra de fundamentação das decisões judiciais constante das Ordenações Filipinas ainda vigia; havia também previsão legal específica para a fundamentação da concessão de revistas pelo Supremo Tribunal de Justiça, ex vi art. 13 da Lei de 18 de setembro de 1828: “Art. 13. Quando o ultimo tiver visto o processo, o apresentará na mesa no dia, que o Presidente designar, e a portas abertas, illustrado o Tribunal pelos tres Juizes, que viram os autos, e debatida a questão por todos os membros presentes, decidir-se-ha á pluralidade de votos, se se deve, ou não, conceder a revista: o resultado se lançará nos autos com as razões, em que elle se fundou”.

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A Gazeta dos Tribunaes foi publicada entre os anos de 1843 e 1846; a Chronica do Foro foi publicada entre os anos de 1859 e 1861; a Revista do Instituto da Ordem dos Advogados foi lançada em 1862 e circulou pelo menos até 1893; a revista O Direito começou a circular em 1873 e foi publicada até pelo menos até 1913. Todas estas revistas reportavam decisões judiciais, mas não era este o seu propósito principal e nem uma parte obrigatória do seu conteúdo. Não obstante, a divulgação de precedentes nestes veículos permitiu que a doutrina se referisse a estes meios com a finalidade de direcionar os leitores à pesquisa e leitura dos precedentes que mencionavam em suas obras.

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São exemplos de obras deste gênero: PESSOA, Vicente Alves de Paula. Codigo Criminal do Imperio do Brazil, Commentado e Annotado com os Principios de Direito; Legislação de Diversos Povos, Leis do Paiz, Decretos, Jurisprudencia dos Tribunaes do Paiz, Avisos do Governo Interpretando, Alterando ou Revogando Diversas das suas Disposições até o Ano de 1884, 2a ed. Rio de Janeiro: Livraria Popular de A. A. da Cruz Coutinho, 1885; TINOCO, Antonio Luiz Ferreira. Codigo Criminal do Imperio do Brazil Annotado. Rio de Janeiro: Imprensa Industrial, 1886; COSTA, Salustiano Orlando de Araujo. Codigo Commercial do Brazil, Annotado com Toda a Legislação do País que lhe é Referente; com os Arestos e Decisões mais Notáveis dos Tribunaes e Juízes; Concordado com a Legislação dos Paízes Estrangeiros, Mais Adiantados; com um Vasto, e Copioso Appendice, Também Annotado, Contendo não só Todos os Regulamentos Commerciais, como os mais Recentes Actos do Governo, quer sobre Bancos e Sociedades Anonymas, quer sobre Impostos, Dispensando Consultar-se a Collecção das Leis do Imperio, 6a ed. Rio de Janeiro: Laemmert & C., 1896.

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A exemplo de: MALHEIRO, Agostinho Marques Perdigão. Manual do Procurador dos Feitos da Fazenda Nacional nos Juízos de Primeira Instância, 2a ed. Rio de Janeiro: Eduardo e Henrique Laemmert, 1873; ALMEIDA, Cândido Mendes de. Auxiliar Juridico (…), cit. FREITAS, Augusto Teixeira de. Consolidação das Leis Civis, 3a ed. Rio de Janeiro: B. L. Garnier, 1876.

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A exemplo de: RAMOS, Joaquim José Pereira da Silva. Doutrina das Acções Accommodada ao Foro de Portugal com Addições da Nova Legislação do Codigo Commercial Portuguez e do Decreto n.º 24 de 16 de maio de 1832 e Outros que Derão Nova Face à Administração da Justiça, por José Homem Corrêa Telles, Consideravelmente Augmentada e Expressamente Accomodada ao Fôro do Brasil por Jose Maria Frederico de Souza Pinto, 6a ed. Rio de Janeiro: Eduardo & Henrique Laemmert, 1865. Sobre a influência do Direito português no Brasil durante o século XIX, cf. FILHO, Alberto Venancio. “Aspectos das Relações entre o Direito