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4. A Criação da Comissão Pastoral da Terra e a Fundação da diocese de itaguaí

4.3 A questão da terra durante o Regime Militar

A Igreja Católica, na década de 1930, disputava o espaço público com as forças de esquerda. Um exemplo dessa disputa foi a ação do Círculo Operário Católico que, desde 1930, procurava fazer frente à presença da esquerda junto aos trabalhadores. Uma das marcas do sindicalismo cristão no período anterior ao golpe se diferenciava por

atuar através de suas ações no estritamente legal. Sua principal arma após o golpe era a legislação existente como o Estatuto do Trabalhador Rural e o próprio Estatuto da Terra. Os advogados de Sindicatos e federações seus grandes aliados fizeram da Justiça, principalmente a trabalhista, um dos principais espaços de resolução, mas também de mediação de publicação de conflitos, trazendo-os para fora das propriedades e da relação direta e personalizada com os proprietários.

Segundo Mario Grynszpan (1987), no Período de 1940 a 1960, os Camponeses afirmavam como atores políticos organizados em ligas camponesas, associações e lavradores lutando por terra e por direitos. Ocorreram manifestações do homem do campo na cidade, grandes congressos camponeses, greves maciças na área rural, as primeiras ocupações para forçar desapropriação de terras. No Rio de Janeiro, essa mobilização atingiu níveis consideráveis. Surgiu a primeira organização nacional dos trabalhadores rurais, União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil (ULTAB). Houve nesse período, de certa forma, uma resposta positiva por parte do poder público, voltadas para a redistribuição da propriedade da terra, áreas de conflito e fazendas foram desapropriadas. Ocorreram também iniciativas por parte do governo estadual e posteriormente do governo federal, foi criada a Superintendência de política Agraria, no Governo de João Goulart e de regulamentação da organização do campesinato através da sindicalização, a criação da CONTAG em 1964, dando origem ao MSTR. Além disso, ocorreu a aprovação do Estatuto do Trabalhador Rural, em 1963 estendendo para o campo dos direitos trabalhistas que as cidades conheciam desde 1930.

Só com Jango houve a percepção do mundo rural e de seus problemas como questões sociais. O período que antecedeu a 1964 foi marcado por forte e extensa mobilização no campo, ocupando a Reforma Agrária o centro do debate político. A luta pela sua implementação, as mobilizações e as pressões sobre o Congresso para a sua aprovação foram elementos determinantes para sua aprovação (GRYNSZPAN, 1987).

Com o golpe de 1964, procurou-se por freio e desmobilizar eliminando a tensão. As medidas repressivas foram capazes de refrear a mobilização. Foram eliminando os focos de tensão, mas isso não foi suficiente para reverter a expectativa criada em torno da realização de uma Reforma Agrária, vista por boa parte da população como remédio para o os males econômicos e sociais vividas pelo país. Houve a disseminação de que a Reforma Agrária era uma medida legítima e necessária para o país. Após o golpe, a questão Agrária manteve a condição de problema central. Pesavam também as

preocupações com a eclosão de processos revolucionários na América Latina aos moldes do que ocorreu em Cuba (GRYNSZPAN, 1987).

Em 1964, no governo Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, foi criado o Estatuto da Terra, a lei que regia a implementação de uma Reforma Agrária no país. Termos como a “justiça social” e a garantia da “liberdade” e da “dignidade” foram incorporadas ao Estatuto, assim como críticas ao latifúndio. O estatuto e os dispositivos legais que a eles seguiram incorporavam medidas que vinham sendo demandados havia alguns anos, mas que não obtinha na passagem no congresso. Uma dessas medidas era o pagamento de indenizações pela desapropriação de terras em títulos da dívida agrária. O Estatuto da Terra se inscrevia em um projeto autoritário mais amplo, ganhando um sentido de desmobilização, excluindo a participação direta dos Trabalhadores Rurais (GRYNSZPAN, 1987).

À ênfase política, substituiu se a econômica os debates. A reforma passou a ter como objetivo aumentar a produtividade e a oferta de bens agrícolas sem precisar aumentar o acesso à terra. O estatuto previa uma política redistributiva, promoção do desenvolvimento agrícola, transformação das grandes propriedades em empresas rurais. Estavam definidos mecanismos de pressão, com a aplicação progressiva do Imposto Territorial Rural (ITR) e a desapropriação de terras improdutivas. Foi quando o MSTR pode se rearticular foi ao Estatuto de Terras que ele se apropriou de forma a legitimar sua luta pela realização de uma reforma agrária (GRYNSZPAN, 1987).

Em 1969, o governo do General Artur da Costa e Silva criou o Grupo Executivo da Reforma Agrária (GERA), que deveria orientar, coordenar e promover a reforma agrária, identificando seus obstáculos e definindo as áreas prioritárias. O IBRA ficaria sob sua coordenação enquanto o INDA atuaria com o Ministério da Agricultura. Em Julho de 1970, esse arranjo foi extinto (GRYNSZPAN, 1987).

No governo do General Emílio Garrastazu Médici criou-se o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). A reforma agrária produzida pelo INCRA passou a significar basicamente colonização, ocupação, controlada e dirigida de áreas, Amapá Amazonas Goiânia Maranhão legal que abrangia Terras do Acre Amapá, Amazonas, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Pará Rondônia e Roraima. A mobilização da agricultura gerou intensos conflitos, envolvendo uma multiplicidade de categorias de trabalhadores e a violência no campo produziu um número considerável de mortes, agressões e ferimentos, que revelaram a atuação de jagunços, capangas, milícias, pistoleiros e matadores de aluguel (GRYNSZPAN, 1987).

O PIN (1970) Plano de Integração Nacional lançado pelo governo Médici tinha em conta essa situação, de reduzir tensões sociais decorrente da demanda de terra, na medida em que articulava e destinava recursos tanto para a construção de estrada quanto para a colonização e para a realização de um programa de irrigação do Nordeste. Buscava-se reduzir as tensões sem as desapropriações o que somente adiou o conflito. O surgimento do MST foi um dos efeitos do fracasso da política de colonização dos governos militares (GRYNSZPAN, 1987).

A colonização foi uma das faces da ocupação das áreasde fronteira. Ao lado dela observou-se também a instalação de grandes projetos agropecuários ou de mineração por empresas como montadoras de automóveis, bancos, que para isso recebiam incentivos fiscais e recursos da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM) e do Banco da Amazônia/S.A. (BASA) - a valorização das terras pelo asfaltamento. Comunidades indígenas inteiras foram alvos de violência, grupos foram exterminados ou tiveram que se distanciar. Também posseiros passaram a ser expulsos de forma violenta. Esse fato ocorreu de forma similar no Litoral Sul Fluminense no período.